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3 Políticos paraibanos suspeitos na suspeita mídia

3.2. Veja se apropria do Caso Gulliver e constrói a identidade política paraibana

Percebo as capas de Veja que enfocaram políticos da terra como um conjunto simbólico, histórico, genérico e totalizante das projeções imagético-discursivas da mídia sobre a política paraibana, dispositivos de representação que definem e simbolizam uma ontologia midiática de construções identitárias da Paraíba pautada pela depreciação que alcança grande evidência e amplitude.

Nessa linha de compreensão destaco a matéria de capa da revista Veja, edição 1 313, de 10 de novembro de 1993 (figura 3), “Viola calibre 38”, com a chamada de capa “Denúncias respondidas à bala: o governador da Paraíba Ronaldo Cunha Lima revida com tiros as acusações do ex-governador Tarcísio Burity”117, destacando-a com uma forte representação imagético-discursivo de cunho identitário, um objeto icônico com toda a potência denotativa para recuperar estigmas e estereotipias da identidade nordestino-paraibana. Simbolismo identitário particularmente ampliado mediante a eficácia da capa para produzir sentidos, na função de hierarquizar a reportagem no máximo patamar de relevância.

Reconheço o episódio relatado como uma acentuada recuperação de signos relativos à cultura e identidade paraibana, entre aqueles que pronunciadamente relembram, ampliam, fortificam, solidificam, sedimentam, projeções depreciativas da formação sociopolítica regional. A prolixa adjetivação aqui é proposital, em virtude da intenção de cravar fortemente o impacto que o episódio teve em todo o país.

Na época eu me encontrava em São Paulo, capital, realizando o curso de mestrado. Além de minha grande surpresa com o acontecido e a repercussão na mídia perdi a conta de quantos comentários ouvi, pessoalmente, em diferentes enunciados. Mas com a base produtora de sentidos relativos à idéia de que “no Nordeste, na Paraíba, as coisas realmente ainda se resolviam à bala, com os políticos mandando em tudo e fazendo o que queriam ao ter

certeza da impunidade”.

Presente na memória regional como o célebre “Caso Gulliver”, classifico o fato e seus desdobramentos como mais um conjunto de ocorrências com valor e uso simbólico de discursos discriminatórios, de aferição de marcas depreciativas. Desencadeados por vozes exteriores, de fora dos limites do Estado, porém motivados por agentes internos, políticos paraibanos que contribuem soberbamente para o processo de depreciação da identidade política regional.

Figura 3: Capa de Veja, ed. 1313, 10 de novembro de 1993.

Se a mídia tem a propensão ao enfocar políticos de forma crítica e denunciativa, o atentado chegou às mesas dos redatores como que numa farta bandeja, com requintes e detalhes de um roteiro de Hollywood, com personagens gangsteres envoltos em rede de intrigas. Pauta especial para Veja aplicar sua eficaz técnica infográfica (uso dos recursos de softwares para a diagramação em computador), apresentar uma capa inspirada em revistas em quadrinhos, daqueles gibis em que os temas das histórias eram os embates entre mafiosos.

Na reportagem, o governador paraibano foi empurrado simbolicamente ao inferno. E a vítima Tarcisio Burity, ex-governador, segundo os sentidos produzidos pela reportagem sairia do mundo dos vivos, ao permanecer quatro dias em coma, “salvo por milagre”, segundo seus eleitores fiéis, a ele e a Deus, “graças às fervorosas orações”.

O ato de Ronaldo Cunha Lima, um agente da discriminação nordestino-paraibana veio ocupar o espaço reservado para fatos nunca vistos na história da política brasileira118. O único em que um governador de uma unidade federativa atirou para matar um adversário, seu antecessor no posto máximo do executivo estadual. Seria pauta para manchetes, assunto de primeiras páginas jornais, capas de revistas, chamadas de abertura para radiojornais e telejornais em qualquer país do mundo, assim como o foi no Brasil, atendendo aos critérios da seletividade técnica editorial de um fato típico que automaticamente é escolhido para ser notícia com destaque.

Todavia, ao se tratar de uma construção discursiva relevante em termos de identidade paraibana, interessa-me a percepção de que a revista Veja tratou de ampliar os sentidos de fato já tão impactante. Elevou o acontecimento ao status de notícia em destaque, ao campo da espetacularização midiática, ativando sua práxis de tessitura enunciativa que dialoga com a sociedade, “circula, serve, se esquiva, permite ou impede a realização de um desejo, é dócil ou rebelde a interesses, entra na ordem das contestações e das lutas, torna-se tema de apropriação ou de rivalidade” (FOUCAULT, 2008 p. 119).

No direcionamento indicado por Foucault é emblemático como Veja se apossou do “Caso Gulliver”, constatação precípua para o desenvolvimento de minhas análises.

A revista se apropriou do episódio conforme sua práxis editorial119, quase sempre eficiente na condução de sua narrativa jornalística pra relatar os fatos com objetividade e interpretar de maneira coerente, em linguagem dinâmica que parece trazer a realidade do acontecido com a necessária eficácia de forma a saciar o apetite do leitor. Mesmo em se tratando de um texto condensado, conseguiu a substancialidade necessária para uma matéria destinada a se tornar documento histórico.

O relato da reportagem se desenvolveu com precisão e completude, o que pessoalmente comprovo ao ter conhecimento de muitas narrativas sobre o episódio ao longo de 15 anos, em

118

A reportagem no próprio texto da matéria afirma que em relação ao acontecido “a crônica do país ganhava uma página inédita”, complementando: “A história registra muitos casos sangrentos envolvendo políticos. Nunca, porém, o de um governador de Estado que pega numa arma para disparar na cara de outro governador.” (Viola Calibre 38. Veja. op. cit., p. 32)

119 Entre as estratégias da revista com o objetivo de suplantar as outras mídias há as técnicas para se apossar do

fato que de certa forma já foi dispensado pelo jornal e a televisão. Isso não que dizer que a revista pega as sobras. Ao contrário, sua apropriação do conteúdo principal do fato pautado é definitiva e soberana. Mesmo que os veículos diários disputassem o acontecimento, a revista o tomaria para si de qualquer jeito, distribuindo-o juntamente com os demais acontecimentos para que todos sofram um processo de hierarquização em função de suas diversas seções (política, economia, artes, cultura, etc.), quando a capa alcança o privilégio maior. A realidade ou a história bem recente surgem simbolicamente como representações construídas pelo que a revista elegeu na semana como acontecimento, na cidade, no país e no mundo, para ficar na memória da sociedade. Comumente as pessoas guardam revistas, dificilmente jornais. Daí ser fácil concluir que elas se tornam importantes documentos históricos, guardando para a posteridade um retrato do que mais de importante aconteceu em determinada semana de tempos passados.

produções historiográficas da recente memória paraibana e em recuperações da mídia que regularmente lembram da gravidade do fato. A revista assume o lugar de historiadora abalizada para narrar o episódio, conforme o exposto por (Nora 1995, p. 181), que credita aos veículos de comunicação de massa o “reaparecimento do monopólio da história”, chegando a afirmar: “De agora em diante esse monopólio lhes pertence. Nas nossas sociedades contemporâneas é por intermédio deles e somente por eles que o acontecimento marca a sua presença e não nos pode evitar”.

Já na apresentação da reportagem, na secção do seu sumário e índice do conteúdo da edição, relata todo o episódio na técnica jornalística do lide que emprega a “pirâmide invertida”:

Governador tenta matar adversário - Na última sexta-feira o governador da Paraíba, Ronaldo Cunha Lima, entrou um restaurante de João Pessoa e atirou contra a cabeça de seu antecessor, Tarcísio Burity. Em entrevistas concedidas a jornais e emissoras de televisão de João Pessoa, Burity vinha acusando Cássio Cunha Lima, filho do governador e superintendente da Sudene, de envolvimento no desvio de verbas da instituição.120

Para o bem ou para o mal, deixando de lado os posicionamentos suspeitos de Veja, é importante se observar como ela elaborou a reportagem analisada, desenvolvendo uma estratégia discursiva na construção dos acontecimentos, colocando para funcionar uma série de mecanismos de produção da realidade: a tessitura do discurso da informação, a avaliação de como se revestem de importância os campos de força dos sujeitos sociais, a noção de que o acontecimento é produzido pela ação/ intervenção do veículo e o recurso da imagem.

O texto conciso e dinâmico da reportagem faz fluir o relato, conseguindo imprimir à narrativa a rapidez compatível à real sequência do episódio, técnica também expressa na precisão sintética dos quadrinhos que resume a tentativa de assassinato. Detalhe que reafirma o uso criativo da linguagem texto-visual de Veja. Se a capa já referenciava uma cena de filme de gangsteres e de história em quadrinhos, tal concepção tem continuidade no discurso da reportagem, inclusive com a mistura de enunciações empregadas nas temáticas dos faroestes.

A associação de sentidos do velho oeste com o gangsterismo, em versão paraibana, é ofertada por uma das testemunhas do crime que permite à reportagem gerar um convincente entrelaçamento do léxico verbal com a semântica imagética conforme a formatação em linguagem cinematográfica:

O deputado Francisco Quintãs que testemunhou os tiros, contou na noite do crime que o governador Cunha Lima atravessou a porta do restaurante como um ator de filme de faroeste. Olhava em frente e caminhava como alguém que sabia

exatamente onde estava indo, com o rosto contraído e muito determinado. Atrás, perto dele, seguia seu irmão, que também parecia embriagado. Com a camisa para fora da calça e o revólver escondido na cintura, o governador foi direto à mesa de Burity no fundo do restaurante. A menos de um metro de distância, bateu no ombro do aniversário com a mão esquerda, enquanto, com a outra, apontava o revólver para a sua cabeça. Disparou três vezes seguidas e acertou duas. O primeiro tiro foi disparado quando Burity se virou para ver quem o chamava. A bala atravessou o lado esquerdo do queixo, arrancou três dentes, feriu a língua e abriu um buraco na bochecha direita do ex-governador. Caído sob a mesa, Burity levou mais uma bala, desta vez no tórax, que furou-lhe o pulmão e foi se alojar no abdômen. Agarrado pelo braço pelo ex-deputado Manoel Gaudêncio, Cunha Lima errou o último disparo (grifo meu).121

O realismo e o dinâmico ritmo do texto, condizentes com a rapidez e violência da cena real, ainda são complementados pela sequência narrativa que remonta ao típico cenário de faroeste:

[Após os disparos] o que se viu em seguida foi uma cena de saloon. As mesas em volta ficaram instantaneamente vazias. O atirador sumiu, levado para o banheiro por um grupo de amigos. No meio de uma poça de sangue. Tarcísio Burity tentou reerguer-se. O deputado Francisco Quintãs avançou para ampará-lo e o ajudou até o caminho da rua (grifo meu).122

Os grifos do texto da reportagem transcritos explicitam a percepção do sentido literal dos termos utilizados, compatíveis com os sentidos desejados pela matéria jornalística, de modo que a estrutura lexicográfica se desenvolve com palavras-chave, na opção da narrativa por formulações enunciativas inspiradas em linguagens de histórias em quadrinhos e da cinematografia que exploram a temática de faroeste ou de gangsteres. Adaptadas e relacionadas a outros elementos textuais, conjugados à semântica de expressões associadas à violência.

Além disso, a concepção discursiva do relato é sincrônica, técnica que contribui para relacioná-lo ao contexto literário histórico do mundo do velho oeste norte-americano, reproduzindo o mesmo tipo de ordenamento léxico e semântico, correspondente à narrativa dramática de outros discursos anteriores que desenvolveram o mesmo tema.

O título “Viola Calibre 38” e subtítulo da matéria “O governador da Paraíba, poeta e violeiro, assombra o país ao disparar três tiros à queima-roupa contra um adversário político” definem o perfil de Ronaldo Cunha Lima, conforme os célebres entendimentos de Stuart Hall (2000) sobre a identidade como resultado de construções discursivas com fronteiras móveis.

As projeções simbólicas por meio de discursos que se apresentam a ponto de definir todo o arcabouço cultural identitário de uma sociedade, contam com a possibilidade de

121 Viola Calibre 38. Veja. São Paulo, 10 de novembro de 1993, edição 1 313, p. 32-33 122 Ibidem, p. 33.

incorporar repertórios históricos e culturais para representar a identidade social que tem, assim, sua caracterização determinada pela linguagem que produz sentidos de modo a influenciar na própria maneira de cada indivíduo procurar se representar.

Veja utiliza tal procedimento para delinear o perfil do governador da Paraíba em construções discursivo-imagéticasque recuperam seu tradicional perfil formulado por vozes locais, cruza com suas caracterizações oriundas de seu papel histórico-político atribuído pela sociedade paraibana, mas também o mostra como um pistoleiro, conforme o texto de diferentes trechos da reportagem.

Poeta e violeiro, o governador Ronaldo Cunha Lima, 57 anos, ficou famoso em sua última eleição estadual pela mensagem pacifista com que encerrava seus comícios na Paraíba, uma terra habituada ao ronco dos trabucos. “Troque a pistola pela viola”, convidava o candidato. Na última sexta- feira, inverteu a rima do verso. Deixou a viola em casa, colocou o 38 na cintura e dirigiu-se ao Restaurante Gulliver, um dos mais freqüentados da cidade, no bairro de Tambaú, onde sabia que o desafeto almoçava. Queria tirar satisfações. Ou melhor, atirar satisfações.123

O violeiro Cunha Lima é um homem alegre e afável, mas estava com o Burity atravessado na garganta há muito tempo. Na véspera dos tiros o governador violeiro chegara ao máximo. Seu filho Cássio Cunha Lima, 30 anos, superintendente da Sudene, tinha sido acusado de proteger uma rede de corrupção na autarquia, durante um programa oficial do Partido da Mobilização Nacional, ligado a Burity. No dia seguinte, a coisa esquentou depois que o próprio Burity voltou a carga em outro programa de TV. Dessa vez fez críticas genéricas, sem elementos consistentes para incriminar o Cunha Lima. Ainda assim, o governador achou que tinha que lavar a sua honra em sangue.124

A identidade, assim, encontra seus signos de representação no seu próprio conjunto humano-societário, ou em formulações discursivas, principalmente na mídia, em configurações móveis, heterogêneas e mutáveis, segundo as proposições de Hall (2000, p. 108): “As identidades não são nunca unificadas, (...) nunca singulares, mas multiplamente construídas ao longo de discursos, práticas e posições que podem se cruzar ou ser antagônicas.”

Veja, no caso, apresenta um Ronaldo Cunha Lima com identidades flutuantes, vindas ao conhecimento do leitor exatamente pela construção discursivo-identitária da revista:

Ex- garçom e muito amigo da garrafa, o governador Ronaldo Cunha Lima, do PMDB, é um político folclórico, que desperta simpatia como um tipo capaz de entrar em um bar da esquina e beber com a barriga encostada no balcão. Em alguns bares de João Pessoa mantém uma garrafa privativa do uísque Johnny Walker, rótulo preto. Conta piadas, é repentista e tem vários outros talentos na área. Ficou conhecido nacionalmente no final dos anos 60 como o “Ronaldo Coisa Linda”, o jovem prodígio que empolgou o auditório do programa O céu é o limite, na TV

123 Viola calibre 38. Veja, op. cit., p. 32. 124 Ibidem.

Tupi, respondendo sobre a vida e obra de Augusto dos Anjos. Cunha Lima memorizou todos os 365 sonetos do poeta. Fez carreira como advogado no Rio de Janeiro e em São Paulo e dá impressão de que poderia sair-se numas cem profissões diferentes.125

A revista constrói a realidade, narrando detalhadamente o “Caso Gulliver. E, ao mesmo tempo, configura a identidade individual de Ronaldo e Burity, indicando que ambos tinham em comum procurarem parecer intelectuais entre os políticos da terra.

Coisa em comum - Antes de os tiros ecoarem na sala do restaurante Gulliver na semana passada, Tarcísio Burity e Ronaldo Cunha Lima tinham pelo menos uma coisa em comum, como os fumantes de Free. Acostumaram- se a posar de intelectuais e renovadores dos hábitos da política paraibana (...). Tarcísio Burity, um advogado de 54 anos, amante de uma boa intriga, metido a erudito e muito enfadonho, nunca perdeu inteiramente o ar de seminarista que foi por muitos anos. Nem mesmo o perdeu após passar duas vezes pelo Governo da Paraíba.126

Veja utiliza-se do arquivo memorial da Paraíba, segundo a concepção de Foucault (2008)127, ao adaptar discursos regionais em seu texto, justamente para apresentar conhecidas e históricas informações, porém apresentando novos registros e representações, mantendo a sincronia do conhecimento transmitido pelas repetições da fala regional, o que regularmente é dito ou escrito, mas em novos enunciados com ação temporal própria, em formulações discursivas diacrônicas. Repetiu dados de conhecimento do povo paraibano, mantendo a semântica histórica, mas mudando a formação léxica, a exemplo de Ronaldo e Burity serem reconhecidos como homens cultos pela sociedade paraibana, em virtude do primeiro deles ser poeta e violeiro, o segundo professor e amante de artes eruditas. Na linguagem de Veja o léxico é atualizado: “Tarcísio Burity e Ronaldo Cunha Lima tinham pelo menos uma coisa em comum, como os fumantes de Free. Acostumaram-se a posar de intelectuais renovadores dos hábitos da política paraibana.”128

125 Viola Calibre 38. Veja, op. cit., p. 35-36. 126 Ibidem, p. 35

127 Lembro que já defini a noção de arquivo, segundo o pensar de Foucault, (ver nota de rodapé 24 da Introdução

deste estudo). Para a análise das representações da matéria de Veja a noção de arquivo, formulada por Foucault (2008), é de suma importância, para se perceber como seus discursos reproduzem informações históricas sobre o mundo paraibano. Para Foucault (2008, p. 146), o arquivo é objeto específico da escavação dos discursos, dispositivo de averiguação sobre as regras e condições de enunciação de determinada fala. O arquivo, assim, procura descobrir “o que faz com que tantas coisas ditas, por tantos homens, há tantos milênios, não tenham surgido apenas segundo a lei dos pensamentos, ou apenas segundo o jogo das circunstâncias, que não sejam simplesmente a sinalização, no nível das performances verbais, do que pôde se desenrolar na ordem do espírito, ou na ordem das coisas; mas que tenham aparecido graças a todo um jogo de relações que caracterizam particularmente o nível discursivo” (Ib. ibidem).

Vislumbro a adaptação pela reportagem de conhecidas informações circulantes na sociedade local, numa intervenção analítica arqueológica129 (Foucault, 2008, p. 151 a 198) em que busco por enunciados identitários na reportagem. Percebo em seu repertório, enunciados sobre os protagonistas do “Caso Gulliver” que narram os acontecimentos segundo um ordenamento semântico regular, com sentidos convergentes do que a memória paraibana registra, porém em formulações discursivo-imagéticas diferenciadas.

O texto jornalístico denuncia a pífia administração de Burity durante duas passagens pelo governo estadual: “Na primeira desperdiçou dinheiro construindo obras inúteis em João Pessoa. Na segunda gestão, entre 1987 e 1991, pior que a primeira, quebrou as finanças do Estado, inchando a folha de pagamento dos funcionários”. E também associa ambos os políticos às práticas políticas oligárquicas, tendo em comum o costume de “posar de intelectuais, de forma contrária aos velhos hábitos da política paraibana, secularmente dominada pelos coronéis e pela rivalidade entre famílias tradicionais”130, conjunto enunciativo diferenciado na função de interpretar informações já conhecidas e prolixas.

A reportagem também aponta para o ato criminoso e agressivo do protagonista, que tentou matar o adversário, como que característico da formação cultural local, recuperando velhos estereótipos e estigmas, classificando o Nordeste como lugar onde as coisas ainda se resolvem “à bala”, e a Paraíba como “uma terra habituada ao ronco dos trabucos”. Configuração em que o governador do Estado surge como lídimo representante, segundo diversos enunciados de Veja ao longo da reportagem, classificando-o como um pistoleiro. Sentido que procurou melhor evidenciar, de maneira diversificada do que geralmente acontece em textos repetitivos, empregando a linguagem não verbal, desenhos para narrar imageticamente o atentado, na forma de história em quadrinhos. A partir da capa (figura 3), cuja ilustração em estilo de história em quadrinho é disposta de forma a representar o crime numa concepção de imagem síntese, representando Ronaldo transtornado, alcoolizado e