PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A
CIÊNCIA
Alysson Cristiano Beneti
TEXTOS PARADIDÁTICOS E O ENSINO DE FÍSICA: UMA ANÁLISE DAS AÇÕES DO PROFESSOR NO ÂMBITO DA SALA DE AULA
Alysson Cristiano Beneti
TEXTOS PARADIDÁTICOS E O ENSINO DE FÍSICA: UMA ANÁLISE DAS AÇÕES DO PROFESSOR NO ÂMBITO DA SALA DE AULA
Dissertação apresentada como requisito à obtenção do título de Mestre à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” -Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, área de concentração Ensino de Ciências, sob a orientação da Profª. Dra. Odete Pacubi Baierl Teixeira
DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO UNESP – Campus de Bauru
Beneti, Alysson Cristiano.
Textos paradidáticos e o ensino de física: uma
análise das ações do professor no âmbito da sala de aula / Alysson Cristiano Beneti. - Bauru, 2008.
138 f. : il.
Orientadora: Odete Pacubi Baieri Teixeira Dissertação (Mestrado)–Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2008
1. Ensino de física. 2. Textos paradidáticos. 3. Alfabetização cientifica. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências. II. Título.
AGRADECIMENTOS
A minha família, pelo apoio e pela motivação.
A orientadora Profª. Dra. Odete Pacubi Baierl Teixeira pela dedicação e
paciência durante esta pesquisa.
Ao Prof. Dr. Roberto Nardi por inspirar esta pesquisa e acreditar em um
estudante de graduação “sonhador”.
À Profª. Dra. Alice Assis pela prontidão e solidariedade com um
pesquisador em começo de carreira.
Ao Prof. Dr. Marco Aurélio Alvarenga Monteiro por confiar em nosso
trabalho.
Ao Prof. Dr. Éder Pires de Camargo por confiar em nosso trabalho.
À Profª Polônia Altoé Fusinato por confiar em nosso trabalho.
Aos membros do Conselho do curso de Pós-Graduação em Ensino de
Ciências da UNESP - Bauru pela compreensão e por serem
complacentes com a situação pela qual passei nos tempos desta
pesquisa.
Aos professores e funcionários da Pós-Graduação em Ensino de
Ciências da UNESP – Bauru pela prontidão e colaboração.
Aos meus amigos pelo apoio e compreensão.
À minha querida esposa Adriana pela dedicação, amor, carinho e compreensão...
Aos meus pais João e Izildinha pelo amor, pelo eterno apoio e pela minha educação...
À minha querida irmã Gláucia sempre presente, amiga e companheira...
À minha querida irmã Ellen, que tanto me apoiou, mas partiu durante esta pesquisa, sem poder ver este sonho realizado...
BENETI, A.C. TEXTOS PARADIDÁTICOS E O ENSINO DE FÍSICA: UMA ANÁLISE DAS AÇÕES DO PROFESSOR NO ÂMBITO DA SALA DE AULA, 2008, 139f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências). Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru, 2008.
RESUMO
Algumas pesquisas em ensino de Física têm apontado a importância da utilização de
textos paradidáticos, no processo de aprendizagem, como um recurso que pode
contribuir para viabilizar um espaço de diálogo em sala de aula, possibilitando
interações e, consequentemente, corroborando para a construção coletiva de
conhecimentos. Nesta vertente, o papel do professor é fundamental, tendo em vista
que será por intermédio da sua mediação que os diferentes conhecimentos,
estudados no cotidiano da sala de aula, se desencadearão e se estruturarão. Desta
forma, a presente pesquisa investigou as características das ações manifestadas por
um professor de Física, ao utilizar, particularmente, um capítulo de um específico
texto paradidático, no contexto da sala de aula, identificando possíveis avanços e
apropriações de conhecimento por parte dos alunos de uma turma de ensino de
jovens e adultos (EJA). A pesquisa é um estudo de caso e as transcrições das aulas
foram obtidas através de gravações em vídeo. Foi utilizada a categorização da
análise da enunciação, defendida por Bardin, para identificar elementos referentes
ao perfil do discurso do professor e, de posse deste perfil, foi empregada a
categorização, proposta por Penick, visando a verificação relacionada ao nível
hierárquico de alfabetização científica assumida pelos alunos. Os conhecimentos
específicos, particularmente presentes durante a utilização do texto, envolviam
velocidade, gravitação, força, impulso, pressão, radiação, massa e teoria do Big
motivador para o aprendizado e, potencialmente significativo para o aumento do
interesse dos alunos nas aulas de Física, tendo sido observados casos de avanços
de nível de alfabetização científica, principalmente com relação aos conceitos de
campo gravitacional, aceleração gravitacional e sua dependência em relação às
massas dos corpos que interagem, bem como a diferenciação entre os conceitos de
massa e peso. Buscando caracterizar o discurso do professor, identificou-se ser
predominantemente “controlado”, se empenhando na constante busca em direcionar
as discussões durante as aulas, mantendo em discussão os temas planejados,
procurando formular questões que despertassem a curiosidade, socializando o
conhecimento, respeitando a diversidade de opiniões, relacionando conceitos físicos
com o cotidiano, retomando e sistematizando conceitos reincidentes.
Palavras-chave: Ensino de Física / textos paradidáticos / alfabetização científica /
ABSTRACT
Some researches associated with different ways of teaching Physics have shown the
importance of using paradidactic texts in the learning process. This resource can
contribute in creating opportunities for discussions in the classroom by making
interactions possible and, consequently, making the collective construction of
knowledge feasible. In view of that, the teacher’s role is crucial since it will be through
the teacher that most knowledge provided in class will be structured and
consolidated. Therefore, by identifying any possible progress and how knowledge
was incorporated throughout the learning process of a group of young and adult
students (herein called EJA), this research has analyzed a Physics teacher’s actions
in class while teaching a particular chapter of a paradidactic text.
This research is a case study and transcripts of the lessons were obtained from
videotapes and then categorized according to Bardin’s teachings about analysis of
the enunciation statements in order to identify elements regarding the profile of the
teacher’s discourse. After classifying such profile, the categorization proposed by
Penick was then applied so as to verify the level of scientific literacy of the students.
Specific knowledge, available mainly during text utilization, involved velocity,
gravitation, force, impulse, pressure, radiation, mass and the Big Bang theory. Due to
the way it was used by the teacher, the text proved efficient in motivating students in
the learning course of action and potentially significant to increase their interest in
Physics lessons. As a matter of fact, in some cases there was some advance in
terms of concepts such as gravitational field, gravitational acceleration and its
dependency in relation to the mass of interacting bodies as well as the difference
The teacher’s verbal communication was considered predominantly “controlled” and
in constant search for ways of monitoring discussions in class, of following the lesson
plans according to the schedule, of trying to ask questions that encourage students
to be curious, of making knowledge socially available, of respecting the diversity of
opinions, of associating concepts pertaining to Physics with daily routine, of reviewing
and systematizing previously studied concepts.
Key words: Teaching Physics / paradidactic texts / scientific literacy / teacher’s
LISTA DE FIGURAS
Quadro 1: Evolução da Situação Mundial, segundo Tendências no ensino
(Krasilchik, 2000, p.86) 16
Quadro 2. Representação estrutural fundamentada nos trabalhos e Bardin (1977) e
de Penick (1998 ) 55
Quadro 3 – Transcrição e comentários referentes ao episódio 1 62 Quadro 4 – Transcrição e comentários referentes ao episódio 2 67 Quadro 5 – Transcrição e comentários referentes ao episódio 3 76 Quadro 6 – Transcrição e comentários referentes ao episódio 4 86 Quadro 7 – Transcrição e comentários referentes ao episódio 5 92 Quadro 8 – Transcrição e comentários referentes ao episódio 6 97 Quadro 9 – Transcrições das respostas dos alunos 105 Quadro 10. Comparação entre níveis de alfabetização científica antes e depois das
aulas, relativas à questão um. 108
Quadro 11 - Comparação entre níveis de alfabetização científica antes e depois das
aulas, relativas à questão dois. 110
Quadro 12 – Comparação entre níveis de alfabetização científica antes e depois das
aulas, relativas à questão três. 112
Quadro 13 – Comparação entre níveis de alfabetização científica antes e depois das
aulas, relativas à questão quatro. 114
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Representação das características apresentadas por Bardin (extraído de
Bardin, 1977, p.35) 48
Tabela 2. Sistematização da representação das categorias e subcategorias segundo
Bardin (1977) 54
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 14
CAPÍTULO I
1. O ENSINO DE FÍSICA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 18
1.1. O PAPEL DOS TEXTOS DE APOIO 22
1.2. A ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA 27
CAPÍTULO II
2. A PESQUISA 32
2.1. O OBJETO DE ESTUDO 33
2.2. A METODOLOGIA 35
2.3. OS SUJEITOS 35
2.4. CONSIDERAÇÕES SOBRE TEXTO PARADIDÁTICO NOSSO UNIVERSO 37
2.5 OS DISPOSITIVOS UTILIADOS PARA A INTERPRETAÇÃO DOS DADOS 45
CAPÍTULO III
3. ANÁLISE DOS DADOS 56
3.1. ANÁLISE DAS DISCUSSÕES RELATIVAS AOS EPISÓDIOS REFRENTES ÀS
AULAS 57
3.1.1.DISCUSSÕES RELATIVAS AO EPISÓDIO 1 57
3.1.2.DISCUSSÕES RELATIVAS AO EPISÓDIO 2 65
3.1.3.DISCUSSÕES RELATIVAS AO EPISÓDIO 3 67
3.1.4.DISCUSSÕES RELATIVAS AO EPISÓDIO 4 78
3.1.6.DISCUSSÕES RELATIVAS AO EPISÓDIO 6 93
3.2. DISCUSSÃO DAS FREQÜÊNCIAS DE INCIDÊNCIAS DE CATEGORIAS NOS
DISCURSOS 98
3.3. DISCUSSÕES RELATIVAS À ANÁLISE DA AVALIAÇÃO DOS ALUNOS
SOBRE AS ATIVIDADES REALIZADAS EM SALA DE AULA 101
3.4. DISCUSSÕES RELATIVAS À ANÁLISE DAS QUESTÕES APLICADAS AOS
ALUNOS 107
CAPÍTULO IV
4. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 119
REFERÊNCIAS 124
INTRODUÇÃO
Atualmente, enquanto professor de Física do ensino médio, tenho vivenciado,
no cotidiano escolar, um ensino de Ciências muitas vezes fragmentado e
descontextualizado, desprovido de ligação entre o mundo escolar e o mundo real.
Por mais esforços que já tenham sido designados para uma mudança por
meio de projetos políticos, ainda são colocadas algumas críticas relacionadas ao
ensino de Ciências, tendo em vista, principalmente, o baixo rendimento apresentado
pelos alunos detectados em determinados indicadores, tanto nacionais quanto
internacionais.
No presente ano, a UNESCO classificou o Brasil em 76º lugar entre 129
países em qualidade de educação (UNESCO, 2008). Segundo o Ministério da
Educação brasileiro, o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica)
classificou o ensino brasileiro público com nota média entre 3,2 e 4,0 pontos em uma
escala de zero a dez, no ano de 2007 (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2008).
Um dos possíveis fatores, que pode ser responsável por este contexto, é a
maneira como se ensina, muitas vezes, de forma fragmentada e descontextualizada.
Algumas pesquisas na área de ensino de Ciências (CARVALHO et al, 2003;
DUARTE, 2000 ; CARVALHO, 2004; PEREZ et. al., 2001), apresentam indicativos
para a necessidade de mudança de atitude do professor ao planejar e desenvolver
suas aulas.
Não desconhecendo que os problemas relacionados à educação são bastante
diversificados e, portanto, a busca por soluções exigiria uma análise bastante ampla
de múltiplos aspectos, sem dúvida merecem nossa atenção, questões como: o que
algumas reflexões sobre os aspectos que poderiam estar relacionados às possíveis
respostas.
Vamos, inicialmente, analisar alguns fatos ocorridos ao longo da história
educacional brasileira, para tentar entender o motivo pelo qual nossos professores
atuam de tal maneira.
Segundo Krasilchik (2000), a partir da década de cinqüenta, as Ciências e a
Tecnologia foram reconhecidas como essenciais para o desenvolvimento
econômico, cultural e social, sendo objeto de inúmeros movimentos de
transformação do ensino. Na década de sessenta, os Estados Unidos da América
criaram os chamados “projetos de primeira geração” do ensino de Física, Química,
Biologia e Matemática, para garantir a formação de uma elite que garantisse a
hegemonia norte-americana na conquista do espaço. Surgiu, então, uma literatura
especializada para cada disciplina - para a Física: o PSSC (Physical Science Study
Commitee); para a Biologia:o BSCS (Biological Science Curriculum Study); para a
Química: o CBA (Chemical Bond Approach); para a Matemática: o SMSG (Science
Mathematics Study Group).
Segundo Krasilchik (2000, p.85),
esse período marcante e crucial na história do ensino de Ciências, que influi até hoje nas tendências curriculares das várias disciplinas tanto no ensino médio como no fundamental, foi dando lugar, ao longo das últimas décadas, a outras modificações em função de fatores políticos, econômicos e sociais.
A autora sintetiza as transformações políticas educacionais que ocorreram
Quadro 1: Evolução da Situação Mundial, segundo Tendências no ensino
(Krasilchik, 2000, p.86)
No Brasil, ainda na década de sessenta, havia a necessidade de uma
“demanda de investigadores para impulsionar o progresso da Ciência e tecnologia
nacionais” (KRASILCHIK, 2000, p. 86) . Segundo a autora, em 1961, a Lei 4.024 das
Diretrizes e Bases da Educação promoveu uma mudança na concepção do papel da
escola que passa a ser responsável pela formação de todos os cidadãos,
privilegiando o método científico e contribuindo para o aumento da carga horária das
disciplinas Física, Química e Biologia.
A Lei Federal 5692 de 1971 estendeu a educação básica obrigatória de 4
para 8 anos e estabeleceu as regras básicas para a educação supletiva. Com a lei,
as funções educacionais foram divididas em: suplência - relativa à reposição de
escolaridade; suprimento - relativa ao aperfeiçoamento ou atualização;
aprendizagem e qualificação - referentes à formação para o trabalho e
Em 1996, segundo Krasilchik (2000, p.87), com a aprovação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação nº 9.394/96, a educação escolar deveria vincular-se
ao mundo do trabalho e à prática social, e, a formação básica do cidadão na escola
fundamental, deveria garantir o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo, a
compreensão do ambiente material e social, do sistema político, da tecnologia, das
artes e dos valores nos quais se fundamenta a sociedade. O ensino médio tinha a
função de consolidação dos conhecimentos e de viabilizar a continuação do
aprendizado após o término dos estudos na escola.
“Embora a Lei indique precariamente os valores e objetivos da educação
nacional, espera-se que a escola forme o cidadão-trabalhador-estudante”
(KRASILCHIK, 2000, p.87). A tentativa de colocar em prática a legislação, com
políticas centralizadas pelo Ministério da Educação (MEC), foi realizada por meio de
documentos oficiais com as seguintes denominações: parâmetros, diretrizes
curriculares e indicativos políticos.
Entretanto, após a análise das transformações educacionais no período de
1950 a 2000, conclui que
a realidade das salas de aula têm mudado muito mais em função da deterioração das condições de trabalho que por injunções legais...” e “... mantém-se um ensino precário com professores que enfrentam nas escolas problemas de sobrecarga, de falta de recursos e de determinações que deveriam seguir sobre as quais não foram ouvidos (KRASILCHIK, 2000, p.87).
A partir do contexto educacional no âmbito mundial e, principalmente
CAPÍTULO I
1. O ENSINO DE FÍSICA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
As pesquisas e os documentos oficiais apontam para um ensino de Física
caracterizado como fragmentado e descontextualizado (ANGOTTI, 1991;
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2000; SECRETARIA DE EDUCAÇÃO
BÁSICA, 2006; DOMINGUES, TOCHI E OLIVEIRA, 2000; MEGID NETO E
FRACALANZA, 2003; MOREIRA, 2000; PEREZ, 2001), desligado do cotidiano dos
alunos e repleto de mitos em torno da Ciência. Os cientistas são tratados como
ídolos, cujas teorias são frutos de “mentes privilegiadas”. A localização histórica dos
conceitos é ignorada e as condições sociais de produção do conhecimento são
desprezadas.
Motivos externos podem colaborar para esse contexto problemático, mas o
professor, responsável pelo processo de ensino, tem um papel preponderante no
sentido de propiciar um aprimoramento e uma melhoria da qualidade de ensino.
A rede pública estadual paulista, atualmente, conta com um grande número
de professores licenciados em Matemática (que possuem em média 160 horas de
aulas de Física no curso de licenciatura em Matemática) lecionando a disciplina de
Física, ao invés de licenciados em Física (que possuem em média 1800 horas de
aulas de Física na licenciatura). Sem domínio pleno de conteúdo, o desafio de
ensinar Física se torna ainda mais difícil, conforme destaca Marin (1998), entre
outros desafios fundamentais importantes pela autora identificados em suas
• fragilidade, rigidez e restrição nos procedimentos e recursos didáticos, com destaque para a escolha e a utilização do livro didático;
• dificuldade dos professores em relacionar-se conscientemente com os pressupostos ético-políticos, epistemológicos, didáticos, psicológicos, lingüísticos subjacentes ao seu trabalho;
• fragmentação, impropriedade e/ou insuficiência de domínio dos conteúdos escolares pelos professores que se manifestam na inadequação de sua seleção, seqüenciação e desenvolvimento; • dificuldades enfrentadas pelos professores no trabalho com recepção e produção de textos;
• dificuldades na utilização da linguagem oral enquanto expressão do conteúdo de ensino, da organização do conhecimento e como instrumento de melhoria de habilidades de pensamento;
• inexistência de trabalho coletivo na escola, agravada pela falta de convivência profissional entre os professores;
• inadequação da avaliação do trabalho docente e do rendimento escolar;
• inalteração nos baixos níveis de aproveitamento escolar dos alunos; • caráter reversível das aprendizagens escolares;
• conflitos e dilemas enfrentados pelos professores no que se refere à relação entre seu saber fazer e as características dos alunos "fracos" e/ou das camadas populares;
• indisciplina na sala de aula;
• dificuldades no processo de reflexão e raciocínio dos professores e seus desdobramentos para a concretização das práticas educativas; • falta de percepção e exercício de autonomia da escola e seus professores, que implica ficar à mercê da descontinuidade das ações oriundas dos órgãos centrais de administração escolar;
• referencial restrito dos professores em relação a experiências bem-sucedidas, sejam de ensino, sejam de escolas
Um outro motivo, que comumente é atribuído a uma parcela de professores,
licenciados em Física que atuam como professores da rede pública estadual
paulista, envolve o fato de ter recebido uma formação de conteúdo desvinculada da
prática pedagógica com o sistema de três anos de estudos sobre conteúdos de
Física e um ano de estudos sobre práticas pedagógicas (três mais um), conforme
defendem Garcia e Garcia (2004, p.4) e Pereira (1999, p.111), comprometendo o
bom desempenho desses professores no desempenho da função de ensinar.
Com a aprovação da Lei 9394/96 (artigos 63 e 64) das Diretrizes e Bases da
Pleno - CNE/CP nº1 de 18 de fevereiro de 2002 – as mudanças nos cursos de
licenciatura ganharam destaque nos debates sobre formação docente e,
mesmo não sendo novidade para diversos cursos de Licenciatura, essas orientações e exigências normativas, por identificarem uma concepção de formação de professores, sugerem que tais cursos deverão, a partir de agora, apresentar um formato distinto do tradicional “três mais um” (três anos de formação básica e um de formação pedagógica), fortemente presente no período que
antecede as novas orientações (GARCIA; GARCIA, 2004, p.5)
Portanto há uma tendência de mudança nos cursos de licenciatura visando
suprir essa deficiência.
Um outro fator importante, é a fonte de consulta utilizada pelos professores de
Física para atuarem no processo de ensino. O livro didático representa uma das
fontes utilizadas pelo professor no processo de ensino. Durante o processo de
aprendizagem, o aluno não conta com o auxílio do livro didático de Física para
consulta, mas em 2009 existe a previsão para o fornecimento de livros para os
alunos da rede pública estadual paulista.
Atualmente, o governo federal brasileiro executa três programas voltados ao
livro didático: o “Programa Nacional do Livro Didático” (PNLD), o “Programa Nacional
do Livro Didático para a Alfabetização de Jovens e Adultos” (PNLA) e o “Plano
Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio” (PNLEM).
O Programa Nacional do Livro Didático
O Programa Nacional do Livro Didático para a Alfabetização de Jovens e Adultos (PNLA)
foi criado em 2007, para distribuição, a título de doação, de obras didáticas às entidades parceiras, com vistas à alfabetização e à escolarização de pessoas com idade de 15 anos ou mais. Entidades parceiras são os estados, Distrito Federal, municípios, entidades da sociedade civil organizada e instituições de ensino superior que estabelecem parceria com o Ministério da Educação, por intermédio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad/MEC), na execução das ações do Programa Brasil Alfabetizado. Os objetivos do programa são os de dar cumprimento ao Plano Nacional de Educação - determina a erradicação do analfabetismo e o progressivo atendimento a jovens e adultos no primeiro segmento de Educação de Jovens e Adultos até 2011 - e promover ações de inclusão social, ampliando as oportunidades educacionais para jovens e adultos com 15 anos ou mais que não tiveram acesso ou permanência na educação básica; e estabelecer um programa nacional de fornecimento de livro didático adequado ao público da alfabetização de jovens e adultos como um recurso básico, no processo de ensino e aprendizagem (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2008).
Segundo informações do Ministério da Educação do Brasil (SECRETARIA DE
EDUCAÇÃO BÁSICA, 2008), o Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino
Médio foi implantado em 2004 e prevê a universalização de livros didáticos para os
alunos do ensino médio público de todo o país. Até o início de 2005 foram
distribuídos os livros das disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática. Em 2007,
foi feita a escolha dos livros didáticos de História e de Química, utilizados a partir de
2008. Em 2008 foram incluídas as disciplinas de Geografia e Física para serem
utilizadas em 2009, completando, assim, a universalização do atendimento do
ensino médio. Portanto, o livro didático de Física para o ensino médio ainda não é
uma realidade para os alunos brasileiros.
Concluímos que o professor pode utilizar diferentes materiais de consulta de
didáticos ou paradidáticos. A seguir teceremos alguns comentários acerca dos
textos.
1.1. O PAPEL DOS TEXTOS DE APOIO
Sob o ponto de vista editorial, verificamos que o livro paradidático é definido
como um livro comercial, sem compromisso com a formalidade científica, que tem
como objetivo trazer informações sobre a Ciência de forma descontraída e informal.
Entretanto, a definição de paradidático no meio acadêmico difere do ponto de
vista editorial. Consideramos os
livros paradidáticos (livros que vão além ou, não sendo especificamente didáticos, que se prestam ao didatismo) como um dos recursos onde podemos encontrar temas com abordagens contextualizadas, motivando desta forma o aluno para o hábito da leitura (TONI; FICAGNA, 2006)
Os PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) indicam a necessidade de
proporcionar aos alunos do ensino médio “... o desenvolvimento de capacidades de
pesquisar, buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a capacidade de
aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de memorização...”
(SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2000, p.5).
Os autores dos Parâmetros Curriculares Nacionais (SECRETARIA DE
EDUCAÇÃO BÁSICA, 2000) afirmam que o país passa por um processo de
mudança educacional e que
O aumento dos saberes que permitem compreender o mundo favorece o desenvolvimento da curiosidade intelectual, estimula o senso crítico e permite compreender o real(SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2000, p.15).
Acreditamos que mudanças são necessárias para promover uma melhor
formação de nossos estudantes, aumentando a qualidade do ensino.
A transformação de qualidade que se procura promover na formação dos jovens irá conviver com mudanças quantitativas e qualitativas, decorrentes de processos sociais e culturais mais amplos, que precisam ser consideradas e compreendidas (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2002, p.10).
Para promover a mudança no ensino e na aprendizagem de Física, as fontes
de consulta dos professores e dos alunos podem ser um ponto a ser melhorado.
De acordo com Toni e Ficagna (2006, p.2) a utilização do livro didático ocorre
de forma inadequada, ou seja, o professor enfatiza que este é o único recurso de pesquisa, fazendo deste uma mera repetição de conteúdos, que muitas vezes estão desatualizados, impedindo desta forma a criatividade e a motivação para a pesquisa ... muitos dos livros didáticos são portadores de informações prontas, acabadas, não oportunizando a construção coletiva do conhecimento, deixando de formar pessoas criativas, pesquisadoras, curiosas, inaptas para encontrar novas soluções para os problemas que terão que enfrentar na sociedade.
Segundo Megid Neto & Fracalanza (2003, p.151), o livro didático
configura erroneamente o conhecimento científico como produto acabado, elaborado por mentes privilegiadas, desprovidas de interesses político-econômicos e ideológicos, ou seja, que apresenta o conhecimento sempre como verdade absoluta, desvinculado do contexto histórico e sociocultural
Diante dos diversos problemas que surgiram a partir do uso dos livros
didáticos de Física, uma pesquisa foi realizada (MEGID NETO; FRACALANZA,
2003, p.148) com o intuito de enumerá-los. Foi constatada a ausência de:
do aluno e com seu entorno sócio-histórico; atendimento à diversidade cultural de
cada local ou região; atualidade de informações; estímulo à curiosidade, à
criatividade e à resolução de problemas.
Entretanto, em 2004 foi dado início à avaliação sistemática de livros didáticos
do ensino médio de Matemática e Língua Portuguesa, e no ano de 2007, incluídos
nesta avaliação os livros de Física. Através da avaliação, os livros didáticos de
Física começaram a ser reformulados pelos autores, dentro dos critérios
estabelecidos pelo Ministério da Educação. Segundo o Catálogo do Programa
Nacional do Livro para Ensino Médio de Física (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO
BÁSICA, 2008a), os critérios de avaliação utilizados são de duas naturezas:
eliminatório e de qualificação. Os eliminatórios são: I) correção e adequação
conceitual e correção das informações básicas; II) coerência e pertinência
metodológicas; III) preceitos éticos. Os critérios de qualificação são: I)quanto à
construção de uma sociedade cidadã; II) Espera-se que a obra seja caracterizada
pelo uso de uma linguagem gramaticalmente correta; III) quanto ao livro do
professor, é fundamental que ele descreva a estrutura geral da obra, oriente com
formulações claras e precisas os manejos pretendidos ou desejáveis do material em
sala de aula, sugira atividades complementares, forneça subsídios para a correção
das atividades e exercícios propostos aos alunos, discuta o processo de avaliação
da aprendizagem, informe e oriente o professor a respeito de conhecimentos
atualizados e/ou especializados indispensáveis à adequada compreensão de
aspectos específicos de uma determinada atividade ou mesmo de toda a proposta
pedagógica da obra; IV) quanto à estrutura editorial e aos aspectos gráfico-editoriais.
Como os próprios critérios de qualificação da avaliação dos livros didáticos
complementares durante as aulas, o texto paradidático se faz um possível
instrumento que auxilie nestas atividades.
Os objetivos principais que devem ser considerados no momento da
elaboração de textos paradidáticos são: viabilizar o acesso dos estudantes ao
universo científico e aos conhecimentos necessários para a vida em sociedade por
meio de leitura contextualizada com o cotidiano dos alunos, prezando também pela
apropriação dos fatos históricos relacionados ao conteúdo e demonstrando a forma
em que foram produzidos os conhecimentos científicos.
Se os objetivos forem cumpridos, hipoteticamente os textos paradidáticos
poderiam possibilitar um maior interesse dos alunos pela Física mediante uma
conveniente postura diferenciada do professor. De acordo com Assis (2005, p.56),
os textos paradidáticos
possuem uma estrutura não linear, diferindo dos textos tradicionalmente usados pelos professores (didáticos), estabelecendo relações entre vários assuntos, articulando-os de modo a oferecerem condições para que os mesmo sejam trabalhados de forma desfragmentada, viabilizando ainda a interdisciplinaridade, o que promove a articulação entre alguns conteúdos de várias disciplinas...
...a leitura pode propiciar a articulação entre Ciência, tecnologia, sociedade e ambiente, bem como corroborar para uma visão mais abrangente do mundo, contribuindo assim para a formação de um aluno em condições de refletir sobre atitudes relacionadas à cidadania, incorporando uma postura mais dinâmica e comprometida com a sua realidade
Os PCN+ (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2002) trazem uma
citação dos possíveis instrumentos que poderiam ser utilizados para contribuir com
uma possível melhoria na participação e no interesse do aluno, pois
já se percebem experiências importantes em muitas escolas brasileiras que desenvolvem novos projetos pedagógicos e novas práticas educacionais, nas quais leituras, investigações,
complementam a didática da transmissão e a pedagogia do discurso. Essas novas práticas, usualmente, são resultado de um trabalho de toda a comunidade, em cooperação com a direção escolar, em apoio à transição entre o velho e o novo modelo de escola (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA, 2002, p.11).
Um cuidado que tomamos neste momento, é evitar que estejamos induzindo
que este instrumento seja interpretado como a solução de todos os problemas
educacionais. Não é este o foco de nosso raciocínio aqui utilizado. Apenas estamos
refletindo sobre a leitura de textos paradidáticos sob a mediação do professor, como
uma possível utilização de mais um instrumento em sala de aula.
Para viabilizar o uso dos textos paradidáticos, é de fundamental importância a
participação dos estudantes de forma ativa e colaborativa, o que nem sempre pode
ocorrer com uma simples mudança de instrumento de consulta. Ao professor, cabe a
manipulação adequada de estratégias metodológicas, conforme salienta Assis
(2005, p.55):
é fundamental que o professor, além de conhecer os conteúdos a serem ensinados, utilize estratégias metodológicas que propiciem a participação dos estudantes. Uma estratégia que tem despertado grande interesse entre os pesquisadores é a utilização de textos paradidáticos em aulas de Física, pois que, muitos desses textos tratam dos conteúdos científicos num contexto das relações científicas, tecnológicas, sociais e ambientais. Muitos deles abordam a história da Ciência
Com relação ao uso de leituras no ensino de Ciências, a pesquisa realizada
por Almeida, Silva & Machado (2001), mostra que "...não é só quem escreve que
significa; quem lê também produz sentidos...”. Sendo assim, acreditamos que seja
importante fazer com que os alunos tenham um compromisso com as interações
durante as aulas, que conduzidas e mediadas pelo professor, no processo de leitura
produção dos sentidos que o texto forneceu a ele, permitindo uma intervenção do
professor que favoreça o aprendizado destes alunos.
Ao discutirmos a Física como Ciência, é necessário pensar também na
compreensão da natureza das Ciências, na contextualização da Física e na
articulação com as outras disciplinas, sua localização histórica e social, na
desmistificação dos cientistas como ídolos, na Ciência como provisória e mutável,
como uma produção humana, assim como seus desencadeamentos alterando a
história da humanidade.
Segundo Matthews (1995), Vannucchi (1996) e Carneiro & Gastal (2005), são
estes enfoques, perante a Ciência, que podem ser modificados para a busca de um
processo de ensino com maior qualidade.
Como nosso foco está no processo de ensino, precisamos ter parâmetros
para avaliar se este processo, aplicado pelo professor, foi produtivo durante o
processo de aprendizagem dos alunos. Para tanto utilizamos uma análise pautada
nos referenciais da alfabetização científica, conforme discutida a seguir.
1.2. A ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA
Diversas pesquisas têm discutido a alfabetização na área de Educação para a
Ciência (CHASSOT, 2003; BRANDI & GURGEL 2002; LACERDA, 1997; PENICK,
1998; OLIVEIRA, 2006; HAZEN, R. M. & TREFIL, J, 1995).
Entendemos por ensino de Ciências todo o ensino que envolve as Ciências
Naturais (Física, Química, Biologia), aplicado aos alunos do Ensino Básico (Infantil,
Fundamental e Médio), bem como para o Ensino de Jovens e Adultos (1º segmento
O termo alfabetização científica surge, segundo Penick (1998), com Hurd
(1958).
Independentemente do surgimento do termo “alfabetização científica”
sabemos, hoje, que se constitui uma nova visão sobre a aprendizagem de Ciências.
A alfabetização científica, na visão de Penick (1998, p.92), é a combinação da
observação da Ciência, da natureza da Ciência e da Ciência do conhecimento
contribuindo para a resolução de problemas do mundo real. Por problemas do
mundo real, entendemos que são os problemas dos seres humanos com a
sociedade e o ambiente em que vivem, pois não há Ciência sem que haja um ser
humano pensando sobre Ciência.
Segundo Hazen e Trefil (1995, p.12 apud OLIVEIRA, 2006, p.23), “...para nós,
alfabetização científica é ter o conhecimento necessário para entender os debates
públicos sobre as questões de Ciências e Tecnologia. Ou seja: é um misto de fatos,
vocabulário, conceitos, história e filosofia...”
Associando os objetivos de aprendizado, esperados com o uso dos
referencias da alfabetização científica, aos objetivos dos processos de ensino do
professor ao planejar suas aulas, procuramos demarcar abaixo possíveis pontos
importantes para as ações do professor em sala de aula.
Há, portanto, um indicativo de que é necessária uma estruturação do
planejamento e execução das aulas por parte do professor.
Entendemos que a alfabetização científica pode ser um possível alicerce,
importante para o trabalho do professor e conduz, segundo Brandi e Gurgel (2002,
P.113), a
aprofundamento de estudos sobre os fenômenos da natureza e outros.
Salientamos que, quanto mais coerente for o conteúdo ensinado com a vida
diária dos alunos, poderemos ter a possibilidade de participação mais ativa deles,
conforme defende Chassot (2003, p.90), dizendo que
hoje não se pode mais conceber propostas para um ensino de Ciências sem incluir nos currículos componentes que estejam orientados na busca de aspectos sociais e pessoais dos estudantes.
Assim, um maior comprometimento dos alunos poderia ocorrer se a
perspectiva da alfabetização científica fosse utilizada no contexto de sala de aula,
considerando que a Ciência passaria a ser vista como tendo uma linguagem a parte,
a linguagem científica que dá acesso aos alunos a um mundo paralelo de
conhecimentos científicos. Não são aqueles conceitos memorizados ou sistemas de
conceitos e equações sem ligação com o fenômeno na realidade, mas sim uma
interpretação e compreensão mais completa e significativa para o aluno. Espera-se
que a Ciência seja uma linguagem; assim, ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que está escrita a natureza. É um analfabeto científico aquele incapaz de uma leitura do universo (CHASSOT, 2003, p.91).
E o acesso a esta linguagem acontece por meio do professor, que pode
auxiliar seus alunos a alcançar este arsenal de conceitos, esquemas conceituais e
símbolos que traduzem a linguagem científica.
Lacerda (1997, p.98) define a alfabetização científica como sendo a
ou relacionados ao uso da Ciência e da tecnologia. Trata-se da instrumentação do indivíduo com conhecimentos científicos válidos e significativos tanto do ponto de vista social quanto do ponto de vista individual, sem os quais o próprio exercício da cidadania ficaria comprometido na medida em que ele depende, entre outros aspectos, da intervenção profissional e da auto-satisfação do indivíduo como detentor de conhecimentos técnicos que lhe são pertinentes.
Para a presente pesquisa, adotamos uma categorização da alfabetização
científica defendida por Penick (1998, p.93), por meio de níveis de alfabetização
científica hierarquizada em quatro níveis, que podem ser alcançados sempre que um
nível anterior já tenha sido atingido. São eles:
a) Alfabetização Nominal: é aquela em que o estudante identifica termos e conceitos
científicos na natureza, mas possui falsos conceitos e apresenta explicações
ingênuas para tais conceitos.
b) Alfabetização Funcional: é aquele estudante que apresenta um vocabulário científico
e termos definidos corretamente, mas com freqüência apenas os memorizou sem
que houvesse a compreensão efetiva dos conceitos.
c) Alfabetização Estrutural: o estudante compreende esquemas conceituados do
conteúdo, entende o conhecimento e habilidades processuais e pode explicar os
conceitos com suas próprias palavras.
d) Alfabetização Multidimensional: o estudante sabe exatamente o lugar do conteúdo
que aprendeu na natureza e entre outras Ciências, sabe a história e a natureza do
Em seu trabalho, Penick (1998) faz referência à disciplina Biologia, mas
entendemos que esta categorização pode ser viável para a Física, considerando
que,
ao definirmos os objetos de cada uma das Ciências que conhecemos, como a Física, a Biologia, a Geologia etc., nos damos conta das muitas interações e, particularmente, das intersecções entre esses objetos...
...Temos nesse conjunto as Ciências naturais. Aliás, é preciso dizer o quanto a divisão em Ciências naturais e Ciências humanas parece inadequada, pois a Química, a Física, a Biologia e mesmo a Matemática são também Ciências humanas, porque são constructos estabelecidos pelos humanos (CHASSOT, 2003, p.92).
Esta categorização será utilizada para a realização da análise discursiva das
falas dos alunos e do professor, ocorridas durante as aulas, que foram gravadas em
vídeo e posteriormente transcritas. Para tanto, foram selecionados momentos
extraídos das aulas que evidenciam as situações que se pretende investigar,
denominados de episódios. A seguir, temos um detalhamento das particularidades
CAPÍTULO II
2. A PESQUISA
Considerando o ensino de Física, que comumente privilegia os cálculos
referentes aos conceitos físicos, entendemos como uma atitude importante do
professor proporcionar um espaço de diálogo em sala de aula para propiciar ao
aluno o aprendizado.
A intenção aqui está centrada na análise das ações do professor em sala de
aula ao utilizar como recurso um específico texto paradidático em aulas de Física. O
objetivo foi identificar as ações do professor durante as interações discursivas em
sala de aula, mediante uma determinada categorização da análise da enunciação
defendida por Bardin (1977), que descreveremos mais adiante, e verificar, segundo
a categorizarão da alfabetização científica defendida por Penick (1998), se houve
aprendizado por parte dos alunos.
Além da necessidade de domínio de conteúdo por parte do professor, e dos
demais fatores importantes para o processo de ensino, consideramos importante
que haja uma mudança de atitude do professor durante as aulas, pois segundo
Prette et al. (1998), é necessária uma reformulação, principalmente, com enfoque
nas ações discursivas.
2.1. O OBJETO DE ESTUDO
Procuramos analisar como o professor, utilizando o texto paradidático
denominado “Nosso Universo”, utiliza seu discurso durante a construção de
conhecimentos por parte dos seus alunos durante as aulas. Para tanto,
estabelecemos elementos que podem propiciar a análise das interações discursivas
durante as aulas.
Contudo, seguimos a pesquisa buscando responder uma questão principal:
Quais ações e atitudes do professor no contexto das aulas de Física, utilizando o
texto paradidático “Nosso Universo”, levam os alunos a avançar para um nível
superior de alfabetização científica em Física segundo Penick (1998)?
Consequentemente os seguintes objetivos orientaram a pesquisa:
1. Caracterizar o formato do discurso do professor associando-o ao aprendizado (ou
ausência de aprendizado) dos alunos dentro dos parâmetros da alfabetização
científica defendida por Penick (1998);
2. Verificar se houve (ou não) avanço de nível hierárquico de alfabetização científica
dos alunos, comparando suas opiniões durante as aulas e as avaliações após as
aulas;
Para verificar os pontos enunciados acima foram analisados os discursos do
professor e de seus alunos durante as aulas de Física.
No discurso do professor foi analisada a capacidade de aproveitar situações
de questionamento, a exploração de temas que venham a surgir durante as aulas, o
estímulo à procura das respostas dos problemas pelos alunos e a posterior
problematização, a explicação do conceito no momento oportuno, entre outros que
Para avaliar a potencialidade de surgimento de situações de aprendizagem
contidas no texto paradidático, propiciadas pelas ações do professor,
consideraremos, como critério, que o aluno tenha avançado seu nível de
aprendizagem sobre um conceito, segundo os níveis da alfabetização científica
estabelecidos por Penick (1998), quando ele expressar sua opinião durante os
fragmentos discursivos e, em fragmentos posteriores ou durante as avaliações
pós-aula, sua concepção do conceito em questão tenha aparecido modificada ou tenha
sido melhorada em relação ao fragmento anterior.
Para a análise, consideramos alguns pontos mais importantes:
a) Os conceitos físicos apresentados no texto paradidático “Nosso Universo”;
b) As características das ações do professor que favoreçam ou não o
entendimento dos conceitos físicos sob o enfoque da alfabetização
científica;
c) A participação dos alunos nas interações proporcionadas pelo debate
sobre o texto paradidático em questão;
Em resumo, serão analisadas as ações do professor que contribuem para o
aprendizado dos conceitos de Física contemplados no texto paradidático Nosso
Universo, através dos fragmentos discursivos proferidos durante as aulas e
avaliações efetuadas após as atividades.
Algumas considerações quanto a metodologia são necessárias, como se
2.2. A METODOLOGIA
A pesquisa se enquadra como um estudo de caso, conforme os critérios dos
autores Bogdan & Biklen (1999, p.89). Segundo esses autores, o estudo de caso se
caracteriza como uma abordagem qualitativa de investigação favorável à
compreensão, exploração ou descrição de fatos e contextos complexos que
envolvam múltiplos fatores a serem analisados. O local do estudo (sala de aula)
constitui a fonte de dados e o pesquisador é o instrumento de obtenção e análise de
dados. O foco principal está no processo como tudo ocorre, bem como no produto e
no resultado final. Os dados são analisados como acontecimentos particulares,
migrando para conclusões com análise global.
A pesquisa é descritiva e considera-se que as análises serão realizadas de
forma indutiva. As afirmações e conclusões foram construídas conforme os dados
foram sendo agrupados.
Os fragmentos discursivos foram explorados considerando-se as palavras,
orações, incluindo as omissões, períodos de silêncio, risadas, exclamações,
entonação de voz e gritos.
Conforme já relatado, foram avaliados os fragmentos antes e depois das
interações, com o intuito de verificar se houve ou não aprendizado segundo o
referencial da alfabetização científica de Penick (1998).
2.3 OS SUJEITOS
As aulas aconteceram em uma escola pública do Estado de São Paulo, tendo
adultos (EJA), do período noturno, na faixa etária de 18 a 45. O tempo total do início
das aulas até o término foi de um semestre.
Nesta turma havia 40 alunos matriculados, mas como a freqüência era muito
flutuante, foi adotado o critério de selecionar os alunos pela regularidade de
participação durante as aulas, resultando nos 14 alunos escolhidos, pois a maioria
dos outros 26 alunos matriculados não freqüentou com regularidade o curso.
A escolha do professor ocorreu em função de sua formação, pois durante as
atividades desta pesquisa ele estava terminando o doutorado em educação. Durante
uma conversa antes das atividades o professor mostrou-se aberto para mediar entre
o texto “Nosso Universo” e os alunos. A importância desta conversa, anteriormente
às atividades, se deu porque durante um ensaio da utilização do texto “Nosso
Universo” efetuado por Assis (2005), observando como sujeito um outro professor de
ensino médio não engajado em pesquisas na área de educação, resultou na leitura
do texto pelos alunos, e a posterior explicação da versão científica pelo professor na
seqüência, sem que houvesse um debate ou questionamento entre professor/aluno
ou aluno/aluno, para o possível surgimento de opiniões dos alunos. Se assim fosse
feito, o único objeto que poderia ser utilizado para a análise dos dados seria a leitura
dos alunos, sem qualquer argumentação por parte do professor.
O professor atuante nas interações analisadas pela presente pesquisa não
conhecia o texto “Nosso Universo” e nunca havia utilizado tal material em suas
aulas.
Com relação ao texto paradidático utilizado durante as atividades, tecemos
2.4. CONSIDERAÇÕES SOBRE O TEXTO PARADIDÁTICO NOSSO UNIVERSO
O texto paradidático utilizado é denominado “Nosso Universo” e foi elaborado
por professores do ensino médio durante o desenvolvimento de um projeto de
melhoria do ensino público1. Para a elaboração do texto, foram utilizados como
referência os livros “A Origem do Universo” (LONGAIR, 1994), “Big Bang”
(COUPER, 1998), “Estrelas e Galáxias” (OXLADE, 1998) e “Galileu e o Sistema
Solar” (STRATHERN, 1999). Como proposta principal, os professores que criaram o
texto paradidático em questão, visaram contribuir para um ensino que
proporcionasse a unificação do conhecimento científico com o cotidiano. Entre as
características esperadas para esse texto, no ato de elaboração, estão os
pressupostos de Salem & Kawamura (1996, p.594 apud ASSIS, 2005, p.70), abaixo
destacados:
- ser conceitual/qualitativo, bem como formal/quantitativo; trabalhar os “comos” e os “porquês”;
- tratar o conhecimento com sentido/relação com a “vida real”;
- explorar questões atuais estimulando a curiosidade, observação e reflexão, levando ao questionamento de problemas;
- propiciar a leitura e contribuir para o estabelecimento de uma forma de pensar, criando a oportunidade para que o estudante se aproxime de questões que, normalmente não encontram espaço para serem abordadas no cotidiano escolar.
O texto final produzido é composto por cinco capítulos. O personagem
principal do texto é chamado Ícaro, um adolescente que vivencia algumas situações
da vida cotidiana durante todo o texto. As situações do cotidiano são utilizadas para
1
contextualizar os conteúdos científicos de Física, utilizando termos e situações muito
comuns na vida dos adolescentes na atualidade.
Um conjunto de sugestões de pesquisas em sites da Internet, filmes e leituras
de livros, é apresentado ao final de cada capítulo em forma de apêndices.
Importante lembrar que, para a presente pesquisa, foram utilizados dados
obtidos em aulas referentes apenas ao Capítulo II do texto “Nosso Universo”
(anexo).
Abaixo descrevemos de forma sucinta os capítulos que fazem parte do texto
elaborado.
Uma Breve descrição dos capítulos
Capítulo I: O sonho de Ícaro
O adolescente Ícaro, cansado da rotina de ir à escola toda as manhãs,
acorda, se apronta, e segue seu caminho até a escola. Cansado, não vê a hora de
chegar a sua casa para o momento mais importante de seu dia: a hora de acessar a
Internet e encontrar com seus amigos em uma sala virtual de bate-papo.
Ao acessar a Internet, Ícaro começa a trocar mensagens com os colegas e,
eis que surge uma mensagem de um desconhecido chamado Dédalo que chama
sua atenção.
A mensagem dizia “...eu sou feito de resto de estrelas...”. Ícaro pergunta ao
desconhecido do que se trata e Dédalo responde que este é um trecho da música
Tubi Tupy de Carlos Rennó Lenine. Ainda indica como encontrá-la na Internet.
Durante a música, Ícaro cai no sono e começa a sonhar. Sonha que possui
asas e pode voar. Ao começar a voar, ele sai da Terra e se sente mais leve ao se
afastar da Terra. Ao se aproximar da Lua, ele percebe que é atraído por ela. Sua
viagem continua pelos planetas e pelo Sol.
Durante a viagem Ícaro faz perguntas como: “Por que Marte é tão vermelho?”
e “Será Júpiter o maior de todos?”.
Ao tocar o despertador Ícaro se apronta, pois está na hora de ir à escola.
Durante a aula de Física ele pergunta ao professor: “...Por que o Sistema Solar tem
tantos planetas e uns são diferentes dos outros? Lá tem mais alguma coisa além de
planetas?...”.
Seu professor responde que naquele momento não seria possível esclarecer
as questões e pediu que Ícaro esperasse até o próximo bimestre, quando seria
tratado o tema de Gravitação Universal.
No apêndice deste capítulo do texto “Nosso Universo”, a história mitológica de
Dédalo e Ícaro é contada. Existe também uma explicação para o motivo da Lua ser
visível ou não de acordo com as fases. Um outro tópico do apêndice explica que no
sonho de Ícaro ele pode ver o Sol, mas na realidade não seria possível fazê-lo de
uma distância tão pequena, devido à intensa radiação da estrela. Por fim, são
apresentadas sugestões de atividades de pesquisa, bem como um filme, um site e
um livro a serem consultados.
Capítulo II: O peso do conhecimento
Ícaro retorna à sala de bate-papo na noite seguinte e encontra novamente seu
foi possível fazer a viagem sob as condições em que foram feitas porque era um
sonho. Na realidade, explica, vários fatores impossibilitam tal viagem como, por
exemplo, a impossibilidade de conseguir atingir a velocidade de escape tão alta da
Terra apenas utilizando asas. Outro problema seria a falta de uma roupa apropriada.
Ícaro diz a Dédalo que ele está parecendo professor com seus dizeres e
pergunta a ele: “somos feitos de estrelas?”
Dédalo utiliza a teoria do Big Bang para explicar a formação dos planetas e
dos elementos químicos, explicando que uma nuvem de gases e poeira gira e, ao se
contrair pela atração gravitacional, começa a girar mais rápido e forma o planeta.
O texto explica a diferença entre peso e massa e, posteriormente, apresenta a
Lei da Gravitação Universal.
Ao final do capítulo II do texto, Dédalo propõe à Ícaro que faça um
experimento com uma cadeira giratória. O experimento consiste em girar numa
cadeira com os braços abertos e depois com os braços fechados. A tentativa é que
Ícaro entenda porque o conjugado de poeira e gases gira mais rápido quando há
concentração de massa.
No apêndice, ainda do capítulo II do texto, há considerações sobre a variação
de temperatura proporcionada pela atmosfera terrestre, considerações sobre a
velocidade de escape de um planeta, sobre a equação da Gravitação Universal e
sobre os resultados do experimento com a cadeira giratória. Ao final do apêndice
Capítulo III: Universo é assim...
O próximo dia é um sábado e Ícaro continua curioso e empolgado com suas
questões. Entretanto, como todo adolescente, Ícaro possui outras atividades e
interesses, como jogar futebol, namorar e passear. Sendo assim, liga para sua
namorada Sandrinha. Ela diz a Ícaro que ele está sumido e pergunta o que vem
acontecendo com ele. Pergunta se, por acaso, ele não teria uma nova namorada.
Ícaro diz que não e a convida para sair a noite. Ela concorda e eles combinam para
as oito e meia da noite.
Ícaro pede o carro emprestado a sua mãe para usar a noite, mas ela diz que
não porque ele não tem habilitação. Ainda pela tarde, ele vai a um jogo de futebol
com seus amigos. Ao retornar, toma um banho e se arruma para o encontro.
Na hora marcada, Ícaro chega à casa de Sandrinha e de lá, os dois seguem
para uma lanchonete com os amigos.
Na lanchonete, Ícaro encontra alguns bancos giratórios junto ao balcão da e
realiza o experimento. Sua namorada pergunta o que vem a ser aquilo e ele diz que
não é nada de mais.
Ao chegar a sua casa, Ícaro acessa a Internet e conta sua experiência a
Dédalo, perguntando: “Por que quando fecho os braços a velocidade de giro
aumenta?”. Dédalo explica o Principio de conservação da quantidade de movimento
angular a Ícaro e contextualiza com o fenômeno do giro da nuvem de gás e poeira
para formar os planetas.
Ícaro pede a Dédalo que responda à sua dúvida anterior sobre a formação
Dédalo explica que a nuvem de gás e poeira foi se concentrando devido à
força gravitacional, dando origem aos planetas. Ele envia a Ícaro o modelo atual de
Sistema Solar e a relação de tamanho entre os planetas.
No apêndice desse capítulo do texto existe uma explicação sobre o
movimento circular na cadeira giratória. Também existem explicações sobre as
forças internas de um sistema e sobre o princípio de conservação de momento
angular. Há ainda sugestões de atividades de experimento e tópicos de pesquisa,
além da indicação de dois sites na Internet.
Capítulo IV: O Santo Inquérito
Logo pela manhã, já na escola, Ícaro fica entusiasmado com a peça teatral
que iria assistir com os amigos, chamada “O Santo Inquérito”.
A peça se passa por volta de 1750, momento em que as questões que
abalavam a fé Cristã eram tratadas como heresia e poderiam acabar com a morte de
seus defensores na fogueira.
Durante a peça há uma passagem na qual uma personagem diz:
Não sei explicar. Mas de um momento para outro, eu me senti tão só, tão desamparada. Só me aconteceu isso uma vez, quando eu era menina e alguém me disse que a Terra se movia no espaço. Não sei que sábio havia descoberto. Até então, a Terra me parecia tão sólida, tão firme...De repente, comecei a pensar em mim mesma, uma pobre criança, montada num planeta louco, que corria pelo céu girando em volta de si mesmo, como um pião. E tive medo, pela primeira vez na vida. Uma sensação de insegurança me fez passar noites sem dormir, imaginando que durante o sono podia rolar no espaço como uma estrela cadente (ASSIS, 2005, p.272)
Ao chegar a sua casa, Ícaro acessa a Internet e troca mensagens com
com Dédalo que tem a intenção de realizar uma consulta sobre o tema, pois
percebeu que muitas pessoas, durante a história da humanidade, se preocuparam
em pesquisar sobre esses assuntos para que fossem conhecidos pelas pessoas
hoje.
No dia seguinte, Ícaro conversa com a professora de Língua Portuguesa e
relata sua intenção. A professora o apoia e ele durante semanas realiza uma
consulta sobre a história do Sistema Solar.
Sua consulta é apresentada sob a forma de um trabalho escolar e tem por
título “Concepções históricas sobre nosso Sistema Solar”.
Uma descrição da história da Astronomia e o desencadeamento dos fatos são
relatados. Os maiores pensadores são citados, entre eles Tales de Mileto, Nicolau
Copérnico, Aristóteles, Giordano Bruno, Tycho Brae, Galileu Galilei e Einstein. No
apêndice deste capítulo do texto, são indicados para consulta três filmes, um site e
um livro.
Capítulo V: O grande “Rei Sol”
Ao realizar a consulta, Ícaro ficou ainda mais curioso sobre os temas de
Física.
Em uma noite em que acessava a Internet, encontrou Dédalo e contou sobre
o seu trabalho. Em seguida pediu a Dédalo que continuasse explicando sobre a
formação do Universo e dos planetas.
Ícaro gostaria de saber como se formou o Sol e por que é tão quente. Dédalo
núcleo, aumentando sua temperatura e dando início às reações nucleares. Explica
que o Sol se encontra numa fase em que não ocorre mais contração gravitacional e,
a transformação de hidrogênio em Hélio, é a principal fonte de energia.
Complementa dizendo que dentro de sete ou oito bilhões de anos, o Sol atingirá um
estado de temperatura em torno de 2500ºC, hoje em 6000ºC, e terá sua maior
luminosidade e seu tamanho será 70 vezes maior que o atual. Neste momento, se
ainda existir vida na Terra, ela será extinta.
Em seguida, Ícaro pergunta a Dédalo sobre o conceito de massa e recebe a
informação que massa é a medida da inércia de um corpo, ou seja, um número que
representa a capacidade que um corpo tem de resistir à variação de velocidade
vetorial quando ocorre a aplicação de uma força, chamando-a de massa inercial.
Mais adiante, Ícaro questiona Dédalo sobre a transformação de Hidrogênio
em Hélio e sobre a liberação de energia que ocorre neste processo. Assim, Dédalo
explica a Teoria da Relatividade Restrita com a introdução da equação que relaciona
massa e energia.
Ícaro pergunta: Por que os planetas não tem esta reação nuclear se eles
também foram formados pela condensação da mesma massa gasosa?
Dédalo explica que os planetas não têm massa suficiente para ter uma
condensação de alta magnitude e, consequentemente, um aquecimento muito alto.
Por isso os planetas não possuem temperaturas elevadas como a do Sol.
Logo em seguida Ícaro pergunta a Dédalo se os planetas ficam todos
alinhados em relação ao Sol. Dédalo responde que todos os astros do Sistema Solar
giram em torno do centro de massa do sistema, inclusive o Sol. Ainda explica a Ícaro
o conceito de centro de massa, inclusive a forma de calcular o centro de massa de
Na seqüência, há uma observação no texto que trata da diferença entre
centro de massa e centro de gravidade. No apêndice deste capítulo existe uma
explicação sobre as reações que ocorrem com o Hidrogênio, quando a temperatura
chega a 10 milhões de graus Celsius. Uma observação sobre as forças internas de
um sistema também é relatada.
Um outro tópico explica como se determina o centro de massa de um sistema
e, o tópico seguinte, trata da posição do centro de massa e do centro de gravidade.
No texto, é sugerido que os alunos realizem a construção de um circulo de raio 70cm
e um outro com 1cm, para comparar como o Sol ficará daqui a sete bilhões de anos.
É importante ressaltar que, nesta pesquisa, particularmente, trabalhamos
apenas dados obtidos com atividades relativas ao capítulo II do texto paradidático
“Nosso Universo”, por causa da riqueza de participações consecutivas dos alunos
nas interações (facilitando a aferição de aprendizagem) e, também, pela diversidade
de conceitos trabalhados dentro das aulas referentes a este capítulo. Ainda foi
relevante a escolha do capítulo II pela diversidade de formatos de fragmentos de
discurso do professor durante as aulas.
A partir dos dados coletados, apresentamos a seguir os dispositivos
selecionados para realizar a interpretação e análise dos dados.
2.5 OS DISPOSITIVOS UTILIADOS PARA A INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
Para a análise dos dados, utilizamos a categorização em níveis de hierarquia
de alfabetização científica, segundo Penick (1998), objetivando estabelecer uma
alunos, acerca dos conhecimentos específicos relacionados aos conteúdos de
Física.
As interações entre o professor e seus alunos, documentadas através de
gravações em vídeo e posteriormente transcritas, foram o ponto de partida para a
verificação da presença de ações do professor que podem ou não ter proporcionado
o aprendizado dos alunos, segundo as categorias de Penick (1998).
Neste sentido, a categorização e a análise dos dados foram determinadas
segundo o referencial da análise de enunciação, um dos tipos de análise de
conteúdo, segundo Bardin (1977).
Procurando justificar a escolha deste referencial teórico em nossa análise,
salientamos que a autora explora a análise de conteúdo que é “...um conjunto de
instrumentos metodológicos que se aplicam a discursos extremamente
diversificados...” (BARDIN, 1977, p.9). O motivo principal da escolha deste
referencial foi a condição em que a amostra se apresentou, rica em detalhes e muito
variada, com omissões, silêncios, risos e posições ideológicas.
A análise de conteúdo (sendo um dos tipos, a análise da enunciação),
trabalha a inferência (hermenêutica controlada) e é dividida em três pólos
cronológicos: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados
(inferência e interpretação). Caracteriza-se como uma ferramenta que prioriza a
análise qualitativa, mas utiliza em um determinado momento a análise quantitativa
para apoiar as conclusões. Escolhemos este referencial por se tratar de uma
ferramenta de uso específico para análise de discursos.
Bardin (1977, p.29) define os principais objetivos da análise de conteúdo, no
- A ultrapassagem da incerteza, é a verificação da leitura do pesquisador por
ele mesmo refletindo sobre a validação da generalização de sua inferência;
- o enriquecimento da leitura: uma segunda leitura mais atenta pode trazer à
tona novas descobertas sobre o conteúdo das mensagens.
A intenção é ir além da aparência do conteúdo e mergulhar em seus
significados.
Para a análise são definidas duas funções pela autora (BARDIN, p.30):
- função heurística: é o aumento da propensão da descoberta através da
análise de conteúdo;
- função de administração de prova: elaboração de hipóteses sob a forma de
afirmações provisórias, servindo de diretrizes que serão verificadas no sentido de
afirmação ou informação. As duas funções podem coexistir de maneira
complementar.
Segundo Bardin (1977, p.31) a “... análise de conteúdo é um conjunto de
técnicas de análise das comunicações. Não se trata de um instrumento, mas um
leque de apetrechos...”.
A autora afirma que a análise de conteúdo possui algumas diretrizes
principais, mas a sua utilização é ampla e a técnica pode sofrer adaptações
conforme a sua utilização, mantendo o rigor de seus principais objetivos.
Quanto à utilização da análise de conteúdo em pesquisas, Bardin (1977)
Tabela 1. Representação das características apresentadas por Bardin (extraído de
Bardin, 1977, p.35)
A presente pesquisa se enquadra na coluna de grupo restrito, pois se passa
em uma sala de aula de ensino de jovens e adultos (EJA) e o professor. Quanto ao
código e suporte, temos um enquadramento lingüístico escrito referente às
comunicações escritas trocadas dentro do grupo.
O enquadramento lingüístico oral refere-se às discussões e diálogos que
ocorrem dentro do grupo durante as aulas, utilizando a leitura do texto paradidático
grupo (célula sombreada). Esta pesquisa se enquadra nesta categoria de código e
suporte.
O enquadramento lingüístico icônico refere-se aos gestos e simbologias que
Finalmente, o enquadramento de outros códigos semióticos refere-se a todo
tipo de comunicação não verbal com destino a outrem, e, os comportamentos
diversos que podem ter sido registrados.
Quanto às técnicas, Bardin (1977) cita seis linhas principais: análise
categorial, análise de avaliação, análise da enunciação, análise da expressão,
análise das relações e análise do discurso.
Nesta pesquisa utilizamos a análise de enunciação pelo fato de diferenciar-se
das outras técnicas de análise de conteúdo. A análise de enunciação se apoia na
concepção da comunicação como um processo. O objetivo é desviar-se das
estruturas e elementos formais presentes no texto. Trabalha com as condições da
produção da palavra e com as modalidades do discurso (análise sintática e
paralinguística, análise lógica, análise dos elementos formais atípicos: silêncios,
omissões, ilogismos e realce de figuras de retórica).
De acordo com Bardin (1977) existe um roteiro a ser seguido:
a) constituição do Corpus;
b) preparação do material;
c) etapas de análise: alinhamento e dinâmica do discurso para encontrar a lógica
inerente à estrutura da mensagem, análise do estilo e análise dos elementos
atípicos de figuras de retórica.
Ao submeter o material coletado durante as observações de campo ao clivo
destas etapas, é esperado que haja a compreensão do seu significado.
Precisamos salientar que a autora, ao utilizar a análise de conteúdo clássica,
considera que o material de estudo possa ser fragmentado e isolado para ser