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Universidade Brasileira: Reformas Educacionais

Com a revolução de 1930, implanta-se no Brasil a Universidade, e em 1931, implementa-se a Reforma Educacional, numa tentativa de adequação do ensino nacional às necessidades resultantes da industrialização e da

urbanização, trazendo para o ensino jurídico o estudo dos fundamentos econômicos com “autonomia reflexiva e metodológica”281.

A reforma Francisco Campos concretizava a universidade orgânica, já apregoada por Anízio Teixeira, programando-se vários cursos isolados, em atenção aos vários níveis de adiantamento dos alunos e, posteriormente, criando- se a Universidade do Distrito Federal (1935/1939). Tal situação permaneceu, com pequenas alterações, até 1961, quando da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que, todavia, não trouxe nenhuma proposta inovadora para o ensino jurídico. O currículo jurídico, desta feita, permanece sem retratar nenhum sentimento renovador, como ocorrera em períodos anteriores.

Neste momento, cumpre-nos uma política ideológica com sensíveis influências para o sistema educacional brasileiro.

MORAIS (1989), em estudo realizado sobre a educação e cultura brasileiras, faz uma análise abalizada sobre a hegemonia exercida pelos Estados Unidos sobre as Américas, especialmente com relação aos países subdesenvolvidos, dentre eles o Brasil, influência essa marcante após a Segunda Guerra Mundial, a qual projetou os Estados Unidos como “heróis mundiais da liberdade e da democracia, como aliados de quantas nações desejassem preservar sua soberania”282. Da mesma maneira, a segunda Guerra Mundial

provoca a “bipolarização do poder”, situando a União Soviética num pólo e Estados Unidos no oposto, totalmente divergentes na limitação do seu exercício de poder, “a fim de criar condições de convivência internacional”283.

A análise realizada revelou perspicácia sobre a situação, tendo em vista não nos termos apercebido, logo de início, sua verdadeira intenção

dos nossos aliados norte-americanos, os quais nos ofereceram de princípio uma face simpática, evocativa da Doutrina de Monroe (“A América para os

281 BASTOS, Aurélio Wander (2000). O Ensino Jurídico no Brasil. p.338. 282 MORAIS, Regis de (1989). Cultura Brasileira e Educação, p.119. 283 Idem, p. 113.

americanos”) ... Quem não se recorda da estupenda admiração que o homem comum brasileiro nutria pela exemplar civillização estadunidense?284

No entanto, a apreensão faz-se sentir mediante a posição assumida pelo presidente Theodore Roosevelt, quando se posiciona sobre o desejo do país, ou seja, “ver que nos países vizinhos reina a estabilidade, a ordem e a prosperidade” e que todo

Estado cujo povo se conduza bem pode contar com nossa cordial amizade. Se uma nação se mostrar capaz de atuar com eficiência e decência do ponto de vista social e político, se mantém a ordem pública e ‘cumpre com suas obrigações’ não deverá temer intervenções dos Estados Unidos. No entanto, uma ordem crônica ou uma impotência resultante do relaxamento geral dos laços da sociedade poderiam exigir da América, como em qualquer outra parte, a intervenção de uma nação civilizada. No hemisfério ocidental, a Doutrina Monroe pode obrigar os Estados Unidos, ‘embora contra sua vontade’, a exercer, em casos de flagrante desordem ou de impotência, um poder de ‘polícia internacional285.

A manipulação sutil fez-se sentir por meio das técnicas de comunicação em massa; a americanização do Brasil se “impõe no vácuo deixado pelo declínio da influência européia”286.

Uma nação apenas iniciada no processo de sua industrialização, uma vez conduzida à órbita de dependência dos Estados Unidos, viu-se de súbito invadida por avançada tecnologia veiculadadora de valores bem mais pragmáticos do que os que até então cultivara. Em poucos anos nós brasileiros tivemos de fazer áspera trajetória que ia do savoir-faire ao Know-how – digo áspera porque era uma trajetória que nos levava de um clima de sensibilidade e sutileza, de inteligência e sagacidade a um clima de esperteza e oportunismo individualista sublimados em condicionamento tecnológico287.

Observa-se que aos poucos vai-se afastando a influência cultural francesa, passando o povo brasileiro a abraçar tão só os hábitos americanos, bem como seus costumes, pois culturalmente estes ainda buscavam uma cultura

284 Idem, p. 113.

285 BRUTI, Hector (1986). O imperialismo. Apud MORAIS, Regis de, Cultura Brasileira e Educação, p.91. 286 MORAIS, Regis de (1989). Op. cit. p.117.

homogênea calcada na européia, concluindo-se que faltava aos Estados Unidos uma “riqueza civilizatória para se impor a outros países”288.

A esse respeito, MORAIS (1989), deixa claro que o fator do empobrecimento cultural dos Estados Unidos à época, sua busca pela hegemonia, nos trouxe um

empobrecimento ainda maior, pois se já vivíamos com um ethos tomado de empréstimo a outra formação cultural (a francesa), se já experenciávamos uma situação básica de inautenticidade, naquele instante éramos transferidos para outra situação de inautenticidade – só que infinitamente mais pobre, na qualidade intrínseca de seus valores289.

Dando continuidade à nossa exposição, urge lembrar a prática constante do comportamentamentalismo decorrente, particularmente da teoria de Skinner, “que compreendeu ser o bastante manipular o agir para transformar o ser”290, resultando em

1. que se procurasse ampliar o comportamentalismo a outros campos das ciências humanas;

2. que o behaviorismo fosse erigido em grande modelo para os países atraídos à órbita de influência norte-americana.

Essa influência foi marcante na área da educação, originando-se, dessa prática que absorvia os princípios básicos, a racionalidade, a eficiência e a produtividade, hoje pilares basilares da tecnologia do ensino, ou seja, das pedagogias tecnicistas, centradas no pragmatismo profissional do tipo how to do, as quais alastraram-se, assomando a diversas áreas do conhecimento, inclusive a jurídica, cedendo os grandes e importantes estudos jurídicos o passo a um praticismo formador de rábulas diplomados.

288 Idem, p. 118.

289 MORAIS, Regis de (1989). Op.cit. 119. 290 Idem, p.119-120.

Não bastasse tal situação, registre-se que a influência americana somou- se à mentalidade consumista, em decorrência dos hábitos e costumes americanos que proscreveram os ideais culturais e éticos.

Com relação à Pedagogia tecnicista, esta ganhou sua primazia na década de 1960, quando acordos foram estabelecidos entre MEC (Ministério da Educação e Cultura) e USAID (United States Agency for Internacional Development), firmando-se a hegemonia dos Estados Unidos, num momento de

especial vassalagem dos governos ditatoriais,291 entre os quais nos incluíamos.

Assim, a promissora virada da educação para o povo dos anos 60, uma vez incinerada pelas chamas de um lamentável equívoco histórico, foi transformada em componente barato dos adubos que alimentaram o crescimento da educação tecnicista em nossa paisagem292,

com profundos reflexos na nossa sociedade hoje produtivista e consumista, e, conseqüentemente, na esfera jurídica que dominou com seus cursos jurídicos a formação superior.

Sem dúvida, a ideologia dominante na Europa sempre produziu seus reflexos no Brasil, mas sempre esbarrou no poder estatal, representante da elite dominante e muito tardiamente os absorveu, resultando na estagnação do Direito, bem como os reflexos decorrentes da maléfica americanização tecnicista de ensino.

4.5. Resolução nº 3 do Ministério da Educação e Cultura: Flexibilidade