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4 A A VALIAÇÃO DA P ARTICIPAÇÃO B RASILEIRA NA P ROMOÇÃO

4.1 A S T ENDÊNCIAS DAS I DEIAS DE I NSERÇÃO DA D IPLOMACIA

4.1.1 A UTONOMISMO

Autonomia significa poder estabelecer as suas decisões sem depender dos outros. Com os países este termo também detém esta significação, ou seja, a nação tem liberdade para imprimir sua inserção internacional sem se subordinar a outras. Neste sentido o Brasil pode ser considerado autônomo, particularmente após o fim do confronto bipolar. Portanto, na atualidade, sua política externa não sofre pressões a ponto de se atrelar às demandas dos outros países do sistema, e suas decisões são tomadas por seus formuladores de maneira independente. Em poucas palavras, possui liberdade de ação para perseguir seus interesses. Adicionalmente, o conceito denota a tentativa de poder auferir mais influência nas decisões tomadas em âmbito global.

Nos discursos e documentos oficiais emitidos por policy makers brasileiros encontra-se a menção de termos que remetem preceito da autonomia do Brasil. Especialmente, quando desejam reafirmar e

defender a soberania de seus territórios e interesses. Neste sentido a autonomia denota uma conotação individual, pois primeiramente o que vale é o interesse da nação, e não o atrelamento dos interesses de outros países.

De um lado enxerga-se de forma positiva esta autonomia, pois o Brasil não estaria vinculado aos desígnios de outros países, já que em sua história, o país já tivera sido uma colônia de Portugal e por séculos deteve suas decisões amarradas ao planejamento político luso. Para as elites dirigentes participes da formulação de política externa, a autonomia manifesta-se como um trunfo para uma nação com as grandes dimensões populacionais, territoriais e de riquezas como o Brasil, já que com estes gabaritos, haveria a potencialidade de buscar de modo independente um lugar de destaque entre as nações que coordenam a ordem mundial. No entanto, percebe-se que o Brasil não tem condições materiais de ser um protagonista maior na cena internacional sem o auxílio de seus vizinhos.

Dependendo do contexto, o autonomismo pode deter um importante papel na política externa sub-regional ou regional. Isto ocorre, quando o preceito torna-se válido para unir um grupo de estados frente a um benefício mútuo. Num primeiro momento na década de 1990 o autonomismo representava os interesses de todos os países na formação do MERCOSUL (VIGEVANI et. al., 2008). Uma vez que, os mesmos possuíam como meta comum, nesta época, a busca por uma autonomia de decisão frente aos desafios extracontinentais na esfera econômico-comercial. Em virtude desta harmonia de interesses, o autonomismo funcionou em “bloco” para estes países, haja vista como foi descrito no Capítulo 2, em que o MERCOSUL auxiliou a rechaçar a ALCA. Existe até um jargão para se referenciar a este período, que ficou conhecido por “autonomia pela integração”, como pode ser verificado a partir de um discurso do presidente Lula na assinatura do Consenso de Buenos Aires em outubro de 2003:

Ratificamos nossa profunda convicção de que o Mercosul não é somente um bloco comercial, mas, ao contrário, constitui um espaço catalisador de valores, tradições e futuro compartilhado. Dessa forma, nossos Governos estão trabalhando para fortalecê-lo através do aperfeiçoamento de suas instituições nos aspectos comerciais e políticos e da incorporação de novos países. Entendemos que a integração regional constitui uma opção estratégica para fortalecer a inserção de nossos países no mundo, aumentando a sua capacidade de

negociação. Uma maior autonomia de decisão nos permitirá enfrentar de maneira mais eficaz os movimentos desestabilizadores do capital financeiro especulativo, bem como os interesses contrapostos dos blocos mais desenvolvidos, amplificando nossa voz nos diversos foros e organismos multilaterais. Nesse sentido, destacamos que a integração sul-americana deve ser promovida no interesse de todos, tendo por objetivo a conformação de um modelo de desenvolvimento no qual se associem o crescimento, a justiça social e a dignidade dos cidadãos (LULA, 2003).

Mas de outro lado, o preceito apresenta ambiguidades62, especialmente quando se remete a esfera regional. Pois, há situações em que o conceito serve para clivar uma decisão e não para consubstanciar. Por exemplo, um padrão de política autonomista estorva o futuro aprofundamento institucional do MERCOSUL. A integração, que num primeiro momento era meta na década de 1990, nos anos 2000 não ultrapassa o plano discursivo. Isto apresenta justificação pelo fato da ameaça da ALCA não mais existir, e para as elites o até mesmo para o povo brasileiro a ideia da integração com os vizinhos não criou raízes (SPEKTOR, 2010).

A ideia da integração parece não ser viável paras elites brasileiras, porque o país não tenciona bancar o papel de Paymaster, ou de grande patrocinador do processo integracionista. Além dos esforços envolvidos na criação do projeto e a prerrogativa de tecer metas para dirimir as assimetrias com as nações menores, o que implicaria altos custos financeiros a serem pagos pelo Brasil, o mesmo parece não estar predisposto a compartilhar sua soberania com seus vizinhos, nem muito

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Obviamente , há áreas em que esta autonomia torna-se desejável, sem ambiguidades. Na área de Defesa a autonomia de tecnologias indispensáveis, como em radares de sensoriamento e em armamentos convencionais, faz-se um inegável trunfo para o desenvolvimento e implementação de sistemas de defesa. Ou seja, tecnologias autônomas não são replicadas e impõe um desafio mais custoso a ser dobrado por nações que, hipoteticamente, tencionariam a ameaçar o espaço soberano do Brasil (LBDN, 2012). Além destes setores, a política de defesa do Brasil persegue a autonomia no desenvolvimento de um Programa Espacial Brasileiro e tecnologia nuclear de aplicação pacífica. Ou seja, o MD e o MRE devem perseguir este tipo de autonomia tanto que o LBDN versa de modo substancial as etapas do planejamento em busca da mesma.

menos compartilhar esta idéia com a sociedade brasileira (SPEKTOR, 2010). Por conseguinte, a institucionalidade de instituições de que o Brasil é participe permanece baixa, e a mesma também serve, além do MERCOSUL, para a UNASUL e o seu CDS.

Dado o exposto, o planejamento integracionista ou o aumento de institucionalidade de OI como o MERCOSUL e a UNASUL traduz- se apenas no plano do discurso. Recentemente, até mesmo o LBDN reiterou a posição brasileira de possuir um “objetivo estratégico” para com a integração regional:

A integração sul-americana permanece como objetivo estratégico da política externa brasileira, pois o País reconhece no adensamento das relações políticas, sociais e econômicas entre os países sul- americanos um elemento fundamental para o desenvolvimento socioeconômico e para a preservação da paz na região (LBDN, 2012, p.34) Para Matias Spektor (2010 e Tullo Vigenavi et.al. (2008) as OI regionais patrocinadas pela diplomacia brasileira não podem ser consideradas como um lócus de integração. Primeiramente, não são instituições supranacionais, e segundo, ironicamente, são instâncias que reforçam as soberanias estatais individuais. Em virtude destas duas prerrogativas suscita-se que o Brasil não deseja intervir diretamente nos problemas de seus vizinhos. “The result is a regional policy that, for all its ambitions, is in the end relatively low-key and predominantly risk- averse. Deep engagement with neighbours does not figure prominently in Brazil´s policy menu” (SPEKTOR, 2010, p. 194). E do mesmo modo, pode-se supor que o mesmo não toleraria interferência de seus vizinhos, e muito menos de outros países externos à região.

De fato, o conceito de autonomia, mesmo quando se opõe a um objetivo da política internacional brasileira como a integração, parece ser inabalável na cosmovisão do Itamaraty. Neste sentido, suscita-se a hipótese de que partes das elites inseridas em círculos diplomáticos, militares e econômicos parecem não crer nas evidências dos aumentos de canais de informações, e, por conseguinte de confiança entre o Brasil e os países sul-americanos, comprovados por conceitos como o de “interdependência complexa” 63. Logo, estariam totalmente mergulhadas

63 Para Robert Keohane Interdependência Complexa: “can be seen as a condition under which it is not only difficult to use conventional Power resources for certain purposes, but under which information levels are relatively high due to the existence of multiple channels of contact among states. If we

numa crença Realista das RI, e desta maneira os vizinhos poderiam ainda representar uma ameaça. A partir deste ângulo, por mais que não seja revelado formalmente, pode-se conjecturar que os vizinhos permanecem sendo fontes de problemas e não da solução, esta última a partir da integração.

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