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Informação, participação e cobrança pelo uso da água: um relato do processo no comitê para integração da bacia do rio Paraíba do Sul

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE

HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL – CPDOC

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, POLÍTICA E BENS

CULTURAIS - PPHPBC

MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM BENS CULTURAIS E PROJETOS

SOCIAIS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Programa de Pós Graduação em

História Política e Bens Culturais (PPHPBC) do Centro de Pesquisa e Documentação

em História Contemporânea do Brasil – CPDOC para obtenção do grau de Mestre em

Bens Culturais e Projetos Sociais.

CLÁUDIA SANTIAGO DE ABREU

RIO DE JANEIRO

MARÇO DE 2006

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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE

HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL - CPDOC

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, POLÍTICA E BENS

CULTURAIS - PPHPBC

MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM BENS CULTURAIS E PROJETOS

SOCIAIS

INFORMAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA: UM

RELATO DO PROCESSO NO COMITÊ PARA INTEGRAÇÃO DA BACIA DO RIO

PARAÍBA DO SUL.

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

APRESENTADO POR

CLÁUDIA SANTIAGO DE ABREU

PROFESSOR ORIENTADOR: FERNANDO LATTMAN WELTMAN, D.Sc.

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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE

HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL - CPDOC

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA, POLÍTICA E BENS

CULTURAIS - PPHPBC

MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM BENS CULTURAIS E PROJETOS

SOCIAIS

INFORMAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA: UM

RELATO DO PROCESSO NO COMITÊ PARA INTEGRAÇÃO DA BACIA DO RIO

PARAÍBA DO SUL

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

APRESENTADO POR

CLÁUDIA SANTIAGO DE ABREU

E APROVADO EM 10/03/2006

PELA BANCA EXAMINADORA

FERNANDO LATTMAN WELTMAN, D.Sc. – professor orientador

ROSA MARIA FORMIGA-JOHNSSON, Docteur - professora co-orientadora.

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Resumo da dissertação apresentada ao CPDOC/FGV como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre em Bens Culturais e Projetos Sociais

INFORMAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA:

UM RELATO DO PROCESSO NO COMITÊ PARA INTEGRAÇÃO DA BACIA DO

RIO PARAÍBA DO SUL

Cláudia Santiago de Abreu Março/2006

Orientadores: Fernando Lattman-Weltman, D.Sc. Rosa Maria Formiga-Johnsson, Docteur

Esta dissertação relata o uso da informação no processo decisório havido na bacia do rio Paraíba do Sul em torno da implementação da cobrança pelo uso da água bruta, instituída pela Política Nacional de Recursos Hídricos. De grande importância no cenário nacional essa bacia hidrográfica foi escolhida como foco de estudo por se tratar de uma experiência pioneira de implementação de um Sistema de Gestão de Recursos Hídricos em rios de domínio da União, tendo como pano de fundo a complexidade do federalismo brasileiro e a falta de tradição em processos participativos para tomada de decisão neste campo. O estudo mostra, ainda, como a cobrança pelo uso da água foi um fator de aglutinação dos atores da bacia, como o capital social acumulado foi fundamental para o processo de negociação, e finalmente, como o uso da informação técnica, ao contrário do que se imaginava, proporcionou avanços significativos na metodologia e critérios propostos para implementação desse importante instrumento de gestão das águas.

(5)

ABSTRACT

This essay reports the use of information in the decisive process that took place in the basin of Paraíba do Sul River when charging for the use of untreated water was implemented, determined by National Policy of Hydro Resources, in the year of 1997. This hydrographic basin is of great importance to the national scenery of Brazil (since it is located between the two largest cities of the country). It was chosen as the focus of this study because it was a pioneer experience in implementing a Management System of Hydro Resources in rivers of Union domain, having as background the complexity of Brazilian federalism and the lack of tradition in participative processes of making decisions in this field. This study shows how the fact of charging for the use of water was an agglutinative factor for all the actors in the basin, how the accumulative social capital was fundamental for the negotiation process, and finally how the use of technical information, contrary to what was expected, led to significant advances in methodology and criteria proposed for implementation of this important instrument of water management.

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“A água quando encontra pedras desvia-se e passa por elas, mas quando presa abre desvia-seu próprio caminho”.

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Agradecimentos

Quando a vida começa, temos apenas uma pequenina mala na mão. À medida que os anos vão passando, a mala aumenta porque recolhemos muitas coisas pelo caminho, coisas que pensamos ser importantes, coisas realmente importantes e outras nem tanto... Escrever esta dissertação foi tirar da mala impressões, discussões, ensinamentos, articulações, idealismo, alegrias, realizações e muitas aventuras vividas em uma década de trabalho na bacia do rio Paraíba do Sul.

Ao meu orientador, Prof. Fernando Lattman-Weltman, por entender uma orientanda inquieta e aceitar o desafio de uma proposta complexa e inovadora no contexto do CPDOC, e particularmente pelo apoio nos momentos absurdamente difíceis em função de uma fatalidade;

À minha co-orientadora, Profa. Rosa Formiga, pela generosidade em partilhar seu conhecimento, por seu incentivo, longas conversas e incontáveis puxões de orelha, que só os generosos sabem dar;

Aos amigos Rita Ciocci, Jacy Ferino, Milton Brandão, Fátima Casarin e Isabel Castro, pelo apoio emocional e a infinita paciência;

Ao ex-diretor do Instituto Brasileiro de Economia – IBRE/FGV, Antonio Carlos Porto Gonçalves, pela confiança;

Ao Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil - CPDOC/FGV, pela bolsa de estudos;

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Envolvimento com o tema

Nos anos de 1990, na extinta Rede Manchete de Televisão, iniciei minha carreira profissional como jornalista. Em 1992, tive a oportunidade de cobrir aquele que seria um dos grandes marcos sobre as discussões do desenvolvimento sustentável, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), no Rio de Janeiro, a Rio-92.

No ano seguinte, ingressei como estagiária de Comunicação Social, em um grupo estatal francês de águas e saneamento, a Beture Setame, sendo alocada no Projeto de Cooperação Técnica Brasil-França, coordenado pelo Ministério de Minas e Energia e pela Embaixada da França no Brasil. Tratava-se de um projeto pioneiro no campo da gestão de recursos hídricos no Brasil, denominado “Projeto Paraíba do Sul”. Em 1994, assumi o cargo de gerente de Comunicação Social e Educação Ambiental do referido projeto, onde permaneci até o ano de 1999.

Com o fim do projeto de cooperação em junho de 1999, implementei e coordenei a execução, no âmbito do Comitê para Integração da Bacia do Rio Paraíba do Sul – CEIVAP, o Programa de Educação Ambiental para a Gestão de Recursos Hídricos da bacia do rio Paraíba do Sul - “Programa Curso D’Água de Educação Ambiental”, nos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, iniciado no âmbito do Projeto Paraíba do Sul. Paralelamente, atuei como consultora do Projeto Alto Paraguai (Fundo Francês para o Meio Ambiente Mundial), e do Programa de Mobilização Participativa para a cobrança pelo uso da água (MMA-SRH / UFRJ-COPPE / UNESCO).

Em 2001, ingressei na Fundação Getulio Vargas, por meio do Instituto Brasileiro de Economia - IBRE, como Coordenadora de Projetos e com a responsabilidade de promover cursos e seminários ligados às áreas de meio ambiente, energia e comunicação, além dos eventos institucionais. Paralelamente continuei atuando na bacia do rio Paraíba do Sul, de forma eventual, em projetos de capacitação de atores locais e ações de comunicação para implementação da cobrança pelo uso da água bruta.

(9)

INDICE

Resumo___________________________________________________________ 04 Abstratc ___________________________________________________________ 05 Agradecimentos_____________________________________________________ 07 Envolvimento com o tema _____________________________________________ 08 Tabelas____________________________________________________________ 11 Quadros____________________________________________________________ 12 Ilustrações__________________________________________________________ 13 Siglas______________________________________________________________ 14 1 – Introdução_______________________________________________________ 15

1.1 - Objeto 18

1.2 - Metodologia 19

1.3 – Justificativa do Estudo 20

1.4 – Estruturação dos Capítulos 21

2 – O Vale do rio Paraíba do Sul_________________________________________ 23 2.1 – A bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul: características e principais

problemas

25

2.2 – Demografia 27

2.3 – Cobertura Vegetal e uso do solo 28

2.4 – Saneamento Ambiental: abastecimento de água e esgotamento sanitário 30

2.5 – Uso Industrial 32

2.6 – Geração de Energia Elétrica 33

2.7 – Uso agropecuário 34

3 – A gestão das águas no federalismo brasileiro: do Código de Águas a Política Nacional de Recursos Hídricos ______________________________________ 35 3.1 – Evolução dos modelos gerenciais das águas 36 3.2 – O Federalismo brasileiro e a gestão das Águas 43 3.3 – A Política Nacional de Gestão de Recursos Hídricos 47 3.3.1 – A aprovação da Lei 9.433/97: conspiração e luta pelo poder? 49 3.3.2 – Lei 9433/97: princípios, instrumentos de gestão e organização

político-institucional

51

3.4 – Uma descentralização complexa 54

3.4.1 – Dominialidade dos Corpos d’água e gestão de bacias hidrográficas 54

3.4.2 – Em busca de soluções: pacto de gestão 56

(10)

4 – A gestão da bacia do rio Paraíba do Sul e a implementação da cobrança pelo uso da água bruta_________________________________________________

64

4.1 – Breve panorama histórico 65

4.2 – O Comitê para Integração da cobrança pelo uso da água bruta 68 4.3 – AGEVAP – a Agência de Água da Bacia do Rio Paraíba do Sul 72

4.4 – Dinâmica e áreas principais de atuação 74

4.5 – A cobrança pelo uso da água bruta 76

4.5.1 – Uma experiência pioneira: a cobrança pelo uso da água bruta na bacia do rio Paraíba do Sul

77

4.5.1.1 – O processo de negociação e condições prévias para cobrança 77 4.5.2 – Arrecadação e aplicação dos recursos da cobrança 84 5 – Informação técnica: insulante ou democratizante?________________________ 85

5.1 – Dados e informação 86

5.2 – Informação técnica, científico-tecnológica ou informação ambiental? 89 5.3 – Barreiras na comunicação da informação ambiental 90

5.4 – Informação para a tomada de decisão 92

5.4.1 – Disseminação e apropriação da informação técnica 94 6 – Participação: CEIVAP um lócus privilegiado?____________________________ 99

6.1 - Participação 103

6.2 – Participação dos atores no processo decisório para implementação da cobrança

106

(11)

TABELAS

Tabela 1 - População da bacia do rio Paraíba do Sul – IBGE 2000 27 Tabela 2 – Saneamento básico em municípios com mais de 15 mil habitantes por Estado

31

Tabela 3 – Disposição final de resíduos sólidos na bacia do Paraíba do Sul, por Estado

32

Tabela 4 – Principais usos da água da bacia do rio Paraíba do Sul 34

Tabela 5 – Composição inicial do CEEIVAP em 1979 66

Tabela 6 - Composição do CEIVAP, por segmento – 2001 – 2002 71 Tabela 7 – Arrecadação da cobrança pelo uso da água de domínio da União na bacia do rio Paraíba do Sul. Período compreendido entre Março de 2003 a Outubro de 2005

84

Tabela 8 – Conceitos relativos a Dados e Informação 87

Tabela 9 – Projetos e programas implementados na bacia do rio Paraíba do Sul no período de 1992 a 2003

98

Tabela 10 – Evolução da participação nos processos eleitorais do CEIVAP 102 Tabela 11 – Índice de participação de membros do CEIVAP em atividades do Comitê 113 Tabela 12 – Índice de participação em reuniões de Câmara Técnica 114 Tabela 13 – Índice de participação em eventos relacionados a recursos hídricos 114

(12)

QUADROS

Quadro 1 – Cartas da ABRH contendo recomendações à Política Nacional de Recursos Hídricos

42

(13)

ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Delimitação do objeto de estudo 20

Figura 2 – Localização da bacia do rio Paraíba do Sul 26

Figura 3 – Bacia hidrográfica de rio Federal 26

Figura 4 – Mapa de cobertura vegetal 29

Figura 5 – Voçoroca localizada no município de Vassouras 30

Figura 6 – Resíduos em suspensão - rio Paraibuna – MG 31

Figura 7 – Matéria veiculada na mídia sobre acidente ambiental 33 Figura 8 – Dinâmica de atuação do Sistema Francês de gestão de Recursos hídricos 48 Figura 9 – Campo de forças para aprovação da Política Nacional de Recursos Hídricos

51

Figura 10 – Unidades hidrográficas francesas de gestão e suas Agências de Bacia 55 Figura 11 – Integração de atores no processo de gestão da bacia: o pacto de gestão pela água

58

Figura 12 – Comitês de bacias hidrográficas existentes (maio de 2005) 61 Figura 13 – Os Comitês e Agências de Bacia no Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos

75

Figura 14 – Metodologia de cobrança pelo uso da água na bacia do rio Paraíba do Sul

83

Figura 15 – Informações utilizadas na tomada de decisão 93

Figura 16 – Acesso a informação 95

Figura 17 – Disponibilização da informação 95

Figura 18 – Comunicação da informação 96

Figura 19 – Nível de confiabilidade na produção e disseminação de informação 97 Figura 20 – Estrutura da organização da sociedade segundo a teoria política e sua configuração no sistema de gestão de recursos hídricos.

(14)

SIGLAS

ANA Agência Nacional de Águas

ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica

AGEVAP Associação Pró-gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul ABRH Associação Brasileira de Recursos Hídricos

CEEIBH Comitê de Estudos Integrados de Bacias Hidrográficas

CEIPAS Comissão de Estudos Integrados da Bacia do Rio Paraíba do Sul

CEEIVAP Comitê Executivo de Estudos Integrados de Bacia do Rio Paraíba do Sul CEIVAP Comitê para Integração da Bacia do Rio Paraíba do Sul

CNRH Conselho Nacional de Recursos Hídricos CERH Conselho Estadual de Recursos Hídricos CEDAE Companhia Estadual de Águas e Esgoto

CODEVASF Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco DAEE Departamento de Águas e Energia Elétrica de São Paulo DNAEE Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica IGAM Instituto Mineiro de Gestão das Águas

FIRJAN Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro FIESP Federação das Indústrias do Estado de São Paulo FIEMG Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais MME Ministério de Minas e Energia

MMA Ministério do Meio Ambiente PQA Projeto Qualidade das Águas SRH Secretaria de Recursos Hídricos

SERLA Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (RJ)

(15)
(16)

Whiskey is for drinking. Water is for fighting over.”1 Mark Twain

Ela permeia a música, a literatura, a pintura, a arquitetura, a religião, o imaginário coletivo e o nosso cotidiano e, por séculos e em diversas culturas, foi considerada como um bem inesgotável. Em todo o mundo, estima-se que um bilhão de pessoas não tenha acesso à água potável e que cerca de 2,4 bilhões não tenham acesso a serviços de saneamento, fazendo com que doenças de veiculação hídrica, como cólera, esquistossomose, hepatite, verminose, entre outras, matem milhares de pessoas por ano, sendo as crianças sua principal vítima (Unicef, 2000).

Há alguns anos, o então vice-presidente do Banco Mundial para assuntos relacionados ao meio ambiente e presidente da Comissão Mundial da Água, Ismail Serageldin2 declarou, de forma enfática e dura, a célebre frase “As guerras do século XXI serão travadas por causa da água”. Mesmo criticado, ele nunca voltou atrás em sua afirmação. A ele juntaram-se chefes de Estado, como o rei Hussein da Jordânia3, que

tinha motivos de sobra para acreditar nessa possibilidade; afinal, trata-se de um conflito milenar no Oriente Médio, onde 85% da água disponível para cada país da região origina-se fora de suas fronteiras ou são provenientes de fontes compartilhadas4.

Entretanto, existem outras correntes de pensamento. Apesar do problema potencial, muitos especialistas preferem acreditar na probabilidade de cooperação em torno dos recursos hídricos e não no conflito. Araaon Wolf, professor de geociências da Universidade de Oregon (EUA), renomado especialista em administração de recursos hídricos e consultor do Departamento de Estado Americano para o Oriente Médio, afirma que:

“(...) as tensões provocadas por disputas de reservas hídricas são muitas, mas a única guerra conhecida e que teve como ponto central uma questão envolvendo a água, ocorreu na região onde atualmente encontra-se o Iraque e a Síria (bacia dos rios Tigre e Eufrates), entre duas cidades-estado (Lagash e Umma) há 4.500 anos”. (Araaon Wolf et al, 2003, p.30).

1Whiskey é para beber; a água, para se travar batalhas.”

2Atualmente Ismail Serageldin dirige a nova Biblioteca de Alexandria, no Egito.

3 O rei Hussein da Jordânia faleceu em 1999.

(17)

Mas, se a água não é claramente o ponto central, ela é, certamente, um elemento de geoestratégia nas guerras da atualidade. Israel e outros países da região a consideram um assunto de segurança nacional e a história mostra que os conflitos em torno da água não se limitam a árabes e judeus. Egito, Sudão e Etiópia, Índia e Paquistão, Estados Unidos e México, além de Brasil e Argentina já vivenciaram conflitos em torno do acesso à água. (Rebouças et al 2002; Villiers, 2002 e Bouguerra, 2003).

Os conflitos relacionados à gestão de bacias hidrográficas em rios transfronteiriços são semelhantes aos dos rios de domínio da União ou dos Estados, divisão político-administrativa adotada pelo Brasil. Dimensões, contrastes climáticos, diversidade de ecossistemas, distribuição demográfica, condições socioeconômicas e aspectos culturais-regionais fazem com que cada bacia hidrográfica seja única em diversos aspectos, mas todas enfrentam problemas semelhantes.

Comparado a outros países, o Brasil ocupa posição privilegiada no que ser refere à disponibilidade hídrica de suas bacias. Estima-se que em nosso território encontram-se 12% das reservas mundias. No entanto, percebe-se que 73% da água disponível em território brasileiro localiza-se na Amazônia, habitada por 4% da população, e apenas 27% dos recursos hídricos estão disponíveis para 96% da população restante (Rebouças et al, 2002; Campos, 2005).

A cultura errônea de abundância, a distribuição geográfica irregular e a degradação em virtude de ações antrópicas tornaram a água imprópria para diversos usos e originaram a necessidade de racionalização do uso deste recurso. A escassez não é mais uma característica apenas da região semi-árida. Em 2005, foi registrada a pior seca dos últimos 102 anos na região mais úmida do país, a Amazônia.

(18)

O fenômeno da seca, segundo Lanna (1995), foi o responsável pela introdução, no Brasil, de processos de gerenciamento de recursos hídricos, tendo como marco referencial o Código de Águas de 1934, primeira legislação a regulamentar o uso desse recurso no país. A nova Constituição Federal, promulgada em 1988, criou o cenário adequado à proposição de uma legislação mais abrangente. Após anos de tramitação no Congresso Nacional, foi aprovada a Lei 9.433, de 1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e canais descentralizados de participação por meio dos Conselhos Nacional e Estaduais de Recursos Hídricos e dos Comitês de Bacias Hidrográficas. A gestão das águas passou a ser realizada por bacias hidrográficas e com a participação do Estado, usuários privados e sociedade civil, “desaguando em um rico momento de exercício da cidadania” (Garjulli, 2002).

Assim, nosso estudo refere-se à bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul, uma das mais importantes bacias hidrográficas da região sudeste do Brasil e que concentra cerca de 10% do PIB nacional. Nosso foco é a atuação do Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul - CEIVAP, organismo criado por meio da Lei 9.433/97, na proposição e implementação da cobrança pelo uso da água bruta e, mais especificamente, como a informação sobre as questões ambientais ou a informação técnica foi utilizada pelos membros do comitê para implementação desse instrumento de gestão.

1.1. OBJETO

(19)

1.2. METODOLOGIA

Para o desenvolvimento deste trabalho buscou-se, primeiramente, a realização de uma pesquisa bibliográfica sobre a situação socioeconômica e ambiental da bacia do rio Paraíba do Sul. Da mesma forma, resgatamos o processo de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos – Lei 9.433/97, além da criação do Comitê de Bacia para Integração da Bacia do Rio Paraíba do Sul - CEIVAP e de seu braço executivo (Agência de Bacia), a Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia do Rio Paraíba do Sul – AGEVAP.

Posteriormente realizamos a revisão bibliográfica sobre o processo de implementação da cobrança pelo uso da água bruta e do processo de negociação com os atores da bacia hidrográfica, em torno da metodologia e critérios para aplicação desse instrumento de gestão. Dessa forma, buscamos resgatar o processo de discussão, as principais reivindicações e como se chegou à solução de consenso.

Para o desenvolvimento da pesquisa, utilizamos diversas bases teóricas, a saber:

federalismo brasileiro, que nos remete às questões de reforma do Estado e, mais especificamente, da complexidade da descentralização da gestão de bacias hidrográficas compartilhadas entre União e Estados (dominialidade), como é o caso da bacia do rio Paraíba do Sul; participação, para explicar o nível de envolvimento dos segmentos representados no colegiado e suas atuações durante o processo decisório e, por fim, informação, na tentativa de definir, segundo a literatura disponível, o tipo de informação utilizada no processo decisório pela cobrança do uso da água naquela bacia hidrográfica.

(20)

no colegiado (Estado, usuários privados e sociedade civil) considerados ativos durante o processo decisório e oriundos de Estados distintos (SP, MG e RJ).

Período relacionado ao

processo decisório e implementação da cobrança

1996 Criação do CEIVAP 2000 Criação da ANA 2001

Início das discussões em torno da

cobrança 2002 Regularização de usos 2003 Início da cobrança 2004 Criação da AGEVAP 2005

Figura 1: delimitação do objeto de estudo

1.3. JUSTIFICATIVA DO ESTUDO

Segundo dados do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, o Brasil possui atualmente seis Comitês de Bacias Hidrográficas instalados (sob jurisdição federal). A escolha pelo caso do CEIVAP se justifica na medida em que:

• trata-se da experiência pioneira e mais adiantada na implementação do sistema de gestão integrada de recursos hídricos;

• trata-se da bacia hidrográfica mais bem estudada do país em seus aspectos ambientais, sociais, econômicos e institucionais, o que possibilitou a existência de um vasto número de informações consolidadas por meio de relatórios técnicos;

• trata-se da bacia pioneira, em nível nacional, na cobrança pelo uso da água;

• trata-se de uma experiência em que o processo de decisão pela cobrança se deu de forma participativa;

• trata-se de um processo decisório pela cobrança pelo uso da água em que o nível de participação, por segmento, foi claramente diferenciada;

(21)

1.4. Estruturação dos Capítulos:

O Capítulo 1 tem por objetivo fornecer uma visão global e sucinta da problemática hídrica, além de descrever o objeto da pesquisa, a metodologia empregada e a justificativa do estudo.

Para compreender a necessidade de uma gestão integrada de recursos hídricos na bacia do rio Paraíba do Sul tornou-se necessário abordar, no Capítulo 2, como historicamente as ações antrópicas afetaram os ecossistemas existentes e quais são as atuais condições socioambientais da bacia, que levaram à necessidade de um gerenciamento integrado.

Dada à complexidade do modelo brasileiro de gestão de recursos hídricos, que se encontra ainda em processo de construção, descrevemos, no Capítulo 3 a gestão dos recursos hídricos no Brasil, a partir da criação do Código de Águas, em 1934, até a promulgação da Lei 9.433, de 1997, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou as figuras dos Comitês e Agências de Bacias Hidrográficas, além da complexidade do sistema em função do federalismo brasileiro.

No Capítulo 4, abordamos o processo de criação e de amadurecimento do Sistema de Gestão de Recursos Hídricos da bacia do rio Paraíba do Sul, além dos pressupostos da cobrança pelo uso da água (proposta metodológica e critérios de cobrança) e como a negociação entre os usuários culminou em uma metodologia mais sofisticada e em critérios mais abrangentes que os inicialmente propostos.

A informação é um elemento-chave no processo de tomada de decisão. Entretanto, dada a originalidade do estudo em relação à introdução desse elemento na análise do processo de decisão pela cobrança do uso da água, buscamos, no Capítulo 5, identificar o que os atores da bacia denominam como informação técnica e como ela foi disponibilizada e apropriada pelos tomadores de decisão.

(22)
(23)
(24)

“Se os homens são a história os rios não raro são a trajetória dela”. Ênio Squeff, jornalista.

Inúmeros eventos significativos assinalaram a evolução histórica do Brasil e influenciaram o desenvolvimento do Vale do Paraíba do Sul. Sua ocupação teve início no século XVII, com o estabelecimento de povoados no trecho paulista (Vila de São Francisco da Chagas de Taubaté, São José dos Campos e Areal) e junto à foz do rio Paraíba do Sul, no Estado do Rio de Janeiro. A criação da Capitania dos Campos dos Goytacazes e a fundação da cidade de mesmo nome, em meados do século XVII, marcaram a concretização da colonização e o desenvolvimento de diversos ciclos econômicos (cana de açúcar, caça ao índio, ouro, café e industrialização).

As vésperas da independência do Brasil e, em virtude da decadência do extrativismo aurífero, renascem as atividades agrícolas e, apesar da importância que a cultura canavieira ainda mantinha, uma nova cultura se transforma na força econômica da região e do País: o café. Foi com a cultura do café, a partir do final do século XVIII e, intensificada no decorrer do século XIX que a ocupação do Vale do Paraíba, fora da tradicional área da lavoura canavieira de Campos, tomou impulso5. Por sua vez, a

decadência da cafeicultura fez surgir uma nova atividade econômica: a pecuária. Esta atividade ainda perdura nos dias de hoje, sobretudo com a criação do gado de leite em regime extensivo. No entanto, sem alcançar resultados expressivos.

As primeiras décadas do século XX são marcadas pelo surgimento das atividades industriais, alavancadas pela política do Estado Novo, iniciado em 1937, e do intervencionismo estatal. Uma das heranças do ciclo do café, a infra-estrutura de transportes, composta pelas estradas de ferro que cortavam todo o Vale e o ligava ao litoral, aliados à posição geográfica da bacia e ao potencial hidráulico, fundamentaram as bases para o desenvolvimento econômico subseqüente.

O Vale começava a sair da inércia decorrente da crise do café. A implantação, em 1946, da Companhia Siderúrgica Nacional – CSN, no município de Volta Redonda, no Estado

5 O início do ciclo do café no Vale do Paraíba data de 1790, com o surgimento das primeiras plantações

(25)

do Rio de Janeiro, e a expansão da atividade industrial em São Paulo, em direção ao Vale do Paraíba, desencadearam um processo que resultou na formação de um eixo industrial entre essa cidade e o Rio de Janeiro.

À malha ferroviária existente, juntou-se importantes eixos rodoviários como a Via Dutra, inaugurada em 1951 pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra com a denominação de “ligação Rio - São Paulo” e fruto das necessidades geradas pelo processo de industrialização. O estágio mais recente deste processo é representado pela instalação da indústria automobilística nos municípios de Porto Real, Quatis e Resende, no Médio Paraíba.

Tanto as atividades agropecuárias quanto urbano-industriais da bacia foram desenvolvidas sem respeito às restrições ambientais, resultando em problemas crescentes e danos à qualidade do meio ambiente e dos recursos hídricos.

2.1. A bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul:

características e principais problemas

O rio Paraíba do Sul nasce da junção dos rios Paraitinga e Paraibuna no Estado de São Paulo, a partir de três reservatórios: Paraibuna, Paraitinga e Santa Branca. Sua bacia hidrográfica abrange uma área total de 55.400km2, distribuída pelos Estados de São

Paulo (13.500Km2), Minas Gerais (20.500Km2) e Rio de Janeiro (22.600Km2). Neste

(26)

Figura 2: Localização da bacia do rio Paraíba do Sul Fonte: Coppe/UFRJ

Percorrendo a extensão de aproximadamente 1.150 km, o rio Paraíba do Sul encontra o mar no município de São João da Barra, no Estado do Rio de Janeiro. Por compreender três Estados, trata-se de uma “bacia nacional” (Figura 3), ou seja, bacia cujo rio principal é de domínio da União6. Sua área corresponde a 6% do total da superfície da Região Sudeste e engloba 180 municípios, sendo que 36 deles encontram-se parcialmente inseridos na bacia.

Figura 3: Bacia de domínio da União - Fonte: Coppe/UFRJ

Figura 3: bacia hidrográfica de rio Federal Fonte: Coppe/UFRJ

6

No Brasil, as águas podem ser de domínio da União ou dos Estados da Federação (Constituição 1988).

BACIA DE RIO FEDERAL

(27)

Segundo (Nogueira et al, 2000), a noção de bacia hidrográfica pressupõe a delimitação de um tipo especial de unidade territorial, derivada da organização espontânea dos cursos d’água, que se justapõe à organização política e administrativa existente – União, Estados e Municípios – a qual decorre do modo como os homens tradicionalmente organizam seu espaço.

Se por um lado à bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul ocupa uma parcela pequena da região Sudeste, por outro, compreende uma das áreas mais industrializadas do país, responsável por cerca de 10% do PIB brasileiro e abastece em água potável, aproximadamente 14 milhões de pessoas, incluindo mais de oito milhões de habitantes da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, situada fora dos limites da bacia.

2.2. Demografia

A população era essencialmente rural e o índice populacional apresentou elevação a partir da década de 60 com a aceleração do processo de industrialização. A região é fortemente urbanizada e, nas últimas décadas, verificou-se um significativo processo de migração fazendo com que cerca de 90% dos habitantes da bacia vivam hoje em áreas urbanas (Tabela 1).

Tabela 1: População da bacia do rio Paraíba do Sul (Censo IBGE 2000)

Estado Municípios População Rural População Urbana População Total

São Paulo 39 165.002 1.933.324 2.098.326

Minas Gerais 88 214.005 1.172.492 1.386.497

Rio de Janeiro 53 288.735 2.132.828 2.421.563

TOTAL 180 667.742 5.906.386 5.238.644

População beneficiada pela transposição para bacia do Rio Guandu: 8.300.000

TOTAL GERAL 13.538.644

Fonte: Laboratório de Hidrologia e Estudos do Meio Ambiente/Coppe/UFRJ (2001).

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limitações impostas pela capacidade de uso das terras; e, de certo modo, o estabelecimento de uma cultura de valorização urbana.

2.3. Cobertura Vegetal e Uso do Solo

A bacia do rio Paraíba do Sul está situada na área de domínio de um dos mais ricos biomas, a Mata Atlântica, que no período colonial cobria toda a costa brasileira. Acredita-se que a largura desta faixa chegou a cobrir cerca de 300 km da costa, onde ocorriam manguezais, restingas e brejos nas planícies costeiras. Atualmente, o que restou da Mata Atlântica na bacia do Paraíba do Sul não ultrapassa o percentual de 11% de área conservada. Remanescentes mais expressivos podem ser encontrados nas Serras do Mar e da Mantiqueira, oficialmente protegidos em Unidades de Conservação (Parques Nacionais de Itatiaia, Bocaina e Serra dos Órgãos) e internacionais (Reserva da Biosfera).

Conseqüência direta dos ciclos econômicos experimentados pela região, o baixo percentual de cobertura vegetal (Figura 4) e a degradação são resultantes da exploração da madeira, lenha para carvão, extração de palmito e de plantas ornamentais, além dos aspectos culturais, como a tradição de realização de queimadas para preparação do solo para o plantio. Junta-se a isso, os incêndios criminosos, oriundos do descontrole de queimadas, incineração de lixo urbano junto a estradas e como forma de descaracterização de áreas para invasão.

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Figura 4: Mapa de cobertura vegetal - Fonte: Coppe/UFRJ

Outro grave problema é o significativo potencial erosivo do solo da região. A qualidade, relevo acidentado e uso do solo7 propiciam o aparecimento de voçorocas, ravinas e

deslizamento de encostas. A erosão é uma grave conseqüência da deteriorização do solo rural devido ao desmatamento, uso intensivo e as práticas agrícolas que provocam a perda da camada fértil do solo. Na região do Médio Paraíba, a partir dos municípios de Cruzeiro e Queluz, localizados no trecho paulista, até a região de Barra Mansa e Vassouras (Figura 5), no trecho fluminense, é onde se registra a ocorrência de processos erosivos mais significativos (Laboratório de Hidrologia e Meio Ambiente, da COPPE/UFRJ).

7 Atualmente, a pecuária é a forma de uso da terra que ocupa a maior extensão na bacia. Cerca de 70%

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Figura 5: Voçoroca localizada no município de Vassouras – RJ Fonte: Coppe/UFRJ

Concomitantemente os estudos apontam a extração mineral, especialmente de argila e areia, como fator de contribuição para o aumento de sólidos em suspensão (sedimentos) que, depositados na calha dos rios, agrava a turbidez das águas, diminuindo a capacidade de drenagem e favorecendo a ocorrência de inundações das cidades ribeirinhas.

2.4. Saneamento Ambiental: abastecimento de água e

esgotamento sanitário

O saneamento é um dos indicadores de desenvolvimento da sociedade. O rio Paraíba do Sul é a principal fonte de abastecimento da população residente em sua bacia. Da mesma forma, é responsável pelo abastecimento da região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro por meio da transposição de até 180 m3 de água, por segundo, para o rio

Guandu, onde está localizada a captação e a estação de tratamento de águas operada pela Companhia Estadual de Águas e Esgoto - CEDAE, a “Estação de Tratamento de Águas do Guandu”.

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tarifários que, segundo as empresas de abastecimento público, não cobrem os custos com a manutenção e operação dos sistemas, o que agrava o índice de perdas de água na rede e aumenta as falhas na distribuição ocasionadas por uma série de problemas técnicos.

Tabela 2 - Saneamento básico em municípios com mais de 15 mil habitantes, por Estado.

Estados SP MG RJ

Consumo médio per capita 297 l/hab.dia 200 l/hab.dia 250 l/hab.dia

Abastecimento de água 94,6% 95% 88,1%

Coleta de esgotos 86,2% 88,9% 45,0%

Tratamento de esgotos 28,3% 1,1% 4%

Fonte: Laboratório de Hidrologia e Meio Ambiente – COPPE/UFRJ

Na maioria dos municípios da bacia não há tratamento de efluentes domésticos. Outro grave problema diz respeito ao descarte de resíduos sólidos de origem urbana (lixo) que é apontado pelos estudos do Laboratório de Hidrologia e Meio Ambiente da COPPE/UFRJ, como recorrente em inúmeros municípios da bacia (Figura 6). O problema da limpeza urbana está diretamente relacionado à falta de recursos financeiros para custear equipamentos e qualificar mão de obra profissional.

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De forma geral, a varrição é realizada de forma satisfatória, embora a eficiência seja diferenciada entre os municípios. No entanto, perdura o hábito, por parte da população, de descartar seus resíduos em córregos, canais e terrenos baldios ao invés de destiná-los a coleta, o que contribui para a contaminação das águas superficiais e subterrâneas, proliferação de vetores biológicos e o agravamento de situações de risco, como as inundações, tão comuns no período chuvoso.

Segundo levantamento realizado no ano de 2002 pelo Laboratório de Hidrologia e Meio Ambiente da COPPE/UFRJ é gerado, diariamente na bacia, cerca de 2.600 toneladas de resíduos sólidos de origem doméstica. Desse volume apenas 23% têm destinação adequada e 24% destinação controlada, sendo que a maioria, cerca de 53% é destinada a lixões ou outras formas inadequadas de disposição. O Estado de São Paulo apresenta os melhores resultados, seguido por Minas Gerais. O Estado do Rio de Janeiro, por sua vez, apresenta resultado insatisfatório (Tabela 3).

Tabela 3 - Disposição final de resíduos sólidos na Bacia do Paraíba do Sul, porEstado

Estados SP MG RJ Bacia

Condições adequadas 54 % 0 % 1 % 23 %

Condições controladas 30 % 69 % 12 % 24 %

Condições inadequadas 16 % 31 % 87 % 53 %

Fonte: Laboratório de Hidrologia e Meio Ambiente – COPPE/UFRJ

2.5. Uso industrial

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Figura 7 – Matéria veiculada na mídia sobre acidente ambiental em Minas Gerais Fonte: Jornal do Brasil – Abril de 2005

Em virtude de pressões oriundas da sociedade, do poder público e do próprio mercado, muitas indústrias vêem investindo recursos significativos em sistemas de tratamento de resíduos, aproveitamento de efluentes e realizando procedimentos para ajustamento de conduta. Contudo, graves acidentes ambientais ainda são registrados.

2.6. Geração de energia elétrica

A primeira usina hidrelétrica brasileira, denominada Marmelos, foi construída na bacia do rio Paraíba do Sul em 1889 pela Companhia Mineira de Eletricidade, no município de Juiz de Fora - MG, localizado na sub-bacia do rio Paraibuna, para fornecer iluminação pública. A dependência do Brasil da disponibilidade hídrica para geração de energia elétrica é significativa. Cerca de 90% de toda a energia gerada no país é de origem hidráulica, o que torna o sistema dependente das condições climáticas.

Neste setor, o maior usuário das águas da bacia do rio Paraíba do Sul é o Complexo Hidrelétrico de Lages, operado pela empresa Light Serviços de Eletricidade S/A, que transpõe para a vertente atlântica da Serra do Mar, as águas da bacia do rio Paraíba do Sul e de seu afluente, o rio Piraí, totalizando até 180m3/s8 de água que, após gerar

energia elétrica, abastece 90% da população da região metropolitana do Rio de Janeiro, por meio da Estação de Tratamento de Águas do Guandu – ETA Guandu (Tabela 4).

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Tabela 4: Principais usos da água da bacia do rio Paraíba do Sul Usos da água Captação (m3/s) Consumo (m3/s)

Abastecimento público 16,84 3,37

Uso industrial 13,65 6,19

Irrigação 49,73 30,28

Pecuária 3,45 1,73

TOTAL 83,67 41,57

Transposição para o sistema Light-Guandu Até 180 Até 180 TOTAL com a transposição Até 263,67 Até 221,57

Fonte: Laboratório de Hidrologia e Estudos do Meio Ambiente/Coppe/UFRJ

Beneficiam-se igualmente dessa transposição diversas indústrias e algumas usinas termelétricas situadas nas proximidades do rio Guandu e da região metropolitana do Rio de Janeiro, que se localizam fora dos limites da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul.

2.7. Uso agropecuário

Em relação à agricultura, o plantio da cana de açúcar, principalmente na região da Foz, além do arroz e do café, na região do Médio Paraíba e no trecho mineiro da bacia, ainda possuem uma razoável produção. Destaca-se também a produção hortigranjeira nas regiões serranas, além de culturas de subsistência (milho, batata, inhame, tomate, feijão, mandioca e banana), que ocorre em todo o Vale·.

O manejo inadequado de agrotóxicos e fertilizantes é a principal causa da contaminação do lençol freático e das águas superficiais (poluição difusa), causando sérios danos à saúde humana, à fauna e à flora, devido à alta toxidade dos produtos utilizados e ao descarte inadequado de embalagens. Ao contrário do que se imagina, este é o setor que mais consome água em virtude da necessidade de irrigação da lavoura.

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3. A gestão das águas

no federalismo brasileiro:

do Código de Águas à Política Nacional

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Neste capítulo resgataremos os modelos gerenciais de recursos hídricos experimentados no Brasil e os principais marcos legais. A abordagem dos aspectos relacionados ao federalismo brasileiro torna-se importante no contexto deste estudo na medida em que auxilia a compreensão de alguns dos principais entraves relacionados a implementação de políticas de gestão de recursos hídricos, quer seja em âmbito Federal quanto Estadual. Conhecer as determinações constitucionais sobre a dominialidade dos recursos hídricos bem como as competências legislativas e executivas dos Estados e da Federação, é compreender a nova dimensão da gestão dos recursos hídricos no Brasil, bem como as articulações complexas e necessárias para a efetividade do processo de gestão no âmbito da Lei 9.433/97, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos.

3.1. Evolução dos modelos gerenciais das águas

A primeira tentativa de ordenamento legal dos recursos hídricos no Brasil foi o Código de Águas9, instituído pelo Decreto Federal n° 24.643 de 10/0 7/1934 e já apresentava

características conceituais de gestão integrada. Antes dele, as águas eram reguladas pelos Alvarás de 1804 e de 1819, da Ordenação do Reino, sendo este último considerado inaplicável com a Constituição do Império Brasileiro; todavia o Alvará de 1804 vigorou por 130 anos, ou seja, até 1934.

Considerado avançado o Decreto n° 24.643/34 tinha, na época, o objetivo estratégico de dotar o País de uma legislação que permitisse ao Estado controlar e incentivar o aproveitamento das águas, sobretudo para geração de energia elétrica, o que possibilitaria ao País romper com sua característica predominantemente agrícola e criar subsídios para o desenvolvimento industrial. O Código de Águas apresenta diversos conceitos precursores dos atuais instrumentos econômicos e de comando e controle da gestão de recursos hídricos, como:

possibilidade de tributação “conforme as leis e regulamentos da circunscrição administrativa”, o que abriu caminho para a cobrança pelo uso da água bruta;

proibição da contaminação das águas e determinação de recuperação da salubridade às custas dos infratores. Pode-se dizer, grosso modo, que esta é uma versão do princípio poluidor-pagador que reapareceu na Europa, na década de 70, tendo sido considerado, naquela época, uma novidade (Pompeu, 2002).

9

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Todavia, a gestão das águas foi prejudicada em função da não complementação do Código por leis e regulamentos como previsto em seu escopo, o que impossibilitou a aplicação de várias de suas disposições, como as citadas por (Pompeu, 2002):

desobstrução dos cursos de água pela Administração às custas dos infratores;

reposição do leito e das margens no estado anterior, quando indevidamente ocupados;

salubridade das águas às custas dos infratores;

servidões urbanas de aqueduto, canais, fontes, esgotos sanitários e pluviais;

disciplina das águas nascentes e;

fixação de sanções pelo descumprimento de suas normas.

Assim, o Código de Águas não foi capaz de combater o desperdício, a escassez, a poluição, e de solucionar os conflitos de uso. Várias tentativas de atualização do Código foram feitas no período de 1968 a 1980, mas os Projetos de Lei encaminhados ao Congresso Nacional, alterando disposições do Código de Águas, não se converteram em Leis. Sua atualização é necessária uma vez que o País passou por diversas modificações nos campos jurídico, técnico, político e social. “(...) mesmo não tendo sido revogado, o Código nunca foi objeto de regulamentações para adaptá-lo ou modernizá-lo com vistas à evolução que acontecia no País” (Granziera apud Pompeu, 2001).

A necessidade de atualização se deve, principalmente, a promulgação da Constituição de 1988 e da Lei 9.433/97, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e, introduziram mudanças significativas na regulamentação das águas, e também da necessidade de disciplinar os aspectos carentes de norma legal.

Tendo como marco referencial a aprovação do Código de Águas de 1934, o primeiro modelo proposto para gerenciamento das águas foi denominado de “Modelo Burocrático” por (Yassuda,1989) e (Lanna, 1995) que apontaram suas principais falhas, além das conseqüências diretas de sua adoção.

O modelo caracterizava-se por:

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atribuir excessiva atenção aos aspectos formais de implementação do modelo que prejudicava a percepção dos aspectos dinâmicos da gestão de recursos hídricos como o meio em que a organização se insere, a personalidade dos atores que nela contracenam e as relações de poder que permeiam a organização.

As principais conseqüências apontadas pelos autores em virtude das falhas do modelo são:

visão fragmentada do processo de gerenciamento, fazendo com que os atores exacerbam a importância das partes e se alheiem dos resultados finais pretendidos e que justificam a própria existência do gerenciamento;

desempenho restrito ao cumprimento de normas e o engessamento da atividades de gerenciamento por falta de flexibilidade para o atendimento de necessidades não rotineiras;

dificuldade de adaptação a mudanças internas e externas, com tendência a perpetuação de normas e procedimentos, mesmo após a extinção dos fatos que as geraram;

centralização do poder decisório nos escalões mais altos, geralmente distantes do local em que ocorre a demanda de decisão, com demoras desnecessárias e descompromisso da parte que recebe as demandas mas sem o poder para atendê-las;

padronização no atendimento a demandas, que nem sempre considera as expectativas e necessidades específicas resultando em conflitos que reforçam a percepção da ineficiência e da falta de eficácia comprometendo a imagem do sistema de gerenciamento;

excesso de formalismo, do qual decorrem “controle sobre o controle” exigindo pessoal para acompanhamento, registro de dados e supervisão de trabalhos, acúmulo de papéis em diversas vias, morosidade no processo de comunicação e ação etc.;

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Esse modelo favoreceu uma atuação ineficiente e fragilizada do poder público dos pontos de vista operacional e político frente aos usuários particularmente interessados em outorga de uso da água, concessões, licenciamentos e que proporcionavam benefícios setoriais em detrimento de outros usuários. De fato, embora o Código de Águas seja descentralizador — pois outorga competências aos Estados para atividades de licenciamento, aprovação, concessão de uso e fiscalização—, ele não prevê em seus artigos a participação social na gestão das águas. (Lanna, 1995) aponta como conseqüência direta desta situação, o agravamento dos conflitos relativos a uso e proteção dos recursos hídricos, que por sua vez alimentavam a fabricação de novos instrumentos legais tendo, como conseqüência, a produção de uma legislação confusa, conflitante e de difícil interpretação.

O Modelo Econômico-Financeiro, cujo marco referencial de sua aplicação é a criação da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF), em 1948. (Lanna, 1995) e (Setti et al, 2001) consideram esse modelo como “um desdobramento do pensamento de John Maynard Keyne10s na medida em que destacava a relevância

do papel do Estado como empreendedor, sendo utilizado na década de 30 para superar a grande depressão capitalista”.

O modelo, considerado avançado em relação ao anterior, foi alicerçado em prioridades setoriais do governo, tendo como foco programas de investimentos em eletrificação, saneamento, mineração, irrigação etc. tendo como entidades privilegiadas autarquias e empresas públicas. Os instrumentos econômicos e financeiros são aplicados dentro de uma concepção de sistema que pode ser setorial (saneamento, energia, transportes etc.) ou integral (bacia hidrográfica).

Neste último caso o modelo pode possibilitar a realização de planejamento estratégico da bacia e a canalização de recursos financeiros para implantação de Plano de Bacia, permitindo relativo desenvolvimento e proteção do meio ambiente.

As principais falhas do modelo são:

injeção de recursos financeiros direcionada a setores selecionados por programas governamentais como resultado de negociações político-representantivas;

10 Economista inglês cujo trabalho sobre o pensamento político e a formulação da política influenciou

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possível ocorrência de apropriação excessiva e mesmo perdulária, por parte de determinados setores o que restringe a utilização social e/ou ótima dos recursos ambientais;

possibilita a intensificação do uso setorial não integrado em certas bacias de importância econômica, acarretando quase sempre os mesmos conflitos do modelo burocrático;

tende a subdimensionar a questão ambiental ou a superdimensioná-la no processo do planejamento integrado da bacia, originando processos traumáticos de contestação por parte de grupos ambientalistas ou desenvolvimentistas;

não assegura o tratamento global de todos os problemas e o gerenciamento integral da bacia hidrográfica uma vez que baseia-se nas diretrizes estabelecidas pela negociação político-representantiva;

tende a criar novas entidades públicas com grandes poderes, estabelecendo conflitos com aquelas pré-existentes resultando em impasses políticos.

Considerado por (Lanna, 1995) como o mais moderno dos modelos de gerenciamento de recursos hídricos, o Modelo Sistêmico de Integração Participativa busca integrar, sistemicamente, quatro tipos de negociação social: econômica, direta, político-representativa e jurídica. Além disso, caracteriza-se pela existência de uma matriz institucional de gerenciamento, responsável pela execução de funções gerenciais específicas e a adoção de três instrumentos específicos, sendo eles:

Planejamento estratégico por bacia hidrográfica

Baseia-se no estudo de cenários alternativos futuros, estabelece metas alternativas específicas de desenvolvimento (crescimento econômico, equidade social e sustentabilidade ecológica11). Vinculados a essas metas são definidos prazos para

sua concretização, meios financeiros e os instrumentos legais requeridos.

Esse instrumento contrasta com os programas circunstanciais do modelo econômico-financeiro, por levar em conta os problemas da bacia em longo prazo, tendo como conseqüência a previsão de programas de estímulo econômico e os instrumentos legais requeridos para atendimento das necessidades de caráter social e ecológico.

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Tomada de decisão por meio de deliberações multilaterais e descentralizadas

Implementação de plano de negociação político-direta baseada na constituição de um colegiado do qual participam representantes de instituições públicas, privadas, usuários, comunidades e de classes políticas e empresariais atuantes na bacia, com base na comparação dos benefícios e custos correspondentes as diferentes alternativas.

Estabelecimento de instrumentos legais e financeiros

Com base no planejamento estratégico e nas decisões do colegiado, são estabelecidos instrumentos legais pertinentes e formas de captação de recursos financeiros para implementação de planos e programas de investimentos.

Setti et al, (2001) vê esse modelo sob a ótica da administração das organizações, enfatizando o ambiente no qual a organização está inserida e como suas necessidades mutáveis e diversificadas agem sobre a dinâmica da organização. “Nada é fixo tudo é relativo e, por isso, leva a valorização do papel da negociação social pelo gerenciamento das águas e prevê instâncias específicas para realizá-lo”.

A Constituição Federal de 1988 e constituições estaduais correspondentes são consideradas o “divisor de águas” nas relações entre Estado e Sociedade no Brasil e podem ser vistas como o princípio do Modelo Sistêmico de Integração Participativa no país. Elas refletem, em parte, os resultados das discussões mundiais havidas sobre desenvolvimento e meio ambiente, como a I Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Estocolmo, 1972), a publicação do relatório do Clube de Roma “Limits to Growth” (Limites do Crescimento), amplamente debatido na ocasião, a Conferência das Nações Unidas sobre Água, realizada na Argentina, em 1977 e o Relatório “Nosso Futuro Comum”, preparado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1987 e que ficou conhecido como “Relatório Brundtland”, entre outros.

No Brasil, uma organização civil de direito privado destacou-se na promoção de debates sobre a problemática dos recursos naturais. (Setti et al, 1997), (Freitas apud Campos, 2000) e (Nogueira et al, 2000) ressaltam a importância de documentos produzidos pela Associação Brasileira de Recursos Hídricos – ABRH12 são eles (Quadro 1):

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Quadro 1: Cartas da ABRH contendo recomendações à Política Nacional de Recursos Hídricos.

Ano Documento Conteúdo

1987 Carta de Salvador

Introduz temas institucionais em suas discussões destacando-se: descentralização e participação, uso múltiplo, aperfeiçoamento da legislação, desenvolvimento tecnológico, capacitação de recursos humanos, sistema de informações sobre recursos hídricos e política nacional de recursos hídricos.

1989 Carta de Foz de Iguaçu

Reproduz os avanços das discussões, caracterizando o que se entende por política de recursos hídricos e explicita seus princípios básicos, como o valor econômico e a cobrança pelo uso da água, além de recomendar a criação do Sistema Nacional de Recursos Hídricos.

1991 Carta Janeiro do Rio de

Propõe, como prioridade nacional, a reversão da poluição das águas e a necessidade premente de planejamento e gestão integrada de bacias hidrográficas, regiões costeiras caracterizando-se as grandes diversidades das bacias e regiões brasileiras, que demandam soluções diferenciadas e adequadas às suas realidades locais.

Fonte: Barth, 1996

Essas e outras propostas encaminhadas pelas diversas áreas técnicas e administrativas relacionadas aos recursos hídricos encontram-se consubstanciadas na Constituição Federal de 1988 (Quadro 2).

Quadro 2: Artigos da Constituição de 1988 referentes a água Constituição Federal de 1988

Art. 20 – São bens da União

III – os lagos, rios e quaisquer correntes de águas em terrenos de seu domínio ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros Países ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e praias fluviais.

Art. 21 - Compete a União XIX – instituir Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e definir critérios de outorga e direitos de uso.

Art. 22 – Compete privativamente a União legislar sobre

IV – água, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão. Parágrafo Único: Lei complementar fixará normas para a cooperação entre União, Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

Art. 26 – Incluem-se entre bens dos

Estados I – as águas superficiais, subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso na forma da lei, as decorrentes de obra da União.

Fonte: Constituição Federal, 1989.

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Um aspecto importante refere-se às características profissionais dos associados a essas entidades composta, em sua maioria, por engenheiros e com grande inserção no setor público. Segundo (Souza Jr., 2004), referindo-se a ABRH:

“(...) a participação de profissionais vinculados àquela entidade na esfera pública, federal e estaduais, associadas aos princípios estabelecidos para a gestão dos recursos hídricos, em suas assembléias gerais, denota um caráter tecnocrático que se internalizou nas atividades de gestão de recursos hídricos no País, desde então”.

A crítica de Souza Jr. (Ibdem), baseia-se no pressuposto de que a gestão integrada de recursos hídricos é um processo interdisciplinar e multi-setorial. Nenhuma especialidade ou campo de saber é capaz de realizá-la isoladamente. Por outro lado, havia um desejo desses profissionais de que o processo de gestão das águas fosse menos politizado e mais técnico, embate que se trava no setor de recursos hídricos e na própria ABRH desde a idéia de criação de uma Comissão de Gestão da ABRH, finalmente ocorrida em 1987 (Formiga-Johnsson, 1998).

3.2. O federalismo brasileiro e a gestão das águas

Uma invenção norte-americana. Assim Riker, Wheare e Duchacek apud (Arrechte, 2001) definem a versão moderna de federalismo sob o argumento de que a origem de todas as federações estáveis criadas no século XIX e XX foi a mesma da criação das federações norte-americanas: uma barganha cuja condição necessária e suficiente, no caso dos Estados Unidos, foi a ameaça ou a oportunidade de expansão além de defesa militar ou diplomática. Entretanto, torna-se impossível afirmar que uma possível ameaça externa ou o desejo de expansão militar tenha originado federações. Arrechte (ibdem) considera que vantagens econômicas, obtidas com a associação dos Estados, assim como o interesse em preservar a unidade nacional estão na origem das modernas federações do século XX.

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“Qualquer País federativo foi assim instituído para dar conta de uma ou mais heterogeneidades. Se um País desse tipo não constituir uma estrutura federativa, dificilmente a unidade nacional manterá a estabilidade social ou no limite, a própria nação corre risco de fragmentação. Outra condição federalista é a existência de um discurso e de uma prática defensores da unidade na diversidade, resguardando a autonomia local, mas procurando formas de manter a integridade territorial em um País marcado por heterogeneidade”.

O federalismo brasileiro foi marcado por desequilíbrios entre os níveis de governo. Em seu período inicial, na República Velha, os Estados tinham ampla autonomia, pouca cooperação entre si e um governo central fraco. Na era Vargas, o governo central foi fortalecido, mas os governos estaduais perderam autonomia. De 1946 a 1964 ocorreu um relativo equilíbrio, tanto do ponto de vista da relação entre esferas de poder como da prática democrática. Esse equilíbrio foi quebrado com o golpe militar que por 20 anos manteve um regime autoritário e centralizado politicamente, administrativamente e financeiramente (Arrechte, 1997; Abrúcio, 1998). A Constituição de 1988 consagrou amplos direitos sociais, descentralização de poder por meio da autonomia político-administrativa e legislativa a Estados e Municípios, marcando um novo momento no federalismo, mas também provocando dois fenômenos:

estabelecimento de um amplo processo de descentralização em termos financeiros e políticos;

configuração de um modelo predatório e não cooperativo de relações intergovernamentais, com predomínio do componente estadual.

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“Desde o final do regime militar, as relações intergovernamentais verticais tinham sido marcadas pela capacidade de os Estados repassarem seus custos e dívidas ao governo Federal e, ainda por cima, não se responsabilizarem por este processo, mesmo quando assinavam contratos federativos. Caso clássico disso foram os bancos estaduais. A partir de 1982, as instituições financeiras estaduais foram utilizadas pelos governadores como instrumento de atuação política. Foram criadas verdadeiras máquinas de produzir moedas com efeitos deletérios para a inflação e para o endividamento global” (Abrúcio, 1998).

Outro aspecto predatório foi a guerra fiscal entre os Estados que ganhou força após a promulgação da Constituição de 1988 (Arrechte, 1997). Entretanto, a partir de 1994 o federalismo estadualista entra em declínio e o Governo Federal se fortalece em virtude de diversos fatores como os citados por (Abrúcio, 2005):

Eleições presidencial e estaduais simultâneas (fato inédito);

Renegociação da dívida externa;

Entrada de investimentos estrangeiros;

Aumento progressivo da arrecadação fiscal;

Êxito inicial do Plano Real;

Melhora nas contas públicas federais;

Criação da Lei de Responsabilidade Fiscal e;

Crise financeira dos Estados.

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O princípio de subsidiariedade, noção jurídica renascida com sua inclusão no Tratado de Maastrich13, em 1992, e também aplicado no contexto da gestão de águas, é

considerado por Caubet (ibdem) como algo extremamente passível de ambigüidades e conseqüências políticas importantes. Nas palavras de (Barracho, 1997) trata-se do princípio “pelas quais as decisões, legislativas ou administrativas, devem ser tomadas no nível político mais baixo possível”, ou seja, as decisões devem, sempre que possível ser tomadas por aqueles que estão diretamente envolvidos com o problema. (Von Rondow apud Campos, 2005) descreve o Estado Federal com as seguintes características:

repartição constitucional de competências;

existência de uma Constituição;

autonomia política das unidades federadas;

participação dos membros nas decisões da União;

soberania pertencente ao Estado Federal;

ausência de direito de secessão;

atribuição de renda própria às esferas de competência;

existência de uma corte suprema nacional e;

existência de dispositivo de segurança (intervenção federal).

A descentralização, no âmbito da Política Nacional de Recursos Hídricos, se traduz em três principais aspectos:

do ponto de vista institucional é entendida como a criação de espaços institucionalizados (Conselhos e Comitês de Bacias), cuja composição é tripartite;

do ponto de vista administrativo-financeiro, por meio do poder de decisão, conferido aos Comitês, sobre a aplicação dos recursos financeiros arrecadados com a cobrança;

do ponto de vista geográfico-administrativo, definindo a bacia hidrográfica como unidade de gestão.

O nível central de governo teve e continua a ter importância estratégica na implementação e coordenação da gestão dos recursos hídricos. Entretanto, a gestão

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dos recursos hídricos deve ser feita pela instituição situada no nível mais baixo do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, ou seja, os Comitês de Bacia.

Por outro lado, torna-se necessária a criação de mecanismos que visem responder a questões de subsidiariedade, ou seja, promover a compensação das desigualdades entre os diversos entes. A implementação desta ação é fundamental para garantir condições mínimas de efetividade da política, pois a tendência concentradora, por aqueles em melhores condições, é uma realidade que poderá colocar em risco todo o sistema. O governo central (ANA) deve desempenhar essa tarefa sob pena de aumento das desigualdades uma vez que este vem desempenhando um novo papel: a regulação das políticas nacionais, a correção das desigualdades regionais e a compensação das insuficiências locais (Arretche, 1997).

3.3. A Política Nacional de Gestão de Recursos

Hídricos: a Lei 9.433/1997

Embora diversos países, como a Alemanha, a Holanda e Inglaterra, tenham desenvolvido metodologias e criado instrumentos jurídicos e institucionais para gerir adequadamente seus recursos hídricos, o Brasil inspirou-se no modelo francês para criar seu próprio sistema. Nas palavras de Lanna (1995) a lei francesa “é saudada hoje por especialistas internacionais em recursos hídricos e economistas ambientais como um dos instrumentos mais abrangentes e eficientes em matéria de gerenciamento de recursos hídricos”.

Em meados do século XX a França se vê diante do desafio de assegurar, em logo prazo, o abastecimento de água potável uma vez que os setores doméstico e industrial exigiam uma disponibilidade cada vez maior em virtude do desenvolvimento pós-guerra. Naquela época, o suprimento originava-se principalmente de mananciais subterrâneos, o que representava riscos em relação aos aspectos quantitativos e qualitativos. De acordo com. Sironeau apud Leal (1998) e Lanna (1995), este último aspecto era crítico em razão da poluição difusa associada às práticas agrícolas e a insuficiência de saneamento básico.

Imagem

Figura 1: delimitação do objeto de estudo
Figura 3: Bacia de domínio da União  - Fonte: Coppe/UFRJ
Tabela 1: População da bacia do rio Paraíba do Sul (Censo IBGE 2000)
Figura 4: Mapa de cobertura vegetal - Fonte: Coppe/UFRJ
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Referências

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