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Prevenção do câncer do colo do útero em população feminina do Parque Indígena do Xingu, Mato Grosso

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Academic year: 2017

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PREVENÇÃO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO EM

POPULAÇÃO FEMININA DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU,

MATO GROSSO

Tese apresentada à Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de

São Paulo, para obtenção do Título de Doutor em Ciências.

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PREVENÇÃO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO EM

POPULAÇÃO FEMININA DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU,

MATO GROSSO

Tese apresentada à Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de

São Paulo, para obtenção do Título de Doutor em Ciências.

Orientador: Profa. Dra. Neila Maria de Góis Speck Coorientador: Profa. Dra. Julisa Chamorro

Lascasas Ribalta

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Pereira, Erica Ribeiro

Prevenção do câncer do colo do útero em população feminina do Parque Indígena do Xingu, Mato Grosso. / Erica Ribeiro Pereira. -- São Paulo, 2011.

xi, 118f.

Tese (Doutorado) – Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-Graduação em

Ginecologia.

Título em inglês: Prevention of cervical cancer in female population Xingu Indigenous Park, Mato Grosso.

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iii

ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA

DEPARTAMENTO DE GINECOLOGIA

Chefe do Departamento:

Prof. Dr. Afonso Celso Pinto Nazário

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iv

PREVENÇÃO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO EM

POPULAÇÃO FEMININA DO PARQUE INDÍGENA DO XINGU,

MATO GROSSO

Presidente da banca:

Profa. Dra. Neila Maria de Góis Speck

Banca examinadora:

Prof. Dr. Roberto Geraldo Baruzzi

Prof. Dr. José Focchi

Prof. Dr. Luiz Carlos Zeferino

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v

Dedico esta tese às mulheres indígenas do Xingu que me receberam com carinho nos

anos que lá estive.

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vi

À Deus por me guiar e dar esperança nos momentos difíceis.

Aos meus pais, dedico mais esta trajetória em minha vida com eterno agradecimento.

Ao meu companheiro Rafael, pelo carinho e compreensão incondicional.

À orientadora Profa. Dra. Neila Maria de Góis Speck e coorientadora Profa. Dra. Julisa Chamorro Lascasas Ribalta, profissionais dedicadas e parceiras nesse trabalho junto às mulheres indígenas. Obrigada por me acompanharem nessa longa jornada, pela oportunidade, apoio e confiança durante todo este tempo de convívio.

Ao Prof. Dr. Roberto Baruzzi, por me acolher e orientar no início desta caminhada.

Ao Dr. Douglas Rodrigues, pela oportunidade de experimentar e ampliar meu trabalho na saúde indígena. Agradeço o carinho que se dedicou à leitura desta tese.

À Dra. Lavínia Santos de Souza Oliveira, pelo incentivo, apoio e dedicação proporcionados ao longo do meu trabalho no Projeto Xingu.

ÀDra. Sofia Beatriz Mendonça, pelo carinho e incentivo constante.

Ao Dr. Marcos Schaper dos Santos Júnior, pelo envolvimento e apoio neste trabalho junto às mulheres do Xingu.

ÀDra. Heloísa Pagliaro, pelo tempo e carinho dedicados (in memorian).

Sinceros agradecimentos aos meus eternos mestres: Dr. Baruzzi, Dr. Douglas, Dra. Sofia e Dra. Lavínia, pessoas iluminadas, altruístas e precursoras na saúde indígena.

(8)

vii

com carinho, em especial à Marly.

Aos alunos de graduação e residentes da Universidade Federal de São Paulo que colaboraram com nosso trabalho no Xingu.

À equipe do Núcleo de Prevenção de Doenças Ginecológicas-NUPREV, em especial às pós-graduandas: Valéria, Ana Carolina, Wany, Pabline, Fernanda, Daiene, Márcia que se dispuseram a viajar para o Xingu, contribuindo na continuidade desse projeto junto às mulheres indígenas.

Ao Departamento de Medicina Preventiva da UNIFESP por ter me recebido como aluna do Programa de Pós-Graduação durante período probatório.

Ao Departamento de Ginecologia da UNIFESP por ter me recebido como aluna do Programa de Pós-Graduação, possibilitando minha titulação. A Karim pelas orientações e apoio.

À equipe do Laboratório de Citopatologia do Departamento de Ginecologia da UNIFESP, em especial a Dra. Célia Regina Sakano que se dedicou ao processamento e leitura das lâminas, pelo envolvimento e responsabilidade.

À equipe do Departamento de Anatomia Patológica da UNIFESP, em especial ao Dr. Gustavo Rubino de Azevedo Focchi pela dedicação e apoio neste trabalho.

Ao Manoel Schimidt por dedicar-se à tradução do resumo da tese.

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viii

Dedicatória...v

Agradecimentos...vi

Listas de figuras e quadros...ix

Lista de tabelas...x

Lista de abreviaturas...xi

Resumo...xii

1. INTRODUÇÃO...01

2. JUSTIFICATIVA...09

3. OBJETIVOS...11

4. REVISÃO DE LITERATURA...13

4.1. Saúde sexual e reprodutiva da mulher indígena ...14

4.2. Mulheres indígenas do Xingu: aspectos culturais e reprodutivos...18

5. CONTEXTO HISTÓRICO...22

5.1. O Parque Indígena do Xingu...23

5.2. A Universidade Federal de São Paulo ...26

5.3. Breve histórico de contato dos povos do Médio, Baixo e Leste Xingu...28

5.4. Programa de atenção básica à saúde no Xingu ...31

5.5. O câncer do colo do útero no Xingu...35

6. PACIENTES E MÉTODOS...37

6.1. Delineamento do estudo...38

6.2. Local e população...38

6.3. Critérios de inclusão e não inclusão...38

6.4. Aspectos éticos...39

6.5. Período da coleta de dados...40

6.6. Fontes de informação...40

6.7. Trabalho de campo...41

6.8. Métodos...46

6.8.1. Coleta do exame citopatológico...46

6.8.2. Colposcopia...48

6.8.3. Cirurgia por ondas de radiofreqüência (CORAF)...50

6.9. Métodos estatísticos...51

7. RESULTADOS...52

8. DISCUSSÃO...63

9. CONCLUSÕES...80

10. ANEXOS...82

11. REFERÊNCIAS ...98

Abstract

(10)

ix

Figura 1. Mapa do Parque Indígena do Xingu, Mato Grosso...25

Figura 2. Organização da assistência à saúde indígena...33

Figura 3. Exame ginecológico realizado na aldeia e adaptado na rede...42

Figura 4. Observação do colo do útero por mulher da etnia Ikpeng...43

Lista de quadros

Quadro 1. Classificação de Bethesda, 2001...47

Quadro 2. Terminologia colposcópica, Barcelona (IFCPC, 2002)...49

Quadro 3. Classificação histológica de Richart, 1990...49

Quadro 4. Distribuição das 503 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo faixa etária, etnia e exame citopatológico, no período de outubro a dezembro de 2005, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...54

Quadro 5. Distribuição das 59 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, portadoras de atipias citológicas e achados colposcópicos, no período de outubro de 2005 a fevereiro de 2006, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...55

Quadro 6. Distribuição das 43 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo achados colposcópicos anormais e anatomopatológicos de biópsia, no período de fevereiro de 2006, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...56

Quadro 7. Distribuição das 22 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual que realizaram cirurgia, segundo resultados da citopatologia, colposcopia, anatomopatológico de biópsia, indicação e anatomopatológico de peça cirúrgica, no período de outubro de 2005 a maio de 2006, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...62

Quadro 8. Distribuição dos exames citopatológicos relativos à flora vaginal, período de outubro a dezembro de 2005, Médio, Baixo e Leste Xingu...95

Quadro 9. Distribuição dos exames citopatológicos relativos à microbiologia, período de outubro a dezembro de 2005, Médio, Baixo e Leste Xingu...95

Quadro 10. Distribuição dos exames citopatológicos quanto à presença de Gardnerella vaginalis segundo etnias, período de outubro a dezembro de 2005, Médio, Baixo e Leste Xingu...96

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x

Tabela 1. Distribuição das 503 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo etnias e resultado do exame citopatológico, no período de outubro a dezembro de 2005, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...56

Tabela 2. Distribuição das 503 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo faixa etária e resultado do exame citopatológico, no período de outubro a dezembro de 2005, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...57

Tabela 3. Distribuição das 59 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo faixa etária e atipias citológicas, no período de outubro a dezembro de 2005, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...58

Tabela 4. Distribuição das 59 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo grupo etário e atipias citológicas, no período de outubro a dezembro de 2005, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...58

Tabela 5. Distribuição das 43 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo faixa etária e exame anatomopatológico de biópsia, no período de fevereiro de 2006, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...59

Tabela 6. Distribuição das 43 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo grupo etário e exame anatomopatológico de biópsia, no período de fevereiro de 2006, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...59

Tabela 7. Distribuição das 43 mulheres indígenas com idade igual ou superior a 12 anos e história de vida sexual, segundo resultado do exame citopatológico e anatomopatológico de biópsia, no período de fevereiro de 2006, residentes no Médio, Baixo e Leste Xingu...60

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xi

ACA Adenocarcinoma

AEI Auxiliar de enfermagem indígena AIS Agente indígena de saúde

AGC Células glandulares atípicas

ASC-H Células escamosas atípicas não podendo afastar lesão de alto grau ASC-US Células escamosas atípicas de significado indeterminado

CAF Cirurgia de alta freqüência CASAI Casa de Apoio a Saúde Indígena CEC Carcinoma espinocelular

CEP Comitê de ética em pesquisa CNS Conselho Nacional de Saúde

CONEP Comitê nacional de ética em pesquisa CORAF Cirurgia por ondas de radiofreqüência DIU Dispositivo intrauterino

DSEI Distrito Sanitário Especial Indígena DST Doenças sexualmente transmissíveis EMSI Equipe multiprofissional de saúde indígena EPM Escola Paulista de Medicina

FUNAI Fundação Nacional do Índio FUNASA Fundação Nacional da Saúde HPV Papilomavírus humano

HIV Vírus da Imunodeficiência Humana HSIL High grade squamous intraepitelial lesion HSP Hospital São Paulo

IFCPC Federação Internacional de Colposcopia e Patologia Cervical INCA Instituto Nacional do Câncer

JEC Junção escamocolunar

LAG Lesão intraepitelial escamosa de alto grau LBG Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau LSIL Low grade squamous intraepitelial lesion MS Ministério da Saúde

MT Mato Grosso

NIC Neoplasia intraepitelial cervical

NUPREV Núcleo de prevenção de doenças ginecológicas OMS Organização Mundial da Saúde

PIX Parque Indígena do Xingu

PNCCU Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero e Mama RG Registro

SIASI Sistema de informação da atenção à saúde indígena

SISCOLO Sistema de informações de combate ao câncer do colo do útero SOE Sem outras especificações

SPSS Statistical Package for Social Sciences SUS Sistema Único de Saúde

UBS Unidade Básica de Saúde

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No Brasil, de acordo com dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), a estimativa para o ano de 2010 e válida para o ano de 2011, mostra a ocorrência de 489.270 casos novos de câncer, sendo mais incidentes os tumores de próstata e pulmão no sexo masculino, de mama e de colo do útero no sexo feminino, não se incluindo o de pele não-melanoma (INCA, 2009).

O câncer do colo do útero é o segundo mais comum entre as mulheres no mundo, com aproximadamente 500.000 mil casos novos por ano. Em alguns dos países em desenvolvimento, ocupa a primeira posição na prevalência dos cânceres entre as mulheres, enquanto nos desenvolvidos, situa-se em sexto lugar. As mais altas taxas de incidência no mundo são registradas, por ordem de freqüência, no Zimbábue, Uganda, Brasil, Mali, Argentina, Gâmbia, Colômbia, Equador, Vietnã, Índia e Tailândia. O número esperado de casos novos, no Brasil, para 2010 é de 18.430, com um risco estimado de 18 casos a cada 100 mil mulheres. A região norte apresenta a maior incidência com 23 casos a cada 100 mil mulheres (Ribeiro, 2008; INCA, 2009; Brasil, 2010).

Essa neoplasia é responsável pelo óbito de aproximadamente 230.000 mulheres por ano em todo o mundo. No Brasil, seu coeficiente de mortalidade variou de 4,6 a 5,0/100.000 mulheres no período de 2002 a 2008. A região norte apresenta a maior incidência, com taxa de 7,1/100.000 mulheres em 2008 (Martins et al., 2005; INCA 2009).

Dentre todos os tipos de cânceres, o do colo uterino é o que oferece um dos mais altos potenciais de prevenção, sendo passível de cura se detectado precocemente. Na faixa etária de 20 a 29 anos torna-se evidente a freqüência desse câncer e o risco aumenta entre 45 a 49 anos (INCA, 2002; Brasil, 2006; INCA, 2009).

No Brasil, cerca de 70% dos casos de câncer do colo do útero são diagnosticados em fase avançada, portanto, com prognóstico bastante reservado. Apesar deste tipo de câncer ter evolução lenta e ser prevenível, as questões culturais, associadas à problemas de acesso, mau funcionamento e precariedade dos serviços de saúde à mulher, podem explicar, em parte, porque continua sendo a segunda causa de morte por câncer no sexo feminino em nosso país (INCA, 2008).

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concentram-se as maiores barreiras de acesso à rede de concentram-serviços para detecção e tratamento das lesões precursoras (INCA, 2002; Brasil, 2006).

O principal agente causal é o papilomavírus humano (HPV) que ocasiona a infecção sexualmente transmitida mais comum em todo o mundo, atingindo aproximadamente de 5 a 44 % das mulheres com vida sexual. Essa infecção é comum em mulheres jovens, na primeira década de atividade sexual. Na maioria dos casos a infecção é intermitente e transitória. Naquelas de infecção persistente, o risco de desenvolver câncer do colo do útero é maior. As infecções virais persistentes promovem modificações celulares que resultam na ocorrência e progressão das lesões pré-cancerosas, neoplasias intraepiteliais cervicais (NIC), em neoplasia invasiva (Guanilo et al., 2006; Schiffman et al., 2007; Ribeiro, 2008; Sankaranarayanan et al., 2008; Rosa et al., 2009 ).

Nas últimas décadas, foram identificados mais de 100 tipos de HPV, onde 40 deles têm predileção pelos epitélios da região anogenital. Aproximadamente, 18 apresentam potencial oncogênico, a saber: 16, 18, 26, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 53, 56, 58, 59, 63, 66, 68 e 82. Os tipos 16 e 18 são responsáveis por 70% dos cânceres cervicais. Aqueles considerados de baixo risco oncogênico, como o 6 e 11 estão associados a 90% das verrugas anogenitais (Guanilo et al., 2006; Ribeiro, 2008; Sankaranarayanan et al., 2008; Rosa et al., 2009 ).

A persistência do HPV é condição necessária para o desenvolvimento, manutenção e progressão das lesões intraepiteliais de alto grau e ocorrência de câncer invasivo do colo uterino. Vários cofatores de risco têm sido estudados quanto à associação com o desenvolvimento desse câncer, mas ainda permanecem obscuros seus verdadeiros papéis. São eles: multiplicidade de parceiros sexuais, tabagismo, coinfecção por agentes infecciosos como o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e Chlamydia trachomatis, uso prolongado de contraceptivos orais, iniciação sexual precoce, multiparidade, baixa ingestão de nutrientes antioxidantes como vitaminas A e E, baixa condição socioeconômica, imunossupressão, higiene íntima inadequada e história familiar de câncer do colo do útero (Aldrighi et al., 2002; INCA, 2002; Pinto et al., 2002; Uchimura et al., 2005; Brasil, 2006; Parellada, 2006; Silva et al., 2006; Appleby et al., 2007; Ribeiro, 2008; Rosa et al.,2009; INCA, 2009).

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invasivas, por meio de técnicas de rastreamento. O exame citopatológico cervicovaginal, comumente conhecido como Papanicolaou, é o método de detecção mais efetivo e eficiente a ser aplicado em programas de rastreamento (Pinho et al., 2003).

No Brasil, segundo as diretrizes estabelecidas pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA, 2011), do Ministério da Saúde (MS), a periodicidade desse exame deve ser: após os dois primeiros exames consecutivos negativos, com intervalo anual, deve-se realizá-lo a cada três anos. Quanto à população a ser rastreada, orienta-se o início em mulheres de 25 anos de idade, que já tiveram atividade sexual, estendendo-se até os 64 anos de idade, podendo estendendo-ser interrompido, após esta idade, caso tenham dois exames negativos consecutivos nos últimos cinco anos. Nas mulheres com mais de 64 anos de idade, que nunca realizaram o exame citopatológico, indica-se realizar dois exames com intervalo de um a três anos. Caso os exames forem negativos, orienta-se dispensá-las de exames adicionais, salvo se houver história prévia de lesões precursoras do câncer do colo uterino (INCA, 2002; INCA, 2002a; Brasil 2006; INCA, 2008; INCA, 2009; INCA, 2010; INCA, 2011).

Com a descoberta da estreita relação entre o HPV e o câncer do colo uterino, outras atitudes têm sido desenvolvidas na promoção e prevenção da saúde como o controle da infecção do HPV por meio da vacinação, além dos programas de rastreamento. O objetivo da vacina profilática é impedir infecção por tipos mais prevalentes do HPV. Atualmente duas vacinas profiláticas estão sendo comercializadas: uma bivalente contra os HPV 16 e 18 e outra tetravalente contra os HPV 6, 11, 16 e 18. São indicadas para mulheres entre 9 e 26 anos de idade1 sendo administradas em três doses por via intramuscular. Entretanto, apesar da grande eficácia clínica da vacina contra o HPV, seu alto custo impossibilita sua utilização na saúde pública, principalmente nos países em desenvolvimento (Sankaranarayanan et al., 2008; Villa, 2008; Silva et al., 2009).

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2007), as estratégias na luta contra o câncer do colo do útero estão relacionadas à prevenção primária, que é impedir a infecção pelo HPV e os cofatores que incrementam o risco de desenvolver tal doença. A prevenção secundária, com detecção precoce por meio de programas de rastreamento sistemático; a prevenção terciária com diagnóstico,

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tratamento, seguimento dos casos positivos e cuidados paliativos na doença avançada. Na prevenção primária além da vacinação, o uso de preservativo nas relações sexuais deve ser estimulado, pois diminui a possibilidade de transmissão do HPV.

O Ministério da Saúde do Brasil, por meio do INCA, assinou em 1996, protocolo de intenções para implementar ações objetivando detecção precoce e o controle do câncer do colo do útero. Foi criado o Programa Viva Mulher-Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero e Mama (PNCCU) que, inicialmente, envolveu cinco capitais brasileiras e o Estado de Sergipe para testar a viabilidade de sua execução (Brasil, 2001). Em 1998, as ações do Programa “Viva Mulher” foram estendidas a todos os municípios brasileiros por meio de campanha nacional, passando de 7 para 10,3 milhões de exames citopatológicos processados por ano (Martins et al., 2005).

Em 1999, o PNCCU estabeleceu normas e recomendações para monitoramento das ações de rastreamento em exames realizados pelos laboratórios. Foi implantado, a partir de janeiro de 2000, o Sistema de Informações de Combate ao Câncer do Colo do Útero (SISCOLO) formando banco de dados a nível estadual, que possibilita aos gestores municipal, estadual e federal acompanhar as ações de rastreamento (Lago, 2004; Maeda et al., 2004).

Apesar da implementação das ações de prevenção e controle, a persistência de taxas de incidência e mortalidade relativamente altas por essa doença revela não serem suficientes as medidas adotadas para efetividade dos programas (Pinho et al., 2003). Entre os fatores relacionados ao baixo impacto dos programas de rastreamento, figura o uso tardio dos serviços de saúde pelas mulheres consideradas de risco (Dias-da-Costa et al., 2003; Oliveira et al., 2006).

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No Sul do Brasil, apesar do aumento geral de cobertura do exame citopatológico, constatou-se a não melhora em grupos de mulheres mais vulneráveis: mulheres de classe econômica mais baixa, idosas, não brancas, viúvas ou solteiras (Dias-da-Costa et al., 2003; Hackenhaar et al., 2006). No município de Campinas-SP, foi menor a proporção de mulheres referidas como pretas ou pardas dentre aquelas submetidas ao exame rastreador, bem como as de menor escolaridade ou de nível socioeconômico mais precário. Isso sugere desigualdade racial no acesso ao programa de rastreamento (Cesar et al., 2003; Amorin et al., 2006).

No Brasil, Martins et al., (2005), mostram poucas estimativas sobre cobertura dos exames de prevenção. A maioria são estudos transversais realizados nas regiões Sul e Sudeste do país, correspondentes às grandes cidades, indicando diferenças regionais. Os autores apontam serem fundamentais as intervenções educativas, o acesso aos métodos diagnósticos e os tratamentos adequados, de forma igualitária.

As experiências dos programas de rastreamento sistemático e planejado, nos países desenvolvidos, demonstram redução no número de casos novos de câncer e taxa de mortalidade a ele associado. Nos países em desenvolvimento, estes números aumentam ou permanecem invariáveis. No entanto, ainda há desigualdades no mundo desenvolvido ao considerar mulheres da zona rural e as mais pobres, apresentando maior risco de adoecer pelo câncer tipo invasor (OMS, 2007; Sankaranarayanan et al., 2008).

Com relação às mulheres indígenas, no Brasil, as informações sobre morbimortalidade por câncer do colo uterino são exíguas, bem como dados do perfil epidemiológico dessa população. Os poucos estudos realizados, com alguns povos indígenas, apontam para a necessidade de implementação de ações de prevenção voltadas a esse tipo de câncer (Brito et al., 1996; Marroni, 2000; Mendes, 2000; Taborda et al., 2000; Brito et al., 2002; Silva et al., 2003; Brito, 2004; Mendes, 2004; Brito et al., 2005; Albring et al., 2006; Brito et al., 2006; Rodrigues et al., 2006; Silva, 2007; Speck et al., 2009; Speck et al., 2009a; Marroni et al., 2010).

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Nicita et al., 2010). Brito (2004) identificou, em mulheres da Amazônia Brasileira, aumento na ocorrência dos casos de HPV de alto risco, de 14% para 42%, nos anos de 1993 e 2000. Tonon et al., (2003) identificaram diferença significativa na presença de HPV de alto risco na população urbana (27,6%) e indígena Guarani (42,2%) na região de Misiones, Argentina.

Além do HPV, as mulheres indígenas estão expostas aos cofatores de risco para o câncer do colo uterino como: multiplicidade de parceiros sexuais, outras infecções sexualmente transmitidas, idade precoce na primeira relação sexual, multiparidade, baixa condição socioeconômica. Além disso, a dificuldade de acesso ao exame preventivo para detecção e tratamento precoce do câncer e de suas lesões precursoras contribui para aumentar o risco dessas mulheres em apresentar essa doença (Costa et al., 1993; Brito et al., 1996; Maldonado et al., 1997; Marroni, 2000; Mendes, 2000; Taborda et al., 2000; Hökerberg et al., 2001; Tonon et al., 2003; Brito, 2004; Mendes, 2004; Brito et al., 2005; Rodrigues et al., 2006; Silva, 2007; Poveda et al., 2008; Marroni et al., 2010).

Estudos epidemiológicos têm mostrado forte associação entre a multiparidade e as lesões de alto grau e carcinoma cervical. O risco quatro vezes maior de desenvolver câncer cervical foi detectado em mulheres com sete ou mais gestações a termo quando comparadas às nulíparas. Uma das explicações para esta relação pode ser a manutenção da zona de transformação na ectocérvice por tempo maior, facilitando a exposição ao HPV. Fatores hormonais, traumáticos e imunológicos parecem ser os mecanismos biológicos que justificam tal associação (Muñoz et al., 2002; Ribeiro, 2008; Aidé et al., 2009).

Na assistência a saúde indígena, questões relacionadas ao isolamento geográfico, à carência de infraestrutura, à dificuldade de articulação entre atenção básica e referência locorregional e a alta rotatividade e despreparo dos profissionais de saúde, são fatores limitantes na prevenção do câncer do colo uterino. Informações sobre cobertura dos exames citopatológicos nas áreas indígenas são escassas e os dados disponíveis são preocupantes. Observa-se ineficiência na atenção básica à saúde associada à desigualdade no acesso ao exame preventivo.

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população indígena pode ser desastrosa nas intervenções em saúde. As mulheres indígenas podem sentir-se inibidas caso o exame ginecológico seja realizado por profissional do sexo masculino. Há também situações onde os parceiros, por desconhecerem a importância do exame, proíbem as esposas de se submeterem ao procedimento. Essas mulheres, por desconhecimento, vergonha, crenças culturais, desconfiança, podem se recusar a realizá-lo.

Prior (2009) entrevistou mulheres aborígines da Austrália sobre percepções acerca do câncer do colo do útero. Para as entrevistadas, o câncer é considerado fatal e o tratamento tem pouco valor. O corpo da mulher é considerado sagrado não devendo ser violado por métodos invasivos de tratamento como a cirurgia. Além disso, esta doença é resultado de maldição, de comportamento imoral e sentem vergonha de discutir sobre saúde sexual com profissionais de saúde, pois é assunto privado. Essas mulheres relatam dilema entre querer acesso às opções de prevenção e tratamento, mas temem os métodos utilizados pela biomedicina que não se alinham aos seus costumes e necessidades. Segundo o autor, são fundamentais intervenções centradas na população, que desloque a autoridade dos serviços de saúde, dando destaque aos valores culturais como ponto focal do controle do câncer.

Ainda sabemos pouco sobre os cuidados, tabus e regras que regem a relação das mulheres indígenas com seu corpo. No entanto, é necessário abrirmos os ouvidos para perceber o que se passa ao nosso redor. Em oportunidade de conversa com mulheres indígenas de algumas etnias sobre a prevenção do câncer do colo do útero no Ambulatório do Índio2, foram identificadas questões culturais que merecem ser relatadas. N. Metuktire, (2009) disse que não faz o exame ginecológico porque o ato de introduzir o espéculo na vagina levaria mais doenças para dentro do útero. Para T. Macuxi, (2009), o canal vaginal é considerado local sagrado relacionado ao nascimento e esse tipo de exame não é permitido na sua cultura. É fundamental que os profissionais de saúde estabeleçam diálogo com essas mulheres para entendê-las, respeitá-las, intervindo de forma segura e profícua.

2

O Ambulatório do Índio do Hospital São Paulo/UNIFESP, presta atendimento a pacientes indígenas referenciados de todo

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Em decorrência de cinco anos de experiência como enfermeira de campo na atenção básica à saúde no Parque Indígena do Xingu- MT, especialmente na área de saúde da mulher, desenvolvi interesse em aprofundar conhecimentos, aproximando a prática da teoria, em relação à prevenção do câncer do colo do útero. As ações de rastreamento compunham as atividades prioritárias que deveriam ser implementadas no serviço local.

Como enfermeira responsável, desde 2005, por organizar o programa de prevenção do câncer do colo do útero no Xingu, vivenciei difíceis momentos e experiências exitosas no dia-a-dia que solidificaram esse trabalho ao longo dos anos. Também pude compartilhar dúvidas, medos que as mulheres indígenas traziam em conversas despretensiosas que aconteceram nas aldeias, mas que apontavam para a urgência em intervir de forma mais efetiva em um programa de prevenção.

O que marcou a necessidade de repensar a prevenção do câncer do colo uterino no Xingu, foram os óbitos decorrentes dessa moléstia associados à dificuldade de encaminhamento para referências especializadas, bem como demora no retorno dos exames citopatológicos e sua baixa cobertura. Com aumento na ocorrência da morbimortalidade no Xingu por esse tipo de câncer, tanto os profissionais de saúde, quanto lideranças e mulheres indígenas tiveram maior preocupação com o diagnóstico, tratamento e seguimento dos casos positivos.

Assim, a partir de 2005 ocorreram mudanças significativas no programa de rastreamento, originados do quadro epidemiológico que se apresentava. Esta pesquisa pretende contribuir, por meio da experiência adquirida no trabalho em campo, no entendimento da epidemiologia desse câncer nas mulheres indígenas do Xingu, direcionando para possibilidades factíveis de enfrentamento. Também será um estudo norteador que possibilitará avaliar e implementar as ações de prevenção no Parque Indígena do Xingu, Mato Grosso.

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3.1. Objetivo Geral

Descrever e analisar a prevenção do câncer do colo do útero desenvolvido no Médio, Baixo e Leste Xingu pela Universidade Federal de São Paulo3

no período de 2005 a 2006.

3.2. Objetivos Específicos

1. Verificar a taxa de cobertura do exame citopatológico no período de outubro a dezembro de 2005;

2. Analisar a prevalência das atipias citológicas cervicovaginais: células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASC-US), células glandulares atípicas (AGC), células escamosas atípicas não podendo afastar lesão de alto grau (ASC-H), lesão intraepitelial escamosa de baixo grau (LBG), lesão intraepitelial escamosa de alto grau (LAG), carcinoma espinocelular ou adenocarcinoma (CEC ou ACA);

3. Verificar as taxas de sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo, valor preditivo positivo, falso negativo e falso positivo dos exames citopatológicos;

4. Descrever os achados dos exames colposcópicos;

5. Analisar os resultados dos exames anatomopatológicos de biópsias colposcopicamente dirigidas realizados em fevereiro de 2006;

6. Verificar as taxas de sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo, valor preditivo positivo, falso negativo e falso positivo do exame anatomopatológico de biópsia;

7. Analisar os resultados dos exames anatomopatológicos das peças cirúrgicas de colo de útero obtidas por excisão da zona de transformação por ondas de radiofrequência (CORAF), conização clássica e histerectomia realizados em maio de 2006.

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4.1. Saúde sexual e reprodutiva da mulher indígena

Nos últimos vinte anos, apesar dos avanços da literatura brasileira com grande produção de conhecimentos sobre saúde da mulher, as investigações tanto socioantropológicas quanto epidemiológicas, desenvolveram-se, particularmente, em contextos urbanos. Nas pesquisas com recorte étnico, ainda existe grande lacuna no conhecimento dos determinantes socioculturais, ambientais, biológicos da população indígena, sobretudo a saúde sexual e reprodutiva (Coimbra Júnior et al., 2004; Marrero, 2007).

A atenção à saúde das mulheres indígenas ainda é precária. Embora exista uma política de atenção à saúde diferenciada para os povos indígenas, não há garantia de cobertura satisfatória em ações básicas como pré-natal, prevenção do câncer do colo de útero e doenças sexualmente transmissíveis (DST). Os dados epidemiológicos disponíveis para avaliar problemas de saúde das mulheres e adolescentes indígenas são insuficientes e apontam necessidade de políticas de saúde direcionadas a esse grupo (Brasil, 2009).

Para os povos indígenas, o tema de saúde da mulher deve ser ampliado para além dos conceitos de direitos reprodutivos tal como defendido pela sociedade não indígena. Trata-se também de incluir a revitalização e valorização do sistema dos saberes tradicionais, reivindicar atenção à saúde de forma diferenciada, que conheça, respeite e atenda as necessidades das mulheres indígenas nas diversas realidades (Monagas, 2006).

Dentro dos aspectos epidemiológicos da saúde reprodutiva das mulheres indígenas, grande parte dos agravos não lhes é exclusivo, aparecendo em diferentes graus e intensidades em mulheres de outras etnias, raças ou classes sociais. No entanto, suas especificidades étnicas e territoriais destacam situações que diferem dos encontrados na população feminina em geral. De acordo com os poucos estudos disponíveis verificam-se altas taxas de fecundidade, marcadas por elevada prevalência de DST, lesões ginecológicas de etiologias variadas, queixas ginecológicas generalizadas como dores em baixo ventre, dispareunia e corrimento (Coimbra Júnior et al., 2004).

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morbimortalidade nas mulheres indígenas do Brasil (Brito et al., 1996; Marroni, 2000; Taborda et al., 2000, Brito, 2004; Mendes, 2004; Brito, 2005; Rodrigues et al., 2006; Marroni et al., 2010; Speck et al., 2009; Speck et al., 2009 a).

Discussões têm sido realizadas no Brasil, e em outros países, sobre a questão da saúde da mulher indígena das Américas. Taxas de morbimortalidade duas vezes maiores são indicadas nessas mulheres, quando comparadas às não indígenas. Isso resulta da falta de acesso aos cuidados de saúde, de educação, de emprego bem como discriminação racial. Ser mulher, indígena, viver em área rural, isolada e ter insuficiência de serviços de saúde podem contribuir para crescente incidência de HIV/AIDS, mortalidade materna, anemia, problemas ginecológicos, uso de álcool, tabagismo, drogas, suicídio, violência, diabetes, doenças hepáticas, cirrose, complicações no período reprodutivo, alto risco para doenças transmissíveis como malária, cólera e alta taxa de câncer do colo uterino (Canadá, 2004; OPAS, 2004; Clark, 2008).

A problemática quanto ao alcoolismo, drogas ilícitas nas comunidades indígenas, associada à violência contra as mulheres, têm sido tema de encontros entre esses povos e diversas instituições que apontam sua inter-relação (Souza et al., 2003; Monagas, 2006; Guimarães et al., 2007). Não se pode deixar de mencioná-las, pois são questões que afetam, de alguma forma, a saúde sexual e reprodutiva destas mulheres. Monagas (2006) mostra que as mulheres indígenas vêem o problema da violência diretamente relacionado ao consumo de bebidas alcoólicas ou abuso de bebidas tradicionais fortes como o “caxiri” e “pajuaru”4. O alcoolismo de jovens e adultos é importante fator de conflito familiar sendo identificado como um dos graves problemas dentro das comunidades, pois causa violência doméstica.

Visando melhoria no acesso, na qualidade e nas ações diferenciadas, foram introduzidas, no Plano de Ação 2004-2007, da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, metas para implantar atenção integral à saúde da mulher indígena em 100% dos polos base dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas-DSEI (Brasil, 2004). No entanto, as ações desenvolvidas ainda são incipientes, descontínuas, sendo necessária atenção dos órgãos responsáveis pela saúde indígena para implementar de fato, a atenção integral a saúde dessas mulheres.

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Caxiri e pajuaru são bebidas fermentadas à base de mandioca, utilizadas em comemorações, rituais e festas pelos povos

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Na I Conferência Nacional de Mulheres Indígenas, realizada em Brasília (CONAMI, 2004), representantes femininas, propuseram necessidades em relação à sua saúde:

x Implementar programas de atenção integral à saúde da mulher, contemplando ações de pré-natal, parto, puerpério com qualidade e desenvolvimento de ações da saúde da criança

x Campanha nacional para prevenção do câncer do colo uterino em mulheres indígenas, sensibilizando para a importância da realização do exame.

x Que a Fundação Nacional da Saúde (FUNASA) desenvolva ações de saúde nos 34 DSEI para mulheres indígenas, dando ênfase ao atendimento à saúde reprodutiva, prevenção, diagnóstico e tratamento das DST e AIDS; câncer do colo uterino, de mama [...]

x Humanização da atenção à saúde da mulher indígena.

No norte da Austrália, Bowden et al., (1999) relatam que a incidência das DST nas mulheres indígenas de áreas remotas e rurais é acentuadamente mais alta do que a média nacional australiana. Foram observados que casos de Neisseria gonorrhoeae, Chlamydia trachomatis, Trichomonas vaginalis e HPV são endêmicos nessa população. A falta de acesso aos serviços de saúde para diagnóstico e tratamento é uma das razões para alta incidência de DST nessas áreas.

O estudo soroepidemiológico realizado em populações indígenas da Amazônia brasileira evidenciou alta prevalência de Chlamydia sp, variando de 50 a 80 % de infectados, chegando a mais de 80 % em alguns povos dessa região (Ishak et al., 2001). Ferri et al., (2011), analisaram o número de casos de DST na população indígena do DSEI Mato Grosso do Sul, onde foi identificado aumento de 400% nas notificações de AIDS nas mulheres indígenas, com 04 casos identificados em 2001 e 16 casos no 2003. Nessa população também houve acréscimo considerável no número de casos de sífilis, Gardnerella vaginallis e Trichomonas vaginalis.

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terras indígenas, o pouco acesso às informações e as deficiências na promoção e prevenção à saúde contribuem para essa situação.

De acordo com o censo de 2000, a população indígena no Brasil corresponde a 734 mil pessoas autodeclaradas, representando 0,4% da população brasileira, congregando mais de duzentos povos diferentes. Com esta informação foi possível traçar o perfil reprodutivo das mulheres indígenas e suas tendências. O que se observa é uma dicotomia com níveis baixos de fecundidade (2,7 filhos) naquelas que residem nas áreas urbanas. Enquanto nas áreas rurais específicas, onde se localiza a maior parte dessa população, predomina e persiste nível alto de fecundidade (6,2 filhos). A metade dessas mulheres em idade fértil pertence às regiões nordeste e sudeste (IBGE, 2009; Wong et al., 2009). Isto mostra a realidade diversa da população indígena dependendo do maior ou menor grau de contato com a sociedade nacional

Segundo Mendonça et al., (2005) “em todas as sociedades, as mulheres desempenham papel social fundamental de salvaguarda da cultura de maneira geral. Elas são responsáveis pelo ensino da língua, boa parte da cultura material, rituais, ritos de passagem, cuidados com a família, crianças, mulheres e anciãos”.

O reconhecimento e a valorização da importância do papel social das mulheres indígenas têm possibilitado cada vez mais sua participação em encontros, oficinas, conferências nacionais e internacionais. Esse comportamento corresponde à estratégia de instalar novos espaços de discussão que possibilitem articulação, dando maior visibilidade e voz às indígenas. Sua inserção na luta pelas necessidades de seus povos propicia fortalecimento do movimento indígena com garantia de posse de seus territórios tradicionais, do direito à saúde e educação diferenciadas (Sacchi, 2003; Monagas, 2006; Paula, 2008).

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4.2. Mulheres indígenas do Xingu: aspectos culturais e reprodutivos

No Xingu, as atividades produtivas femininas acontecem em grupos e são orientadas pela família nuclear, sendo os papéis sociais bastante estabelecidos. O espaço de trabalho da mulher vai da coleta ao preparo dos alimentos a partir da mandioca, com produção da farinha e o beiju, um dos principais alimentos do dia-a-dia. Também são responsáveis pelo preparo do peixe, da caça e participam das atividades da roça como o plantio e a colheita, além da confecção de artesanato e os cuidados com a casa e filhos (Pagliaro et al., 2008).

Observa-se nas mulheres indígenas do Médio, Baixo e Leste Xingu início precoce da vida reprodutiva, por volta dos 15 anos e em alguns casos até antes. Como o exercício da sexualidade e concepção é precoce, o período reprodutivo destas mulheres, em sua maior parte, dura cerca de trinta anos, com taxas elevadas de fecundidade. Nas mulheres Kisêdjê foi encontrada média de 6,7 filhos no período de 2000-2007. Entre jovens de 12 a 14 anos, a média de idade da menarca no ano de 2007 foi de 11,3 anos. O intervalo entre menarca e primeira gestação foi de 2,6 anos nas adolescentes de 15 a 19 anos (Pagliaro, 2005; Pagliaro et al., 2008; Pagliaro et al., 2009).

Para as várias sociedades do Parque indígena do Xingu, cada ciclo da vida representa um período especial sendo nominados de forma diferente e marcados por ritos de passagem. Quando a criança nasce recebe um nome, depois quando está adolescente outro, na fase adulta também troca de nome que perdura até ser avô (ó). Nesta fase, deve escolher outro nome porque o seu é dado para o neto, assim sucessivamente de acordo com as regras de cada povo.

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permitido ter relações sexuais e geralmente ocorrem casamentos que são, na maioria das vezes, combinados entre os pais. É comum união conjugal em idades muito jovens (Verani et al., 1991; Junqueira, 2002; Camargo et al., 2005; Junqueira et al., 2009; Pagliaro et al., 2009).

Entretanto, observa-se no Xingu, a negligência pelos jovens de práticas tradicionais da sua cultura como: recusa e redução do período de reclusão pubertária, casamento, primeira gestação e parto em idades muito jovens, desrespeito à abstinência sexual pós-parto, transgressão da dieta alimentar e aumento no consumo de alimentos industrializados. Essas mudanças são atribuídas, em parte, ao desinteresse dos jovens pela cultura tradicional, influenciados pela mídia, sobretudo a televisão, a internet e a possibilidade de convivência com outros jovens fora da aldeia (Pagliaro et al., 2009).

O casamento no Xingu e, em particular, na cultura Kamayurá, além das funções de procriação e as de natureza sexual, pode ser influenciado, também, por questões econômicas, decorrentes da divisão social do trabalho e políticas, como forma de alianças. Cabe à família da moça, tomar iniciativa de entrar em contato com a do rapaz para formalizar a união, que consiste no simples ato de transferir a rede para a casa dela, onde ele deverá prestar serviços ao sogro. Nos primeiros anos de casamento o marido deve viver na casa dos pais da esposa e após cumprir esse período, tem liberdade de escolher nova residência que, em geral, é a casa de seus pais (Junqueira, 2002; Camargo et al., 2005; Pagliaro, 2007; Junqueira et al., 2009).

A poligamia é comum, principalmente entre lideranças. O homem pode se casar com mais de uma mulher, geralmente com duas ou mais irmãs, sendo esta regra sinal de prestígio. Há muita liberdade de namoros múltiplos, sem punição, desde que não se tornem públicos. Para mulheres, namoros pré-maritais costumam ser livres, sendo os extraconjugais sujeitos à punição. A poliandria, união de uma mulher com mais de um homem, é relatada em poucos povos, como os Yanomami ou os Zoé (Mindlin, 1992; Junqueira, 2002; Mindlin, 2005; Valencia et al., 2008).

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As mulheres da área estudada são caracterizadas pela sua capacidade de gerar filhos nos primeiros anos do ciclo reprodutivo. O casamento é considerado consumado quando nasce o primeiro filho do casal. Como a infertilidade é um estigma e a dissolução de casais sem filhos é comum, as mulheres têm pressa em engravidar tornando público sua fertilidade. Se, com o passar do tempo, isso não acontecer, a fitoterapia tradicional pode ser tentada para estimular a fecundidade. Pode ser usada tanto pela esposa quanto pelo marido (Junqueira et al., 2009).

No período da gestação, dietas alimentares e regras de comportamento devem ser cumpridas pelo casal, pois o nascimento é importante momento de transição na vida dos pais. Entre o povo Kisêdjê, as relações sexuais precisam ser freqüentes, pois acreditam que o feto desenvolve-se pelo acúmulo do sêmem. A dieta seguida corretamente pela mãe assegura desenvolvimento normal da criança e estende-se também ao pai, que deve evitar alguns afazeres (Pagliaro, 2005; Junqueira et al., 2009).

Os partos acontecem, em sua maioria, na aldeia em espaço isolado dentro da casa, sendo realizado pela mãe, avó ou parente próximo. Se há complicação, chama-se uma mulher experiente e, caso o quadro venha a agravar, convoca-se o pajé (Pagliaro, 2005; Junqueira et al., 2009; Pagliaro et al., 2009).

Após o nascimento, os pais devem seguir regras para garantir saúde do filho, como abster-se das relações sexuais até a criança começar andar, privar-se de determinadas atividades de trabalho e cuidados com alimentação. No pós-parto devem permanecer em casa por períodos determinados de acordo com cada etnia, sendo de regra, o término do resguardo do pai com a queda do coto umbilical. Até os seis meses a criança não pode sair de casa, pois seu espírito está susceptível de se perder ou ser levado por aqueles ruins. Geralmente, alimentam-se somente de leite materno até que comece a engatinhar, quando passa a comer outros alimentos como peixe e ave que são preparados de forma especial, além de água e mingau. Continuam a ser amamentadas por longo período de tempo, chegando até três anos. Comumente, a criança precisa saber andar e comer sozinha para que a mãe possa ter outro filho. Com isso a fecundidade das mulheres diminui consideravelmente neste espaço de tempo (Pagliaro, et al., 2008).

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livre e indiscriminada, devendo ser realizada por pessoa detentora desse conhecimento. Para evitar a gravidez usa-se uma beberagem preparada com raízes de plantas que a mulher ingere durante vários dias após as relações sexuais. Nos casos de anticoncepção definitiva, é necessário auxílio do pajé que prepara outros tipos de infusões de ervas que devem ser ingeridas pela interessada. Existem também as práticas abortivas com auxílio de ervas para interrupção de uma gravidez indesejada que é utilizada pela maioria dos povos do Xingu (Camargo et al., 2005; Pagliaro, 2005).

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5.1. O Parque Indígena do Xingu

As etnias que compõem o Parque Indígena do Xingu (PIX) pertencem a quatro troncos ou famílias lingüísticas, a saber: Kamayurá, Yudjá, Aweti e Kaiabi (Tupi-Guarani), Mehinako, Waujá e Yawalapiti (Aruak), Kalapalo, Ikpeng, Kuikuro, Matipu, Nahukwá (Karib), Kisêdjê (Macro-Jê), além dos Trumai de língua isolada (Baruzzi, 2005). A população do PIX em 2009 era de 6.152 habitantes, segundo dados da Fundação Nacional da Saúde (FUNASA/MS), distribuídos em quatro regiões conhecidas como Alto, Baixo, Médio e Leste Xingu (ISA, 2009).

O Parque Indígena do Xingu (PIX) foi criado em 1961, no governo do presidente Jânio Quadros, quando a venda indiscriminada de terras pelo governo do Mato Grosso, no país e no exterior, ameaçava estender-se a territórios ocupados por povos indígenas desde tempos imemoriais. Amplo movimento de opinião pública para criação do Parque foi estabelecido, envolvendo a academia, os sanitaristas, os antropólogos e militantes da causa indígena como Darcy Ribeiro e os irmãos Villas Bôas. Teve como objetivos, proteção física e cultural dos povos indígenas que ali viviam, garantia da preservação ambiental e acolhimento de grupos indígenas ameaçados de extinção (Baruzzi, 2005; Villas Bôas, 2005; Baruzzi, 2007; ISA, 2009).

O Parque está situado na região noroeste do Estado do Mato Grosso, Brasil Central, numa área de 26.400 km² ao longo do curso inicial do rio Xingu, desde a região dos seus formadores, ao sul, até a cachoeira de von Martius, ao norte, próxima dos limites com o Pará (Figura 1). É caracterizada por biodiversidade muito particular, de transição entre cerrado do Brasil Central e Floresta Amazônica com extensa rede hidrográfica (Baruzzi, 2007).

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Panará, com a criação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena em 19995, passaram a integrar o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Kaiapó (MT) e os demais povos o DSEI Xingu, Mato Grosso (Baruzzi, 2005; Villas Bôas, 2005).

Para percorrer a maioria das aldeias no PIX, utiliza-se transporte via fluvial por meio de embarcação de pequeno porte. O tempo gasto para ir do Polo Base à aldeia, dependendo da localização, varia de 40 minutos a 6 horas. Existem aquelas mais distantes, onde é necessário além do barco, fazer percurso a pé, bicicleta ou carro. Para ingressar no Xingu, demora-se em média 1hora e 15 minutos de aeronave mono ou bimotor partindo dos municípios de Sinop-MT ou de Canarana - MT a um dos Polos. Outra forma é percorrer trajeto de aproximadamente cinco horas de carro, partindo de um destes municípios à beira do rio que dá acesso ao Xingu e de lá seguir de barco com tempo estimado de 10 a 12 horas de viagem. Com aumento da abertura de estradas, ligando aldeias às cidades próximas, torna-se cada vez mais fácil o acesso via terrestre.

Uma das preocupações que permeiam a preservação do território no Xingu é a constante aproximação das cidades, por meio do desmatamento. Atualmente, são nove municípios que estão localizados próximos ao Xingu, com facilidade de acesso para muitas aldeias. A ação ilegal de madeireiras na região, a intensificação do agronegócio no Estado de Mato Grosso, têm trazido conseqüências desastrosas para o meio ambiente. Outro fator importante e preocupante é que as nascentes dos rios estão localizadas fora da demarcação do PIX e estão sendo poluídas, além dos projetos de construção de hidrelétricas que irão afetar os principais rios da região amazônica. Há uma ação devastadora no entorno que se aproxima cada vez mais, cercando com áreas enormes desmatadas (Rodrigues, 2005; ISA, 2009).

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No ano de 1999, com o Decreto no 3156/99 e a chamada “Lei Arouca” de no. 9.836/99 elaborada com base no relatório final da II

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5.2. A Universidade Federal de São Paulo

O desafio não é simplesmente implantar no Parque um modelo de assistência à saúde calcada na medicina ocidental, com mera transferência de

tecnologia e locação de recursos. O real desafio é trazer benefícios à saúde do índio

sem causar danos irreversíveis à sua cultura, sem destruir suas crenças e sua

medicina tradicional. A busca de resultados imediatistas poderia significar um dano

irreversível para essa população no decorrer do tempo, dentro do conceito amplo de

saúde definido pela OMS como estado de completo bem estar físico, mental e social”

(Baruzzi, 2005).

A Escola Paulista de Medicina (EPM)/UNIFESP desenvolve, desde 1965, o Projeto Xingu que é um programa de atenção à saúde no Parque Indígena do Xingu (PIX), no estado de Mato Grosso, conduzido pela Unidade de Saúde e Meio Ambiente (USMA) do Departamento de Medicina Preventiva. Inicialmente, equipes multidisciplinares compostas por médicos, dentistas, enfermeiros e alunos da EPM eram enviados ao PIX, pelo menos quatro vezes ao ano, para assistência à saúde, imunização, cadastramento da população com abertura das fichas médicas individuais6

(anexo I) e colaboração também em situações epidêmicas. A imunização foi um dos programas em que a EPM colaborou, sendo importante na redução da mortalidade dessa população ao longo dos anos. Os índios do Xingu ainda guardam na memória epidemias de sarampo que surgiram na década de 50 atingindo toda a população, ocasionando muitos óbitos (Baruzzi, 2005).

O Hospital São Paulo (HSP), da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), hospital escola da EPM, desde o início do trabalho no Xingu, era retaguarda para casos que necessitavam de atendimento especializado. Muitos indígenas do Xingu foram removidos para o HSP, que passou a ser referência nacional para os casos de maior complexidade. Com o decorrer do

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tempo foi criado o Ambulatório do Índio como apoio no atendimento e acompanhamento dos pacientes indígenas referenciados de todo o país. Esse Ambulatório é responsável pela coordenação de cuidados a esses pacientes, sendo porta de entrada para atendimento no hospital escola da EPM/UNIFESP.

O Projeto Xingu passou por diversas etapas, ampliando e diversificando suas atividades para atender às novas e crescentes demandas sanitárias, conseqüentes do contato dos povos xinguanos com a sociedade nacional. A partir de 1989, concentrou suas atividades na estruturação de um sistema local de saúde, tendo como estratégias principais a formação de indígenas para o trabalho e participação social em saúde (Rodrigues, 2005; Rodrigues et al., 2005; Baruzzi, 2007).

Com a criação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, pelo Ministério da Saúde, em todo território nacional, a gestão da atenção à saúde dos povos indígenas passou a ser responsabilidade da FUNASA, constituindo um subsistema inserido no Sistema Único de Saúde (SUS). Coube à EPM, atendendo ao convite de lideranças indígenas do Xingu, celebrar sucessivos convênios com a FUNASA com objetivo de colaborar na implantação do DSEI Xingu e dar continuidade à formação de profissionais indígenas para o trabalho em saúde (Rodrigues et al., 2005). Um dos resultados da atuação da EPM no Xingu foi participar da formação de 16 auxiliares de enfermagem indígenas em 2001, além da formação dos agentes indígenas de saúde e gestores indígenas, ainda em curso.

O Projeto Xingu, atualmente, é responsável pela atenção básica à saúde e formação de recursos humanos nos Polos Pavuru, Diauarum e Wawi, compreendendo as regiões do Médio, Baixo e Leste Xingu atendendo, em 2011, uma população de 2.685 habitantes7. Encontram-se distribuídas nesses Polos, as etnias: Kaiabi, Yudjá, Ikpeng, Kisêdjê, Trumai, Kamayurá, Waujá, localizadas em 35 aldeias.

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5.3. Breve histórico de contato dos povos do Médio, Baixo e Leste Xingu

“Desde a invasão européia, a dependência e a opressão a que

foram submetidas as sociedades indígenas em relação à sociedade nacional são

flagrantes e variam conforme tipo de contato. Os povos indígenas foram subjugados e

desorganizados através da imposição do convívio pacífico, pela restrição do território

tribal, pela subjugação étnica e pelos efeitos dissociativos da depopulação e debilitação

física por conta de doenças e epidemias que aniquilaram vários povos ao longo dos

anos” (Mendonça, 2005).

Ao aproximarmos dos povos indígenas é fundamental conhecer sua cultura e, principalmente, o processo de contato com a sociedade nacional, que é determinante para entendimento da sua história. Os sete povos do Médio, Baixo e Leste Xingu, objetos desse estudo, formam um mosaico cultural com diversidades e saberes distintos. Esses povos vivenciaram diferentes processos de contato com a sociedade que causaram impacto significativo na redução da população e perda do território. Os povos Kaiabi e Ikpeng não tiveram escolha, foram transferidos para o Parque Indígena do Xingu, deixando suas terras para evitar o contato com exploradores que invadiram as regiões onde viviam. Os outros povos migraram para a região do Xingu, fugindo de conflitos e das epidemias de doenças infecto-contagiosas.

O povo Kaiabi viveu até a década de 1940 em extensa região à oeste do Rio Xingu (Pagliaro, 2005; ISA, 2009). Na metade do século XX, ocorreu redução dessa população, resultante de décadas de conflitos com colonizadores, seringueiros e por doenças como o sarampo, malária que os assolaram terrivelmente em 1945 (Baruzzi, 2005; Hemming, 2005; Pagliaro, 2005; ISA, 2009). O início da migração desse povo para o Xingu incidiu em 1952 e se estendeu até 1973, após aceitarem o convite dos irmãos Villas Bôas para serem transferidos. Ocuparam a parte norte do PIX em aldeias próximas ao Polo Diauarum. Esta mudança de habitat possibilitou, depois de quase meio século, o aumento da população, preservação da identidade cultural e evitou que fossem dizimados ou absorvidos no mercado de trabalho rural ou urbano precarizado (Pagliaro, 2005).

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precária. Estavam doentes, subnutridos, sendo necessário intervir, pois grupos de garimpeiros chegavam cada vez mais próximos de seu território. Diante desta situação, em julho de 1967, foram transferidos para o Xingu, restando apenas 56 deles. A maior parte da população era composta por crianças e adultos, estavam magros e doentes (Baruzzi, 2005; Hemming, 2005; Villas Bôas, 2005 a). Diferente dos Kaiabi, os Ikpeng tiveram muitas dificuldades de adaptação no novo território, permanecendo algum tempo na região do Alto Xingu, convivendo forçadamente com seus antigos inimigos. No final dos anos 70, mudaram-se para a região do Médio Xingu no Polo Pavuru (ISA, 2009). A população atual é de 421 habitantes segundo censo de 2011.

Os Yudjá foram contatados pelos irmãos Villas Bôas em 1948 no baixo rio Xingu com população muito reduzida. Eles residiram anteriormente na desembocadura do rio Xingu, no Amazonas. A partir do século XVII, os sobreviventes do constante contato com colonizadores e doenças, migraram rio acima, sendo pouco a pouco empurrados para o Alto Xingu (Baruzzi, 2005; Hemming, 2005). Segundo dados de historiadores, o povo Yudjá representava 2000 pessoas em 1842; 200 em 1884; 150 em 1896; 52 em 1916 e 37 pessoas em 1950 (Baruzzi, 2005; Hemming, 2005; ISA, 2009). A maioria desse povo concentra-se na região do Polo Diauarum com população de 260 pessoas, dados de 2011.

No século XIX, quando os Trumai chegaram ao PIX, consta que eram bastante numerosos. Porém, em decorrência de conflitos e guerras com inimigos, epidemias de gripe, sarampo e disenteria, ocorreu diminuição abrupta da população que quase foi extinta. Esse povo foi o último a chegar aos formadores do rio Xingu e teriam se originado da região do Araguaia, deixando essas terras por conflitos com outros povos indígenas, vindo a encontrar os irmãos Villas Bôas em 1946 (Hemming, 2005; ISA, 2009). Por um longo período habitaram as proximidades do Posto Leonardo, no Alto Xingu, depois foram se instalar na margem esquerda do rio Xingu, onde se distribuíram em quatro pequenas aldeias situadas na abrangência do Polo Pavuru, Médio Xingu (ISA, 2009).

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denominada Pyulaga, e outra, no Médio Xingu, formando a aldeia Aruak localizada nas margens do rio Von den Steinen (ISA, 2009).

O primórdio do contato dos Kamayurá com a sociedade remonta a 1884, na expedição do antropólogo alemão Karl Von den Steinen ao Xingu, na parte sul do Xingu. Nesta época estavam em 264 pessoas, em 1938 eram cerca de 240. As epidemias de sarampo os reduziram a 94 pessoas no ano de 1954 (Junqueira, 2002; ISA, 2009). A maior parte do povo Kamaiurá vive na aldeia Ipavu, localizado no Alto Xingu. Na região central do Parque, as margens do rio Xingu, na aldeia Morená, vivem algumas famílias que se encontram na região do Médio Xingu, Polo Pavuru (ISA, 2009).

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5.4. Programa de atenção básica à saúde no Xingu

A partir de 1999, com a nova política de saúde indígena configurada na criação dos DSEI, iniciou-se reestruturação de uma rede de atenção básica nos territórios indígenas que fosse capaz de atender, de forma diferenciada, as especificidades dessa população. Nesse modelo, equipes multiprofissionais são responsáveis pela atenção à saúde nas aldeias.

O território de atenção à saúde no Xingu está dividido em quatro polos base, cada um com várias aldeias em sua área de abrangência. Cada polo conta com equipe multiprofissional de saúde indígena (EMSI) formada por médico, enfermeiro, dentista, auxiliar de enfermagem indígena (AEI) e agentes indígenas de saúde (AIS). Os AIS estão presentes na maioria das aldeias e são imprescindíveis na operacionalização da atenção básica na saúde indígena. Há uma coordenação técnica que supervisiona e orienta o trabalho desenvolvido pela EPM/UNIFESP no DSEI Xingu, capacita e norteia a EMSI na atenção à saúde. Além desses profissionais, existem os professores indígenas que trabalham em conjunto com a EMSI nas escolas e comunidades. Os curadores tradicionais como pajés, raizeiros e parteiras ocupam papel fundamental no processo de tratamento e cura.

Os profissionais de saúde no Xingu cumprem escala de trinta dias em campo e quinze dias de folga. As escalas são organizadas de maneira que permitam cobertura contínua das aldeias. As equipes, geralmente, permanecem fixas nos polos por determinado período, com objetivo de aumentar vínculo com a comunidade e dar continuidade nas ações em saúde. A comunicação entre os polos e aldeias acontece comumente via rádio. Em alguns locais existe possibilidade de se utilizar internet.

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em saúde oriundas das aldeias e polos são organizadas e consolidadas por essa equipe antes de serem encaminhadas ao DSEI.

No subsistema de saúde indígena, o primeiro atendimento acontece na aldeia, sendo que cuidados iniciais são prestados pelos AEI e AIS sob orientação dos médicos e enfermeiros (Figura 2). Quando o problema de saúde não pode ser resolvido na aldeia, os doentes são encaminhados para Unidade Básica de Saúde (UBS) localizada nos polos, que possui maior poder resolutivo. Se mesmo assim, não for possível tratar o doente, a equipe de saúde encaminha para uma das Casas de Apoio a Saúde Indígena (CASAI)8 localizadas nos municípios de Querência, Canarana e Sinop, no estado de Mato Grosso. As CASAI fazem a interface com o SUS regional e tem como função alojar e acompanhar os pacientes indígenas para investigação diagnóstica e tratamento de maior complexidade (Rodrigues, 2005).

O suporte para atendimento secundário e terciário é de responsabilidade do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena que deve se articular com os centros de referência de média e alta complexidade. Porém, nessa estruturação dos serviços para atender as demandas de saúde, há uma infinidade de questões que interferem na política de atenção a saúde indígena e que dificulta a concretude do modelo proposto. Freqüentemente, a fragilidade desse sistema tem origem na atenção básica, refletindo em todos os níveis de atenção à saúde.

O programa de saúde desenvolvido no Xingu está organizado nas áreas de saúde da criança, do adulto, do idoso, da mulher, da imunização, do controle de endemias, da vigilância à saúde e do atendimento das urgências e emergências. Dentre essas ações, destacamos o programa de saúde da mulher com enfoque no período gravídico puerperal, queixas ginecológicas mais freqüentes como dor em baixo ventre, DST e prevenção do câncer do colo do útero.

Um dos pilares de trabalho da EPM/UNIFESP no Xingu é a formação dos próprios indígenas para atuar na saúde, como gestores e interlocutores dentro e fora da aldeia. A capacitação acontece de acordo com a realidade local, por meio de cursos modulares regulares e também de forma contínua no dia-a-dia.

8 A casa de apoio a saúde indígena (CASAI) faz parte da estrutura do subsistema de saúde indígena, os Distritos Sanitários

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Figura 2. Organização da assistência à saúde indígena Fonte: Brasil, 2007

A formação dos agentes indígenas de saúde e auxiliares de enfermagem indígenas foi concebida como um elo entre os serviços de saúde e a comunidade indígena. Foi uma estratégia para garantir sua inserção no mercado de trabalho e atuar como promotor de saúde enfatizando a integração entre as práticas de prevenção e cura envolvidas no processo de saúde-doença. Com a profissionalização desses indígenas, houve um salto de qualidade no serviço de saúde sendo vislumbradas diferentes possibilidades de formação no contexto da saúde (Mendonça, 2005; Oliveira, 2005; Rodrigues, 2005).

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al., 2001; Cardoso et al., 2003; Santos et al., 2003; Baruzzi, 2005; Rodrigues, 2005; Brasil, 2007; Gimeno et al., 2007; Salvo et al., 2009).

Gimeno et al., (2007) avaliaram o perfil metabólico e antropométrico de indígenas do Xingu e evidenciaram altas porcentagens de indivíduos com excesso de peso, dislipidemias e elevação dos níveis pressóricos. Esse perfil é decorrente das mudanças no estilo de vida como redução de atividade física e o aumento no consumo de alimentos industrializados.

Transcorridos mais de quatro décadas de atuação da EPM/UNIFESP no Xingu, os resultados são evidenciados pelos indicadores demográficos e epidemiológicos. De acordo com dados levantados, a população do PIX passou de 1.220 pessoas no ano de 1970 para 5.000 no ano de 2005. O programa de imunização sempre foi destacado como fundamental para as melhores condições de saúde e sobrevivência desta população. A cobertura vacinal atingiu níveis satisfatórios no Xingu e obteve nítido progresso nos últimos anos com amplo número de vacinas preconizadas pelo Ministério da Saúde e aquelas recomendadas aos povos indígenas (Baruzzi, 2007).

A mortalidade infantil, no Xingu, vem se estabilizando no decorrer dos anos, permanecendo entre 30 a 35 mortes por 1000 nascidos vivos no período de 1999 a 2005. O pano de fundo para este cenário é a falta de saneamento básico e a desnutrição infantil que, associadas às doenças diarréicas, respiratórias e afecções neonatais constituem as principais causas de morte entre crianças menores de um ano de idade. Quanto à mortalidade geral, os números também estão decrescendo conseqüente à melhoria das condições de saúde. Foi verificada no ano de 1999, ocorrência de 22 óbitos; no ano de 2005 este valor baixou para seis casos (Rodrigues, 2005; Rodrigues et al., 2005).

Referências

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