• Nenhum resultado encontrado

4. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.6. Vida afetiva e sexual

Estaremos apresentando as categorias representacionais em torno da vida afetiva e sexual e os elementos periféricos emergidos nas falas. Dentre as representações identificadas, estão as que representam o sexo como sinal de saúde e o desejo, como algo natural do homem. No entanto, com relação a outros aspectos, os entrevistados representam a sexualidade como se a mesma apresentasse um grau de importância, no cotidiano, menor do que era antes do diagnóstico, utilizando-se de explicações diversas, e até mesmo desconhecidas, para justificar a mudança da libido (FIG. 6).

ABSTINÊNCIA COM AIDS, A GENTE NÃO TEM MAIS CORAGEM DE

SE RELACIONAR VIDA AFETIVA

E SEXUAL: ‘tudo muda, mas a gente faz de tudo para não

CULPA

TER DESEJO FAZ PARTE DO SER HUMANO, MAS DEPOIS DO HIV, NÃO ME ACHO MERECEDOR DE NOVAS RELAÇÕES

A ESPOSA NÃO TEM CULPA E ACABOU PAGANDO TAMBÉM, TEM QUE GOSTAR MAIS AINDA DELA; A ESPOSA É PARA SER RESPEITADA, MAIS AINDA DEPOIS DA DESCOBERTA DO SOROPOSITIVIDADE PARA HIV, MESMO QUE EU NÃO A TENHA INFECTADO

HOJE TEM QUE TER MAIS DO QUE SÓ SEXO

AFETO O APOIO DO PARCEIRO É O GRANDE MOTOR PARA

ENFRENTAR A SITUAÇÃO DE INFECTADO

TRANSMISSIBILIDADE EU TRANSMITI PARA A PARCEIRA E, MESMO ASSIM

,ELA CONTINUOU COMIGO

COM AIDS FICA MAIS DIFÍCIL DE SEPARAR-SE DE PARCEIRO, SOBRETUDO DAQUELE DE QUEM SE DEPENDE

CASAMENTO

AIDS DEVERIA FAZER O CASAL SE SEPARAR: ‘A GENTE TEM QUEM FICAR AGRADECIDO POR NÃO SE SEPARAR’

parecer que mudou’

SIGILO COM AIDS FICA MAIS DIFÍCIL DE TROCAR DE

PARCEIRO OU DE ‘ARRUMAR’ ALGUÉM

FIGURA 6 – Núcleo central e elementos periféricos das representações sobre aids em torno da vida afetiva e sexual

As mudanças relatadas são consideras importantes no estabelecimento de novos relacionamentos afetivos e sexuais após a confirmação do diagnóstico, assim como na manutenção dos relacionamentos em curso. Dentre as mudanças relatadas, encontramos: afastamento do(a) parceiro(a), diminuição do número de relações sexuais, abstinência sexual, diminuição do desejo ou do prazer, fuga de relacionamentos novos. Diante dessas mudanças, existe uma preocupação uma mudança de atitude, por parte dos homens, para a incorporação do hábito do uso de preservativo nas relações sexuais, independente do tipo de parceria, fixa ou ocasional.

A preocupação quanto à incorporação do uso do preservativo nesse grupo é identificada diferentemente pelos autores quando comparado com grupo de homens não-HIV positivo. Para estes últimos, o uso do preservativo, em contraposição ao grupo estudado, não é percebido como importante, pelo fato de os homens não se sentirem expostos, segundo Silva, W. et al (2002), às doenças tramissíveis, HIV e aids, o que faz com que os mesmos não percebam essas doenças como uma de suas preocupações de vida, dificultando, assim, a percepção da vulnerabilidade individual.

Silva, W. et al (2002) ainda coloca que, para o grupo de homens, assim como para o grupo estudado, a confiança no uso do preservativo, como medida preventiva, é pouco consistente, pois, segundo a maioria deles, assim como a maioria dos homens estudados “a camisinha estoura com facilidade”. Outra representação identificada é o fato de os homens considerarem que “o sexo com camisinha não é igual quando feito sem camisinha”. A insegurança quanto à proteção oferecida pelo preservativo faz com que homens, independente de ser soropositivo ou não, declarem medo de usar o preservativo e ter problemas com o rompimento do mesmo.

Dessa forma, após o diagnóstico, as relações sexuais são representadas como perigosas, passíveis de serem motivo de infecção do parceiro, fato esse que justificaria a abstinência ou a diminuição do número de relações sexuais mantidas, mesmo quando admitem a obrigatoriedade do uso de preservativo. Esse fato - aliado à culpa representada pelo risco e pela insegurança sentida pela pessoa infectada, não só quanto à possibilidade da transmissão da infecção para um possível parceiro, mas também em relação a uma nova exposição ao vírus do HIV - faz com que esses homens, em contraposição à representação - presente nos estudos - de que a relação extraconjugal faz parte da realidade de vida de homens casados (SILVA C., 2002), passem a representar esse tipo de comportamento como inconcebível após saber-se infectado.

As relações afetivas, sexuais e a vida amorosa, ao longo de toda a analise é um tema recorrente e central na trajetória de vida dos homens. Para esses homens, a aids e o sexo estão representados como intrinsecamente relacionados, mesmo para aqueles que acreditam ter-se infectado de outra maneira. A infecção pelo HIV representa uma ruptura na trajetória de vivência da sexualidade e desencadeia um questionamento intenso sobre si mesmo. Essa inter- relação entre sexo e aids é discutida por Silva W. et al. (2002) ao colocar que há uma associação imediata entre a traição e as doenças sexualmente transmissíveis, sendo que a falta

do uso da camisinha nas relações extraconjugais é considerada como uma atitude que compromete a saúde do(a) parceiro(a).

Para os homens, o fato de representar a aids, como diretamente interligada ao sexo, gera sentimento de culpa e de medo, visto que a fidelidade conjugal remete a sentimentos de amor, respeito, consideração, companheirismo. Dessa forma, as representações sobre aids são mais pesadas de significado, para esses homens, pelo fato de a transmissão ser sexual, sendo que, para os mesmos, o sexo tem uma importância muito grande e o desempenho sexual, um valor alto. A constatação da infecção faz com que as representações sobre sexo venham à tona, misturado a culpa pela vida sexual ‘sem controle’, ´desviante`, ‘promíscua` e ´eventual` e a constatação de que a libido se alterou. (GIACOMOZZI & CAMARGO; 2006; OLTRAMARI, 2003).

O apoio do parceiro é visto como fundamental para o enfrentamento do cotidiano com o HIV, porém a manutenção dos relacionamentos duradouros explicita representações sobre casamento, que implicam afeto ou dependência, além daquelas relativas ao risco de transmissão ao fato de que a aids é um fator que pode determinar a separação do casal: o apoio do parceiro é o grande motor para enfrentar a situação de infectado; com aids, a gente não tem mais coragem de se relacionar; ter desejo faz parte do ser humano, mas depois do HIV não me acho merecedor de novas relações; com aids fica mais difícil de separar-se de parceiro do qual há dependência; com aids fica mais difícil de trocar de parceiro ou ‘arrumar’alguém.