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CAPÍTULO 1 – Memórias e História Oral: Caminhos da pesquisa

1.4 As Histórias dessas Mulheres no movimento estudantil

1.4.4 Violeta

Antes de entrar na universidade eu tive uma participação no Ensino Fundamental. Naquela época era um centro cívico que hoje nem existe mais (risos), ainda bem. Na ditadura era o centro cívico, mas não era uma atuação política, não existia essa atuação como é hoje, essa discussão mais política da sociedade, mas porque também no Ensino Fundamental, aos treze, catorze anos, você não tem ainda bagagem nem de vida, nem teórica, nem acadêmica, nem nada de formação. Sempre tive uma vontade muito grande de participar. Essa foi a única participação fora do movimento estudantil.

Eu comecei no movimento estudantil no final da década de 1980, no ano de 1989, o ano que eu entrei na universidade, mas a minha atuação maior foi durante a década de 1990, na minha graduação. Eu não atuei no movimento secundarista, eu não tive oportunidade, mas quando eu entrei na universidade eu tinha muita vontade porque os professores falavam muito que a gente tinha que ter grupos de estudos de política. E eu tive muita vontade de ter uma participação, sempre tive, mas nunca me organizei para formar um coletivo antes do movimento estudantil.

Quando eu entrei na universidade eu fiquei muito decepcionada no começo, porque eu entrei no curso de Ciências da Computação da USP e não gostei do curso, eu não gostei de nada, não gostei da USP, não gostei de coisa nenhuma [e] achei que não era aquilo, achei que a universidade seria um lugar que as pessoas iriam se abrir para o mundo, que você ia discutir um monte de coisa. Eu cheguei lá e parecia o Ensino Médio, mais difícil, certo? Eram as aulas, os trabalhos, os espaços e você não tinha nenhum espaço institucional pra se discutir carreira, nenhum espaço institucional pra discutir a sociedade, você estava se formando para quê? Eu sentia uma deficiência muito grande nisso, era um objetivo que eu tinha quando eu entrei. Eu entrei e fui ser monitora de um cursinho popular, desde aquela época o cursinho do CAASO era muito forte, fui ser monitora de literatura lá no cursinho.

E um dia eu estava formando uma chapa para o CAASO, no final de 1989, em setembro de 1989, que era o Centro Acadêmico da USP, Centro Acadêmico Armando Salles de Oliveira, e comecei a participar das reuniões e gostar, eu não entrei

oficialmente na chapa, mas a gente funcionava como um grande coletivo, então tinha o pessoal que ficou somente na chapa e o pessoal que ficou no apoio, trabalhávamos com um coletivo maior que a diretoria, ganhamos a diretoria e eu me envolvi no movimento estudantil a partir do CAASO, no final de 1989, a gestão foi de 1990 a 1991.

Eu comecei a participar da vida política universitária, na verdade na participação de uma mobilização, e minha atuação foi aumentando no movimento estudantil. Foi uma década muito difícil para as universidades e para o movimento estudantil, que a gente vivia e viveu a eleição do Lula e do Collor, o Collor ganhou e teve um desmonte muito grande no nosso país, não foi só nas universidades, mas de tudo e foi uma crise muito forte.

A universidade tinha uma deficiência muito grande na permanência dos estudantes. A USP nunca foi uma universidade que tivesse essa preocupação, que tivesse isso como fator principal, tanto que a evasão é muito alta até hoje no campus de São Carlos, que é essencialmente de Exatas. E você tinha uma dificuldade no ponto de vista estrutural de se manter no curso, os conteúdos também eram ponto de discussão no movimento.

Eu me envolvi nessa época no movimento e nossa grande atuação externa foi o Fora Collor. São Carlos teve uma atuação muito forte no Fora Collor, foi a maior passeata que eu já vi, nunca foi feita uma passeata maior do que a de 1992, [que] era uma passeata com quilômetros de distância, você via gente saindo lá do começo e foi a maior passeata que eu já vi aqui. Eu não sei se as Diretas teve essa mobilização aqui, mas o Fora Collor teve uma participação muito grande, se encontravam várias caminhadas juntas, essa atuação foi muito forte e isso foi no ano de 1992, nós não éramos mais CAASO e fui diretora do DCE da USP – Alexandre Vannucchi Leme, fui diretora oficialmente na gestão 1992/1993, chamava-se gestão “É preciso ousar”.

Foi uma composição de estudantes de vários cursos da USP, nessa gestão a gente teve, depois teve uma gestão no CAASO, que foi uma [chamada] “Abertura”, e ganhou o Gomes, que foi presidente, nós éramos apoio do Gomes, mas atuávamos mesmo no DCE e as coisas eram mais amplas. Dentro dessa atuação a gente teve momentos de muito embate dentro do movimento estudantil ligados à questão da permanência estudantil, estrutural principalmente, uma falta de vagas muito grande de moradias para os estudantes. Teve uma ocupação em 1993, entre 1992 e 1993 em um bloco da USP, era um bloco de salas de aulas, o bloco C e virou moradia por seis meses, até se ter o compromisso realmente de ampliar o número de vagas, o que

acabou acontecendo. Nesse período tivemos duas ocupações do bandejão, um do bandejão de São Carlos e a outra de bandejão da USP-SP, participamos em São Paulo por conta da questão do subsídio.

Foi um momento a década de 1990 para as universidades e pra quem estudava nessa época, foi um período muito difícil, [pois] o país passava por um momento um pouco complicado.

Eu me formei em 1995, ingressei em 1989 na Computação, fiz dois anos de Ciência da Computação. Quando cheguei ao final de 1990 eu prestei vestibular porque eu não queria continuar esse curso, eu decidi que realmente não era isso e prestei Engenharia de Produção. Fiz Engenharia de Produção e me formei em 1995, eu fiz 1991, 92, 93, 94 e 95 e me formei, na verdade eu fiquei sete anos na USP e praticamente todo esse tempo no movimento estudantil. Em alguns momentos com maior envolvimento e [em] outros momentos em que eu estava quase me formando, com menor envolvimento porque tinha outras prioridades.

Foi um pouco isso eu acho a campanha mais forte que o DCE fez quando eu estava na direção, foram as “Diretas para Reitor” e a USP até hoje é uma instituição extremamente conservadora, centralizada e não democrática. Nós vemos uma diferença extremamente grande entre as Universidades Federais e as Universidades Estaduais no Estado de São Paulo. É lamentável até hoje isso ainda ser uma briga, o governador escolhia o Reitor, a consulta, acho que a última versão, agora se teve uma consulta para Reitor, pois não existia nem consulta à comunidade e a comunidade não optava, foi muito difícil, foram reitorias extremamente conservadoras.

Com a indicação, não tem voto paritário. Até hoje a indicação é feita, ainda tem a lista tríplice e as consultas extremamente complicadas, a nossa grande bandeira era “Diretas para Reitor”. Fizemos uma ocupação no colégio, no colegiado da USP, fizemos uma ocupação da reitoria da USP na direção do DCE, muito em função dessa discussão das “Diretas para Reitor”, [pois] passávamos uma dificuldade muito grande de ter direito de opinar sobre essas coisas, tinha um colégio de, sei lá, de cinquenta, sessenta professores, a gente tinha meia dúzia de funcionários e dois estudantes. E o que esses dois estudantes vão conseguir opinar num colegiado como esse, então, extremamente complicado, nossa luta foi muito por essa questão da permanência, tinha um debate muito grande sobre isso e também a relação de democratização das instituições, da instituição. Na verdade, era extremamente complicado, muito complicado a USP sempre tradicional, infelizmente ainda hoje é uma instituição que eu

não acho democrática, muito centralizada e [de] relações extremamente antidemocráticas. Eu fui também delegada para o Congresso da UNE, participei de um dos Congressos da UNE como delegada por São Carlos.

Outra campanha muito forte foi contra o jubilamento, [porque] a USP não tinha jubilamento [e] ele foi implementado na década de 1990. O jubilamento, o desligamento dos estudantes, foi praticado de forma mais contundente nessa década. Quando aconteceu essa mudança teve uma resistência muito forte dos alunos e nós fizemos uma matrícula paralela, nós detonamos a matrícula da USP, foi um problema porque toda a matrícula foi feita paralela [e] ninguém fez a matrícula oficial. Nós fizemos a matrícula como era antes, eles fizeram várias mudanças e eles tiveram muita dificuldade, foi um trabalho para os técnicos, coitados! Eles nem tinham culpa da situação [mas], no fim das contas, assim fez com que a USP tivesse que dialogar com os estudantes sobre isso porque eles decidiram uma coisa da vida dos estudantes sem ter participação nenhuma de discussão sobre a questão do jubilamento, eles aplicaram regras mais difíceis para o jubilamento. Fizemos uma campanha muito forte em São Carlos, foram quase 100% de matrículas paralelas, acho que foi 92% de matrículas paralelas, foi uma decisão massiva dos estudantes, isso é um pouco da história geral.