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I. UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA UC’s:

4 ÁREAS PROTEGIDAS E GESTÃO TERRITORIAL

4.1 ZONEAMENTO AMBIENTAL.

No âmbito das políticas públicas para o desenvolvimento da Amazônia efetivadas no decorrer do século XX, o uso do solo foi um fator determinante na implementação e consolidação da presença do Estado na Região. Inicialmente foi a questão do domínio das terras públicas rurais, que foram então distribuídas entre os entes da federação, União federal e Estados Federados, cada um destes administrando seus domínios territoriais, de acordo com suas competências constitucionais através de suas autarquias83.

Posteriormente, a gestão das terras84 e seus usos na Amazônia passam a ser visto como uma questão ambiental, considerando a rápida redução das áreas de florestas nativas que era em parte incentivada pela própria legislação agrária e fiscal do Brasil, visto que esta exigia o beneficiamento de parte da área total do imóvel rural como condição mínima para o requerimento de titulação ou regularização fundiária.

O beneficiamento significava a conversão de área florestal em área de uso alternativo do solo, atividade que nem sempre resultava em produtividade do imóvel rural, e que paulatinamente foi se mostrando como uma forma de uso descontrolada na Região, tornando- se inadequada e incompatível com os propósitos da legislação ambiental.

Dessa forma, pode-se verificar no quadro abaixo o crescente aumento do índice de desmatamento no estado do Pará ainda na primeira década deste milênio, registrado pelo sistema de observação da Região, através do Projeto Prodes – Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira, executado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE,

83 INCRA – Instituto de Colonização e Reforma Agrária, autarquia federal e ITERPA – Instituto de Terras do

Pará, autarquia estadual.

órgão vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia. O INPE desde 1988 vem produzindo as taxas anuais de desflorestamento da Amazônia Legal. A partir do ano de 2002, estas estimativas estão sendo produzidas por classificação digital de imagens seguindo a Metodologia Prodes, que apresenta como principal vantagem neste procedimento a precisão

do geo-referenciamento dos polígonos de desflorestamento, de forma a produzir um banco de dados geográfico multitemporal. Essa metodologia busca resultados a partir dos incrementos de desflorestamento identificados em cada imagem, sendo as taxas anualizadas estimadas para a data de 1º de agosto do ano de referência.

Quadro: 2

Registro do processo de desmatamento no Pará.

Taxas de desmatamento registradas anualmente no estado do Pará

Ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Km2 6.571 5.237 7.510 7.145 8.874 5.899 5.659 5.526 5.607 4.281 3.770 3.008 1.741

(Fonte: Dados do PRODES/INPE, acessado em 14.06.2013, destaque inserido).

O crescente aumento da conversão de área de floresta em área desmatada na Região que atinge seu ponto alto no ano de 2004, com uma área de 8.874 Km2, fez com que o Governo Federal brasileiro, em conjunto com os governos estaduais da Amazônia Legal, passasse a agir incisivamente de forma a propor alternativas que pudessem mudar o quadro.

Nesse contexto, o Governo Federal já havia tomado uma medida jurídica desde 1996, para evitar grandes avanços na derrubada da floresta na Região, alterando o Código Florestal através da Medida Provisória Nº 1.511, de 25 de julho de 1996, aumentando o percentual de Reserva Legal85 de 50% para 80%, conforme a alteração do percentual para a reserva legal

85 Reserva Legal, instituto de caráter perpétuo de proteção legal para áreas de florestas nativas, previsto no

Código Florestal, de 1965, atualmente este instituto está definido nos artigos 12 e seguintes da Lei Federal Nº 12.651, de 25 de maio de 2012, que instituiu o Novo Código Florestal para o Brasil como: “Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízos da aplicação das normas sobre Áreas de Preservação Permanente observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei: I - localizado na Amazônia Legal: a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas; b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado; c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais; II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).(...) § 2o O percentual de Reserva Legal em imóvel situado em área de

formações florestais, de cerrado ou de campos gerais na Amazônia Legal será definido considerando separadamente os índices contidos nas alíneas a, b e c do inciso I do caput. (...) § 4o Nos casos da alínea a do

inciso I, o poder público poderá reduzir a Reserva Legal para até 50% (cinquenta por cento), para fins de recomposição, quando o Município tiver mais de 50% (cinquenta por cento) da área ocupada por unidades de conservação da natureza de domínio público e por terras indígenas homologadas. (...) § 5o Nos casos da alínea a

do inciso I, o poder público estadual, ouvido o Conselho Estadual de Meio Ambiente, poderá reduzir a Reserva Legal para até 50% (cinquenta por cento), quando o Estado tiver Zoneamento Ecológico-Econômico aprovado e mais de 65% (sessenta e cinco por cento) do seu território ocupado por unidades de conservação da natureza de domínio público, devidamente regularizadas, e por terras indígenas homologadas.

prevista no Código Florestal para a Região Norte brasileira, determinada da seguinte forma: “Nas propriedades, nas quais a cobertura arbórea se constitui de fitofisionomias florestais, não será admitido o corte raso em pelo menos oitenta por cento dessas tipologias florestais” (art. 1º, §2º, MP. Nº 1.511/1996).

Essa determinação jurídica foi reeditada com maior ênfase em 2001, através da Medida Provisória Nº 2.166, situação essa que levou de imediato à revisão dos pedidos de licenciamento para a exploração florestal nos estamentos competentes tanto no âmbito Federal como no Estadual, provocando assim a necessidade de uma reorganização nas emissões de licenças e autorização para o uso do solo e das florestas na Amazônia.

Fica patente na delimitação da Reserva Legal no Novo Código Florestal brasileiro de 2012, que para a efetiva gestão ambiental na Amazônia Legal é necessário o ordenamento territorial, ou seja, a organização do território é condição sine qua non para a qualidade da aplicação das políticas que consolidam a implementação da Política Ambiental.

A organização do território se dá pelo zoneamento ecológico-econômico, ou seja, o zoneamento ambiental, que é um instrumento tanto da gestão ambiental como da gestão territorial. É uma ação de política pública que envolve a organização dos espaços territoriais, urbanos ou rurais. Em sentido amplo: “ato ou efeito de zonear, que é discriminar setores ou zonas, com fins administrativos” (CUNHA, 2007, p. 280).

De acordo com o Dicionário Jurídico do Ambiente, o zoneamento ecológico-econômico foi “estabelecido com o objetivo de nortear a elaboração dos Planos nacionais e regionais de ordenamento do território e de desenvolvimento econômico e social” (CARVALHO, 1991, p. 334). Complementando o significado desta proposta, o autor também expõe a metodologia para a elaboração do zoneamento e diz que os trabalhos do zoneamento deverão obedecer:

- uma abordagem interdisciplinar que vise à integração de fatores e processos de modo a facultar a elaboração de zoneamento que leve em conta a estrutura e a dinâmica ambiental e econômica, bem como os valores histórico- evolutivos do patrimônio biológico e cultural do país; e, - uma visão sistêmica que propicie a análise de causa e efeito, permitindo estabelecer as relações de interdependência entre os subsistemas físico-biótico e socioeconômico (CARVALHO, 1991, p. 334).

O zoneamento ecológico-econômico foi inserido como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981, conforme o disposto no artigo 9º, inciso III. Trata-se de um instrumento de intervenção ambiental, conforme o que foi dito antes neste trabalho, regulamentado em 200286. O decreto regulamentador do zoneamento propôs uma unificação

86 Regulamentado pelo Decreto Federal Nº 4.297, de 10 de julho de 2002, que definiu, determinou seu objetivo e

nas diversas ações, de iniciativa tanto do Governo Federal como dos governos estaduais para utilizarem esse instrumento na gestão ambiental.

O regulamento nacional do Zoneamento Ecológico-Econômico impõe uma definição que compreende várias ações públicas para a gestão e o ordenamento territorial, o conjunto dessas determinações passa a condicionar todas as atividades públicas e privadas no ambiente rural, embora o legislador do Regulamento não tenha usado a expressão “ambiente rural”, é possível afirmar que as ações previstas são para fins de organização dos terrenos rurais.

Pois se deve considerar que para o ordenamento territorial do espaço urbano a Constituição Federal de 1988, faz essa diferença ao dispor sobre a Política de Desenvolvimento Urbano no artigo 182, e para tanto deve ser observada a legislação que a ordena, ou seja, os planos diretores municipais e leis correlatas.

Portanto, a definição disposta no regulamento para o zoneamento ecológico-econômico é a seguinte, art. 2º, in verbis:

Instrumento de organização do território a ser obrigatoriamente seguido na implantação de planos, obras e atividades públicas e privadas, estabelece medidas e padrões de proteção ambiental destinados a assegurar a qualidade ambiental, dos recursos hídricos e do solo e a conservação da biodiversidade, garantindo o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de vida da população.

O primeiro aspecto a ser considerado no enunciado é a ação de organizar o território, isto implica na identificação de áreas a partir de critérios e condições de uso, para posteriormente estabelecer o zoneamento que permite de imediato observar três situações de uso do solo, a situação de uso restrito, que se configura na zona de proteção integral; a situação de uso flexível, que se identifica como zona de uso sustentável e na terceira situação que é a zona de consolidação e expansão da atividade produtiva, incluindo aqui as áreas já alteradas87.

As determinações do zoneamento quanto ao uso do solo deve ser observado, obrigatoriamente, na implantação de planos, obras e atividades, o qual implica dizer que todas as atividades econômicas, produtivas e sociais devem estar de acordo com o que determina o zoneamento. O que vale dizer que tais determinações também conformam a própria função socioambiental da propriedade rural.

Brasil. Este regulamento foi alterado e atualizado pelo Decreto Federal Nº 6.288, de 6 de dezembro de 2007 e mais recentemente pelo Decreto Federal Nº 7.378, de 1º de dezembro de 2010, que aprova o Macro Zoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal.

87 Interpretação a partir do estabelecido no artigo 14 do regulamento, Decreto Federal Nº 4.297, de 10 de julho

O segundo aspecto a ser observado no enunciado é o que corresponde ao estabelecimento de medidas de proteção ambiental cuja meta é “assegurar a qualidade ambiental dos recursos hídricos e do solo e a conservação da biodiversidade”, para esta ação justifica a instituição de áreas protegidas seguindo a diretriz estabelecida no conceito legal de corredores ecológicos88, ou seja, consolidando uma zona que garanta o fluxo, e possa, esta zona ser constituída por várias espécies de área protegida, ou, ainda, por aqueles espaços territoriais denominados de zonas de amortecimento89, que também têm limites legais estabelecidos para seu uso.

O decreto regulamentador do zoneamento apresenta objetivos, princípios e uma metodologia para elaboração do mesmo no que se refere às metas a serem alcançadas para a organização do espaço territorial, e dispõe o seguinte no artigo 3o, in verbis:

O ZEE tem por objetivo geral organizar, de forma vinculada, as decisões dos agentes públicos e privados quanto a planos, programas, projetos e atividades que, direta ou indiretamente, utilizem recursos naturais, assegurando a plena manutenção do capital e dos serviços ambientais dos ecossistemas.

A seguir estabelece uma condição para o cumprimento do objetivo, conforme determina o Parágrafo Único, in verbis:

O ZEE, na distribuição espacial das atividades econômicas, levará em conta a importância ecológica, as limitações e as fragilidades dos ecossistemas, estabelecendo vedações, restrições e alternativas de exploração do território e determinando, quando for o caso, inclusive a relocalização de atividades incompatíveis com suas diretrizes gerais.

Quanto às diretrizes gerais estabelecidas para o zoneamento, o regulamento lista o mínimo que deve ser observado, constituindo uma matriz de conteúdo para a consolidação do zoneamento ecológico-econômico, conforme o artigo 14, in verbis:

Atividades adequadas a cada zona, de acordo com sua fragilidade ecológica, capacidade de suporte ambiental e potencialidades; - necessidades de proteção ambiental e conservação das águas, do solo, do subsolo, da fauna e flora e demais recursos naturais renováveis e não renováveis; - definição de áreas para unidades de conservação, de proteção integral e de uso sustentável; - critérios para orientar as atividades madeireiras e não madeireira, agrícola, pecuária, pesqueira e de piscicultura, de urbanização, de industrialização, de mineração e de outras opções de uso dos recursos

88 De acordo com o art. 2º, da Lei Federal Nº 9.985, 2000, corredores ecológicos são: “porções de ecossistemas

naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recolonização de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais”.

89 De acordo com o art. 2º, da Lei Federal Nº 9.985, 2000, zona de amortecimento compreende: “o entorno de

uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade”.

ambientais; - medidas destinadas a promover, de forma ordenada e integrada, o desenvolvimento ecológico e economicamente sustentável do setor rural, com o objetivo de melhorar a convivência entre a população e os recursos ambientais, inclusive com a previsão de diretrizes para implantação de infraestrutura de fomento às atividades econômicas; - medidas de controle e de ajustamento de planos de zoneamento de atividades econômicas e sociais resultantes da iniciativa dos municípios, visando a compatibilizar, no interesse da proteção ambiental, usos conflitantes em espaços municipais contíguos e a integrar iniciativas regionais amplas e não restritas às cidades; e - planos, programas e projetos dos governos federal, estadual e municipal, bem como suas respectivas fontes de recursos com vistas a viabilizar as atividades apontadas como adequadas a cada zona (destaque inserido).

Vale ressaltar que em 2010 o Governo Federal estabelece o Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal – MacroZEE da Amazônia Legal90, editado “como instrumento de orientação para a formulação e espacialização das políticas públicas de desenvolvimento, ordenamento territorial e meio ambiente, assim como para as decisões dos agentes privados”. Este documento legal propõe como meta “assegurar a sustentabilidade do desenvolvimento regional, indicando estratégias produtivas e de gestão ambiental e territorial em conformidade com a diversidade ecológica, econômica, cultural e social da Amazônia”.