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Interfaces entre o NEAPO e a educação

A educação com viés agroecológico envolve importantes aspectos, como a dialogicidade, a democratização do saber e a interdisciplinaridade.

Freire (1987) aborda a dialogicidade em seu livro intitulado “Pedagogia do oprimido”, onde o diálogo inicia com a busca do conteúdo programático e os temas geradores advêm das relações homem­mundo. A democratização do saber segundo Shiva (2003, p. 81) “transformou­se num pré­requisito para a liberação humana porque o sistema e saber contemporâneo exclui o humano por sua estrutura”. Assim como Paulo Freire, Vandana Shiva chama a atenção para a autonomia no processo da democratização do saber. Gadotti (2009) em seu livro sobre “Education for sustainability” alerta para uma educação sobre e para o desenvolvimento sustentável, na primeira corresponde sobe a aquisição da discussão teórica e informação e na segunda, como usar a educação de modo a construir um futuro sustentável. A interdisciplinaridade como é tratada a Agroecologia como ciência, também se estende à prática pedagógica. É preciso religar os conhecimentos que estão fragmentados como proposto por Morin (1999), pois os problemas são multidimensionais, e se mantivermos as separações reduzimos as nossas possibilidades de lidarmos com eles.

As interfaces entre o Neapo e a educação tem se dado dentro de um olhar contínuo, compreendendo que a educação, no caso em agroeocologia, pode ser oportunizada da escola até a pós­graduação. A agroecologia como processo pedagógico se caracteriza como interdisciplinar, portanto pode ser vivenciada no ambiente escolar como tema transversal, ou seja, nas diferentes disciplinas no processo de aprender/ensinar/aprender. Na graduação e pós­

graduação em cursos de ciências agrárias e interdisciplinares também podem ser construídos processos de ensino­aprendizagem em agroecologia, e ampliando o diálogo com a pesquisa e a extensão. A agroecologia na educação também pode dialogar com a educação em direitos humanos (EDH) nesse contínuo, pois também se respalda em valores humanitários. Segundo Brasil (2013, p. 13),

...a EDH intervém por meio de uma mediação pedagógica­pacificadora, restabelecendo valores e a segurança necessários para um ambiente educacional saudável, no qual a justiça, a igualdade, o respeito, a solidariedade e a consideração entre as pessoas prevalecem.

Em Rorainópolis, nas áreas de assentamento rural, as escolas do campo atendem e educam às crianças das famílias rurais, as quais convivem em um ambiente escolar e comunitário marcados por aspectos culturais, sociais e econômicos em torno da(s) agricultura(s). Esse ambiente é extremamente acolhedor para a vivência em agroecologia como prática pedagógica, no sentido de resgatar os conhecimentos tradicionais, conhecer a diversidade sociocultural e ambiental e aprender/ensinar/aprender na prática, como horta escolar, conteúdos de biologia, matemática, história e outros de modo a praticar a transversalidade do aprender de uma forma lúdica e criativa.

O NEAPO tem desenvolvido um projeto “Agroecologia como tema transversal no ensino­aprendizagem em escola do campo em Rorainópolis”, na Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental João Rodrigues de Souza. O projeto tem atuado na construção de práticas pedagógicas em agroecologia com a comunidade escolar da escola do campo. Assim, atividades de ensino­aprendizagem de forma lúdica sobre o tema biodiversidade, solo, horta, ecologia e outros afins foram realizadas na escola.

Essas atividades também dialogaram com os pais e parentes das crianças, valorizando os saberes dos seus familiares e contextualizando com a realidade da escola e da comunidade. Tais atividades foram complementadas com eventos e oficinas (Figura 1). Os passos, mesmo que pequenos, envolvendo a educação, são essenciais nesse caminhar para a construção de uma sociedade mais justa.

Figura 1. Oficina de aproveitamento de pneus na Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental João Rodrigues de Souza, Rorainópolis, julho de 2019. A. Os pneus ilustrados juntamente com as crianças da escola. B. Espaço externo da escola com o pomar recém implantado com frutíferas, atividade de pintura das estacas próximas às mudas. (Fotos: BARROSO, C., 2019)

Na graduação, os (as) estudantes interagem através das disciplinas cursadas dentro da temática, por meio de visitas, estudos e elaboração de

relatórios, no desenvolvimento de pesquisas e também na aproximação com o agricultor, proporcionando experiências que alguns acadêmicos ainda não tinham. Esse diálogo se dá através de visitas às propriedades locais, participação em mutirões e estudos dirigidos relacionados às temáticas do núcleo. Assim, os estudantes desde o início em disciplina como a de Introdução à Agronomia podem se aproximar das atividades do núcleo e iniciarem a construção teórica e prática da Agroecologia. A exemplo, podemos citar a atividade de construção de uma horta em espiral de plantas medicinais feita pela turma de 2019, na qual foram reaproveitadas garrafas pet, mudas de seus próprios quintais, plantas medicinais, e composto orgânico produzido pelo pai de um deles, o qual é um dos integrantes do Sul Orgânico.

O curso de Agronomia tem em sua matriz curricular a disciplina de Agroecologia, na qual o (a) estudante ao cursar já possui experiências prévias construídas ao longo de sua trajetória pessoal e familiar, na comunidade e na academia. Essas experiências, vivências e reflexões são sistematizadas na disciplina. Essa disciplina no curso de Agronomia tem favorecido um diálogo interdisciplinar, baseados em três trinômios, homem­terra­natureza, agricultar­

preservar­viver e sensibilizar­cooperar­agir (CASTRO, 2015).

Figura 2. Participação dos mestrandos da disciplina de Sistemas Agroecológicos, Mestrado em Agroecologia, no mutirão do Sul Orgânico, 21 de junho de 2019 em Rorainópolis. A. Atividade na implantação do pomar. B. Caminhada na horta e prática de levantamento de artrópodes do solo. (Fonte: BARROSO, C., 2019).

O NEAPO também tem atuado alinhado ao programa de mestrado em Agroecologia da instituição em associação com a Embrapa­RR e IFRR. Nas disciplinas em que docentes do núcleo participam tem­se oportunizado trocas de experiências e vivências entre os mestrandos e os agricultores (as) e graduandos (as) de Rorainópolis, tanto na construção teórica, como também científica e prática. Uma turma de 2019 teve uma vivência de mutirão em processos de agricultura em transição agroecológica em uma das propriedades

do Sul Orgânico (Figura 2). Após a visita, foram ao campus conhecer os trabalhos científicos dentro do NEAPO em desenvolvimento no laboratório de Biologia Aplicada. Os (as) mestrandos (as) avaliaram, através de relatório, como uma vivência transformadora em suas formações. Essa atividade oportunizou uma interação entre os (as) agricultores (as) e a pós­graduação em uma ação comum, com muita troca de conhecimento e alegria.