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Afirmei, no início deste trabalho,1 que considero que a Utopia nasce no século XVI, pela mão de Thomas More, mas defendi também que é possível encontrarmos um leque de prefigurações de Utopias antes dessa data, tendo citado dois possíveis exemplos, A República, de Platão e A Cidade de Deus, de Sto Agostinho. Disse então que, embora estas duas obras se encontrem animadas por um espírito utópico, não avançam os ideais que propõem com o mesmo dinamismo e eficácia com que Thomas More o fará, séculos mais tarde. Na verdade, a obra de Platão, escrita sob a forma de diálogo (a forma por excelência dos ensaios filosóficos), fala de um modelo possível, conjecturando sobre as vantagens e desvantagens que tal modelo pressuporia, não chegando nunca a ser apresentado como um plano acabado e pronto a ser posto em prática. Também a obra de Sto Agostinho avança um ideal que não pode ser concretizado durante a nossa vida biológica, remetendo-nos para as recompensas que poderemos vir a merecer se observarmos as leis de Deus durante a nossa caminhada terrena. Contrastando com estas obras que fazem parte da pré-história da Utopia, a obra-prima de More apresenta a sociedade ideal como um modelo concretizado com resultados comprovados: funciona! Eu vi!, é o grito exultante que domina o discurso do entusiasmado Rafael Hitlodeu. Embora, como tem vindo a ser salientado pela crítica mais recente, o discurso de Rafael Hitlodeu seja, mais do que veículo de sátira, uma autêntica fonte de sátira, Qá que ao longo de Utopia ele se revela como um narrador pouco fiável e as vantagens do modelo que propõe são liminarmente postas em causa pelo narrador Thomas More), a verdade é que, formalmente, o modelo utópico é apresentado como algo que existe já, num ponto do globo indeterminado e que poderia também existir na Inglaterra quinhentista. Pouco importa, nesta perspectiva, que tal modelo não possa vir a ser concretizado no contexto histórico do século XVI, sem que grandes convulsões sociais e políticas se observem. O que é relevante é que não existe nenhuma impossibilidade técnica.

O mesmo não se poderá dizer de A Cidade de Deus, de Sta Agostinho, ou do

ideal de S. Brandão, ambos projectados além-morte. Estas são obras tipicamente medievais, pela concepção que avançam da vida terrena como um momento de passagem para os redutos do Paraíso ou do Inferno, consoante a actuação do homem na terra. De forma alguma poderiam ser consideradas Utopias, já que este género literário pressupõe que o ideal a implantar seja promovido pelo homem e por ele usufruído durante a sua vida terrena. Clara Almeida Lucas propõe que chamemos a estas obras medievais Alotopias. Como explica António Martins Gomes, a Utopia "implica geralmente uma alternativa política e social à actual sociedade", enquanto que na Alotopia "o mundo prometido é virtual, sendo alcançado apenas depois da morte"; "é o caso de certas visões exocrónicas que os fiéis em Cristo alcançarão se seguirem em vida determinadas regras." (Gomes

1990: 103).2 A Alotopia é pois a prefiguração medieval por excelência da Utopia. A impossibilidade técnica que, nas Alotopias, inviabiliza uma concretização terrena dos ideais utópicos só é superada no Renascimento, quando o homem descobre novos valores. Este tipo de afirmação acerca do período renascentista tomou-se, sem dúvida, num lugar-comum, mas julgo que não deveremos por essa razão deixar de salientar a importância de que se reveste a descoberta renascentista da possibilidade de uma ordem social que não a medieval. Esta descoberta está solidária com outras duas que inauguram o período da modernidade, a dos poderes infinitos da razão e a de que o homem poderá construir o seu próprio destino.

Estas descobertas têm como pano-de-fundo a recuperação dos valores da Antiguidade greco-latina, pelo que alguns autores preferem falar de redescobertas. Considero, contudo, que tal vocábulo implica a ideia de uma recuperação ipsis

verbis desses valores, isto é, sem o acrescento de outras cambiantes à cosmovisão

clássica. Como explica Ignacio Sotelo, a modernidade inspira-se na realidade grega, mas trata-se de uma realidadade transformada e não transposta. Por essa razão, os dois conceitos básicos que informam o pensamento renascentista não

são traduzíveis, com rigor, para as línguas grega e latina:

"Dos son los conceptos políticos fondamentales que introduce la modernidad: el de Estado y el de Utopia. Estado, // stato, no puede traducirse por polis o res

publica Utopia también es un neologismo que, aunque se nutra dei pensamiento

griego - y no solo ni principalmente en razón de su etimologia - , coincide con

politeia o civitas Dei." (Sotelo 1984: 14)

Com efeito, os conceitos de Estado e de Utopia servem agora, no âmbito do pensamento político moderno, para dar conta da nova ordem económica, social e política a que aspira a burguesia.

Também Marie Louise Berneri realça o facto de os escritores renascentistas não se inspirarem apenas nos modelos gregos para a produção de Utopias. Segundo Berneri, as diferenças profundas existentes entre as respectivas estruturas sociais impedem que o processo de recuperação dos valores Antigos seja linear e se limite à adopção de uma cosmovisão pronta a ser interiorizada (Berneri 1982: 52-55). O simples facto de o trabalho ser encarado, no século XVI, como uma actividade honrosa e já não como a actividade exclusiva dos escravos, é indicador claro da nova atitude do homem renascentista, que pensa na sociedade como um todo coeso, tentando, nesse sentido, nela integrar o camponês de forma harmoniosa, redignificando o seu trabalho e o seu estatuto. As Utopias renascentistas traduzem e promovem essa nova mentalidade.

Para além da realidade clássica greco-latina, as Utopias renascentistas inspiram-se no mito da Idade do Ouro que é agora identificado com um topos real, a América recém-descoberta, onde, de acordo com os relatos de Américo Vespuccio, existem povos que vivem ordeiramente, organizando-se segundo uma ordem social comunitária. As descrições que Maneio Sierra de Leguízano, o padre Acosta e o padre Mariana fazem da sociedade peruana descoberta pelos

conquistadores espanhóis, vêm corroborar, aos olhos europeus, esta ideia de paz social americana, sendo a inexistência da propriedade privada a chave para a instauração de uma sociedade sem ladrões, assassinos ou viciados.

As notícias da existência do Novo Mundo vêm alterar a noção tradicional de espaço. Segundo Fred Polak, as descobertas geográficas traduzem uma expansão do conhecimento num movimento horizontal (há mais espaço para explorar), mas é igualmente importante, segundo este autor, observar-se a expansão que se dá num movimento vertical, isto é, no sentido espiritual. Trata-se de um movimento provocado pela invenção da imprensa (que permite uma incomparavelmente maior divulgação do texto escrito) e pela queda do Império Bizantino, em 1453 (que está na base da radicação, na actual Itália, de filósofos que consigo trazem um inestimável volume de livros da tradição do contacto helénico-bizantino) [Polak 1961 I: 214-6]. Segundo Krishan Kumar, estas descobertas geográficas e espirituais (isto é, a descoberta do Novo Mundo e a interiorização e transformação dos valores renascentistas) são os factores modernos que, impulsionados pelo sentimento de necessidade de uma mudança que o Movimento de Reforma incute nos indivíduos, condicionam o nascimento da Utopia (Kumar 1991).3

Mas todas estas mudanças não poderiam ser orquestradas por uma geração de homens ligados à Igreja. Como refere Miriam Eliav-Feldon, não seria possível o surgimento da Utopia moderna enquanto predominasse a ideia da constante degeneração da humanidade desde a Queda. Nesse sentido, a Utopia renascentista (assim como os sentimentos novos que ela traduz) deverá ser perspectivada como o produto de uma geração de intelectuais desvinculados da cosmovisão teológica medieval.4 No entanto, tal não significa que o homem renascentista, em geral, e os utopistas, em particular, não sejam cristãos. Muitas das contradições e ambivalência de posições que os homens revelam, neste

3 Kumar desenvolve estas ideias no capítulo I ("Utopianism Ancient and Modem") do seu estudo de 1991.

4 Segundo Eliav-Feldon são fundamentalmente três as razões que impediram que a Utopia nascesse antes do Renascimento: (1) as Utopias não poderiam existir enquanto prevalecesse a ideia da crença num Universo divinamente ordenado; (2) as Utopias só seriam possíveis quando o homem deixasse de encarar a vida na terra como o caminho para a vida seguinte; (3) as Utopias só seriam possíveis quando deixasse de predominar a ideia da constante degeneração da humanidade desde o Pecado Original. Enquanto prevaleceram estas ideias era apenas possível a ideia da perfeição projectada num passado mitológico - uma Idade do Ouro - ou então numa vida além-morte. Cf. Eliav-Feldon 1982: 2-6.

período, resultam exactamente do choque de duas mentalidades, que procuram (mas nem sempre conseguem) a conciliação dos seus princípios. Assim se compreende a coexistência de sentimentos como o optimismo (resultante da perspectivação humanista das capacidades do indivíduo) e o pessimismo (motivado pela cosmovisão cristã que reconhece no homem uma propensão para o mal). A Utopia renascentista, que descreve já não uma cidade de Deus mas uma cidade de homens, ao promover o princípio de que o homem é mau por natureza mas que poderá ser controlado por um conjunto de leis, faz a síntese destes sentimentos opostos, perfilando-se como o mais genuíno estandarte do Humanismo Cristão. Exemplo dessa síntese é sem dúvida a ideia renascentista de que o progresso é possível, se não a nível do aperfeiçoamento humano, pelo menos a nível da organização social. Esta ideia influencia a atitude do homem renascentista face aos três modos do tempo. Como diz Eliav-Feldon, "The Utopias of the Renaissance in no way express a belief in the future, but at the same time they are no longer a lamentation of the past." (Eliav-Feldon 1982: 6) A estas Utopias que tentam neutralizar, através do estabelecimento de leis e instituições, a tendência do homem para o mal, incentivando-o e premiando a sua capacidade para agir bem, chama Frank Manuel Utopias of Calm Felicity (Manuel 1967: 72-9).5

Porque não é, como vimos já, um legado exclusivamente greco-latino, mas o resultado dos valores da Antiguidade filtrados (e portanto modificados) por uma mentalidade que não renega totalmente a sua herança medieval e iluminados pela percepção de que o mundo se encontra num ponto de viragem, aos mais variados níveis, a cosmovisão renascentista imprime ao homem uma vivência dividida. Para Fred Polak, o homem do Renascimento é um homem dividido, no sentido literal do termo:

5 Manuel distingue três tipos de Utopias, correspondendo a períodos da história distintos: (1) Utopias de Felicidade Calma, desde More até à Revolução Francesa; (2) Utopias Socialistas e outras Deterministas, escritas sobretudo ao longo do século XIX; (3) Utopias Psicológicas e Filológicas, escritas no século XX e que Manuel propõe designar de eupsychia, recorrendo à terminologia de Abraham H. Maslow. (Manuel 1967: 72-9.

" He is split between expressing the highest individuality and submitting, anew, to the highest authority; split between the classical opposites, such as Stoicism and Epicurism; split between universal and national, intellectual and commercial aspirations; split between the pagan ideas of Antiquity and the religious ideas of Christianity, and between Hellenic and medieval worlds of thought; split between predestined' rebirth and the free shaping of man's own destiny; split, finally, between the two extremes of virtù - the heights of human perfection and the depths of human degradation." (Polak 1967 I: 212-3)

Esta vivência dividida não faz contudo do homem do Renascimento um indivíduo desorientado. Ele especula sobre possibilidades que desconhecera, discute, para utilizar a expressão de Werner Plum, o para onde do

desenvolvimento* Como diz Polak, o split man renascentista, exactamente porque

se habitua a este tipo de divisão melhor do que ninguém, prova ser capaz de, com extrema facilidade, imaginar o outro, criando mentalmente novos mundos e neles explorando as múltiplas possibilidades de organização social.

A elasticidade mental que implica a divisão que o homem renascentista experimenta é, segundo Fred Polak, o factor que falta adicionar ao rol das razões normalmente apontadas pela crítica para o surgimento da Utopia no início do século XVI inglês. Diz Polak que a explicação tradicional para este fenómeno assenta no reconhecimento do dealbar do Renascimento inglês como um período de invenções mas também de descobertas, tanto no espaço (geográficas) como no tempo (os valores da Antiguidade Clássica), apresentando-se assim novos mundos em contraste com o único mundo concebível da Idade Média. De acordo com Polak, esta explicação não tem em conta um factor importante do Renascimento, o facto de o homem tentar conhecer o mundo, mas também e simultaneamente, a si próprio. As descobertas geográficas e as mentais são assim solidárias, nesta perspectiva. Mas mais importante ainda, o facto de o homem querer conhecer-se a si próprio (imaginando mundos onde se sentiria realizado) revela o que o espírito

6 Segundo Plum assiste-se no século XVI e sobretudo no século XVII, a uma riqueza de pensamento político como nunca antes se havia verificado. As questões discutidas não são de ordem prática, como nos séculos XVIII e XIX, isto é, não se discute como fazer, mas antes os caminhos que deverão ser tomados. Neste sentido, o nosso século XX, tão rico em ideias políticas, assemelha-se ao período do Renascimento inglês (cf. Plum 1979: 21).

renascentista e o espírito utópico têm em comum, a necessidade que o homem sente de dominar o seu futuro:

"( ) not only (...) this type of image of the future is the necessary product of the Renaissance, but (...) this image of the future is both m a ^ ^ ( p ^ f

Renaissance, and thus becomes itself an integral part of this era of change. (Polak I. 218)

A importância das imagens do futuro é explicada por Polak de forma consistente. No Renascimento predomina a ideia de que cabe ao homem construir o seu próprio destino. É portanto em relação a ele que o futuro se define. Não me parece, contudo, que a relação entre a Utopia e as imagens do futuro seja tão óbvia, neste período. Como disse já, o homem renascentista não pretende encontrar resposta para a questão que hei-de eu fazer? (o que pressuporia agir e assim contribuir para a construção do seu destino) mas especula sobre o que poderá desejar. Ao aperceber-se da nova concepção das possibilidades de transformação humana e social, o homem renascentista queda-se, extasiado. Não sabe o que há-de querer, qual criança a quem num grande bazar é pedido para escolher um brinquedo. Deseja isto ou aquilo ou um pouco de tudo. A Utopia renascentista é, nesta perspectiva e na minha opinião, a pura expressão de desejo. A sua relação com o futuro é pois ainda vaga, indeterminada.

Segundo Northrop Frye a Utopia é um produto típico do Renascimento, estando em conformidade com a reestruturação que aos mais variados níveis se opera naquele período, na sequência da desintegração da ordem medieval, nomeadamente do esmorecimento da aldeia como núcleo regional de organização política, social e económica. Defende Frye que a Utopia é essencialmente urbana. Ela é a visão por excelência da cidade ordeira de cujas estruturas depende a organização de toda a sociedade (Frye 1967: 25).

Na verdade, se tomarmos como exemplo aquela que considerei ser a primeira Utopia, a de Thomas More, verificaremos que a sua estrutura básica é urbana. Na sua descrição da ilha utópica Rafael Hitlodeu realça o carácter modelar da capital, afirmando que nos bastará conhecer uma cidade para ficarmos a conhecer todas. Embora, como vimos já, o trabalho agrícola seja redignificado e se assista a um esforço de integração deste tipo de actividade na vida dos utopianos, o seu peso é diminuto quando comparado com a forma como das estruturas urbanas emanam os princípios de organização social.

Relativamente a estas considerações que tenho vindo a tecer, julgo que uma questão se levanta, imperiosamente, a de sabermos por que razão são as Utopias do Renascimento visualizadas como cidades. A explicação que Eliav-Feldon avança para esta questão é simples. O padrão seguido por More é o grego e os gregos nunca conceberam padrões sociais que não fossem urbanos. Para além disso, a cidade é apresentada como um modelo, sendo, nessa perspectiva, a unidade mais pequena e mais verosímil, passível de conter em si uma representação de toda a sociedade (Eliav-Feldon 1982: 7-8).

Para Charles Autran, a ideia de cidade ideal impõe-se, primeiramente, no plano teológico e tem origens orientais:

"Elle procède en droite ligne de l'antique Kosmos sidéro-terrestre de Sumer et d'Akkad. Kosmos où chaque élément du monde d'en-bas possède dans le monde d'en haut, par conséquent dans le ciel, son prototype et son correspondant." (Autran s.d.: 22)

Esta ideia de uma cidade eterna e divina influencia os hebreus, sobretudo após o seu exílio, mas encontramo-la também na Bíblia. Trata-se assim, segundo Autran, de uma ideia herdada e acarinhada pela Igreja, desenvolvendo-se num ambiente erudito. Também na Ásia, a nível religioso, a ideia de uma cidade ideal tem grande implantação. De acordo com Autran, esta espécie de milenarismo subsiste sensivelmente até ao início do século XIII. Após um eclipse relativo de três séculos, emerge já não no seio da teologia, mas como um produto do humanismo, descendo

dos céus e firmando as suas bases na terra (Autran s.d.: 24).

A explicação nestes termos das origens da cidade ideal utópica, assentando unicamente na análise do seu processo de secularização, não me parece a mais correcta. Com efeito, creio que entre a Utopia e as ancestrais formas helénicas de expressão do pensamento utópico existe uma relação de filiação que não deve ser ignorada. Como sublinha Lewis Mumford, Thomas More opta conscientemente pelo modelo helénico de organização social porque este apresenta vantagens na descrição do funcionamento das instituições (Mumford 1967: 7-13). Mas precisamos de saber por que razão haviam considerado os gregos a cidade como o elemento básico de uma organização social ideal.

Como refere Mumford, encontramos a defesa do modelo de vida urbano em

República, de Platão, mas também em Política, de Aristóteles. Para este último

filósofo, o homem é um ser eminentemente urbano. Enquanto animal político que é, não poderia viver isolado. Contudo, lembra Mumford, a cidade não é uma invenção helénica. Encontramos o arquétipo da cidade ideal no Egipto e na Mesopotâmia, onde a vida urbana se organiza em torno do príncipe:

"First of all the city is the creation of a king (Menés, Minos, Theseus), acting in the name of a god. The king's first act, the very key to his authority and potency is the election of a temple within a heavily walled sacred enclosure. And the construction of another wall to enclose the subservient community turns the whole area into a sacred place." (Mumford 1967:12)

Como salienta Mumford, a cidade surge primeiramente como o produto do acto de

um príncipe. A magnificência do reinado deste último traduz-se nas monumentais

obras-de-arte urbanas. Com efeito, submetida ao controlo do príncipe, a comunidade encontra nele toda a sua coesão e garantia de paz social. A vida ordeira, característica destas cidades é conseguida, no entanto, a troco de um preço muito alto, a liberdade da população.

Também os Incas do Peru aderem ao modelo urbano, mas com características diferentes. Na sociedade inca o Templo é a instituição principal,

cabendo aos seus responsáveis a distribuição dos bens pela população. A terra é propriedade do príncipe (ou do deus que adoram), sendo trabalhada pelos habitantes da cidade. Embora a distribuição de alimentos nem sempre seja equitativa, não existe a pobreza. Mas mais uma vez, a liberdade da população é posta em causa, para que a coesão social não perigue. A regimentarização e a especialização do trabalho, indispensáveis para que a organização social funcione, obrigam a uma vigilância constante das actividades da comunidade por parte dos responsáveis pela organização social.

Segundo Mumford, a ideia de paz social que emana da Utopia tivera pois já uma concretização histórica, no Egipto, na Mesopotâmia e no Peru. Por isso considera este autor que mais do que um ideal utópico, a cidade é a primeira

Utopia7 O conceito de Utopia que defendo e defini no início deste trabalho impede-

me, naturalmente, de concordar com esta última conclusão de Mumford, mas parece-me importante esta sua análise das origens do ideal urbano, porque nos permite compreender um outro aspecto das Utopias renascentistas, o facto de elas defenderem, invariavelmente, um modelo urbano mas também um modelo político

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