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Num ensaio cujo título é «The Chick-Lit Pandemic», Rachel Donadio dá conta do impacto que o romance Bridget Jones’s Diary teve num grande número de países, não só ocidentais mas, também, orientais, como a Índia e a Indonésia. Estes países não só acolheram o romance de forma entusiástica, o que se traduziu no número de vendas, como iniciaram uma chick lit própria, escrita nas suas línguas (Donadio, 2006). A estas novas formas de chick lit, chamam Ferriss e Young «varieties», mas também «versions» (2006: 5,6). Eu chamar-lhes-ei variantes. Helen Fielding vê a proliferação destas variantes regionais como uma manifestação do espírito do tempo, não como um mecanismo de imitação: «I think it had far more to do with zeitgeist than imitation.» (Fielding, apud Donadio, 2006). Nóra Séllei, ao escrever sobre as repercussões da chick lit na Hungria, apresenta alguns números relativos a 2002. Diz a académica que o romance de Fielding vendeu, nesse ano, oito milhões de cópias em todo o mundo, tendo sido traduzido em pelo menos trinta e três línguas (2006: 174). Ora, olhando para a tradução portuguesa do romance, pode verificar-se que, em 2002, houve três edições

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em Portugal (Fielding, 2003). De igual modo, todos os nomes de referência anglo-americanos estão traduzidos em Portugal. Falo de Fielding e Bushnell, mas, também, de Sophie Kinsella86,

Lauren Weisberger e Marian Keyes.

Donadio dá conta de variantes de chick lit na Suécia, na Rússia, na Polónia, na Itália, na Hungria, na Índia e na Indonésia, acrescentando que, no Japão e na França, apesar do sucesso de Bridget Jones, não se constituíram variantes próprias. Nos outros países, porém, houve uma adaptação das características principais do género ao contexto cultural desses países, adaptação essa que inclui a própria designação. É referido que, na Indonésia, a chick lit é conhecida como “sastra wangi” ou, em Inglês, “fragrant literature” (Donadio, 2006). Na Alemanha, a chick lit também faz sucesso e é motivo de debate on-line, em blogues e no Facebook. No site Happy End Buecher Magazin - Revista de Livros com Final Feliz -, não só aparecem os nomes mais sonantes da chick lit anglo-americana traduzidos em alemão, como uma lista de autoras e autores alemães de chick lit, designação que preferem, pese embora não deixem de apresentar a tradução literal para alemão: “Hühnchen Literatur” (Anke, 2011).

As recensões de romances alemães apresentadas no site referido, bem como a leitura da narrativa curta Vom Frosch geküsst - Beijada pelo Sapo -, de Alice Winter e Katja Schneidt, permitem concluir que há semelhanças relativamente ao conteúdo e ao estilo entre a chick lit americana e britânica e a alemã.No romance referido, temos Susa, algo parecida com Bridget Jones, que tem problemas com o peso, faz dietas e faz igualmente listas com os desejos que quer ver cumpridos: ser uma pintora de sucesso e encontrar o príncipe encantado. Não há referências ao Mr Right. Susa, aquando de um encontro de antigos alunos, reencontra o seu amor de adolescente, Jörn Scholle, que é agora um médico reconhecido. Quando partilha, porém, com Flip, o seu amigo, que tem um relacionamento com Scholle, este fica muito perturbado e desaparece. Susa descobre entretanto que Scholle, tal como Daniel Cleaver, tem outras mulheres. Aquele, tal como Daniel Cleaver, não é um príncipe, mas um sapo. É então que reaparece Flip que, como Mark Darcy, é responsável, ponderado e está sempre ao lado de Bridget quando é necessário (Winter, Schneidt, 2014: passim). Sendo uma narrativa curta, de pouco mais de cem páginas (2340 locations), a dimensão de crítica social está ausente. Mas, como ficção oriunda de um país ocidental, não há nela algo de distintivo, em termos sócio-culturais, em relação à ficção anglo-americana. Susa, aliás, que gosta de sonhar acordada, imagina que está na passadeira vermelha ao lado, entre outros, de Brad Pitt (idem: loc. 65). Os seus ídolos são, pois, do imaginário mediático de Hollywood. Susa utiliza, também, para exprimir surpresa, a expressão «OMG» - Oh My God – (idem: loc. 2298), e não a

86 Os manuais de língua inglesa, de autores portugueses, contêm textos e referências aos romances The

Secret Dreamworld of a Shopaholic e The Devil Wears Prada, da autoria de Kinsella e de Weisberger.

Isto nas rubricas dos programas que abordam o consumismo. O romance About a Boy, de Hornby, por sua vez, integra a lista de obras recomendadas para os alunos dos cursos humanístico-científicos.

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expressão alemã Mein Gott. Ou seja, há, na chick lit germânica, uma continuidade em relação ao que se faz no espaço anglo-americano. O mesmo não acontece em países como a Hungria.

O ensaio de Séllei sublinha o impacto que o romance da “Bridget Jones húngara” teve na sociedade conservadora da Hungria, ao chamar a atenção para as solteiras, um grupo especialmente mal visto neste país. Ser solteira é sinónimo de ser egoísta, de não querer contribuir, solidariamente, para o desenvolvimento do país (2006: 185). Ou seja, a chick lit, vista, na Hungria, como fazendo a apologia não do casamento, mas do celibato, veio lançar o debate em torno das mulheres solteiras, que se consubstancia no questionamento do seu desejo de ter uma carreira, dinheiro e acesso ao consumo. Mais, a reacção ao fenómeno veio também pôr a nu o medo, por parte dos decisores políticos, de que haja uma mudança em termos culturais, pois aqueles querem, por palavras da estudiosa, «put women back where they traditionally belong.» (idem: 186).

Também em Portugal, na década de 1990, começou a aparecer uma ficção de mulheres, para mulheres, urbana, escrita na primeira pessoa, num estilo coloquial, aliando à busca do homem ideal as preocupações com a carreira, a aparência e o medo de envelhecer, que, após a publicação do romance Sei Lá, da autoria de Margarida Rebelo Pinto, ficou conhecida como literatura light. Ora, como procurarei demonstrar no próximo capítulo, a literatura light é a variante portuguesa da chick lit.

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Capítulo 3

A Literatura Light como a Variante