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A VIDA EM UMA FAVELA INDIANA: COM A PALAVRA, AS MULHERES A sabedoria das mulheres pobres pode

não estar circunstanciada nos planos dos governos, instituições internacionais e organizações de pesquisa, embora elas conduzam suas precárias vidas diárias nas fronteiras do mundo de 7 bilhões de pessoas. Estatisticamente, as mulheres dos vilarejos e bairros mais pobres das nações em desen- volvimento são, ou serão, as mães da maior parte das pessoas que virão ao mundo neste século e, mesmo com quase nenhuma esco- laridade ou sendo analfabetas, elas querem dividir suas experiências, seu modo de pen- sar e seus conselhos.

Bhim Nagar é uma das numerosas favelas que se aglomeram em espaços anteriormen- te abertos em Thane, cidade de classe média nos arredores de Mumbai, capital financei- ra e de entretenimento da Índia. Estima-se que 30% da população de Thane hoje viva nesses assentamentos precários de cres- cimento rápido. Mas Bhim Nagar, para os que nela vivem, é um bairro cheio de vitali- dade e ingenuidade, a despeito da escassez e da disseminada violência doméstica. A comunidade abriga mulheres que trabalham arduamente e que mantêm unidas grandes famílias, apesar das dificuldades.

Uma tarde passada em Bhim Nagar, na companhia de algumas dezenas de mulhe- res sentadas no chão, à porta de suas casinhas na maioria sem janelas, permi- tiu uma rápida visão do bom senso inato de tantas mulheres não escolarizadas do mundo, manifestado enquanto elas refle- tiam sobre as forças sociais e econômicas

que as levaram para lá. Espelhando as pre- ocupações e esperanças de mulheres de outras sociedades em desenvolvimento, as mulheres de Bhim Nagar falam não ape- nas sobre suas vidas diárias, mas também sobre questões mais amplas: alta dos pre- ços dos alimentos, oportunidades e padrões

de ensino, disparidades no atendimento à saúde, casamentos muito precoces e a ameaça do abuso no lar, que as impede de fazer uso dos serviços de planejamento familiar. Crianças com os olhos arregalados tudo veem e escutam.

Todas as mulheres – a maior parte delas provenientes do estado de Maharashtra, onde Mumbai está localizada – migraram para lá com seus maridos e encontraram abrigo nessas sujas fileiras de casas de propriedade de locadores que podem des- pejá-las a qualquer momento. Todas elas se casaram ainda adolescentes. O casa- mento infantil é ilegal na Índia, onde uma lei de 1978 estabeleceu que o casamento só pode se dar entre maiores de 18 anos. A lei, porém, é quase universalmente descumpri- da, especialmente nas áreas rurais. Uma das mulheres ressaltou que ela nem sabia que tinha sido casada quando seus pais a entre- garam para um homem, em trato arranjado por ambas as famílias. Não havia saída.

As mulheres de Bhim Nagar, trabalhando como empregadas domésticas ou, às vezes, na coleta de lixo e de descartes recicláveis, são quase sempre as únicas que trazem alguma renda para a família. São elas que pagam a maior parte das contas, inclusive a do aluguel, de cerca de US$38 por mês – com recursos que tiram de salários que raramente excedem a US$50. Seus maridos, dizem elas, trabalham por dia e apenas oca- sionalmente encontram trabalho.

O alcoolismo e a violência são proble- mas constantes no seio de várias famílias. “Trabalho o dia inteiro, chego em casa e cozinho, e nem consigo comer sem que meu marido bata em mim,” disse uma mulher no início da meia-idade, através de um intér- prete. Ele procura motivos para justificar o abuso. “Que a comida está fria, que está sem

Em uma antiga área de alojamentos militares, 12 hectares foram transformados em espaço verde para corrida, ciclismo e prática de esqueite em novas instalações. Outro parque, maior, conta com equipamentos de atletismo e um museu infantil “para tocar”. Para transformar ambos os projetos em realidade, os planejadores da cidade lutaram com sucesso contra licitações do governo que pre- tendiam requisitar os terrenos para a construção de novos prédios de escritórios.

Toluca e a Cidade do México, de forma geral, atraem migrantes de outras partes do país. Chemor conta que, em um esforço para prevenir a instalação

de mais favelas urbanas ou periféricas, ou de ter mais pessoas mudando-se para áreas vulneráveis a inundações, os funcionários do governo estão trabalhando em conjunto com as incorporadoras privadas na construção de novas cidades autônomas com moradias a preços compatíveis com a dispo- nibilidade das famílias de baixa renda. Um desses projetos, chamado Bonanza, está localizado bem longe da cidade e sem acesso ao transporte público. Os funcionários informam que os proprietários de linhas de ônibus particulares já estão atendendo a essa necessidade, o que reflete uma tendência, no México, de se exigir maior participação do setor

Moradoras das favelas de Bhim Nagar, todas provenientes de Maharashtra, a oeste da Índia. Todas trabalham como empregadas domésticas nas áreas residenciais das proximidades ©Atul Loke/Panos

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gosto ou muito salgada,” conta, sobre as queixas do marido. Mulheres com manchas arroxeadas dizem não poder tirar alguns dias de folga de seu trabalho de diaristas e cozi- nheiras para se recuperar das lesões, porque temem perder o emprego para as concorren- tes. As famílias não têm previdência social, aposentadorias ou planos de saúde.

As moradoras de Bhim Nagar dizem ter dado à luz entre quatro e sete filhos cada. Conhecem o planejamento familiar e onde obtê-lo, mas são proibidas de fazer uso desse recurso, dizem. “Os homens são muito exigentes,” comenta uma delas, enquanto suas vizinhas balançam a cabeça, concordando. “Eles só querem filhos homens. E têm o poder.” Solicitadas a sugerir qual seria o tamanho ideal para uma família, concordam que seria de dois filhos – misteriosamente perto da taxa de reposição mundialmente reconhecida de 2,1 filhos, a qual estabilizaria a população naquele canto da Índia onde elas vivem.

Em Bhim Nagar, existem apenas dez latrinas – cinco para os homens e cinco para as mulheres, compartilhadas por centenas de pessoas, dizem as moradoras. Os vasos sanitários das mulheres são limpos apenas esporadicamente. Não há água corrente no assentamento. O locador, que abre as tor- neiras por poucas horas na maior parte dos dias da semana (mas não em todos) cobra 100 rúpias, cerca de US$2,50, para encher os potes das famílias. A energia elétrica tam- bém é vendida para elas, a 100 rúpias por mês por cada soquete ou tomada. A maior

parte das casas é escura ou com muito pouca iluminação no interior.

Encontrar comida suficiente para suas famílias é uma constante preocupação e fonte de tremendo estresse mental e ten- são para essas mulheres. Elas sabem que devem se cadastrar para se beneficiar dos programas de assistência pública que ofe- recem preços reduzidos para os alimentos e querosene que são itens essenciais. Mas, contam, os alimentos são desviados para o mercado negro antes que elas cheguem até eles e, mesmo se tivessem cartões de racio- namento, eles seriam inúteis porque elas são forçadas pelas circunstâncias a com- prar a preço de mercado.

Apesar de tudo isso, as mulheres de Bhim Nagar são espantosamente resilien- tes. Muitas enviaram os filhos para escolas estaduais informais ou locais, esperando que eles venham a ter uma vida diferente. Alguns deles foram encaminhados para formação vocacional ou educação em níveis mais altos. Para as meninas, porém, a vida pode ser mais difícil. Algumas das que vivem nas vizinhanças já são empregadas domésticas. Foram tiradas da escola para ajudar a susten- tar as famílias em necessidade, destinadas a repetir as vidas de suas mães. Outras são casadas cedo – naquela tarde, uma meni- na de 14 anos estava passando por uma cerimônia de noivado – e podem estar con- denadas a outra geração de abuso familiar.

Nesse e em alguns outros bairros da área, as mulheres ainda contam com um lugar para pedir aconselhamento e ajuda.

Há uma pequena filial da Federação Bhartiya Mahila nas vizinhanças. A orga- nização, que recebeu auxílio do UNFPA para iniciar suas atividades, auxilia mulhe- res a obter aconselhamento, alguma ajuda jurídica ou espaço em um abrigo (e orfa- natos ou internatos para as crianças), quando a crise é extremamente perigosa. Os voluntários, entre os quais se encon- tram professores, assistentes sociais e um psiquiatra, dedicam seu tempo ao cen- tro que a organização opera em Thane. Um grupo de teatro de rua foi formado para levar mensagens às comunidades carentes. Um grande sucesso, com mais de 2.500 apresentações, tem como título “Salve as Meninas e Salve o País”. O grupo atraiu grande atenção e foi convidado para se apresentar na Alemanha.

Prabha Rathor, uma das mulheres da favela, contou como o Centro Feminino lhe deu apoio para sair de um casamento violento, ao qual ela foi forçada quando tinha 14 anos. Prabha conta que foi uma mulher isolada e aterrorizada por anos, mas, desde então, tornou-se uma mulher adulta e confiante em si, que se sustenta cozinhando e vendendo almoço em mar- mitas – as “tiffin box” – que fizeram a fama de Mumbai. Ainda morando na favela, ela auxilia crianças abandonadas ou em grave abandono a sobreviver. Com muita tristeza ela teve de abrir mão de seus dois filhos para obter o divórcio. “Agora eu digo que não tive apenas dois filhos,” diz ela. “Tive mil, na comunidade.”

privado no desenvolvimento. “As incorporadoras são obrigadas a construir as instalações para escolas e hospitais,” diz ela sobre os projetos de moradia para famílias de baixa renda do estado. “Não se faz isto em muitos outros lugares.”

O crescimento das cidades em todos os lugares impõe desafios reais para os governos e para seus moradores. Mas a urbanização pode ser um fator positivo para o desenvolvimento econômico, ambiental e social sustentável, segun- do o relatório Population Dynamics in the Least

Developed Countries: Challenges and Opportunities for Development and Poverty Reduction

(Dinâmica Populacional nos Países Menos Desenvolvidos: Desafios e Oportunidades para o Desenvolvimento e Redução da Pobreza), publi- cado em 2011 pelo UNFPA. As populações estão crescendo, e, para as pessoas, faz sentido do ponto de vista econômico e ambiental a mudança para as proximidades das áreas urbanas, acrescenta o rela- tório. A urbanização gera empregos e possibilita que os países ofereçam serviços essenciais a custos mais baixos per capita. Ela também contribui para a redução do consumo de energia, especialmente de transporte e moradia, e pode aliviar as pressões populacionais nas áreas rurais.

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