• Nenhum resultado encontrado

A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso,

em condições dignas de existênda.^^^

O E sta tu to d a C riança e do A dolescente (ECA), ex p ressa de form a m uito cla ra o s direitos d a crian ça no q u e se refere à saú d e. O artigo citado acim a é o m ais ab ran g en te pois a trav és dele p ro cu ra-se g a ra n tir n ã o só a sobrevivência d a criança, m a s a s u a integridade física, psicológica e social.

S aú d e é m uito m ais que o aten d im en to que se íaz no consultório ou no hospital. Ao falar de saú d e, o ECA utiliza o seu conceito m ais a tu a l q u e é aquele que se refere ã h arm o n ia do se r h u m a n o por inteiro, com o seu corpo, s u a m ente e com o seu meio social.

P a ra a execução do artigo 7°, n ão é necessário a p e n a s “o p esso al de ro u p a b ra n c a ” (os profissionais de saúde). É necessário a articu lação d a sociedade e u m posicionam ento político que considere o respeito pela c ria n ç a como u m se r h u m a n o , p a ra que seja possível proporcionar-lhe a vida e a sa ú d e com dignidade. Portanto, q u an d o se fala em políticas sociais p ú b licas, deve-se a te n ta r p a ra o papel que devem a ss u m ir ta n to ò E stado com o a sociedade n a s u a im plem entação, u m a vez que a p alav ra p ú b lica é sinônim o de coisa de todos.

A pesar de n ão ter sido n o s s a in ten ção fazer u m a an álise p ro fu n d a do a tu a l siste m a de saú d e, sen tim o -n o s forçados, pelos d ad o s obtidos, a

Artigo 7. da Lei n. 8069 de 13 de julho de 1990.(BRASIL, E statuto da C riança e do Adolescente . Brasília: Senado Federal; Subsecretaria de Edições técnicas, 1991. p.8.

d isc u tir a q u estão do acesso d a crian ça ao s serviços de saú d e. Em seu artigo 11° o ECA165 diz:

É assegurado atendimento médico á criança e ao adolescente, através do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde.

E n tretan to , sab em o s q u e esse direito n ão tem sido efetivado. No B rasil, a crian ça tem sido vítim a, principalm ente, d a pobreza, d a violência e d a falta de cu id ad o s com a s u a saúde.

D u ran te o período de observação de cam po p u d em o s c o n s ta ta r m u ita s situ açõ es de c ria n ç a s h o sp italizad as por problem as q u e poderiam te r sido evitados caso a s diretrizes p a ra a aten ção à c ria n ç a e ao adolescente preco n izad as pela legislação^®® fossem realm ente im plem entadas.

A criança tem 40 dias de vida, está desnutrida e com diarréia. A mãe diz que não conseguiu amamentar e estava oferecendo leite NAN engrossado com arrozina.

Nota de observação n. 6 A

A criança internou por pneumonia e desnutrição. Ela tem quase dois anos e pesa sete quilos.

Nota de observação n. 9 A

A equipe comenta sobre o ‘menino de rua’ que fe z enxerto na mão devido a uma queimadura de terceiro grau causada por acidente com fio de alta tensão, quando ele tentava soltar uma pipa presa no poste de luz.

Nota de observação n. 5 B

Ibidem, p. 8.

Resolução n. 42 de 13 de outubro de 1995- Dispõe sobre as DIRETRIZES NACIONAIS PARA A POLÍTICA DE ATENÇÃO ESfTEGRAL À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NAS ÁREAS DA SAÚDE, EDUCAÇÃO, ASSISTÊNCIA SOCIAL, TRABALHO E PARA A GARANTIA DE DIREITOS. Diário

No Brasil, d en tre a s p rin cip ais c a u s a s de m ortalidade infantil d estacam -se a s afecções originadas no período p érin atal, a s d o en ças d iarréicas e resp irató rias a g u d a s e a d esn u trição . São, tam bém , a s c a u s a s m ais c o m u n s de hospitalização de crian ças. As c a u s a s e x te rn a s - acid en tes prin cip alm en te - tam bém ap arecem com d estaq u e e n tre a s c a u s a s de in te rn a ç ã o de c rian ças em diversas faixas etárias. T odas e s ta s situ a ç õ e s poderiam se r red u zid as se h ouvessem ações dirigidas á prom oção d a saú d e.

Isso n o s faz utilizarm os a s reflexões de Pessini e Barchifontaine^^^ sobre a bioética (ética d a vida) no m u n d o d o s pobres. P ara os a u to re s é n ecessário re p e n sa r a bioética no contexto do subdesenvolvim ento pois, d a form a como têm -se tra ta d o o tem a, h á a ilu são de q u e a vida e s tá sendo prezada. M as, ao co ntrário, m u ita s vidas estão no lim ite d a existência en tre aq u eles que ch am am o s de “excluídos” socialm ente. M uitas c ria n ç a s ob serv ad as d u ra n te a coleta de d ad o s p a ra e s s a p e sq u isa j á en trav am n a in stitu ição vio len tad as p o r c a rên cias básicas: alim entação, a m b ie n te /h a b ita ç ã o , educação, convivência social, en tre o u tra s.

O direito ã vida e o acesso ao s serviços de sa ú d e de qualid ad e p a ss a m tam b ém pela form a como se organiza o sistem a de sa ú d e p ú b lica atu a lm e n te . A pesar dos g ran d es av an ço s alcan çad o s pelo S istem a Único de S aú d e (SUS), este a in d a sofre dificuldades re p re s e n ta d a s prin cip alm en te p ela g ran d e d e m a n d a e tam b ém pela falta de investim ento n o s se u s re c u rso s h u m a n o s (como j á discu tim o s an terio rm en te no item 3.3.1..). E n tre ta n to , é im p o rtan te sa lie n ta r u m aspecto referente ao s profissionais q u e n ão depende ta n to de investim entos públicos.

PESSINI, Leocir ; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problem as atuai$ de Bioética. 2 ed. São Paulo; Loyola, 1994. P. 33-39.

T rata-se d a p o s tu ra ética dos profissionais, pois, como diz Ângelo

...os programas de saúde da criança, não se implementam por si só. Eles são uma abstração sem as pessoas, (,..)sem os profissionais de saúde. Quem os desenvolve, quem dá estilo e ritmo a eles são as pessoas. Cabe a nós então, numa perspectiva ética, decidirmos que normas e valores devem nortear nossas ações em relação à criança. Que tipo de atenção eu ofereço à criança? Em nome de quem eu utilizo o meu saber? Em nome de uma instituição, também abstrata, sempre auto- referente, já que muitas vezes preocupa-se apenas com ela mesma, com seus manuais e rotinas? E quase sempre nós, para não nos confrontarmos com ela, protegemo-nos com os mesmos manuais de normas e rotinas. Em nome de uma população,

sobretudo de crianças, mergulhada no mais profundo

desamparo e abandono?

Na fase inicial d e s ta investigação, d u ra n te a coleta de dados, p u d em o s conviver com m u ito s dilem as éticos. E n tre ta n to , com freqüência, tín h a m o s a sen sação de q u e nin g u ém os percebia. Intrigáva-nos a n ão reação dos tra b a lh a d o re s do h o sp ital d ian te de situ açõ es d ra m á tic as .

Saí do campo agoniada porque aquela criança não está bem. Será que morreu? Fico o resto da noite pensando na situação, por se tratar de um dilema ético importante. O que mais me chocou foi a sujeira, a escabiose disseminada, a desnutrição (kwashiorkor) (...) e não pude fa zer nada... Ou talvez eu pudesse fazer mais alguma coisa?

Notas pessoais n. 7 E

N esta situ ação p u d em o s ex p erim en tar u m dos m aiores dilem as e n q u a n to enferm eira e pesq u isad o ra. Nosso desejo e ra de, n aq u ele m om ento, esquecerm os que estávam os como p esq u isad o ra. Mas, m esm o que fizéssem os isso, n ão “estaríam o s” como enferm eira (porque n ão tra b a lh a m o s

ÂNGELO, Margareth. Saúde da criança e do adolescente, políticas e programas de saúde, aspectos técnicos, científicos e éticos. In: ANAIS do 45. Congresso Brasileiro de Enfermagem, 1993, Recife. Anais...,Recife:

n a q u e la instituição) a p e sa r de c o n tin u a r “sen d o ” enferm eira. Há, enfim, u m a g ran d e d istâ n c ia en tre o “se r” e o “e s ta r” enferm eira, o q u e n o s re p resen to u m uito sofrim ento d u ra n te o processo de coleta de dados.

O correram situ açõ es, e n tre ta n to , q u e n ão exitam os em agir como “sen d o ” enferm eira:

A criança está sem acesso venoso e, junto com as auxiliares de enfermagem, resolvemos pegar outra veia. A s auxiliares me avisam que a mãe não deixa pundonor na cabeça. Comento com as mesmas que existem situações em que temos que utilizar argumentos mais fortes para convencer a família. Me aproximo da mãe agachando junto a ela e converso esclarecendo sobre a necessidade do procedimento. A mãe continua chorando, sem decidir, mas parece estar querendo confiar em mim. Dada a gravidade da situação, resolvemos decidir por ela. A mãe pede para esperar lá fora. Felizmente o procedimento foi rápido, sem maiores traumas. A mãe retoma e agradece.

Nota de observação n. 8 E

H á situ açõ es, como a s de urgência, em que to m a -se necessário e irrecusável u m a ce rta violência. C ham o de violência irrecu sáv el: é violência porque, a p e sa r de m uito bem indicada, tem u m com ponente agressivo re p re se n ta d o pelo procedim ento doloroso e tam b ém pela relação de dom inação sim bolizada pelo “decidir pelo o u tro ”. M as é tam b ém irrecusável no sentido de que a re c u sa pode significar a in jú ria ou a m orte. È u m a violência justificável a trav és do “princípio d a beneficiéncia” . N esta situ a ç ã o e s tá em jogo o m aior de to d o s os in terêsses: a vida. A q u estão é difícil, prin cip alm en te ap ó s ta n to term os discutido sobre a s relações de poder derivados do sa b e r e d a co n seq ü en te a ssim e tria que a s p rá tic a s profíssionais de sa ú d e estabelecem en tre os tra b a lh a d o re s e os clientes. Mas, como diz Silva^®^, é possível d issociar o exercício d a com petência profissional do poder a ele associado a trav és do cuidado ético, paralelo ao cuidado terapêutico.

ABEn nacional. Ed. Universitária da UFPE, 1993. P. 131.

SILVA, Franklin Leopoldo e. Beneficiéncia e paternalismo. Revista M edicina - Conselho federal, dez. 1997. P. 8-9.

(...)Este cuidado consistiria sobretudo num esforço para não chegar a ignorar a singularidade do paciente, isto é, de cada pessoa. Significa compreender que os benefícios devidos ao paciente não se restringem à esfera terapêutica no sentido técnico e operacional, já que, qualquer que seja o problema específico do paciente, é sempre um sujeito individual, moral, histórico, social que o manifesta. Não se pode, assim, separar o problema daquele que o tem.^^°

T rata-se, tam bém , de agir seg u n d o u m a ética d a “resp o n sab ilid ad e solidária” p ro p o sta p o r Apel e defendida por Caponi^^^, segundo a q u a l é im possível resolver todos os conflitos h u m a n o s m ediante n o rm a s ou d isc u rso s p rático s prontos. Se q u iserm o s g aran tir, e n q u a n to profissionais de saú d e, c e rta responsabilidade e c e rta solidariedade em n o s s a s ações co tid ian as, é preciso q u e n o s neguem os a p rescin d ir a b so lu ta m e n te d a racionalidade estratégica. T rata-se, enfim, de posicionar-se e n q u a n to p esso a e de tr a ta r o cliente tam bém como tal.

E n tre ta n to , m u ito s d ad o s d e sta p e sq u isa d em o n stram q u e tem ocorrido a b an alização do sofrim ento e d a experiência de quem se coloca n a posição de paciente, e isto tem e stre ita relação com a red u ção d a q u alid ad e do serviço público.

(...) A criança está muito grave(..) Saindo da enfermaria (onde estava a criança), vejo duas enfermeiras conversando e rindo, indiferentes ao que ocorria com uma criança a poucos metros dali.

Nota de observação n. 8 G

A situ a ç ã o colocada por este relato d e m o n stra a desvalorização d a vida h u m a n a no contexto ap resen tad o . Assim como os tra b a lh a d o re s do hospital, em m u ita s situ açõ es re la ta d a s an terio m en te - no capítulo sobre a

organização do trabalho no serviço público - têm d em o n strad o u m a c e rta Ibidem, p. 9.

CAPONI, Sandra N. C. Limites Y prioridades éticas de la asistencia de urgência. In: CAPONI, Gustavo; LEOPARDI, Maria Tereza; CAPONI, Sandra N. C, (org.) A saúde como desafio ético. Anais do I

ad a p ta ç ã o ã s condições p re c á ria s de tra b a lh o e de a ss istê n c ia ao s u su á rio s, tam b ém a banalização d a vida h u m a n a ap arece como u m “co stu m e”. A m orte m u ita s vezes é v ista como inevitável. A m orte é, em essên cia, inevitável. M as e ss a generalização de s u a inevitabilidade como respaldo p a ra o agir descom prom etido com a c a u s a d a vida, este sim é evitável. O d iscu rso do inevitável tem u m poder m uito g rande n a á re a d a sa ú d e e é utilizado com m u ita freqüência no h o sp ital p a ra ju stific a r negligências, om issões, iatro g en ias e o u tra s ta n ta s situ açõ es de violação dos direitos dos u s u á rio s e tam b ém d a ética profissional.

P ara L u n a r d i a to s de negligência ou de om issáo dos profissionais de

sa ú d e n ão devem se r ju stificad o s por s u a s c a ra c te rístic a s p esso ais e /o u contextos sócio-históricos, pois a a tu a ç ã o d e ste s sujeito s p a s s a ria a se r explicada como efeito de ta is c aracterísticas e contextos. E refletindo sob a visão de K ant afirm a:

Somos seres naturais, sociais e além disso, racionais e livres, uma liberdade que nos leva para além do que somos, do reino do ser para o reino do dever.(,..)A decisão do que fa zer ou do que não fazer, entendida também como uma decisão,

compete apenas ao h o m e m .

Mas, como é de se prever, o d iscu rso do inevitável tem sido m uito m ais freqüente q u an d o se refere á m orte de c ria n ç a s d a s classes m en o s favorecidas econom icam ente, o que confirm a a exclusão. A m orte de “m ais u m pobre” parece n ão ch o car m ais m u ito s tra b a lh a d o re s do hospital, a ssim como b o a p a rte d a sociedade. E m bora n ã o d eclarad am en te, tem sido aceito o acesso restrito d o s pobres ã s diversas tecnologias de saúde.

Seminário Internacional de Filosofia e Saúde. Florianópolis: Sociedade de Estudos em Filosofia e Saúde, 1995. P. 54-72.

LUNARDI, Valéria L. Uma crítica da moral da obediência para a busca de uma moral autônoma da enfermeira. Texto Contexto enferm., Florianópolis, v. 4, n. 2, p. 73-92, jul./dez. 1995. p. 85-86.

Dos três respiradores do hospital, dois estão estragados. A gente tem muito caso de perder criança por falta de respirador. Teve um caso de uma criança que nós entubamos, colocamos no oxigênio, não tinha respirador. A criança parou e a médica disse que não iria reanimar porque não tinha o que fazer. Fiquei muito revoltada por perder essa criança. Se fo sse meu filho ou o filho dela a atitude seria outra.

Enfermeira A (Nota de entrevista n. 20J)

Q u an d o esse acesso lh e s é perm itido, com freqüência ele ap arece com o sen tid o de “dádiva”, ou seja, algo oferecido como esm ola , n o s rem etendo a sen tim en to s como piedade ou com paixão.

Tem exames que o SUS não paga. Você corre prá conseguir encaixe, ou conversa com o diretor, ou o pessoal do laboratório fa z como cortesia...

Enfermeira A (nota de entrevista n. 20 E)

Não tem vaga de UTI pelo SUS na cidade. A enfermeira pede para ligarem para o doutor Fulano que trabalha na UTI do hospital X e pedir para atender a esse favor.

Nota de observação n. 23 B

E sta s observações ilu stra m bem o que Caponi^’^'^ c h a m a de êtica d a com paixão. A a u to ra d e m o n stra que foi e s s a abordagem que dom inou a s relações n a á re a d a sa ú d e a tê o sêculo XVIll. Ser com passivo, a te n d e r os pobres, d o en tes e in fo rtu n ad o s e ra te r a certeza de conseguir a salvação d a p ró p ria alm a. M as a com paixão caracteriza u m a form a de dom inação: q u a n d o alguém m an ifesta piedade por o u tra pessoa, a caracteriza como su je ita a u m a debilidade que só pode se r co m p en sad a com o auxílio d aquela. C itando Collière, C aponi diz que

CAPONI, Sandra N. C. Ética e compaixão na genealodia da ordem médica. Florianópolis: UFSC, 1997. (datilografado)

...a necessidade e sujeição dos pobres necessitados é, por si própria, uma garantia de obediência, porém, ela representa também a impossibilidade, a incapacidade de se situar numa relação de paridade e a possibilidade de evitar um enfrentamento com diversas formas de relacionamento social que exijam julgamento e discernimento.

E m bora e ss a ética com passiva te n h a sido m ais u s u a l até o século XVII, até hoje p ersistem resquícios d e ss a abordagem . Exemplo disso sáo a s ações p a sto ra is ligadas à Igreja, os projetos filantrópicos e o próprio posicionam ento de tra b a lh a d o re s no cotidiano do exercício de s u a s funções no hospital.

Em su p eração à ética c o m p assiv a/p ied o sa e s tá a ética u tilita rista ou ra c io n a lista . E m bora su p ere a prim eira, a se g u n d a form a de intervenção to m a -se com plem entar ãq u ela n a m edida em que tam b ém é fundada na

exclusão e na normalização que fa z dos pobres perigosos, sujeitos docilizados e laboriosos submetidos ao imperativo de viver conforme o bem-estar geraV^^. O

princípio d a ética u tilitarista, b a se a d a n a s form ulações de Je re m ia s Benthami'^^, é “a p ro c u ra d a m aior felicidade p a ra o m aior n ú m e ro ”, ou seja, o bem e s ta r público e o in terésse d a m aioria d a s p essoas. S ão esse s critérios que governam e fu n d am en tam a té hoje a s m ais v aria d a s in stitu içõ es de a ssistê n c ia pública. A ética u tilita rista tam bém m o stra-se p resen te no cotidiano do aten d im en to ã cria n ç a no hospital.

A situação do ambiente está caótica: estourou o sifão da pia do posto de enfermagem, está tudo alagado, mas não há como parar. Há em tomo de sessenta crianças no corredor para serem atendidas e outras quinze nas enfermarias de observação.

Nota de observação n. 26 A

CAPONI, 1997.0/7. cit. , p. 50, A autora faz referência ao pensamento de Bentham baseada na seguinte referência: BENTHAM, Jeremias, Uma introdução aos princípios da moral e da legislação, In: Os pensadores 175

CAPONI, 1997. op. c it, p. 47 CAPONI, 1997.op. cit. , p. f referência: BENTHAM, Jeremi

A pesar do am biente im próprio e d a s condições in a d e q u a d a s p a ra o aten d im en to , n ão h á como p a ra r ou m esm o d is p e n sa r a grande d e m a n d a que p ro c u ra o serviço, visto que ele tem sido a ú n ic a opção p a ra a m aioria d a população.

Aqui e s tá p resen te o princípio d a “m aior felicidade p a ra u m m aior n ú m e ro ”. E n tre ta n to , concordam os com C aponi q u a n d o e s ta afirm a que este princípio traz consigo u m a periculosidade m oral, dado o c a rá te r am bíguo de “felicidade”. P ara a a u to ra , e s s a felicidade pode ser u m valor rad icalm en te incom patível com o valor d a liberdade, pois h á u m preço p a ra se p ag ar e s s a felicidade.

Mas, ta n to a ética u tilita rista q u a n to a ética d a com paixão p a rte m d a m esm a certeza:

sempre atuam em nome e pelo bem daqueles que dizem auxiliar, conhecem esse bem de um modo claro e distinto, mesmo antes de ser solicitado e prescindem de argumentos, excluem as palavras e emudecem qualquer diálogo. A segunda, pela força do sentimento compartilhado que aproxima os benfeitores responsáveis dos sofredores submissos sem precisar da mediação de razões e a primeira na medida em que modela os interêsses privados, através de normas e instituições inapeláveis, com a finalidade de orientá-las para a felicidade e o bem do maior número. ^

C o n tra o utilitarism o e citEindo Rawls, Caponi^’’® relaciona trê s princípios básico s cap azes de g a ra n tir o exercício d a ju s tiç a : o princípio de liberdade, o de igualdade de o p o rtu n id ad es e o princípio de diferença, q u e o rd en a beneficiar os m em bros m enos favorecidos do grupo. E n tre ta n to , diz a au to ra;

CAPONI, \9910p. cit., p. 53. CAPONI, 1995.(9p. Cit., p. 57.

... esse terceiro princípio e sua ênfase no privilégio dos menos favorecidos, permite dizer que as diferenças deixam de ser um dado meramente arbitrário e passam a ser elementos significativos, que contam no momento de organizar uma estrutura. Mas, ao mesmo tempo, é esse princípio o que nos impede traçar barreiras taxativas entre aqueles que podem ou devem ser excluídos e aqueles que “merecem” a atenção conforme sua “valia”

E m bora j á te n h a m o s d iscutido a q u e stã o d a dor, d e sta c a m o s u m fragm ento d a en trev ista com u m a enferm eira do seto r de q ueim ados que d e m o n stra a inexistência de u m radical q u estio n am en to ético:

É um grande sofrimento trabalhar aqui porque você convive o tempo todo com a dor. O que mais me toca são os curativos dos pacientes externos pois não há qualquer solução analgésica para fazer o procedimento, porque o médico não está presente no momento do curativo.

Nota de entrevista n. 28 A

N esta situ ação n ão h á q u a lq u e r possibilidade de cu id ad o ético, pois a m ais elem en tar tecnologia (a analgesia) n ão e s tá acessível á criança.

A sociedade b rasileira tem sido m a rc a d a como u m a d a s m ais in ju s ta s do m u n d o , m a s en co n tra-se d ian te d a exigência de to rn a r-se u m E stad o de direito dem ocrático. Isso p ressu p õ e a integração d a im e n sa m a s s a de excluídos . Essa é a exigência central de nossa epocalidade; é a forma específica de

efetivação, em nossa epocalidade, da exigência ética fundamental do reconhecimento universal.

Isso n o s faz rep o rtar ao a tu a l dom ínio d a racionalidade científica frente à s q u e stõ e s éticas. Na concepção co n tem p o rân ea d a ciência - onde tem o s o exem plo d a a tu a l m edicina n a q u al e s s a racionalidade científica é tra d u z id a pela objetÍAÀdade do d iag n ó stico -tratam en to - a problem ática êtica onde o se r do hom em e s tá em jogo tam b ém carece de u m a fu n d am en tação racio n al

179

d a ação h u m a n a . N essa perspectiva, a m aioria d o s profissionais de sa ú d e b u s c a “receitas p ro n ta s ” p a ra a s d iversas q u e stõ e s éticas. Mas, com o diz

Documentos relacionados