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2.2 ASPECTOS METODOLÓGICOS

2.2.5 Verbos Poder e DEVER com Funções Distintas em Análise Estrutural

2.2.5.2 Verbo PODER

Ao considerar, agora, o comportamento do verbo PODER nos dados a seguir, diferentemente do verbo DEVER, inicialmente não se registra o seu uso em PB com sentido pleno, mas apenas como auxiliar (161). No entanto, uma ocorrência que vem intrigando, tanto na escrita quanto na oralidade, é a estrutura em (162), onde se consta a preposição COM entre esse verbo e o seu “pseudo” objeto; em ocorrências de sentido relacional ((163) e (164)) e de exercício de força ((162) e (164)). Nesse caso, é importante excetuarem-se os sentidos instrumental e adjuntivo.

162. Posso (?) com o tambor.

163. Posso com tambores.

164. Posso com meus filhos.

Uma das grandes questões que chamam a atenção nessas ocorrências é justamente se se trata do mesmo verbo. O exemplo (161) representa todas as ocorrências dentro da estrutura VERBO PODER + VERBO PRINCIPAL + ARGUMENTO INTERNO. Nas orações afirmativas, essa estrutura domina as ocorrências. E, em todas essas formas, o verbo PODER aparece como verbo auxiliar, diferentemente do verbo DEVER, que marca o uso tanto como auxiliar quanto como principal. Uma diferença de sentido percebe-se no dado (162) em relação ao sentido de (161): A carga semântica presente no primeiro é de possibilidade (ser possível). No segundo, fica clara a carga semântica de exercício de força física.

Em testes com nativos do PB não se descarta a idéia de um sentido de exercício de força em (165), indicado pela determinação do SN. Nele se indica a elipse de um verbo auxiliado dotado de função principal em relação a esse verbo. Em contraponto a essa ocorrência, haveria em (166):

165. Posso (lidar) com o computador.

Uma restrição interessante se percebe para esse dado: quando o SN é do tipo determinado e (-)humano, a leitura volta-se mais ao exercício de força. Quando o SN é do

tipo não determinado do tipo (-)humano, a leitura volta-se para o sentido relacional, como se vê em (166). Nesse caso, a restrição para uma leitura mais relacional ou mais exercício de força dá-se pela determinação ou não do SN subcategorizado pelo verbo em elipse.

166. Posso lidar com computadores ???

Porém outras estruturas que remetem ao mesmo sentido de uso desse verbo sacrificam a presença da preposição com (168) e (170):

167. Posso levantar o tambor.

168. *?Posso levantar (com) o tambor.

169. Posso erguer o tambor.

170. *?Posso erguer com o tambor.

Os dados (168) e (170) não são considerados agramaticais em todos os contextos. O problema está nas diferentes leituras que a eles são atribuídas pela inclusão da preposição COM. A ocorrência da estrutura no exemplo (167) apresenta o sentido de ter condições de levantar o tambor e apenas ele naquele contexto. Com a retirada da preposição nos exemplos (168) e (170), o verbo PODER com os verbos levantar e erguer atribui outro sentido à sentença, o de instrumento para ação de erguer (171) e (172).

171. Carlos pode levantar com o tambor. [SP, instrumental]

172. Fábio pode erguer com o tambor. [PP, instrumental]

Em ambos os casos é possível atribuir dois sentidos: em 171, o SP “com o tambor” indica a noção de que o tambor não seria um grau de dificuldade para a realização da ação de “levantar algo” exercida por Carlos. E, nesse caso, não se trataria do verbo pronominalizado LEVANTAR-SE, que já traria outro sentido à sentença; no caso em questão, dá-se que Carlos levantaria algo com o auxílio do objeto.

Em (172), a noção de instrumentalidade do SP “com o tambor” é bem clara, permitindo ser desdobrada em (173), em que o sintagma preposicional exige a presença de um elemento adicional que não está realizado foneticamente. Ocorrendo, inclusive, pelo contexto, o bloqueio a função de objeto para o SP com o tambor que passa a ter uma indicação circunstancial de instrumento.

173. Fábio pode erguer (algo) com o tambor.

Dessa forma, marca a ocorrência de um objeto nulo em relação ao verbo erguer, indicando que o tambor serviria de instrumento para erguer algo que não ele mesmo, o que se observa também em (174):

A presença da preposição em (174) indica uma mudança de foco em relação ao complemento anterior (tambor) do verbo, o que lhe custa a perda da condição de argumento interno. Nesse caso, o verbo levantar (171) passa a funcionar como verbo com objeto não realizado foneticamente. Percebe-se, então, que o único verbo que vai admitir funcionamento com a estrutura de (162) – Posso com o tambor – sem o sacrifício da preposição COM é justamente o verbo lidar.

Esse fenômeno instala-se como indicador de que, na verdade, as sentenças Poder com e Lidar com se equivalem estruturalmente tanto para o verbo em sentido

relacional quanto para sentido indicador de exercício de força. Inclusive porque em outras situações de uso o verbo PODER + VERBO PRINCIPAL + PREPOSIÇÃO COM + OBJETO, tanto para o exercício de força quanto para um sentido relacional, são viáveis ao se considerar os exemplos (175) a (176).

175. Eu posso com você. [sentido relacional/exercício de força]

176. Eu posso (lidar) com você. [sentido relacional/exercício de força]

Defende-se, inicialmente, nesse trabalho que o verbo PODER próximo à preposição COM entre esse verbo e seu pseudo objeto oculta a elipse do verbo lidar, indicador tanto de situações relacionais quanto de exercício de força. Nessas circunstâncias, o verbo PODER em estruturas como (161) – Posso comprar/doar/visitar/olhar/vender/etc um apartamento –, e (162) – Posso (?) com o tambor – são equivalentes e nesse caso não se tratam de verbos diferentes, mas do mesmo verbo.

CAPÍTULO 3

3. ESTRUTURA SINTÁTICA DO VERBO PODER

Neste capítulo, o foco é a descrição da estrutura sintática do Verbo PODER (Vpoder) no PB. Para isso, recorreu-se à proposta apresentada por Pontes (1973) de ambientação sintática desse verbo, incluindo-o junto aos demais que se enquadram nas exigências para a condição de auxiliaridade, não significando dizer que houve total adesão às idéias da citada autora, sobretudo no tocante ao Vpoder e a sua inclusão na condição de auxiliar pleno. Inicialmente, a discussão se dá em torno do que ela (PONTES, 1973) determina ser uma Sequência Verbal (SVb) e uma Locução Verbal (LV); distinção para a qual se propõe uma revisão, com base no que evidenciam os dados, presentes no corpus desta pesquisa. Por exemplo, a proposta de Pontes (1973) de que o Vpoder subcategorize uma oração infinita, que funcionaria como seu argumento interno.

Discussões teóricas como o fenômeno da elipse de V e VP presentes em Mateus et al (2006); além das noções de Categorias Vazias e Objetos Nulos de Raposo (1992), bem como a visão de que o PB é uma língua de tendente à orientação tópica (Cf. PONTES, 1986, apud SILVA, 2004) darão corpo ao ponto de vista defendido aqui em torno funcionamento do Vpoder no PB ao longo da discussão desenvolvida neste capítulo. É nesse capítulo também que se propõe uma revisão dos princípios para determinação de uma LV ou de uma SVb, com base também no que propõe Pontes (1973), mediante uma aplicação à estrutura sintática do Vpoder, verificação que dá conta de que não são muito eficientes no tocante a uma observação da estrutura complexa introduzida por esse verbo.

3.1. ESTUDO DE PONTES (1973) SOBRE A ESTRUTURA DO VERBO PODER NO PB: PONTOS E

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