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Variação de fase em estirpes responsáveis por infecções invasivas

Optimização das condições de crescimento

Foi variada a composição da atmosfera de incubação, nomeadamente a concentração de oxigénio e de dióxido de carbono, que se sabem influenciar a expressão do polissacárido capsular nos variantes de S. pneumoniae (Weiser et al., 2001) e o tempo de incubação até à

Testaram-se as seguintes atmosferas de incubação: condições atmosféricas não alteradas, microaerofilia criada por métodos químicos ou por extinção da chama de uma vela num recipiente fechado, anaerobiose criada por métodos químicos e atmosfera enriquecida com 5% CO2. Usaram-se duplicados de 10 estirpes responsáveis por infecções invasivas e não invasivas, expressando diferentes serótipos, para avaliar possíveis diferenças entre estas estirpes e entre diferentes serótipos.

Uma das condições de microaerofilia (5% oxigénio, 8% de CO2 e 87% de nitrogénio) foi criada com o uso de agentes químicos CampyPak PlusTM (BBL Microbiology Sistems, Sparks, EUA) num sistema GasPakTM e num exsicador em que a chama de uma vela no ambiente fechado utiliza uma grande parte do oxigénio, produzindo dióxido de carbono, criando-se uma atmosfera com teor reduzido de oxigénio e elevados níveis de dióxido de carbono. A condição de anaerobiose foi criada com o uso de agentes químicos CampyPak PlusTM num sistema GasPakTM. Foi usada uma estufa apropriada para a incubação em atmosfera enriquecida com 5% CO2. As culturas foram incubadas durante 16 horas, tal como recomendado por Weiser et al., 1994.

Depois de determinada a condição de crescimento, as colónias foram visualizadas de 3 em 3 horas de modo a seleccionar o tempo de incubação mais adequado à visualização do fenótipo.

Resultados

Condições atmosféricas de incubação

Entre as diferentes concentrações de CO2 aquelas que foram mais adequadas à visualização do fenótipo de opacidade foi o exsicador com vela e a microaerofilia química. Isto verificou-se em todas as estirpes analisadas expressando diferentes serótipos e isoladas de diferentes origens. Foi adoptado o exsicador com vela por ter sido previamente usado na observação de variantes do fenótipo de opacidade (Weiser et al., 1994) e por ser uma solução mais económica.

Nas quatro diferentes atmosferas de incubação, após 16 h de incubação a 35ºC (ver abaixo), o fenótipo dominante manteve-se. Contudo, em atmosfera enriquecida com 5% CO2 algumas estirpes apresentaram uma depressão central nas colónias transparentes como se estas entrassem mais rapidamente no processo de autólise. Nestas condições também se observou um aumento do diâmetro das colónias nalgumas estirpes. No exsicador com vela e em microaerofilia obtida por métodos químicos a aparência das colónias foi mais mucóide sugerindo um maior grau de encapsulação (anexo 1, Figura 17).

Duração do tempo de incubação

Verificou-se que as 16 horas de incubação, tal como proposto por Weiser et al. (1994), foi o tempo mais adequado para que as colónias se tornassem claramente visíveis e as diferenças no fenótipo se tornassem aparentes em todas as estirpes. Após este período de tempo a morfologia das colónias continuou a mudar adquirindo uma coloração azul/acinzentada. Tendo aumentado de diâmetro a depressão central, sinónimo de lise, nas colónias que já a exibiam, esta tornou-se aparente em algumas das restantes.

Determinação da estabilidade do fenótipo

A estabilidade do fenótipo foi estabelecida em estirpes escolhidas ao acaso e nas estirpes R36 e D39. Foram testadas três estirpes isoladas de infecções invasivas e três de infecções não invasivas. De cada uma das estirpes foram isoladas em duplicado colónias opacas, transparentes e intermédias de acordo com a classificação estabelecida por Weiser et al. (1994). A partir dessas culturas procedeu-se a passagens diárias do inóculo em gelose de sangue que foi incubado durante a noite na estufa a 35ºC usando o exsicador com vela, e no final de cada semana as células foram guardadas a -70ºC no meio de TSB com 15% de glicerol. O inóculo foi passado com o uso de uma ansa que recolheu um grande número de colónias de modo a serem representativas do fenótipo.

Em meio líquido o procedimento foi o seguinte, 50 μl do inóculo foi semeado em 5 ml de meio C+Y (Lacks e Hotchkiss, 1960) e cresceu durante a noite até atingir a densidade óptica (DO), medida a 620 nm, entre 0,7 a 0,9, correspondente à fase exponencial tardia e início da fase estacionária. A cultura foi guardada a -70ºC em meio de 20% de glicerol até ser inoculada no mesmo meio. Este procedimento foi repetido 25 vezes.

Após 25 passagens, em meio sólido ou líquido, todas as estirpes foram observadas na lupa e foram consideradas estáveis se a prevalência de cada um dos fenótipos coincidia com a prevalência observada no início da experiência.

Resultados

O fenótipo manteve-se estável em todas as estirpes, o que significa que as passagens laboratoriais e o crescimento in vitro não influenciaram o fenótipo. Assegura-se assim que a caracterização do fenótipo nas estirpes de S. pneumoniae responsáveis por infecção no Homem, que foram passadas pelo menos 5 vezes antes de serem estudadas, é válida.

Metodologia para o cálculo da frequência de transição do fenótipo

A frequência de transição do fenótipo foi estabelecida em estirpes escolhidas ao acaso e nas estirpes R36 e D39. Foram testadas três estirpes responsáveis por infecções invasivas e não invasivas. Para cada estirpe foi inoculada uma colónia do fenótipo opaco, outra do fenótipo transparente e outro do fenótipo intermédio em cuvetes de vidro com 700 µl de meio C+Y. A experiência foi repetida em dois dias diferentes. As culturas cresceram na estufa a 35ºC até ser atingida a densidade óptica de 0.5 medida a 620 nm, tal como previamente descrito (Weiser et al., 1994). A cultura foi diluída sucessivamente para o cálculo das unidades formadoras de colónias (ufc). Inocularam-se 100 µl das soluções diluídas no meio de TSA com catalase (Sigma-Aldrich, Steinheim, Alemanha) (50 unidades/µl, ver “Meios de cultura”) e incubou-se a 35ºC no exsicador com vela durante 16 h. A contagem das colónias revertentes foi feita em todas as diluições em duplicado.

O cálculo da frequência de transição da estirpe fez-se pela contagem das colónias transparentes (revertentes) numa população de 105-106 ufc proveniente de uma colónia opaca e pela contagem das colónias opacas (revertentes) numa população de 105-106 ufc proveniente de uma colónia transparente. Em seguida a frequência de transição foi obtida dividindo o número de revertentes pelo número total de colónias na placa.

Resultados

O número de colónias revertentes foi proporcional nas diferentes diluições. A frequência de reversão entre o fenótipo opaco e transparente variou entre 10-3 e 10-6, ou seja entre 1 colónia em 1000 e 1 colónia em 1.000.000 reverteu para outro fenótipo. Estes valores mantiveram-se independentemente do serótipo testado e do facto da estirpe ser responsával por infecção invasiva ou não invasiva. Este intervalo de valores foi também o da frequência de reversão entre o fenótipo intermédio e opaco e entre o fenótipo intermédio e transparente.

Dentro da mesma estirpe a frequência de transição entre os variantes foi igual, ou seja se numa estirpe a frequência de transição entre o fenótipo opaco e transparente foi de 10-4 então a frequência de transição entre o fenótipo opaco e intermédio e entre o intermédio e transparente foi também de 10-4.

A transição para uma mistura de fenótipos foi sempre rara qualquer que fosse o fenótipo inicial. Neste caso é impossível calcular a frequência de reversão, uma vez que os revertentes representam mais de um fenótipo.

Metodologia adoptada para a visualização do fenótipo

O protocolo adoptado para a visualização do fenótipo de cada estirpe foi o descrito previamente por Weiser et al. (1994). Em resumo, as colónias foram dispersas numa solução salina (NaCl 0,84%) até ser atingida uma turvação aproximada à do padrão 1 de McFarland. A suspensão foi diluída até se obter cerca de 105 ufc/ml, sendo 100 µl semeados na superfície de meio de TSA (15 ml), ao qual foi previamente adicionada a enzima catalase na concentração de 50 unidades/µl. Usaram-se placas de petri com grelha de contagem (Greiner Bio-one Gmbh, Kremsmünster, Áustria) e as culturas foram incubadas a 35ºC num exsicador com vela durante 16 h.

Foram visualizadas duas placas por estirpe e as placas foram divididas em sectores. As estirpes foram classificadas como opacas, transparentes ou intermediárias se mais de 70% das colónias eram opacas, transparentes ou intermédias, respectivamente. Foram adoptadas as definições de colónia opaca, transparente e intermédia propostas por Weiser et al., (1994) (ver capítulo I). As estirpes foram classificadas como misturas quando nenhum dos fenótipos contabilizava mais de 70% das colónias. Foi possível adoptar este método simples porque houve concordância entre a classificação obtida pela contagem total das colónias e pela estimativa visual da área coberta pelas colónias de cada tipo.

A visualização da variação de fase na morfologia das estirpes foi feita com recurso a uma lupa diascópica Leica MZ75 (Leica Microsystems Ltd, Heerbrugg, Suiça), equipada com um espelho com uma superfície difusora e outra polida, sob luz transmitida obliquamente (45º). A transmissão de luz neste ângulo, através dum meio translúcido de TSA, possibilitou a observação de colónias com os diferentes fenótipos. À lupa foi ligada uma câmara digital Leica DFC320 (Leica Microsystems Digital Imaging, Cambridge, Reino Unido) e uma fonte de luz Schoott KL 1500 LCD (Shoott Glas, Mainz, Alemanha). As imagens mais representativas do fenótipo de cada estirpe foram registadas.

Resultados

Variação intra e inter-estirpes

A variação de fase nas estirpes de S. pneumoniae é facilmente observável. No anexo 1 a figura 18 mostra colónias transparentes e opacas de diferentes estirpes. É de notar que as três estirpes do serótipo 8 (fotografias b, c e d) exibiram colónias opacas e transparentes com uma coloração ligeiramente diferente. Esta observação impôs uma classificação do fenótipo mais flexível do que a proposta por Weiser em 1994, particularmente, na cor e no tamanho das colónias, que nem sempre coincidem com as previamente definidas. As colónias transparentes

foram azuladas (figura 18 a a c) e acinzentadas (d), enquanto que as opacas variaram entre a cor esbranquiçada (a e c) a acastanhada (b e d). Quanto ao tamanho, as colónias transparentes foram geralmente menores do que as opacas e intermédias. Contudo, houve serótipos que apresentaram uma maior uniformidade no tamanho e maior diâmetro das colónias, como os serótipos 3 e 8. O serótipo 14 foi um dos que exibiu colónias de menor tamanho. O anexo 1 mostra ainda, na figura 19, as colónias transparentes, opacas e intermédias, duma estirpe responsável por infecção invasiva do serótipo 5, facilmente identificáveis.

A classificação do fenótipo pode ser dificultada pela existência de variação de fase intracolonial, na qual as colónias exibem secções transparentes e opacas (anexo 1, figura 20), propriedade já observada por Weiser et al. (1994). O crescimento confluente das colónias é outro factor que deve ser contornado através da inoculação bacteriana numa densidade adequada e através do espalhamento uniforme do inóculo.

Não houve diferenças na cor ou tamanho das colónias entre estirpes isoladas de infecção invasiva e não invasiva.

Caracterização inicial do fenótipo

Foram caracterizadas 356 estirpes usando a metodologia adoptada para a visualização do fenótipo. Estas estirpes pertencem à colecção de 465 estirpes de S. pneumoniae causadoras de infecções invasivas, isoladas entre 1999 e 2002, que foram previamente descritas. As primeiras estirpes caracterizadas foram as isoladas do líquido cefalorraquidiano (LCR), as resistentes à penicilina e foi também caracterizado um grupo de estirpes escolhidas ao acaso não pertencendo às categorias anteriores, perfazendo um total de 154 estirpes (Quadro 3). A maioria (76,6%) das estirpes resistentes à penicilina era resistente a pelo menos três classes de antimicrobianos. Pretendeu-se com esta selecção verificar se as estirpes isoladas do LCR e as que exibiam resistência à penicilina apresentavam uma maior proporção do fenótipo opaco do que as restantes.

Quadro 3

Estirpes inicialmente avaliadas quanto ao fenótipo de opacidade.

Fenótipo

a