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2.5 RELAÇÕES INTERPESSOAIS E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

2.5.2 Vygotsky e a aprendizagem

Neste item serão abordados alguns conceitos centrais na obra de Vygotsky, além de alguns aportes provenientes de suas teorias sócio-históricas para as concepções de ser humano. Vygotsky trata de vários aspectos da aprendizagem, abordando conceitos como zona de desenvolvimento proximal e a cultura como mediadora de processos intra e interpessoais.

Para este autor, a zona de desenvolvimento proximal de uma pessoa representa as potencialidades de aprendizagem ainda não concretizadas dela em um determinado momento. Essas potencialidades começam a se formar quando um indivíduo tem que tomar parte de ações (sozinho ou em conjunto) para as quais ainda não tem competência (COLE; WERTSCH, 1996, pp. 4-5).

Outra construção teórica importante de Vygotsky é a da cultura como mediadora das ações e pensamentos humanos. Para ele, a cultura age na construção da personalidade, desde a infância, através de seus artefatos, isto é, as construções humanas, materiais ou não, através das quais o ser humano pensa e expressa suas idéias. Esses artefatos podem ser da forma de sistemas de contagem, símbolos algébricos, obras de arte, linguagem escrita, diagramas, mapas, desenhos, símbolos e instrumentos de uso cotidiano em geral (VYGOTSKY; BERLINER, 1999, p. 137).

Para Oliveira (1992, p. 76), Vygotsky tinha uma perspectiva de estudo monista, ou seja, ele não analisava as idéias concretas ou abstratas em termos de dicotomias. Outra característica desse estudioso é a sua visão holística sobre o ser humano, no sentido de olhá-lo como um ser inteiro, incompartimentalizável em dimensões afetivas e cognitivas:

A análise em unidades indica o caminho para a solução desses problemas de importância vital. Demonstra a existência de um sistema dinâmico de significados em que o afetivo e o intelectual se unem. Mostra que cada idéia contém uma atitude efetiva transmutada com relação ao fragmento de realidade ao qual se refere. Permite-nos ainda seguir a trajetória que vai das necessidades e impulsos de uma pessoa até a direção específica tomada por seus pensamentos, e o caminho inverso, a partir de seus pensamentos até o seu comportamento e a sua atividade (VYGOTSKY, 1989, pp. 6-7).

Percebe-se então, no raciocínio anteriormente, a influência do pensamento dialético, em que dimensões cognitivas e biológicas do sujeito influenciam e são influenciadas pelas dimensões afetivas. Essas relações de influências mútuas são articuladas pela consciência, conceituada por Vygotsky como um conjunto de instâncias sociais internalizadas (WERTSCH, 1990, pp. 195-196).

Essa instância possibilita que o indivíduo substitua as suas formas instintivas de manifestação em função dos artefatos encontrados na cultura em que vive, na medida em que esses artefatos substituem de forma satisfatória comportamentos instintivos e a utilização de outros artefatos utilizados anteriormente. Segundo Vygotsky (1984, p. 65), esse processo se constitui num “salto qualitativo da psicologia animal para a psicologia humana”, além de possibilitar o entendimento de como as estruturas mentais se modificam de acordo com a época e a cultura que as envolvem. Isso quer dizer que, na medida em que o ser humano foi desenvolvendo a linguagem verbal e os instrumentos, foi-se abandonando a oralidade e expressões corporais típicas animais, e se desenvolveram formas de pensamento de acordo com os artefatos conhecidos pelas pessoas.

Pode-se compreender, através dessa concepção de estruturas mentais, como as culturas de área, os relacionamentos que se tem na infância e ao longo da vida e o contexto sócio-histórico e cultural em que as pessoas vivem influenciam nas formas de pensar e se expressar delas. Por exemplo, se pensarmos em termos de culturas de áreas dentro das universidades, os artefatos aprendidos na área de matemática, podem levar as pessoas a pensarem em termos mais universais e descontextualizados, pela própria natureza dos conhecimentos da área de matemática pura, principalmente. Os artefatos provenientes das áreas mais tecnológicas podem influenciar as pessoas vinculadas a essas áreas a pensarem mais em termos de uma racionalidade instrumental, de avaliar as construções humanas e culturais em termos de sua utilidade. Os artefatos provenientes das áreas

de humanas, por exemplo, os originados na filosofia e nas artes, podem em contrapartida influenciar na compreensão dos fênomenos em termos de critérios éticos e estéticos, entre outros.

Segundo Davis e Hersh (1989, pp. 362-363), boa parte dos matemáticos (95%) acredita que a matemática é uma linguagem com que se constróem teorias. É interessante notar que na aquisição de qualquer linguagem, assim como no ato de acostumar-se com sua utilização, há componentes afetivos envolvidos. Não deixa de ocorrer esse processo na aprendizagem da matemática, como linguagem.

Um exemplo disso é a dificuldade dos próprios estudantes de matemática para provarem teoremas em linguagem rigorosamente matemática, dificuldade essa, encontrada até mesmo em estudantes finalistas do curso, que pode ser explicada pela falta de sentido em termos cotidianos e afetivos em relação ao objeto em questão.

De acordo com a perspectiva monista de vygotsky, pode-se perceber a integração intrínseca entre o desenvolvimento afetivo e o cognitivo, isto é, a separação entre esses aspectos que aparece nos autores ocidentais da área pode ser considerada uma divisão artificial, talvez por intenções didáticas. Nesse caso pode-se promover um processo de ensino-aprendizagem significativo através de situações em que o aluno se sinta motivado a aprender determinado conteúdo, tanto pela utilidade quanto pelo prazer em aprendê-lo (ALVES, 2002, pp. 32 e 74), para que ele suporte as dificuldades que aparecerem na aprendizagem.

É importante também criar situações de convívio social que favoreçam a interação entre as pessoas para que ocorram oportunidades de aprendizagem proporcionadas pelas experiências com pessoas de diferentes competências de acordo com suas histórias de vida.

Alves (2004) descreve os efeitos da afetividade de uma figura docente carismática (dona Clotilde) que evoca sentimentos positivos nos alunos ao entrarem em contato com os conteúdos a posteriori. Ele chama este processo de metonímia, quando se associa determinado conteúdo, lembrança ou objeto a uma determinada pessoa de quem se gosta.

Esse carisma é descrito por Freire (1996, p. 144) como uma capacidade de “querer bem aos educandos”, que leva a ações como escutar e ajudar alunos com problemas pessoais, com empatia, mesmo que dê mais prazer ao professor continuar em suas elucubrações teóricas. Estas não devem, nessa concepção, ser utilizadas para dar mostras de poder pelo saber conteudista por parte do professor.

No caso, o docente é influenciado em sua prática em sala de aula por vários fatores como: comportamento observado em antigos professores, concepções sobre educação, concepções sobre o conteúdo a ser ministrado, entre outros. O item seguinte refere-se à influência das concepções sobre educação e sobre o conteúdo a ser ministrado nas práticas docentes.