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1.2 Aspectos Sociais da Linguagem

1.2.1 Variação lingüística

Até o surgimento da Sociolingüística, a língua era considerada uniforme, homogênea e monolítica em sua estrutura. Para os lingüistas da época, as diferenças encontradas nas línguas eram todas “variantes livres”, e, quando contextualizadas, eram posicionais, uma vez que a língua deveria ser uniforme. Esta é a grande oposição que se criou entre lingüistas e sociolingüistas. Para os sociolingüistas, essa variação não é livre, mas condicionada e correlacionada com as diferenças sociais sistemáticas. Desse modo, os falantes podem eleger uma ou outra variante. As variantes são determinadas por fatores estruturais e/ou sociais. Portanto, por diversas causas, as línguas tendem a modificar-se.

Para a Sociolingüística, a variação é essencial à própria natureza da linguagem humana. A partir dos estudos sociolingüísticos, especialmente, depois de Labov, pôde-se compreender que as estruturas variantes, muito mais do que as invariantes, mostram padrões de regularidade que, de tão sistemáticas, não podem ser devidas ao acaso. Para a Sociolingüística, a heterogeneidade lingüística reflete a variabilidade social, e as diferenças no uso das variantes lingüísticas correspondem às diversidades dos grupos sociais.

Nem todos os fatos, porém, estão sujeitos a variações. A heterogeneidade, assim como a homogeneidade, na língua, não se dá de forma aleatória, mas regulada por regras. A

língua possui sua parte invariável que a faz uniforme: são as regras gramaticais que se definem como categóricas, e que não podem ser violadas pelo falante, sob pena de dificultar a compreensão dos enunciados. Em outras palavras,

[...] tal como existem condições ou regras que obrigam o falante a usar certas formas (a casa) e não outras (casa a), também existem condições ou regras mudáveis que funcionam para favorecer ou desfavorecer [...] o uso de uma ou outra das formas em cada contexto. (NARO, 2003, p.15).

Segundo Wardhaugh (1992), “São regras que especificam exatamente o que é – e conseqüentemente o que não é – possível na língua”. Essas são as chamadas invariantes ou categóricas, que se opõem às regras variáveis. Reconhecer a variação como parte integrante do sistema, juntamente com as estruturas invariantes, e não, como simples manifestação do uso lingüístico, constitui uma forma de melhor compreender a organização do sistema lingüístico internalizado pelos falantes.

1.2.1.1Variantes, variáveis e registro

a) Variantes

Estudar a variação lingüística não quer dizer estudar os desvios da língua, mas as suas variantes lingüísticas que, segundo Tarallo (1990, p.8), “[...] são diversas maneiras de se dizer a mesma coisa em um mesmo contexto, e com o mesmo valor de verdade”. Formam um conjunto de formas lingüísticas que compõem uma variável, podendo ser: padrão, não-padrão, conservadora, inovadora, estigmatizada e de prestígio.

A Sociolingüística investiga o grau de estabilidade ou de mutabilidade da variação, diagnosticando as variáveis que contextualizam variantes e descrevendo seu comportamento preditivo. Isto quer dizer que na língua as variantes podem estar em competição, no sentido de que, ora pode ocorrer uma, ora outra, dependendo dos fatores que influenciam no seu uso que, por sua vez, podem ser internos ou externos ao sistema lingüístico. No primeiro caso, teremos fatores estruturais ou lingüísticos. No segundo, fatores sociais ou extralingüísticos:

I) Variantes Internas são os fatores: fonológicos, morfossintáticos, semânticos, discursivos e lexicais;

II) Variantes Externas agrupam-se nos seguintes fatores: – Inerentes ao indivíduo: sexo, idade, etnia;

– Sócio-geográficos: região, escolarização, nível de renda, profissão, classe social;

– Contextuais: grau de formalidade e tensão discursiva.

b) Variáveis

A variável lingüística é o conjunto de variantes lingüísticas. São formas distintas de se transmitir um conteúdo informativo. Para se definir bem o conceito de variável lingüística é necessário que duas ou mais variantes tenham o mesmo significado referencial ou denotativo, ou seja, dizer o mesmo de formas diferentes. No português falado no Brasil, a marca de plural no sintagma nominal (SN) é um exemplo de variável lingüística, pois se encontra em estado de variação. Temos, assim: a marca do plural no SN. A esta variável, representada por colchetes angulares <s>, correspondem duas variantes: (a) a presença de marcação, representada pelo segmento fônico [s], como em “os menino[s]”; (b) a ausência de marcação, representada por [Ø], como em “os menino[Ø]”. (TARALLO, 1990, p.09).

[s]

<s>

[Ø]

Numa comunidade de fala, essas variantes encontram-se sempre em relação de concorrência, “[...] padrão vs. não-padrão; conservadoras vs. inovadoras; de prestígio vs. estigmatizadas. Em geral, a variante considerada padrão é, ao mesmo tempo, conservadora e aquela que goza de prestígio [...]”. (Id.Ibid.p.11).

c) Registro

Dentro da noção de variedade de língua surge além da noção de dialeto (variedade de acordo com o usuário), a de registro (variedade de acordo com o uso). A primeira mostra quem você é, enquanto a segunda, o que você faz. Podemos, portanto, trabalhar com os

conceitos de outro tipo de variedade social que é o que se relaciona com o contexto ou situação extralingüística. A esse tipo de variedade chamamos nível ou registro e depende do tempo, local e circunstâncias em que ocorre o ato de fala, como também das relações que unem falante e ouvinte no momento do diálogo, da intimidade entre os falantes, do tema que está sendo discutido, das condições físicas e psicológicas do falante. Preti (1997) diz que:

As variações quanto ao uso da linguagem pelo mesmo falante, em função das variações de situação, podem ser de duas espécies: nível de fala ou registro formal, empregado em situações de formalidade, com predominância da linguagem culta, comportamento mais tenso, mais refletido, incidência de vocabulário técnico; e nível de fala ou registro coloquial, em situações familiares, diálogos informais onde ocorre maior intimidade entre os falantes, com predominância de estruturas e vocabulário de linguagem popular, gíria e expressões obscenas ou de natureza afetiva.

O autor propõe, também, um registro comum que ficaria numa posição intermediária entre o registro formal e o coloquial. A esse tipo de variação de nível ou registro de fala, alguns autores chamam de variante ou variedade estilística, tendo-se, neste caso, o estilo formal e o estilo informal ou coloquial.

A variação de estilo, também, chamada diafásica ou diafática, está ligada às diferentes situações ou contextos lingüísticos e extralingüísticos que envolvem o ato de fala. Os contextos lingüísticos podem ser: fonético-fonológico, léxico, morfossintático ou semântico. Os contextos extralingüísticos são os sociais ou situacionais, formais ou informais, que marcam os níveis ou registros de fala, e que envolvem o emissor com todas as suas características, o receptor, também, com suas características, o assunto, o tipo de comunicação e as relações entre emissor e receptor. Os registros podem ser vistos como variedades dialetais e são o resultado, não só, do contexto social, mas regional, etário e cultural do falante e do ouvinte.