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A competência do município para legislar sobre meio ambiente

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Academic year: 2017

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ARTHUR ANTONIO TAVARES MOREIRA BARBOSA

A COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA

LEGISLAR SOBRE MEIO AMBIENTE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

ORIENTADORA:PROFESSORA ASSOCIADA ANA MARIA DE OLIVEIRA NUSDEO

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE DIREITO

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ARTHUR ANTONIO TAVARES MOREIRA BARBOSA

A COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA

LEGISLAR SOBRE MEIO AMBIENTE

Dissertação apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo como requisito para a obtenção do Título de Mestre, sob orientação da Professora Associada Ana Maria de Oliveira Nusdeo.

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE DIREITO

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Banca Examinadora

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AGRADECIMENTOS

À Professora Ana Maria de Oliveira Nusdeo, pela valorosa orientação, que em muito contribuiu para o desenvolvimento desta dissertação, assim como pelo exemplo de pessoa, dentro e fora das salas de aula, que em muito serviu de inspiração para meu aprimoramento pessoal, acadêmico e profissional.

Aos Professores Gilberto Passos de Freitas e Fernando Dias Menezes de Almeida, pelas iluminadas sugestões e considerações que enriqueceram este trabalho.

Aos Drs. Gilberto Leme Marcos Garcia e José Eduardo Ismael Lutti, que, no dia a dia da Promotoria do Meio Ambiente, muito me ensinaram, incentivando decisivamente minha dedicação à tutela ambiental.

Aos meus pais, Severino Antonio Moreira Barbosa e Katia Tavares da Silva, que desde cedo me ensinaram a importância da busca do conhecimento.

À Nathalia Lima Feitosa Lopes, pelo carinho demonstrado diariamente em todos esses anos.

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RESUMO

O presente trabalho visa à realização de um estudo sobre a possibilidade de os Municípios editarem leis aumentando a proteção ambiental em seu território, assim como os eventuais limites de referida atuação. Este estudo inicia-se com a análise da repartição de competências, notadamente sobre os poderes atribuídos aos Municípios pela Constituição Federal de 1988. O ente municipal recebeu deveres e competências mais abrangentes e, por estar mais próximo dos interesses dos cidadãos, precisa utilizar-se dessas competências para cumprir os deveres que lhe são impostos, especialmente no artigo 225 da Carta Magna. A edição de leis ambientalmente mais protetivas pelos Municípios acabou por ser questionada no Poder Judiciário, em razão da alegada falta de competência deste ente para a edição das referidas leis. Assim, multiplicaram-se nos últimos anos as Ações Diretas de Inconstitucionalidade contra a edição das leis municipais que buscavam proteger o meio ambiente local. Neste trabalho serão analisados alguns casos que afetam mais diretamente a população e que têm gerado debates mais profundos na doutrina e jurisprudência, especialmente no Tribunal de Justiça de São Paulo e no Supremo Tribunal Federal. Ao final, a partir da análise de cada caso concreto tratado, em diálogo com o refencial teórico, poder-se-á verificar as possibilidades da atuação do Município na edição de referidas leis ambientais, assim como os limites desta atuação frente à existência da legislação estadual e nacional.

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ABSTRACT

This paper is intended to conduct a study on the possibility of local government authorities to edit laws aiming to increase environmental protection within their relevant territories, as well as to rule any limits to such extent. The present study begins with the analysis of the allocation of competent jurisdiction, notably with respect to the powers granted to Municipalities pursuant to the Brazilian Federal Constitution of 1988. The local government authority was bestowed more comprehensive duties and jurisdiction and, precisely for the fact that it is closer to citizens’ interest, it must avail itself from such jurisdiction so as to fulfill the duties imposed upon it, particularly those under Section 225 of the Brazilian Federal Constitution. The enactment of more protective environmental laws by Municipalities was challenged in courts on the grounds of alleged lack of jurisdiction on the part of Municipalities for purposes of the enactment of such laws. Hence, for the past years several suits challenging the enactment of municipal laws on local environment protection were filed. This paper addresses some of the cases that most directly affect population and which have given rise to heated debate on legal books of authority and case law, particularly in the Court of Appeals of the State of São Paulo and the Federal Supreme Court. As a final point, from the analysis of each case addressed herein, one shall be able to infer to which extent a certain Municipality is entitled to interfere in the enactment of these environmental laws, as well as the limits of the interference thereon vis-à-vis Brazilian state and federal legislation.

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SUMÁRIO

Introdução...10

Capítulo 1 – A adoção do modelo federativo e a repartição de competência na Constituição Federal de 1988 1.1. Da organização do Estado...14

1.2 Breve histórico do federalismo...19

1.3 A Federação brasileira...20

1.4 O conceito de competência no direito pátrio...22

1.5 Classificação das competências...23

1.5.1 Competência administrativa...23

1.5.1.1 Competência administrativa exclusiva...24

1.5.1.2 Competência administrativa comum...24

1.5.2 Competência legislativa...25

1.5.2.1 Competência exclusiva e privativa...26

1.5.2.2 Competência concorrente e suplementar...26

1.5.2.3 Competência supletiva (plena)...28

1.6 As competências implícitas...29

Capítulo 2 – A competência ambiental na Constituição e sua repartição em matéria legislativa 2.1 O meio ambiente na Constituição Federal de 1988...31

2.2 Princípios norteadores da competência ambiental...37

2.2.1 O princípio da predominância do interesse...37

2.2.2 O princípio da subsidiariedade e o direito comparado...38

2.3 Repartição da competência legislativa ambiental...45

2.3.1 O papel da União na competência ambiental...45

2.3.2 O papel dos Estados na competência ambiental...48

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3.2 A competência material do Município...56

3.3 A competência legislativa do Município...60

3.3.1 O interesse local...61

3.3.2 A suplementação de lei federal...66

3.4 Os limites materiais da legislação ambiental dos Municípios....70

3.5 O controle de constitucionalidade das leis municipais e as espécies de inconstitucionalidades...77

Capítulo 4 – Casos representativos da discussão 4.1 A proibição da queima da palha da cana de açúcar...83

4.2 A proibição do uso das sacolas plásticas...95

4.3 A proibição da utilização do amianto crisotila...107

4.4 Lei da Cidade Limpa...115

4.5 Restrição ao consumo do tabaco...119

4.6 Taxa de Preservação Ambiental em cidade litorânea...123

4.7 A proibição da extração de minérios...127

4.8 Legislação baseada no princípio da precaução...130

4.8.1Restrição aos organismos geneticamente modificados.132 4.8.2 Poluição eletromagnética...137

Conclusão...149

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INTRODUÇÃO

Historicamente, os seres humanos puderam atender às suas necessidades com uma grande quantidade de recursos naturais. A natureza sempre foi vista como ilimitada à espécie humana, pois havia vasta disponibilidade dos bens ambientais à disposição do homem. Como o modo de vida não era significativamente predatório, era comum certo otimismo sobre a possibilidade de se explorar infinitamente os recursos ambientais. Sob tal visão, o filósofo Francis Bacon pregava, no início da ciência moderna, o domínio total da natureza pelo homem, numa relação de servo-senhor1.

Com o advento da revolução industrial, todavia, os meios de produção capitalista ampliaram-se exponencialmente, assim como as necessidades de consumo da população. Além disso, o índice demográfico crescia vertiginosamente, ao mesmo tempo em que se assentava a sociedade industrial e urbana2.

Tais fatores conjugados trouxeram graves problemas ambientais, muito dos quais foram aos poucos sendo percebidos pelos sinais de esgotamento dos recursos naturais. A limitação física dos bens do planeta, que jamais havia sido cogitada por outras sociedades, passou a ser uma das maiores preocupações do homem na transição do século XX para o XXI. Foi percebido que, se nada fosse feito, a própria sobrevivência da civilização tal qual se conhece estaria ameaçada.

Como muito bem observou Alaôr Caffé Alves, “o sistema, muitas vezes, não tem uma dimensão criteriosa e crítica, por ser calcado na perspectiva de uma lógica acumulativa do sistema capitalista, de reprodução acumulativa, sem levar em conta a totalidade do sistema vital e universal do homem.”3

Somente com essa mudança de paradigma global é que foi necessário o surgimento do hoje chamado ‘direito ambiental’. Ele nasceu do conjunto de princípios e regras jurídicas que passaram a disciplinar a preservação e a racional

1 MORA, J. Ferrater.

Dicionário de Filosofia. São Paulo: Loyola. 1994, p. 765.

2 CORTEZ, Ana Tereza C.; ORTIGOZA, Silvia Aparecida G. (Org.). Da produção ao consumo - impactos

socioambientais no espaço urbano. São Paulo: Editora UNESP. 2009, p. 92.

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utilização dos recursos ambientais. Seu crescimento também se deu em função de casos de degradação ambiental de grandes proporções que passaram a ficar conhecidos, os quais influenciaram na formação de ordenamentos jurídicos específicos nas nações.4 Assim, tal ramo do Direito busca assegurar não só a manutenção dos recursos ambientais, mas principalmente a continuidade da sadia qualidade de vida humana, tanto às presentes como às futuras gerações.

Tal ideal somente poderá ser alcançado se forem implementados os ideais de desenvolvimento sustentável, que fora definido pelo ‘Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento: Nosso Futuro Comum’5, conhecido por “Relatório Brundtland”, como sendo o desenvolvimento que satisfaz as necessidades das presentes gerações sem comprometer as das sociedades do porvir.

Ocorre que o quadro de devastação ecológica que se vivencia nas últimas décadas é extremamente vasto: como o aquecimento global, as espécies ameaçadas de extinção, as diversas formas de poluição urbana (visual, sonora, dos solos, das águas, do ar), entre outros.

Diante disso, inúmeras são as formas possíveis de contenção da degradação ambiental e promoção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. No plano internacional, têm sido elaborados inúmeros acordos, tratados, convenções, pactos, entre outros instrumentos político-jurídicos, que visam à melhoria da qualidade ambiental. No plano interno, também se podem verificar as mais diversas alternativas em prol do ambiente, seja pelos entes públicos, seja pela iniciativa privada e também pelo terceiro setor.

Dentre essas inúmeras tentativas de ações em prol do meio ambiente, a presente dissertação se limitará ao estudo das legislações municipais que visam a garantir maior proteção ao meio ambiente local e à saúde da população envolvida.

Antes de analisá-las especificamente, será demonstrado que há certo questionamento acerca da viabilidade jurídico-formal de referidas leis, sob o argumento de que a Constituição Federal de 1988 não outorgou competência legislativa ao Município para tratar do meio ambiente.

4 SAMPAIO, Rômulo Silveira da Rocha. Direito ambiental – doutrina e casos práticos. Rio de Janeiro: Elsevier Editora. 2012, p. 39.

5 Annex to document A/42/417.

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Nesse contexto, a presente dissertação inicialmente trará breves considerações acerca do Federalismo adotado na última Carta Magna, para em seguida analisar como foi estabelecida a repartição da competência constitucional, notadamente sobre as disposições relacionadas ao meio ambiente.

Firmada essa base teórica, passar-se-á a verificar o papel da União e dos Estados na competência legislativa ambiental. A partir da delimitação das competências dos entes superiores, será possível depreender mais claramente a possibilidade dos Municípios editarem leis mais protetivas ao meio ambiente local.

Sob essa perspectiva, será feito um cotejo entre os princípios que norteiam a repartição de competências constitucionais, quais sejam, o princípio da predominância do interesse e o princípio da subsidiariedade. Ambos devem ser considerados em conjunto para se chegar a uma conclusão a respeito da possibilidade dos entes públicos atuarem com mais eficácia para solucionar as demandas ambientais da sociedade6.

Visando melhor sistematizar a questão, será feita uma análise constitucional da competência municipal, notadamente da possibilidade do ente local legislar suplementarmente para restringir atividades e práticas potencialmente causadoras de danos ambientais que não estejam proibidas pela União ou pelos Estados, com vistas ao atendimento do interesse local.

Para tanto, imperioso será o estudo do papel do Município como ente da Federação, status que só foi por ele obtido na última Constituição Federal. Desde então,

os ideais de maior autonomia ao ente municipal têm crescido exponencialmente na doutrina, buscando-se romper com a tradição centralizadora dominante no País.

Todo esse fortalecimento do Município na Federação refletiu-se no alargamento de suas competências, de modo que a repartição constitucional conferiu-lhe a tarefa de legislar privativamente sobre os “assuntos de interesse local”, assegurou-lhe a possibilidade de suplementação das leis estaduais e federais, bem como lhe impôs a competência comum de proteção do meio ambiente e do combate à poluição7.

Em que pesem as inúmeras dificuldades provenientes desta opção descentralizadora, parece este ser um bom caminho para se buscar um aumento da

6 LEUZINGER, Márcia Dieguez; CUREAU, Sandra. Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Elsevier Editora, 2008, p. 43.

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efetividade na proteção ambiental. Aguarda-se, assim, que os Municípios aproveitem esta expansão de suas competências para legislarem adequadamente aos desígnios do artigo 2258 da Constituição Federal, almejando sempre a busca do meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.

E para poder exercer eficazmente tal mister, os Municípios terão, antes de mais nada, que enfrentar a resistência de parte dos membros do Poder Judiciário, os quais têm declarado a inconstitucionalidade de muitas das leis ambientais locais, sob pretexto de que faltaria competência aos Municípios para restringir atividades e produtos não proibidos pela legislação estadual e/ou federal.

Por outro lado, pode-se enxergar uma mudança dessa jurisprudência centralizadora, notadamente pela sensibilidade demonstrada por parte dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, assim como por alguns votos dos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Como será demonstrado, hoje já existem importantes precedentes a favor da competência legislativa dos entes municipais.

Assim, o presente trabalho buscará analisar a possibilidade de o Município editar leis ambientais mais protetivas e, para a melhor verificação desta competência constitucional, serão utilizados inúmeros casos concretos exemplificativos, os quais demonstram que já há grande debate a respeito do tema. Como exemplo, podem ser citadas algumas leis paradigmáticas, como a recente proibição da utilização de sacolas plásticas no comércio da cidade de São Paulo, a tentativa de vedação da queima da palha da cana-de-açúcar em inúmeras cidades do interior paulista, a Lei da Cidade Limpa, entre outros importantes precedentes.

Todos os casos concretos serão analisados individualmente, de modo que será feita uma análise acurada dos argumentos utilizados pelos Desembargadores ou Ministros para fundamentar as decisões de constitucionalidade ou inconstitucionalidade das leis municipais.

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Capítulo 1 – A ADOÇÃO DO MODELO FEDERATIVO E A

REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

DE 1988

1.1 Da organização do Estado

De acordo com o caput do artigo 1º da Constituição Federal, a

República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito, é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios.

Primeiramente, cumpre lembrar que a noção de Estado está ligada à ideia de sociedade politicamente organizada dentro de determinado espaço territorial e que tem por fim o bem estar de todos9. Este Estado pode ser classificado de diferentes maneiras, principalmente quanto à forma de governo, sistema de governo, regime de governo e forma de Estado.

Forma de governo pode ser entendida não só como o modo de instituição do poder na sociedade, mas também como a relação entre governantes e governados. Atualmente, duas são as formas comumente adotadas pelos Estados: a Monarquia e a República.

A Monarquia, sinteticamente, é a forma de governo pelo qual o monarca adquire o poder de forma hereditária, passando a exercer um mandato perpétuo e vitalício. Além disso, como sua escolha comumente é justificada por razão divina, o exercício de seu poder é realizado com base na irresponsabilidade, isto é, não haveria o dever de prestar contas à sociedade ou a qualquer órgão político de suas decisões. Conforme recorda Dalmo de Abreu Dallari10, a Monarquia foi adotada “por quase todos os Estados do mundo” durante muitos séculos, mas acabou sendo gradativamente enfraquecida e abandonada pela maioria dos países.

9 DALLARI, Dalmo de Abreu.

Elementos de teoria geral do Estado. 24.ed Sã Paulo: Saraiva, 2003, p. 118.

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De forma diametralmente oposta, na República a aquisição do poder está vinculada a realizações de eleições, e, por isso, há prazo determinado para os mandatos dos governantes. No Brasil, inclusive, o voto direto, secreto, universal e periódico é cláusula pétrea, nos termos do artigo 60, §4º, inciso II, da Constituição Federal. Outra dentre as principais características desta forma de governo é a necessidade de prestação de contas pelo governante, o qual é responsável pela gestão da coisa pública e está sujeito ao sistema de controle de sua atuação, inclusive sendo permitido o impeachment nos casos de crimes de responsabilidade (infrações

político-administrativas). Atualmente, referida previsão está expressa no artigo 85 da Constituição Federal de 1988.

Etimologicamente, República deriva da justaposição de “res” “publica”, referindo-se a coisa pública, coisa do povo, para o povo, se relacionando ao interesse público primário, isto é, aqueles interesses do Estado que são os interesses da sociedade enquanto coletividade. Apesar da República não estar expressamente no rol das cláusulas pétreas, pode-se afirmar que estaria implícita no texto constitucional, inclusive porque foi tratada como princípio constitucional sensível, nos termos do artigo 34, inciso VII, aliena “a”, da Constituição.

Como é sabido, o modelo republicano é o adotado no Brasil desde o fim da Monarquia (15 de novembro de 1889), estando presente em todas as constituições brasileiras desde 1891, inclusive sendo corroborada na Constituição Federal de 1988 e posteriormente ratificada no plebiscito realizado no ano de 1993, no qual os cidadãos deveriam escolher entre a forma de governo monárquica ou republicana.

Já no que concerne ao sistema de governo, este pode ser definido como o estudo a respeito da relação entre os Poderes Executivo e Legislativo, de modo que pode haver maior interdependência ou maior liberdade entre ambos. Destacam-se atualmente dois sistemas: o parlamentarismo e o presidencialismo.

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Governo exerce o poder executivo, possuindo relevante responsabilidade política. Diante desta dicotomia de chefias, e considerando que em alguns casos o Chefe de Estado também exerce algumas funções políticas, passou-se a denominar este Parlamentarismo de um sistema de governo dual (ou dualista), o qual é adotado normalmente nas monarquias constitucionais.

De modo diverso, no Presidencialismo, apesar da harmonia, há clara independência entre os poderes Executivo e Legislativo, de modo que em ambos os mandatos possuem prazos determinados. No mais, nesse sistema inexiste, por exemplo, possibilidade de dissolução do Legislativo pelo chefe de governo, pois há maior rigidez na relação entre os Poderes, em consonância com o princípio da separação dos poderes. Além disso, a chefia deste sistema de governo é unipessoal e escolhida diretamente pelo povo, de modo que o presidente acumula as funções de chefe de Estado e chefe de Governo, tendo exclusividade na execução de seu plano de governo. Finalmente, importante recordar que este sistema é típico dos países republicanos.

No que tange aos regimes de governo, pode-se distinguir dois regimes principais, baseados na participação do povo na tomada de decisões do Estado, seja de forma direta, seja por meio dos representantes que elegem.

Na autocracia, o povo não participa das políticas governamentais, de forma que o governante impõe sua vontade unilateralmente. Assim, pode-se dizer que há um governo estruturado de cima para baixo, pois tanto a elaboração das normas como a execução das políticas públicas serão realizadas pelo governante independentemente da vontade do povo.

De outro lado, no regime democrático há plena participação do povo nos rumos do Estado. Isso porque, sendo o titular do poder constituinte originário, o povo tem o poder de estabelecer a Constituição e todas as formas pelos quais haverá manifestação do Poder Estatal. Para a efetivação deste governo do povo, deve-se buscar atender a vontade da maioria, mas sempre com respeito aos direitos das minorias.

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governamentais, a exemplo do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular para projetos de lei. Em razão desta combinação, chega-se a uma democracia semidireta.

Já o conceito de forma de Estado relaciona-se ao modo de exercício do poder político em função do território do Estado, podendo haver ou não repartição com poderes autônomos. No Brasil, desde a proclamação da República passou a ser adotado o modelo federativo, de forma que o poder foi repartido entre os entes federados, que possuem autonomia. Assim, referida opção se deu em detrimento do Estado Unitário, no qual há extrema centralização (o qual, inclusive, foi vivenciado durante a maior parte da história do País - todo o período colonial e imperial).

O federalismo não só foi a forma de Estado adotado por todas as Constituições brasileiras desde 1891, como atualmente figura como cláusula pétrea da Constituição Federal de 1988, de acordo com o artigo 60, § 4º, inciso I. Assim, faz parte do núcleo duro da constituição, sendo imutável e não podendo nem mesmo sofrer proposta de emenda tendente a aboli-la.

Etimologicamente, Federação decorre de foedus, foederis, que

significa aliança, união. Para restar caracterizada, pode-se apontar alguns elementos essenciais, como a descentralização política, a autonomia, a possibilidade de autoconstituição (em regra), a inexistência do direito de secessão, bem como a repartição de competência s e de receitas.

Assim, uma Federação deve buscar preservar a unidade nacional sem comprometimento das autonomias regionais. Enquanto as unidades federadas mantêm autonomia política, a soberania é transferida para o Estado Federal, de forma a coexistir diferentes esferas políticas dentro do mesmo Estado.

O fato de o Brasil constituir-se numa Federação é deveras relevante para se entender as divisões das competências entre os entes federados. Uma constituição federativa deve buscar equalizar certa distribuição de competência que garanta autonomia a todos os entes. Deve-se manter a existência de um poder central, mas sem que isso aniquile os poderes locais de exercerem suas funções estatais.

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Brasil para com os seus cidadãos.Assim, a repartição de competência é a espinha dorsal do federalismo, garantindo ao mesmo tempo a autonomia dos entes federativos e o equilíbrio da Federação.

Na divisão de competências entre os entes federados, conforme será mais bem desenvolvido, adota-se como regra o critério da predominância do interesse, segundo o qual a União teria competência sobre as matérias de interesse nacional, os Estados sobre as de interesse regional e os Municípios sobre os assuntos de interesse local. Referida divisão, apesar de transparecer uma ideia precisa e até demasiadamente simples, na verdade faz parte de um complexo sistema de distribuição de competências, o qual exige esforço do operador do direito para se alcançar a busca de equilíbrio entre os entes.

Conforme muito bem pontua José Afonso da Silva, pode-se perceber que “são notórias as dificuldades quanto a saber que matérias devem ser entregues à competência da União, quais as que competirão aos Estados e quais as que se indicarão aos Municípios”.11 Isso porque está cada vez mais difícil estabelecer uma grande diferenciação entre os assuntos que seriam de interesse nacional, regional ou local.

Apesar das dificuldades, a constante busca do equilíbrio na divisão de competências deve sempre almejar assegurar a unidade na diversidade. Assim, será visto que a União poderá dispor sobre os princípios, os fundamentos, as normas-diretrizes e uniformizadoras, ao mesmo tempo em que os demais entes complementariam para melhorar adaptar as leis às suas condições locais, sem perder a harmonia do sistema.

A solução teórica, todavia, não tem sido aplicada na prática, pois a doutrina afirma que em nossa Federação a União exerce papel predominante na produção legislativa, reduzindo os Estados e os Municípios, na prática, “a papéis praticamente insignificantes” 12.

Buscando reverter este quadro, a Constituição Federal de 1988, de maneira inovadora, buscou imprimir força ao pacto federativo, invertendo esta tendência centralizadora verificada desde a proclamação da República Federativa. E para assegurar a autonomia das entidades federativas, trouxe mudanças no modelo de repartição de competências até então vigente. Referido tratamento constitucional merece ser

11 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores. 2008. 30ª edição. p. 477.

12 ANTUNES, Paulo de Bessa.

Federalismo e Competências Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Editora

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devidamente estudado para se poder chegar a uma conclusão acerca da possibilidade do ente municipal criar leis mais protetivas ao meio ambiente.

1.2 Breve histórico do federalismo

A forma federativa de Estado teve sua origem nos Estados Unidos, no ano de sua primeira Constituição - 1787. O modelo de estado federativo foi a solução encontrada para se manter a união dos treze Estados independentes norte-americanos13.

Pela Federação estabelecida, cada Estado cederia parcela de sua soberania para um órgão central, o qual ficaria responsável pela centralização e unificação dos Estados Unidos da América. Assim, houve um movimento centrípeto (de fora para dentro), no qual os Estados até então independentes se aglutinaram, criando um poder central único (federalismo por agregação).

Diante deste nascedouro, até hoje os Estados Unidos tem um governo central demasiadamente limitado, em razão dos fortes poderes e autonomia de que os governos regionais dispõem. Contribui para isso haver neste país um federalismo simétrico, pois ao mesmo tempo em que há equilíbrio na repartição de competências, também há homogeneidade cultural, incluindo língua comum e grau de desenvolvimento semelhante. Essa forma norte-americana, que originou o Estado federal, acabou por receber adaptações nos países que vieram a adotar a forma federativa de Estado.

No Brasil, diferentemente do ocorrido nos Estados Unidos, a formação federativa proveio de um movimento centrífugo (de dentro pra fora). Se antes havia um Estado unitário centralizado, passou-se a constituir um Estado descentralizado (federalismo por desagregação).

Essa diferenciação histórica da implementação do federalismo nos Estados Unidos e no Brasil até hoje influencia o grau de autonomia dos entes menores em comparação com o poder central. Acostumados com muita autonomia, os Estados norte-americanos mantiveram-na em grande medida mesmo após a constituição do Estado federado, e, por isso, ainda detêm muito mais autonomia que os Estados-membros brasileiros.

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Essa divisão vertical de poder em muito serviu para que não houvesse abusos de um ente federado em relação ao outro. Isso porque, a liberdade política só pode ser alcançada com um sistema de freios e contrapesos, de modo que um poder limita os demais. O Brasil adotou a clássica tripartição de poderes, divididos em Poder Executivo, Legislativo e Judiciário14. Mas ao lado dessa divisão horizontal, também se mostra relevante a distribuição de poder/competência verticalmente entre os entes federados.

O regime federativo pressupõe que os entes vão dividir as tarefas essenciais do Estado-Nação, cooperando uns com os outros para alcançar o bem comum.

1.3 A Federação brasileira

A Federação brasileira está assentada na ideia de repartição de competência com vistas a garantir autonomia entre os entes federativos e, ao mesmo tempo, alcançar o equilíbrio da Federação.

O artigo 1º, caput, da Constituição Federal, prevê a indissolubilidade

dos entes federados, de modo a não haver hierarquia entre a União e os demais entes, haja vista que há uma clara fixação da competência de uns e outros.

Referido artigo deve ser lido conjuntamente com o caput do artigo

18, que também traz a peculiaridade brasileira da inclusão do Município como ente da Federação. Pode-se dizer, assim, que a Carta Magna de 1988 buscou imprimir maior força ao pacto federativo, indo de encontro à centralização vigente até então.

Pela leitura dos dispositivos constitucionais supramencionados percebe-se que foi criada uma Federação em três níveis, diferentemente do que há em qualquer outro país do mundo. Édis Milaré assevera que “embora único, esse modelo espelha uma tendência mundial, que é a de uma crescente afirmação das autonomias locais”15. Essa inclusão do Município faz o federalismo brasileiro ser denominado tricotômico, trino, tríplice ou tripartido.

14 RICHTER, Melvin. The Political Theory of Montesquieu. Estados Unidos: Cambridge University Press, 1977, p. 92.

15 MILARÈ, Edis.

Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. São

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No Brasil, como a tradição do Estado unitário sempre foi muito presente, seria preciso transferir poderes aos entes menores de forma gradual, para que aos poucos pudessem consolidar essa visão de Federação descentralizadora. Só assim possibilitar-se-ia uma descentralização política adequada, distribuindo-se o que até então estava inteiramente sob a competência do poder central (União), paulatinamente, aos poderes regionais e locais.

Outra questão importante sobre o federalismo brasileiro é sua classificação como ‘federalismo cooperativo’. Como o próprio nome sugere, significa que as atribuições entre os entes federados se darão de forma cooperativa, conjunta, em um exercício coordenado de competências, de modo comum ou concorrente16.

Essa classificação se contrapõe ao clássico modelo de federalismo dual, no qual há rígida separação de competência entre os entes, especialmente entre a entidade central (União) e os demais entes federados. Assim, percebe-se que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu um federalismo cooperativo no Brasil, com vista a um maior inter-relacionamento entre os diferentes níveis de poderes políticos.

Conforme será demonstrado, neste federalismo de integração, a distribuição de competências entre a União, Estados e Municípios se faz como um compromisso de união de esforços para realizar o bem-estar da coletividade da melhor maneira possível.

Assim, a República Federativa do Brasil é fundada no equilíbrio de suas competências constitucionais entre os entes federados, daí se falar que foi adotado um federalismo de equilíbrio.

Outra possível abordagem para o federalismo brasileiro se refere ao que foi denominado ‘federalismo de 2º grau’. A justificativa para tal denominação se dá pela tríplice estrutura do Estado Brasileiro, sendo a União a ordem central, os Estados as ordens regionais e os Municípios as ordens locais. Assim, os entes municipais deveriam não só observar a Constituição Federal, mas também a Constituição do respectivo Estado, e, por isso, haveria um federalismo de 2º grau17.

16 CAMARGO, A. Federalismo cooperativo e o princípio da subsidiariedade: notas sobre a experiência

recente do Brasil e da Alemanha. In: HOFMEISTER, W., CARNEIRO, J. M. B. (Orgs.). Federalismo na Alemanha e no Brasil, Série Debates, n.22, v.1. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2001, p. 83.

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Assim, pode-se sintetizar toda esta complexidade do federalismo brasileiro na busca de um equilíbrio entre os poderes nacionais e regionais, assegurando a possibilidade da União, Estados e Município exercerem suas competências na forma do que foi estabelecido pela Constituição Federal

1.4 O conceito de competência no direito pátrio

Para se poder tratar apropriadamente do tema ‘competência’, imprescindível se faz a busca de uma definição a respeito deste termo. Diante da dificuldade inerente em precisar um tema tão complexo, será necessária a comparação das abordagens do conceito por alguns dos mais renomados autores jurídicos que trataram do tema.

Valendo-se primeiramente das lições de José Afonso da Silva, tem-se que “Competência é a faculdade juridicamente atribuída a uma entidade ou a um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções.”18

No mesmo sentido é a definição de Canotilho, em que competência seria “o poder de acção e de actuação atribuído aos vários órgãos e agentes constitucionais com o fim de prosseguirem as tarefas de que são constitucionalmente ou legalmente incumbidos”19.

Já na concepção de Tércio Sampaio Ferraz Junior, Trata-se de uma

forma de poder jurídico, isto é, de exercício impositivo de comportamento e relação de autoridade regulado por normas”.20

O que se pode perceber da leitura conjunta das três definições supracitadas, é que o conceito de competência obrigatoriamente trata da questão do poder.

18 SILVA, José Afonso da. Op. cit. p. 479.

19 CANOTILLHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Portugal – Coimbra: Ed. Almedina, 2003, p.543.

20 FERRAZ Jr, Tércio Sampaio.

(23)

O Estado concentra o poder político que a sociedade lhe atribui, e, como não pode exercê-lo somente por um único órgão, acaba por distribuir tal poder aos seus entes, os quais o recebem-no na forma de competência para exercer a vontade do Estado.

Por isso, não há como precisar o que seria competência sem relacioná-la com a quantidade ou até qualidade de poder distribuído aos entes do Estado para a consecução de suas finalidades.

Isto posto, passa-se a analisar especificamente como foi realizada essa distribuição das competências na Constituição Federal, tanto no âmbito administrativo quanto no legislativo.

1.5 Classificação das competências

A Constituição Federal de 1988 estruturou-se num complexo sistema de repartição de competências, notadamente criando dois grandes blocos: a competência administrativa e a legislativa.

Com relação à primeira, houve sua divisão em competência administrativa comum e exclusiva. Já quanto à segunda, houve uma subdivisão ainda maior, abarcando a competência legislativa exclusiva, a privativa, a concorrente, a supletiva e a suplementar. Diante dessa secção constitucional das competências, se mostra salutar explicá-las em subtópicos separados.

1.5.1 Competência Administrativa

A competência administrativa, também denominada de material ou não legislativa, refere-se ao poder-dever de gerir a coisa pública, isto é, de atuar de modo concreto para a realização dos fins estatais.

(24)

na Carta Magna, tal exercício pode ter sido incumbido de modo exclusivo a só uma esfera estatal, bem como pode estar afeta de maneira comum a todos os entes.

1.5.1.1 Competência administrativa exclusiva

As competências materiais exclusivas são marcadas principalmente pelo fato de serem indelegáveis, de modo que nessas áreas somente um ente estatal terá o poder de agir.

Tais competências são a regra do ordenamento, estando arroladas as competências materiais exclusivas da União no artigo 21 da Constituição, as competências dos Municípios no artigo 30, incisos III a IX, e as dos Estados serão aquelas que não tiverem expressamente conferidas aos dois primeiros entes (artigo 25, §1º). Por isso, diz-se que a competência material exclusiva dos Estados são remanescentes ou residuais.

1.5.1.2 Competência administrativa comum

As competências materiais comuns são aquelas em que todos os entes federativos podem atuar simultaneamente, daí também se denominar competência paralela ou cumulativa. Todos têm interesse na consecução das matérias arroladas no artigo 23 da Constituição, haja vista se tratarem precipuamente de direitos difusos, isto é, aqueles que interessam a toda sociedade.

(25)

Conforme recorda Paulo de Bessa Antunes, esta colaboração deve ser feita racionalmente, para que os “serviços sejam prestados da forma mais eficiente possível e com a maior economia de recursos públicos”.21

Como não há prevalência de um ente sobre o outro em tais matérias, somente com o estabelecimento de instrumentos jurídicos de cooperação - como os convênios - poderão ser otimizados os esforços na busca do bem comum.

Na seara ambiental especificamente, buscando evitar a dispersão de recursos causados pelos conflitos entre os entes, foi promulgada recentemente a Lei Complementar nº 140/11. Referida lei regulou a coordenação da atuação das ações em prol do meio ambiente, possibilitando o estabelecimento de convênios, a descentralização de encargos, entre outros instrumentos.

Somente após um tempo maior poderão ser analisados os impactos reais da aplicação desses instrumentos na melhoria da qualidade ambiental. Apesar disso, a alteração legislativa por si só já mostra a preocupação do Estado na cooperação de seus entes para a busca da melhor salvaguarda do meio ambiente.

Por fim, como o tratamento do meio ambiente foi incluído na competência material comum, muitos advogam que este dever de cuidado traria tacitamente uma correlata competência legislativa sobre a matéria. Diante da relevância deste tema para a verificação da possibilidade do Município editar leis ambientais, tais “competências implícitas” serão analisadas em tópico separado.

1.5.2 Competência legislativa

Como o próprio nome sugere, as competências legislativas são aquelas relacionadas às atribuições dos entes políticos para que estabeleçam leis, isto é, a aptidão para legislar.

Esta atribuição constitucional dos entes federados em poder editar suas próprias leis é de suma importância para a Federação. Nesse sentido é a lição de Fernanda Dias Menezes de Almeida: “A partilha do poder de legislar é sempre o fulcro da

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repartição de competências, já que a lei – pensando-se em termos de Estado de direito – é que dá a dimensão do exercício dos demais poderes”.22

De acordo com a divisão feita na Constituição Federal, serão vistas sucintamente as diferentes competências legislativas que foram estabelecidas.

1.5.2.1 Competência exclusiva e privativa

As competências exclusivas e as privativas são aquelas que autorizam a União a impor um tratamento uniforme em todo o território nacional. Enquanto as primeiras estão previstas no artigo 25, §§1º e 2º da Constituição Federal e são indelegáveis, as segundas estão arroladas no artigo 22 e tratam de matérias que podem vir a ser delegadas.

Tal previsão está expressa no parágrafo único do mesmo artigo 22, o qual estabelece que a União poderá, por meio de lei complementar, autorizar os Estados a legislar sobre as matérias constantes desse artigo. Não havendo delegação nesses casos, fica excluída a possibilidade de os Estados e Municípios legislarem sobre tais matérias, pois a regra é de que tais entes só podem atuar obedecendo os limites e condições da lei federal.

1.5.2.2 Competência concorrente e suplementar

A competência concorrente foi tratada no artigo 24 da Constituição Federal e se refere àquelas matérias em que será necessária uma verdadeira “divisão de tarefas” a ser compartilhadas entre União, Estados e Distrito Federal. Na definição de José Afonso da Silva, esta competência concorrente seria a“possibilidade de disposição sobre o mesmo assunto ou matéria por mais de uma entidade federativa”23

O campo de atuação de cada ente está delimitado na própria Carta Magna, ao dispor que a União tem primazia para a fixação de normas gerais, enquanto os

22 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1998. 5ª edição. São Paulo: Atlas, 2010. p. 60.

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Estados e Distrito Federal poderão suplementá-las editando leis mais específicas sobre as matérias.

Valendo-nos ainda das lições de José Afonso da Silva, pode-se afirmar que estas suplementações seriam “o poder de formular normas que desdobrem o conteúdo dos princípios ou normas gerais ou que supram a ausência ou omissão destas”24.

Assim, competência suplementar estaria ligada à possibilidade de edição de leis que pormenorizem as normas gerais da União, suplementando, desdobrando ou detalhando, de acordo com suas peculiaridades locais, os princípios já baixados pela norma federal.

Embora os Municípios tenham sido aparentemente excluídos da titularidade desta competência, por não constarem no artigo 24 da Constituição, verifica-se que sua competência suplementar está expressa no artigo 30, inciso II, de modo que também cabe ao ente municipal a edição de leis suplementando as normas federais e estaduais.

Muitos assuntos importantes foram incluídos sob o manto da competência concorrente. Para este trabalho, destacam-se a proteção do meio ambiente, o controle da poluição, a defesa dos solos e dos recursos naturais, a conservação da natureza, a responsabilidade por danos ao meio ambiente, o direito urbanístico, entre outros.

Tal previsão se mostra salutar para o tratamento de tais questões. Fernanda Dias Menezes de Almeida observou tal realidade com propriedade: “Parece-nos, efetivamente, que a utilização das competências concorrentes, como idealizada, atende aos desígnios de se chegar a uma maior descentralização, sem prejuízo da direção uniforme que se deva imprimir a certas matérias”.25

Como é sabido, apesar de haver certo consenso de que a União deveria uniformizar tais matérias, limitando-se a uma legislação abrangente, sem pormenores ou peculiaridades, ainda há divergência acerca dos limites da descentralização realizada pela suplementação de tais leis pelos Estados e Municípios.

Poder-se-ia argumentar tanto que tais entes deveriam somente preencher as lacunas deixadas pela normatização federal, sem jamais afrontá-la, como também que poderiam atender suas peculiaridades regionais/locais plenamente, inclusive

24 SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 481.

(28)

confrontando as normas gerais. O estudo da argumentação completa de referido embate se mostra imprescindível para a análise da possibilidade dos Municípios legislarem mais restritivamente a respeito do meio ambiente. Diante de tal importância, esta discussão será desenvolvida nos capítulos subseqüentes, notadamente quando do estudo sobre a repartição da competência legislativa ambiental entre os entes da Federação.

1.5.2.3 Competência supletiva (plena)

Como visto acima, na competência concorrente é facultado aos entes menores suplementarem a legislação da União. Todavia, diante da possibilidade de inércia legislativa deste ente, surge explicitamente aos Estados a competência supletiva ou plena, nos termos do artigo 24, §3º da Constituição Federal.

Isso significa que, não havendo norma geral da União sobre determinado assunto de competência concorrente, a competência suplementar do Estado passa também a ser supletiva, ou seja, será possível a edição de normas gerais por tal ente.

Ao mesmo tempo, justifica-se a competência plena dos Estados nos casos da existência de lei federal omissa sobre determinado assunto. Por isso, fala-se que a competência supletiva serve tanto para suprir a ausência como também a omissão das normas federais.

Esta possibilidade de legislação plena do ente Estadual foi uma das grandes novidades da Constituição Federal de 1988, haja vista que não se aventava tal possibilidade nas constituições anteriores.

Em que pese a Constituição não trate especificamente do Município neste artigo, pode-se argumentar que este ente também teria recebido tal competência na hipótese de não haver lei geral nem por parte da União, nem pelo Estado-membro correspondente. Essa interpretação decorreria da competência suplementar do Município constante no inciso II do artigo 30 da Constituição Federal.

Apesar de todo o ânimo do “status nascendi” de referida

(29)

próprio ente que a está editando, não podendo se estender a norma regional/local para outras localidades. Já a limitação temporal se refere ao fato de que, em havendo a edição superveniente de norma geral da União, esta lei prevalecerá.26

Assim, conforme resta expresso no § 4º do artigo 24 da Constituição Federal, “A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.”

Com relação a esta última previsão constitucional, por fim, é importante atentar para o significado de ‘suspender a eficácia’, que não se confunde com revogação. Por isso, ao invés da lei anterior ser extirpada do ordenamento, ela ficará somente suspensa, o que significa que poderá eventualmente voltar a ter vigência se a lei nova da União for revogada ou declarada inconstitucional, por exemplo.

1.6 Competências implícitas

As competências implícitas, também chamadas de resultantes, inerentes ou decorrentes, são aquelas que não estão expressas no texto constitucional para um determinado ente.

São competências implícitas porque se referem aos atos que legitimamente se esperam de um ente para que ele cumpra de modo eficaz as competências materiais que lhe foram incumbidas.

Por isso, diz-se que a necessidade de implementação das competências administrativas traz consigo uma correlata competência legislativa referente a tais matérias. Assim, estariam os entes autorizados a legislar para poder agir adequadamente.

Nesse sentido, inclusive, é a ‘teoria dos poderes implícitos’, a qual, simplificadamente, preceitua que se a Constituição Federal atribui uma determinada finalidade a um ente federado, implicitamente estaria também lhe provendo de todos os meios necessários para a consecução deste mister.

Segundo Hely Lopes Meireles:

26 MACHADO, Paulo Affonso Leme.

Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Malheiros Editora. 2009. p.

(30)

“Poderes implícitos são os que resultam como conseqüência lógica e necessária de um poder explícito, ou dos princípios adotados pela Constituição. (...) A teoria dos poderes implícitos está constitucionalmente consagrada no nosso regime, como norma interpretativa de observância obrigatória na partilha da competência entre a União, os Estados-membros e os Municípios.”27

Por isso, pode-se afirmar que a competência material pressupõe uma correlata competência legislativa, haja vista que somente com a edição de leis poderá o ente atuar eficazmente para cumprir o encargo atribuído pela Constituição.

Tratando especificamente da questão ambiental, tanto o artigo 23 da Constituição assegurou competência administrativa comum a todos os entes da federação, como o artigo 225 impôs o dever a todo o Poder Público de defender e preservar o meio ambiente.

Sob o respaldo desses argumentos, entende-se, portanto, que a Constituição Federal, por ter determinado uma obrigação comum de proteção do meio ambiente à União, aos Estados e também aos Municípios (competência material), acabou por assegurar a correlata competência legislativa a todos esses entes.

27 MEIRELLES, Hely Lopes.

Direito Municipal brasileiro. 15ª edição, atualizada por Márcio Schneider Reis

(31)

Capítulo 2 - A COMPETÊNCIA AMBIENTAL NA CONSTITUIÇÃO E

SUA REPARTIÇÃO EM MATÉRIA LEGISLATIVA

2.1 O meio ambiente na Constituição Federal de 1988

A Carta Magna atualmente vigente inovou em parte no tratamento da competência ambiental, principalmente no que concerne às competências legislativas.

A Constituição de 1967, por exemplo, não chegava a atribuir competência ao Estado-membro para legislar a respeito dos bens ambientais, incumbindo tal tarefa exclusivamente à União. Nesse sentido se alinhou a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81), que mantinha essa atribuição única da União para dispor acerca de tais bens ambientais.

Já a Constituição Federal de 1988 mudou a sistemática até então existente, conferindo mais poderes aos entes inferiores. Apesar disso, como pondera Paulo de Bessa Antunes quanto às competências legislativas, “a repartição de competências ambientais, tal como posta na Constituição de 1988, é extremamente confusa e, seguramente, centralizadora.”28

A qualificação como confusa se justifica porque o federalismo brasileiro é bastante complexo, especialmente no tratamento das questões ambientais, nas quais a Constituição estabelece diferentes entes federados para o exercício da competência político-administrativa comum e para as competências legislativas concorrentes.

A característica de ser centralizadora é explicada pelo fato de ainda existir monopólio da União em determinados temas (por exemplo: águas, energia, recursos minerais etc). No entanto, apesar de haver certa concentração de competências na União, inegável que a privatividade até então existente foi certamente amenizada, pois muitas das mais importantes questões ambientais foram descentralizadas aos entes inferiores.

(32)

Na divisão da competência material ou administrativa (artigo 23 da Constituição Federal), por exemplo, determinou-se a tutela comum de todos os entes públicos para “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”, bem como para “preservar as florestas, a fauna e a flora”.

Assim, considerando que a proteção do meio ambiente foi incluída no rol das competências comuns, tanto a União, os Estados, o Distrito Federal como os Municípios são igualmente competentes para a implementação das diretrizes e políticas de resguardo do meio ambiente sadio.

Corroborando esta previsão de competência comum, no capítulo específico da Constituição Federal sobre o Meio Ambiente (artigo 225), foi imposto ao “Poder Público” o dever de preservar o meio ambiente. Referida expressão tem nítido caráter genérico, de modo que muito bem representa essa incumbência comum de todos os entes federados na defesa do ambiente. Por isso, pode-se dizer que os artigos supracitados complementam-se mutuamente, determinando a necessidade do agir estatal em todos os seus níveis para a completa salvaguarda do ambiente.

Para tanto, conforme já mencionado em capítulo anterior, foi editada em novembro de 2011 a Lei Complementar n. 140/11, que fixou normas para:

“a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora.”

Referida lei complementar veio para regular a coordenação das ações em prol do meio ambiente por todos os entes da Federação, de modo a possibilitar convênios, acordos de cooperação técnica, delegação de atribuições, descentralização dos encargos, entre outros instrumentos. Como ainda há pouco tempo de vigência desta lei, não é possível falar nos efeitos concretos das mudanças, mas aguarda-se que a proteção do meio ambiente possa ser mais bem efetivada com os novos parâmetros e instrumentos previstos.

(33)

somente a um ente. Por isso, Paulo Affonso Leme Machado criticava em parte a competência comum, mesmo antes da edição da Lei Complementar:

“O perigo da simultaneidade de competências para a implementação do controle ambiental é que todos os entes federados ficaram competentes, mas nenhum deles tem assumido especificamente a melhoria da qualidade das águas, do ar e do solo e nenhuma instância governamental se responsabiliza pela conservação das florestas e da fauna.”29

Outro problema decorrente da competência comum para o tratamento das questões ambientais se dava no conflito entre os próprios órgãos integrantes do SISNAMA. Paulo de Bessa Antunes recorda que “existe um avanço dos órgãos federais sobre os estaduais e municipais, de maneira cada vez mais insinuante”.30

Para tentar solucionar tal questão, o Decreto 6.514/08 prevê em seu artigo 12 que o pagamento de multa por infração ambiental imposta pelos Estados ou Municípios “substitui a aplicação de penalidade pecuniária pelo órgão federal, em decorrência do mesmo fato”. Assim, quando houver aplicação de multa por diversos agentes públicos de fiscalização ambiental, o ente inferior terá prioridade no recebimento de tais valores, haja vista que é afetado diretamente em seu território e terá que suportar as consequências do dano ambiental ocorrido.

O que se busca, portanto, é que haja uma adequada coordenação de tarefas de proteção do meio ambiente por todos os entes, sendo certo que será preciso muito esforço de todo o poder público. Nesse sentido, não pode ser olvidado que tal incumbência constitucional acaba por incluir a atuação do ente municipal na produção de normas locais para cumprir a contento seu mister.

Certamente os Municípios deverão prever restrições adicionais se forem necessárias para o resguardo do meio ambiente local, chegando até mesmo a se cogitar a possibilidade de contrariar legislações estaduais e federais mais permissivas, que muitas vezes não podem atentar para uma questão peculiar de determinado local que merece melhor proteção.

(34)

Assim, Paulo de Bessa Antunes sintetiza muito bem a questão: “se a Constituição estabeleceu uma obrigação de cuidado, necessariamente autorizou a produção de normas para que o cuidado pudesse ser exercido”.31

Além dessa competência legislativa ambiental implícita, devem-se analisar as competências legislativas dos artigos 22 e 24 da Constituição. O primeiro insere alguns temas ambientais “lato sensu” na competência privativa da União, enquanto o

segundo faz a inserção da proteção do meio ambiente no rol das competências concorrentes, autorizando expressamente a produção de normas pela União e pelos Estados.

A previsão da competência privativa da União para legislar sobre energia, atividades nucleares, jazidas, minas, outros recursos minerais, águas, entre outros temas correlatos ao meio ambiente, faz parecer que a Constituição Federal elegeu tais temas como prioritários da nação, devendo necessariamente sofrer tratamento uniforme no território brasileiro.

No entanto, tal justificativa aparente não é suficiente para convencer a maior parte da doutrina a respeito desta necessidade em dar privatividade à União em referidos assuntos. Sintetizando tais questionamentos, têm-se as palavras de Paulo Affonso Leme Machado:

“Sob o ponto de vista da eficiência legiferante, parece-me difícil que a legislação federal privativa nos setores indicados tenha melhor desempenho do que se fosse inserida na competência concorrente. Da forma como está, os Estados e os Municípios não podem suplementar as deficiências dessas normas federais, como, também, não têm atribuições diretas para adaptar essas normas às suas peculiaridades regionais e locais”.32

O mais importante, todavia, é que foi inserida junto à competência concorrente a maior parte da tutela ambiental constitucional. Entre elas, se destaca a previsão de legislação sobre “florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição”, a “proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico” e a

(35)

“responsabilidade por dano ao meio ambiente” (artigo 24, incisos VI, VII e VIII, respectivamente).

Conforme já foi tratado em capítulo específico, a competência concorrente pressupõe que haverá normas gerais, diretrizes, bases estabelecidas pela União, ao passo que aos Estados caberá a suplementação de tais normas.

Assim, com relação à legislação de proteção ambiental, aguarda-se que a União edite as normas gerais e estabeleça as políticas nacionais, de modo a cumprir seu papel principiológico. Dessa maneira, efetivar-se-á a garantia da existência de pisos mínimos de proteção ambiental por meio desta legislação federal.

Paulo de Bessa Antunes, ao tratar do tema, assevera que “há a necessidade de que a legislação de proteção ao meio ambiente assegure níveis nacionais mínimos de tutela ambiental, evitando-se que a possibilidade de poluir mais seja um

diferencial competitivo entre os estados e municípios”.33

Nesse sentido, a previsão de normas gerais conferirá um primeiro passo na efetivação da proteção ambiental, pois como lembra Celso Antonio Pacheco Fiorillo, após a fixação de tais bases os “Estados e Municípios jamais poderão legislar de modo a oferecer menos proteção ao meio ambiente”.34 Por isso, tais entes menores serão legítimos para fixar um teto de proteção, baseado nos seus interesses regionais/locais.

Para que tal sistemática funcione, necessariamente deverá haver cooperação dos entes para a salvaguarda integral do meio ambiente, pois a União não esgotará os assuntos, mas sim tratará das normas com interesses amplos, que afetem todo o País ou pelo menos grande parte deste.

Em caso de inexistência de tais leis federais a respeito de uma matéria específica, já foi visto que os entes inferiores poderão suprir a ausência da norma por meio do exercício da competência legislativa supletiva, produzindo normas gerais válidas em seus respectivos territórios.

Havendo legislação federal, será de suma importância a competência suplementar dos Estados e Municípios, haja vista que estes entes estão sempre mais próximos às suas realidades locais, podendo aumentar a proteção ambiental dos respectivos

33 ANTUNES, Paulo de Bessa. Op. cit. p. 165. 34 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco.

Curso de direito ambiental brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Saraiva.

(36)

territórios sempre que necessário. Só assim será garantido o atendimento conjunto de uma proteção nacional mínima sem retirar o interesse dos entes inferiores em efetivar a defesa do meio ambiente em sua extensão necessária.

Desse modo, pode-se concluir que o cenário ideal da produção de leis para proteger o meio ambiente se dará quando a União prioritariamente estabelecer os princípios, as diretrizes, as regras nacionais uniformemente aplicáveis, enquanto os Estados e Municípios farão a suplementação dessas normas gerais, em favor da efetiva tutela de seus interesses ambientais.

Certamente será necessário que os Estados e Municípios passem a assumir um papel de maior relevância na elaboração de legislação para implementar suas políticas e restrições ambientais. Apesar de haver algumas iniciativas de leis, que serão melhor tratadas em capítulo específico, parece que ainda há certa resistência com relação a essa normatização estadual/municipal. Tal fato acaba por refletir na atuação desses entes, que ainda está muito aquém de suas capacidades, e, consequentemente, não se situam num patamar condizente com as necessidades de proteção do meio ambiente local e da saúde pública das sociedades envolvidas.

Apesar das críticas que a descentralização da normatização ambiental possa receber, importante mencionar nesta discussão a lição-síntese de Paulo Affonso Leme Machado:

“Não reivindicamos para o Brasil a debilitação do Estado federal. Entendemos de real importância que a normatização fundamental para o meio ambiente seja feita pela União, através de normas gerais; mas que com isso não se anule o Município.”35

Em suma, nos parece claro que o que a Constituição Federal busca, como finalidade precípua da divisão da competência ambiental, que sempre se possibilite a atuação tanto da União como a dos Estados e Municípios. Somente com a observação das leis dos diferentes entes é que se poderá aferir a norma com mais eficácia na proteção do meio ambiente, seja esta norma federal, estadual ou municipal. Por isso, imprescindível será a atuação de todo o “Poder Público” para cumprir tal mandamento constitucional.

(37)

2.2 Princípios norteadores da competência ambiental

2.2.1 O princípio da predominância do interesse

O princípio da predominância do interesse é o que norteia a repartição das competências entre os entes federados. De acordo com esse princípio, serão incumbidas à União todas as matérias de predominante interesse nacional, isto é, aquelas matérias que necessitam de um regramento uniforme por haver um interesse geral da nação sobre os mesmos.

Já os Estados seriam responsáveis pelos assuntos de interesse regional, ou seja, aqueles que não chegam a ser nacionais, mas ao mesmo tempo transpassam os interesses meramente locais.

Por último, aos Municípios seriam afetas as matérias de nítido interesse local. Essa sintética divisão baseia-se na predominância do interesse, que é o norte do pacto federativo nacional.

Apesar de a distinção estar formalmente bem delineada, não se pode olvidar a grande dificuldade no estabelecimento de uma distinção profunda entre os interesses supramencionados.

José Afonso da Silva compreende muito bem esse empecilho e sintetizou a questão em breves palavras: “no Estado moderno, se torna cada vez mais problemático discernir o que é interesse geral ou nacional do que seja interesse regional ou local.”36

Como se pode imaginar, na seara ambiental as dificuldades são ainda maiores, pois o meio ambiente é um bem de uso comum do povo e a qualidade ambiental afeta a cada um e a todos indistintamente. Assim, é demasiadamente difícil delinear quais temas ambientais poderiam pertencer mais à esfera local, regional ou nacional.

Diante da complexidade de problemas como esse, a doutrina moderna trouxe mais um princípio para nortear à repartição das competências constitucionais, qual seja, o princípio da subsidiariedade, que se passa a examinar.

(38)

2.2.2 Princípio da subsidiariedade e o direito comparado

No tratamento da divisão das competências constitucionais, também se pode mencionar o princípio da subsidiariedade, o qual está historicamente baseado num direito natural do homem de tomar suas decisões em sua comunidade, pois teria recebido da natureza o direito de viver e proteger sua espécie, muito antes da existência do próprio Estado. O conteúdo moderno do princípio está fundado na doutrina social da Igreja e em Encíclicas, que já postulavam que deveria ser dada maior atenção ao tratamento local das questões37.

O princípio da subsidiariedade pode ser analisado sob dois aspectos: o vertical e o horizontal. Pela ótica vertical, entende-se que, na distribuição de competência, só deveria haver maior influência da União quando fosse necessário, isto é, quando os Estados-membros não pudessem realizar suas ações de forma suficiente. Já pela ótica horizontal, busca-se uma primazia da atuação da iniciativa privada, de modo que o Estado só deveria agir residualmente. Além disso, é buscada uma atuação com mais proximidade ao cidadão, seja pelo órgão público ou pelo privado, bem como se busca que essa tarefa seja realizada pelo órgão que possa desempenhá-la com maior eficiência.

Para a presente dissertação, tem maior importância o enfoque da subsidiariedade na ótica vertical, quando é relacionada a um princípio norteador da repartição de competências, baseado na cooperação entre os entes federativos. Tal cooperação seria realizada, em certos casos, com a primazia do ente menor na realização das tarefas comuns, enquanto que a entidade maior só interviria quando fosse necessário.

Assim, percebe-se que referido princípio auxilia na repartição de competências dentro da esfera estatal, buscando assegurar liberdade e autonomia aos entes que a compõem, ganhando especial relevo nos países que adotam a Federação como forma de Estado.

No Brasil, vislumbra-se uma incorporação implícita do princípio da subsidiariedade no texto constitucional, em razão do modo como foi feita a repartição de competências somada ao fortalecimento municipal. A inclusão do Município como ente da

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