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Agricultura de baixa emissão de carbono: a evolução de um novo paradigma

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Agricultura de Baixa Emissão de Carbono:

A evolução de um novo paradigma

R E L AT Ó R I O C O M P L E T O

(2)

Ficha Técnica

Projeto: Observatório ABC

Apoio: CLUA – Aliança pelo Clima e Uso da Terra

Organização Responsável: Fundação Getulio Vargas

Centro de Agronegócio da Escola de Economia de São Paulo

Coordenador do GVagro: Roberto Rodrigues

Coordenação do projeto: Angelo Costa Gurgel Cecilia Fagan Costa Felippe Serigati

Equipe técnica do projeto: Fernanda Casagrande Rocha Guarany Ipê do Sol Osório Mario Monzoni

Sérvio Tulio Prado Junior

Coordenador do Estudo: Eduardo Delgado Assad

Equipe técnica do Estudo: Eduardo de Morais Pavão

(3)

ii

SUMÁRIO

1. Agricultura de Baixa Emissão de Carbono: a construção de um paradigma ... 1

1.1 O despertar: da Eco-92 à Política Nacional de Mudanças Climáticas ... 1

1.2 Compromissos na COP-15 ... 4

2 Plano ABC: invertendo o sinal de carbono da agropecuária brasileira ... 9

2.1 Fundamentos estratégicos ... 9

2.2 Fundamentos técnicos ... 12

2.3 Ações transversais ... 29

3 Da teoria à prática: evolução do Programa ABC (2010-2012) ... 50

3.1 Implantação, operação, contratos e execução financeira no ano de 2010 ... 52

3.2 Operação, contratos e execução financeira no ano de 2011 ... 52

3.3 Operação, contratos e execução financeira no ano de 2012 ... 53

3.4 BNDES e Banco do Brasil: diferenças de execução ... 57

4 O Plano operativo do Programa ABC ... 59

4.1 Comitês, comitês gestores e atores principais ... 59

4.2 Sinergia com as políticas climáticas estaduais ... 62

4.3 Parcerias com o setor privado ... 64

5 Sugestões para o monitoramento do Plano ABC ... 70

5.1 Monitoramento das pastagens ... 72

5.2 Monitoramento dos sistemas ILPF e ILP ... 74

5.3 Monitoramento do plantio direto ... 77

5.4 Monitoramento da fixação biológica de nitrogênio... 77

5.5 Monitoramento das florestas plantadas ... 77

5.6 Monitoramento do tratamento de dejetos animais ... 78

6 Rumo a 2020: como acelerar o ABC para cumprir as metas de Copenhague ... 79

6.1 A obrigatoriedade das análises de solo e de carbono no solo ... 79

(4)

iii

6.3 Municípios prioritários para capacitação ... 86

7 Efetividade do Plano ABC ... 91

7.1 O ABC e as particularidades regionais ... 91

7.2. Operadores financeiros do Programa ABC ... 93

7.3 O papel da Embrapa ... 94

7.4 Plano ABC e a agricultura de base familiar ... 95

7.5 Esforço para capacitação de agricultores e de agentes rurais ... 97

7.6 E o que pensam os produtores rurais? ... 98

7.7 Plano ABC: agricultura sustentável para garantir o futuro... 100

8 Sugestões e conclusões finais ... 101

9 Bibliografia Consultada ... 105

(5)

iv

ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1.01. Proposta brasileira de mitigação de emissões de GEE. (Casa Civil da Presidência da República, Brasília, 2009 e Notificação do Brasil à UNFCCC, Acordo de Copenhague). ... 5

Tabela 2.01. Emissões anuais de CO2 eq. por GPV (ganho de peso vivo) até abate em quatro cenários de manejo (resultados obtidos em experimentos da Embrapa Agrobiologia). ... 12

Tabela 2.02. Parâmetros utilizados para o cálculo da redução das emissões nas propostas referentes à Recuperação de Pastagens Degradadas e ILP. ... 15

Tabela 2.03 Resumo das emissões em pastagens com e sem recuperação na proposta referente à Recuperação de Pastagens Degradadas. ... 16

Tabela 2.04. Estoques de Carbono (t C ha-1) no solo em pastagem degradada, pastagem manejada e vegetação nativa em diferentes localidades no Brasil (0-30 cm). ... 17

Tabela 2.05. Estoques de Carbono (t C ha-1) no solo em Sistema Plantio Convencional (SPC), Sistema Plantio Direto (SPD) e vegetação nativa em diferentes localidades no Brasil (adaptado para a profundidade de 0-30 cm). ... 20

Tabela 2.06. Redução das emissões (em milhões de t CO2 eq. ha-1 ano-1) na proposta referente à adoção do Sistema Plantio Direto (SPD) em 8 milhões de hectares. ... 21

Tabela 2.07 Aspectos relacionados ao processo de fixação do nitrogênio atmosférico por via industrial e biológica. ... 25

Tabela 2.08 Parâmetros utilizados para o cálculo da redução das emissões (em milhões de t CO2 eq. -1 ano-1) na proposta referente à adoção da tecnologia de Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN) em 5,5 milhões de hectares de soja. ... 26

Tabela 2.09 Parâmetros utilizados para o cálculo da redução das emissões (em milhões de t CO2 eq. ano-1) na proposta referente à ampliação do uso de tecnologias para tratamento de 4,4 milhões de m3 de dejetos de animais para geração de energia e produção de composto orgânico. ... 29

Tabela 2.10 Cursos presenciais na área de Ciências Agrárias em funcionamento no Brasil. Fonte: eMEC, consultado em 05/02/2013. ... 34

Tabela 2.11. Distribuição estadual das instituições de ensino, pesquisa, extensão, sindicatos e cooperativas no Brasil. ... 36

Tabela 2.12 Área total de pasto sujo e pasto com solo exposto e número de municípios e suas respectivas áreas totais nos estados pertencentes ao TerraClass. 48

(6)

v

Tabela 3.02 Volume de desembolso no plano ABC por região até 23/01/2013 (Fonte: MAPA). ... 55

Tabela 3.03 Comparação entre a execução das aplicações feitas no Programa ABC pelo BNDES e pelo Banco do Brasil até 23/01/2013. ... 57

Tabela 4.01. Relação das principais empresas produtoras e importadoras de inoculantes no Brasil. ... 66

Tabela 6.01 Categorias de municípios, que possuam escritórios ou bases de capacitação instalada. ... 88

(7)

vi

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1.01 Projeção para as emissões de gases do efeito estufa (GEE) com o cumprimento dos compromissos assumidos em Copenhague, não comprometendo o crescimento brasileiro (Adaptado de MCT, 2010). ... 6

Figura 2.01 Esquema representativo da degradação de pastagem (Foto: Embrapa CNPGL). ... 14

Figura 2.02 Dinâmica da matéria orgânica do solo na camada de 0-20 cm em dois sistemas de cultivo em experimento de longa duração (Souza, 1997). ... 18

Figura 2.03. Área de plantio direto no Brasil – evolução entre 1972 e 2012 (Fonte: FEBRAPDP). ... 22

Figura 2.04. Área total sob SPD em diversos países. Até 2008, o Brasil era o terceiro país do mundo em área plantada com SPD (Fonte: Derpsch e Friedrich, 2009). ... 23

Figura 2.05 Bactérias do gênero Rhizobium ou Azorhizobium em simbiose com a planta, vivendo nos seus nódulos radiculares (Foto: Marisa Piccolo). ... 24

Figura 2.06 Vendas de inoculantes das empresas filiadas à ANPII (Fonte: http://www.anpii.org.br/?estatistica/2/). ... 27

Figura 2.07 Distribuição espacial de unidades de ensino de superior em Ciências Agrárias no Brasil. ... 34

Figura 2.08 Distribuição de cursos de Ciências Agrárias por região no Brasil. ... 35

Figura 2.09. Número de cursos de graduação em Agronomia por estado no Brasil. 35

Figura 2.10 Localização das cooperativas com atividades relacionadas à produção de grãos, carne e leite em todo território nacional. Fonte: OCB. ... 38

Figura 2.011 Localização dos sindicatos rurais com atividades em todo território nacional. Fonte: CNA. ... 39

Figura 2.12 Localização, por estado dos escritórios de assistência técnica e extensão rural no Brasil (Fonte: ASBRAER http://www.asbraer.org.br/nossasassociadas). . 40

Figura 2.13 Evolução da taxa de desmatamento na Amazônia entre 1988-2012. ... 41

Figura 2.14 Tipologias de uso do solo e municípios-alvo para implementação das ações do Eixo Fomento às Atividades Sustentáveis (Fonte: PPCDAm, 2012). ... 42

(8)

vii

Figura 2.16 Identificação dos municípios com pastagens degradadas segundo os resultados do Projeto TerraClass. Adaptado de TerraClass/INPE http://www.inpe.br/cra/projetos_pesquisas/terraclass.php ... 48

Figura 3.01 Porcentual e valor médio dos recursos aplicados por região (Fonte: MAPA, 23/01/2013). ... 56

Figura 4.01 Estratégia de implementação do Plano ABC (Fonte: MAPA). ... 60

Figura 4.02. Estados da Federação com atuação dos Grupos Gestores Estaduais (GGE) (Fonte: MAPA). ... 61

Figura 4.03 Fluxograma proposto pelo MAPA para as ações de capacitação dos diversos atores, em nível federal, estadual e municipal. ... 62

Figura 4.04 Estados que possuem política estadual de mudança do clima com alguma sinergia com o Plano ABC e estados que têm política de mudança do clima com pequena ou nenhuma aderência ao Plano ABC. ... 64

Figura 4.05 Distribuição espacial dos produtores de sementes de forrageiras no Brasil, registrados no RENASEM-MAPA e associados da UNIPASTO. ... 66

Figura 4.06 Distribuição espacial dos fabricantes de biodigestores no Brasil. ... 69

Figura 5.01 Imagens da série temporal do sensor Modis disponibilizadas pelo Laboratório de Agricultura e Floresta do INPE. Nesta curva, aparece a mudança de uso do solo em 2004, quando o produtor migrou de cultura anual (picos maiores) para pastagem, que possui curva mais suavizada. ... 73

Figura 5.02 Procedimento para a coleta de amostras indeformadas. ... 76

Figura 6.01 Distribuição espacial dos laboratórios de análise de solos no Brasil, segundo informação dos provedores IAC, ROLAS, PROFERT, CELA e PAQLF. 80

Figura 6.02 Distribuição espacial dos pastos degradados no Brasil, com taxas de lotação variando de 0,1 a 0,6 UA/ha/ano. ... 82

Figura 6.03 Distribuição espacial da possível atuação das universidades na capacitação do Plano ABC, num raio de 100 km e num raio de 200 km. ... 87

(9)

viii

RELAÇÃO DE SIGLAS

ABRAF – Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas

ANPII – Associação Nacional dos Produtores e Importadores de Inoculantes

ASBRAER – Associação Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural

Ater – Assistência Técnica e Extensão Rural

CAR – Cadastro Ambiental Rural

CELA-PR – Comissão Estadual de Laboratórios de Análise Agronômica

CNA – Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil

CNPGC – Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Corte

CNPGL – Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Leite

CRA/INPE – Centro Regional da Amazônia INPE

Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

Embrater – Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural

FBN – Fixação Biológica de Nitrogênio

GEE – Gás do efeito estufa

GTP – Global Temperature Potential

GWP – Global Worming Potential

IAC – Instituto Agronômico de Campinas

ILP – Integração Lavoura-Pecuária

ILPF – Integração Lavoura-Pecuária-Floresta

INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

IPCC – International Panel on Climate Change (Painel Intergovernamental sobre

Mudança Climática, no português)

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário

MMA – Ministério do Meio Ambiente

NAMAs – Nationally Appropriate Mitigation Actions (Ações de Mitigação

Nacionalmente Apropriadas, no português)

OCB – Organização das Cooperativas Brasileiras

Oepa – Organização Estadual de Pesquisa Agropecuária

PAQLF – Programa de Análise de Qualidade de Laboratórios de Fertilidade

PD – Plantio direto

(10)

ix PRODES – Programa de Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite

PROFERT-MG – Programa Interlaboratorial de Controle de Qualidade de Análise de

Solo de Minas Gerais

ROLAS – Rede Oficial dos Laboratórios de Análise de Solo e de Tecido Vegetal dos

Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina

SAF – Sistema Agroflorestal

SPD – Sistema de Plantio Direto

UNFCCC – United Nations Framework Convention on Climate Change (Convenção

das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – CNUMC , no português)

UNIPASTO – Associação de Empresas e Produtores de Sementes de Forrageiras

(11)

x

RESUMO

O Plano ABC, de fomento à adoção de boas práticas agrícolas para reduzir as

emissões de gases do efeito estufa da agricultura, faz do Brasil um dos principais

protagonistas na discussão mundial sobre o combate às mudanças do clima. Seus

resultados, porém, ainda são tímidos, pois é preciso vencer barreiras burocráticas,

ampliar a capacitação de técnicos, orientar empresas de planejamento na elaboração de

projetos, adaptar regras de crédito e, principalmente, ampliar a participação do setor

privado na execução do programa.

Este estudo procura identificar os principais entraves encontrados após três anos

de recursos investidos nas ações preconizadas pelo plano e pelo programa que lhe dá

forma prática e apresentar um diagnóstico com o qual se procura oferecer soluções de

curto e médio prazo para aumentar a eficiência do plano. Para tanto, é preciso conhecer

o histórico do ABC, sua base técnico-científica, suas propostas, avaliar sua eficiência

(12)

1

1. Agricultura de Baixa Emissão de Carbono: a construção de um paradigma

1.1 O despertar: da Eco-92 à Política Nacional de Mudanças Climáticas

A assinatura da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do

Clima, durante a Cúpula da Terra no Rio de Janeiro, em 1992 (Eco-92), trouxe o debate

sobre o aquecimento global e desenvolvimento sustentável dos corredores da Academia

para a agenda dos governos no mundo inteiro.

Primeiro país a firmar o documento, por ser a sede da conferência, o Brasil

adotou, a partir de 1994, uma série de decisões de governo destinadas a dar forma

prática às decisões políticas tomadas pela convenção e por outros acordos produzidos no

Rio, em especial a Agenda 21, uma carta de intenções que visava romper o padrão

tradicional de desenvolvimento sujo. A Presidência da República, por meio do Decreto

nº 1160, de 21 de junho de 1994, constituiu a CIDES (Comissão Interministerial de

Desenvolvimento Sustentável), com objetivo de propor estratégias, políticas e

instrumentos nacionais referentes à Agenda 21, além de definir critérios e prioridades

nacionais para obtenção de recursos para execução das ações propostas pelo documento.

As políticas propostas diziam respeito às negociações internacionais sobre

desenvolvimento sustentável, estabeleciam que o MCT (Ministério da Ciência e

Tecnologia, hoje MCTI) ficaria encarregado de coordenar as ações em mudança do

clima e que o MMA (Ministério do Meio Ambiente) seria responsável pelas ações

atinentes à Convenção da Diversidade Biológica, também firmada em 1992.

Em 1997, os países-membros da Convenção do Clima assinaram o Protocolo de

Kyoto, que, pela primeira vez, estabelecia metas numéricas de redução de gases do

efeito estufa, obrigando as nações desenvolvidas a adotá-las entre 2008 e 2012. Os

países em desenvolvimento ficaram livres de obrigações de mitigação, uma vez que

pouco ou nada haviam contribuído para o aquecimento da Terra até aquele momento.

Ao contrário: estavam entre as maiores vítimas da mudança climática produzida pela

industrialização dos ricos. As vulnerabilidades do Brasil vinham sendo discutidas pela

comunidade científica desde 1988, quando a Organização Meteorológica Mundial e o

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente criaram o IPCC (Painel

Intergovernamental sobre Mudança Climática). Naquele mesmo ano, a Universidade de

São Paulo promoveu um workshop de abrangência nacional sobre o tema, que ensejou

(13)

2 Quase dois anos após Kyoto, em 7 de julho de 1999, um decreto presidencial

instituiu a CIMGC (Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima), com a

finalidade de articular as ações de governo decorrentes da convenção. Nesta comissão,

estão presentes onze ministérios.

Para cumprir seus compromissos no âmbito da Convenção do Clima, o País

precisou engajar-se mais ativamente e oficialmente nas discussões mundiais entre

nações que iniciavam os seus inventários de gases do efeito estufa. O Ministério da

Ciência e Tecnologia criou a Coordenação Geral de Mudanças Globais do Clima, que

atua nos assuntos referentes aos projetos de MDL (Mecanismo de Desenvolvimento

Limpo), como inventário nacional de gases do efeito estufa, definição de políticas de

mitigação e adaptação, estimativas anuais de emissão de GEE e outras contribuições da

Ciência com o apoio do PROBIO.

No ano de 2007, o IPCC lançou seu Quarto Relatório de Avaliação da Ciência

do Clima, que concluiu que o aquecimento da Terra é “inequívoco” e “muito

provavelmente” agravado por atividades humanas. Naquele ano, antecipando um

encontro da Convenção do Clima em Bali, Indonésia, que lançaria as bases do acordo

substituto do Protocolo de Kyoto, o Ministério do Meio Ambiente criou a Secretaria de

Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental. Ela é responsável pela definição de

estratégias e proposição de políticas referentes à mitigação e adaptação às mudanças do

clima e pela coordenação do Grupo Executivo (GEX) do CIM (Comitê Interministerial

sobre Mudança do Clima – este liderado pela Casa Civil da Presidência da República),

encarregado da elaboração do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, publicado em

2008. O plano marcou uma reviravolta na política climática brasileira, pois, pela

primeira vez, o País assumia uma meta numérica doméstica, ainda que voluntária, de

redução de gases do efeito estufa: comprometia-se a reduzir em 80% o desmatamento

na Amazônia em relação a uma linha de base fixada a partir da média de anos

anteriores.

Em 2009, a Convenção do Clima reunir-se-ia em Copenhague, Dinamarca, para

produzir o que se esperava ser um novo regime global de combate aos gases-estufa a

partir do plano de ação definido em Bali. Com base no Plano Nacional de Mudança do

Clima e amparado na redução do desmatamento (e das emissões) na Amazônia

verificada desde 2005, o País deu mais um salto: definiu um conjunto de metas de

redução de GEE para vários setores da economia, a ser ofertadas à comunidade

(14)

3 de emissões entre 36,1% e 38,9% em relação ao que seria emitido em 2020 se nada

fosse feito. No mesmo ano, o País sancionou a Política Nacional de Mudança do Clima,

que transforma em lei as metas brasileiras, e o Fundo Nacional de Mudança do Clima

(Fundo Clima), que destina uma fatia da participação especial do petróleo para ações de

adaptação e mitigação.

Foi também em 2009, no contexto das metas da política nacional, que se

desenhou o que viria a ser o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano

ABC). O setor agropecuário, responsável por cerca de 30% das emissões do Brasil,

havia ficado de fora das ações de mitigação previstas no Plano Nacional. Mas, já havia,

em 2008, discussões avançadas sobre o tema na Academia. Naquele ano, após o

lançamento do estudo “A Nova Geografia da Produção Agrícola”, financiado pela

Embaixada Britânica e executado pela Embrapa e pela Universidade Estadual de

Campinas, ficou claro que, se mantida a política de inação referente ao aquecimento

global, já no ano de 2020, o Brasil poderia perder aproximadamente R$ 7 bilhões,

considerando somente o aumento de temperatura de 1o C. Os impactos maiores seriam

sentidos nas culturas de soja, milho e café, e havia, portanto, a necessidade de se criar

um plano que tivesse como foco, em um primeiro momento, a redução das emissões de

gases do efeito estufa na agricultura.

Ao mesmo tempo, outros estudos foram sendo feitos e, juntamente com os

resultados do inventário nacional dos GEE feito pelo MCT, foi possível começar a

quantificar a possível redução das emissões e quais deveriam ser as tecnologias que, se

financiadas, promoveriam esta redução. A ideia era mostrar que, num curto espaço de

tempo, a agricultura brasileira poderia deixar de ser altamente emissora de gases-estufa

para se tornar um setor muito eficiente na sua mitigação.

O Plano Nacional de Mudança do Clima é, na realidade, o resultado da

construção das ações que começaram em 1988. Em toda essa trajetória, por vários

momentos, avanços do conhecimento científico permitiram ou promoveram o avanço da

política ambiental nacional. Os avanços obtidos na execução do inventário nacional de

gases do efeito estufa deixam clara essa sinergia entre ciência e política. Uma

quantidade importante de cientistas participou do processo de elaboração do inventário

e, num intervalo de tempo muito curto (próximo de cinco anos), foram gerados os

fatores de emissão de diversos setores da nossa economia e adotados nos cálculos do

(15)

4 No ano de 2013, será feita a primeira revisão do plano, com forte participação da

sociedade, por meio do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, cujo presidente é o

Presidente da República e o secretário-executivo, um membro da comunidade científica.

Atualmente, para a execução da política nacional, o Brasil dispõe de cerca de R$

5 bilhões anuais. Este montante está distribuído entre os recursos captados no Fundo

Amazônia (R$ 1,3 bilhão em doações internacionais), a verba do petróleo alocada no

Fundo Clima (R$ 500 milhões) e o programa ABC (R$ 3,4 bilhões). A execução

financeira desse recurso, porém, ainda é baixa.

1.2 Compromissos na COP-15

O Brasil, como país em desenvolvimento, não foi obrigado a fixar metas de

redução de emissões de gases do efeito estufa pelo Protocolo de Kyoto. Entretanto,

apresentou na COP-15, a conferência do clima de Copenhague, um conjunto de ações

voluntárias (NAMAS – Nationally Appropriate Mitigation Actions, ou Ações de

Mitigação Nacionalmente Apropriadas, em português) para reduzir suas emissões até

2020. O chamado desvio de trajetória, de 36,1% a 38,9%, permitiria ao País deixar de

emitir cerca de 1,2 bilhão de toneladas de CO21 equivalente (t CO2eq). As NAMAS do

Brasil foram assim definidas:

• Redução em 80% da taxa de desmatamento na Amazônia e em 40% no Cerrado em relação a uma linha de base predefinida, implicando em redução

de emissões da ordem de 669 milhões de t CO2 eq.;

• Adoção, na agricultura, da recuperação de pastagens atualmente degradadas, promoção da integração lavoura-pecuária, ampliação do plantio direto na

palha e da Fixação Biológica de Nitrogênio, ações que implicariam em corte

de emissões entre 133 e 166 milhões t CO2 eq.;

• Ampliação da eficiência energética, do uso de bicombustíveis, da oferta de hidrelétricas e fontes alternativas (biomassa, eólica, pequenas centrais

hidrelétricas) e o uso na siderurgia de carvão de florestas plantadas,

totalizando uma redução em emissões variáveis entre 174 e 217 milhões t

CO2 eq.

1

Por definição, 1kg de CO2 vale 0,2727 kg de carbono equivalente, já que considera apenas a massa das

(16)

5 Posteriormente, nos compromissos que envolvem o componente agropecuário,

adicionaram-se as estratégias de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e os

sistemas agroflorestais (SAFs), bem como a produção de florestas plantadas e o

processo de tratamento de dejetos animais.

Tabela 1.01. Proposta brasileira de mitigação de emissões de GEE. (Casa Civil da Presidência da República, Brasília, 2009 e Notificação do Brasil à UNFCCC, Acordo de Copenhague).

Uso da Terra 1.084 669 669 24,7 24,7

Desmatamento na Amazônia (80%) 564 564 20,9 20,9

Desmatamento no Cerrado (40%) 104 104 3,9 3,9

Agropecuária 627 133 166 4,9 6,1

Recuperação de pastos 83 104 3,1 3,8

ILP, ILPF, SAF 18 22 0,7 0,8

Plantio direto 16 20 0,6 0,7

Fixação Biológica de Nitrogênio 16 20 0,6 0,7

Energia 901 166 207 6,1 7,7

Eficiência energética 12 15 0,4 0,6

Uso de biocombustíveis 48 60 1,8 2,2

Expansão de energia por hidrelétrica 79 99 2,9 3,7

Fontes alternativas 26 33 1,0 1,2

Siderurgia 92 8 10 0,3 0,4

Total 2.704 976 1052 36,1 38,9

Ações de mitigação 2020

Tendencial

Amplitude da redução 2020 Proporção de redução

mi t CO2 eq. (%)

No caso dos biocombustíveis, a proposta é de que, até 2020, haja uma redução

de 48 milhões a 60 milhões de toneladas de CO2 equivalente pela substituição de

combustíveis fósseis por biocombustíveis. Nesse caso, e considerando que o setor

sucroalcooleiro saia da estagnação em que se encontra, para atingir a meta, será

necessário um crescimento de 500 mil hectares por ano de área cultivada com

cana-de-açúcar até o ano de 2020. Trata-se de uma meta razoável, uma vez que, na região

Centro-Sul, maior produtora de etanol no País, existem disponíveis para expansão 13

milhões de hectares, de acordo com o zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar. A

Figura 1.01 mostra as projeções, com e sem mitigação, em 2020. Em todos os setores,

considerou-se um crescimento do PIB de no máximo 6% ao ano. Ressalte-se que as

condições atuais (2011 e 2012) de PIB muito baixo, em torno de 1% a 1,5% ao ano, não

favorecem o alcance das metas no setor agropecuário e no de biocombustíveis, porque,

em situação de estagnação econômica, seria mantido o mesmo patamar das emissões de

2010, sem ações de mitigação que envolvem investimentos. Um crescimento de 4% a

6% do PIB associado à mitigação permitiria mais facilmente atingir as metas, uma vez

(17)

6 econômico baixo, corta-se os investimentos e fica-se como está, sem cumprimento das

metas.

O exemplo do setor sucroalcooleiro é didático nesse sentido. Os compromissos

assumidos em Copenhague indicam que, por meio dos biocombustíveis, pretende-se

reduzir as emissões em 60 milhões de toneladas de CO2 eq. até o ano de 2020. O setor

está estagnado desde a crise de 2008, com uma oferta interna de 550 milhões de

toneladas de cana-de-açúcar. Se a produtividade da cana crescer das atuais 70 t/ha

médias e chegar a 90 t/ha, ou seja, se houver ganho tecnológico, com baixo

investimento em expansão de área plantada, a oferta pode chegar a 750 milhões de

toneladas de cana-de-açúcar em 2020. Considerando o potencial de mitigação do etanol

com relação à gasolina, isso significa que, mantido esse cenário, atinge-se somente algo

entre 18% e 20% da meta de Copenhague para os biocombustíveis. Já, no caso inverso,

havendo ganho tecnológico e expansão de área plantada, é possível chegar a mais de 1,2

bilhão de toneladas de cana e a meta pode até ser superada, tanto na geração de

biocombustíveis, quanto no componente de geração de bioeletricidade. Não está sendo

considerado, nesses cálculos, o aumento do estoque de carbono no solos quando da

substituição de pastos e áreas degradadas pela cana-de-açúcar, como previsto no

zoneamento agroecológico.

Figura 1.01 Projeção para as emissões de gases do efeito estufa (GEE) com o cumprimento dos compromissos assumidos em Copenhague, não comprometendo o crescimento brasileiro (Adaptado de MCT, 2010).

A situação atual das ações de mitigação brasileiras que já possuem

(18)

7 84% da meta estabelecida. No caso do Cerrado, entre junho de 2009 e julho de 2010, a

taxa de desmatamento diminuiu 16%. Se comparados aos índices de 2002

(disponibilizados na base PROBIO do MMA), a queda da taxa de desmatamento do

Cerrado em 2010 foi de 40% (MMA, 2011). Não existem dados oficiais da taxa de

desmatamento até o ano de 2012, uma vez que não foram desenvolvidos os sistemas de

monitoramento anual com cobertura completa do bioma Cerrado e de monitoramento

em tempo quase real, como é feito pelo INPE na Amazônia. Esse sistema de

monitoramento deverá ser implantado no decorrer do ano de 2013 no Cerrado pelo

MMA. Uma vez implantado, produzirá dados e informações que permitirão agilizar e

atualizar o sistema de controle e fiscalização. Neste momento, será possível, então,

avaliar as metas para o desmatamento do Cerrado.

O plano setorial da agricultura, conhecido como Plano ABC, está no seu terceiro

ano, com R$ 3,4 bilhões destinados a práticas agrícolas que promovam a redução de

emissões. As ações de redução de GEE a partir do uso de biocombustíveis ficaram no

Plano Decenal de Energia (PDE – 2020).

Apesar de o Plano ABCter sido concluído apenas em 2011, no contexto da

Política Nacional de Mudança do Clima, o País já apresentava, antes disso, ações

concretas no sentido de financiar a redução das emissões de GEE na atividade agrícola.

Tais medidas foram implementadas por meio do Programa ABC, sob responsabilidade

do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). O programa foi

incluído no Plano Agrícola e Pecuário 2010-2011, para financiar os agricultores que

adotassem práticas adequadas, tecnologias e sistemas produtivos eficientes que

contribuíssem para a mitigação dos GEE. Sua forma de atuação é regionalizada,

oferecendo a oportunidade de estados e municípios aderirem.

Nesse ponto, é preciso esclarecer a diferença entre o plano e o programa. O

Plano ABC é um conjunto de propostas de tecnologias limpas que, quando da sua

adoção, permitirão reduzir ou evitar as emissões de gases do efeito estufa, com metas

bem definidas e estabelecidas em Copenhague. Ele foi criado oficialmente pelo decreto

7.390, de 9 de dezembro de 2010. Acompanha o plano, além das proposições

tecnológicas fundamentadas em estudos científicos, um componente operativo, que

procura buscar as soluções para o seu principal entrave, que é o treinamento dos

principais atores, ou seja, setor financeiro, extensionistas e produtores. O Programa

ABC é um conjunto de ações e normas de financiamento que segue as indicações de

(19)

8 outros programas que existiam no Ministério da Agricultura. Isso acabou levando à

incorporação, no programa, de alguns itens que não necessariamente reduzem as

emissões ou que, em certos casos, são até mesmo emissores de gases do efeito estufa

(veja quadro na pág. XX). Essas ambiguidades podem ser – e algumas já estão sendo –

corrigidas. A comparação detalhada entre o plano e o programa e suas consequências

(20)

9

2 Plano ABC: invertendo o sinal de carbono da agropecuária brasileira

2.1 Fundamentos estratégicos

2.1.1 O papel da Ciência

O Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas Visando

à Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura, nome

oficial do Plano ABC, tem o objetivo de garantir o aperfeiçoamento contínuo e

sustentado das práticas de manejo que reduzam a emissão dos gases do efeito estufa.

Este plano surgiu a partir dos resultados dos inventários de gases do efeito estufa

feitos em 1996 e 2006 pelo MCT, que evidenciaram que uma parcela importante das

emissões brasileiras vinha das atividades agropecuárias. Nos inventários, são

computadas emissões de diversos setores da agricultura, notadamente a emissão de

metano (CH4) pela fermentação entérica dos bovinos e pelo cultivo de arroz irrigado; a

emissão de diversos gases pela queima da cana; a emissão de óxido nitroso (N2O) e

dióxido de carbono (CO2) pelos solos agrícolas a partir da aplicação de fertilizantes

sintéticos e de resíduos agrícolas etc. Estava bem sinalizado que, segundo os métodos

de inventário determinados pelo IPCC (2006), as emissões da agricultura brasileira

eram significativas. A partir daí, independentemente do método utilizado para

inventariar as emissões, tornou-se necessário aumentar o conhecimento sobre o balanço

de gases na agricultura em diversos sistemas de produção, incluindo o sistema pecuário

e os sistemas de produção integrados. Tal necessidade tinha dois objetivos: aumentar a

independência do País em relação aos índices de emissão determinados preliminarmente

pelo IPCC (o chamado “nível 1”); e incluir nos próximos inventários o estado da arte da

pesquisa agropecuária brasileira, que possuía informações acumuladas havia mais de

vinte e cinco anos e que não estavam sendo levadas em consideração no balanço final

dos GEE.

Como exemplo, no cálculo de emissões do rebanho bovino, somente era

determinada a emissão por fermentação entérica. Há, aqui, sem dúvida, uma forte

emissão de metano. Entretanto, em sistemas de produção de pastos que adotam boas

práticas agrícolas, quando se inclui no cálculo a quantidade de carbono que é retida nos

solos, constata-se que esse sistema neutraliza, em termos de CO2 equivalente, a emissão

do metano do gado. Há, portanto, um balanço positivo. Por outro lado, nos pastos

(21)

10 No caso da cana, era computada somente a queimada, forte emissora de CO2 e

outros gases. Entretanto, o etanol emite um décimo do que emite a gasolina. Esse

cálculo não entrava no balanço da agricultura. Vários exemplos como estes foram

detectados, e tanto o setor público, quanto o setor privado entenderam que, com

pequenos ajustes nos sistemas de produção já conhecidos, a agricultura brasileira

poderia responder com eficiência pela mitigação de GEE no Brasil num curto espaço de

tempo. Seriam necessários dois caminhos: primeiro, definir os fatores de emissão da

agricultura tropical; e, em seguida, buscar nas boas práticas agrícolas maior eficiência

na produção e no balanço final de GEE. Os principais alvos seriam a redução do

desmatamento para a ocupação pela pecuária, principalmente na Amazônia; a

recuperação de pastos degradados no País inteiro; a adoção do plantio direto; e a

Fixação Biológica de Nitrogênio. A escolha destes quatro alvos estava baseada em três

aspectos: escala do empreendimento, importância econômica e alta eficiência na

redução de emissões de gases do efeito estufa, notadamente metano, dióxido de carbono

e óxido nitroso. Adotando essas práticas, num horizonte de dez anos, a agricultura

brasileira poderia deixar de ser altamente emissora de GEE para se tornar eficiente na

sua mitigação.

2.1.2 O papel das políticas públicas

Para tanto, seria necessário reduzir a pressão de expansão da pecuária na

Amazônia, aumentar sua eficiência em outras regiões do Brasil e criar condições de

financiamento de sistemas de produção, e não somente de itens de produção. Esse é o

grande avanço que se pretende com o Plano ABC: incorporar nas atividades da

agricultura o sistema de produção e o financiamento do sistema de produção. Havia, em

2009, total condição técnica e científica para propor essas ações para o governo federal.

O contexto político também era o ideal, já que o governo do então presidente Luiz

Inácio Lula da Silva via a conferência de Copenhague, em dezembro daquele ano, como

uma oportunidade de ampliar a projeção internacional do Brasil. A comunidade

científica brasileira e o Ministério do Meio Ambiente souberam aproveitar esse contexto

e convencer a Presidência da República a apresentar tais ações como NAMAS na

cúpula sobre o clima.

Dessa maneira, o Plano ABC procurou, na sua concepção original, incentivar

(22)

11 efeito estufa, elevando simultaneamente a renda dos produtores, sobretudo com a

expansão das seguintes práticas: (i) recuperação de pastagens degradadas; (ii) sistemas

de integração lavoura-pecuária-floresta; (iii) sistema de plantio direto na palha; (iv)

substituição de fertilizantes nitrogenados pela Fixação Biológica do Nitrogênio na

produção de leguminosas (como, por exemplo, a soja e o feijão), além de outras

espécies (como cana-de-açúcar, e milho, feijão) em desenvolvimento pela pesquisa; (v)

plantio de florestas, além do incentivo a estudos sobre a adaptação de plantas, no Brasil,

aos novos cenários de aquecimento do planeta, com sustentabilidade na produção de

alimentos nos próximos dez anos e o estímulo ao uso de tecnologias para geração de

energia e compostagem a partir do tratamento dos dejetos animais.

O processo de construção do plano foi um dos mais participativos dentre os

planos setoriais da Política Nacional sobre Mudança do Clima. Após divulgar os

compromissos assumidos em Copenhague, o MAPA e o MDA (Ministério do

Desenvolvimento Agrário) iniciaram a formação de um grupo de discussão, sendo aos

poucos incluídas instituições públicas, privadas e do terceiro setor. No total, foram mais

de trinta instituições e aproximadamente cem pessoas participando. O processo de

discussão pareceu lento no início, mas foi o que deu toda a robustez ao plano, incluindo

a percepção da sociedade brasileira com relação ao papel da agricultura na mitigação

dos gases do efeito estufa. A lentidão do processo decisório foi o que atrasou a

publicação do plano, entregue oficialmente ao MMA em maio de 2011. Porém, as

propostas gerais do Plano ABC, apresentadas em Copenhague, começaram a vigorar a

partir da sua publicação no Diário Oficial da União, por meio de decreto 7.390, de 9 de

dezembro de 2010.

Entre as ações já adotadas, destaca-se a criação, pelo Ministério da Agricultura,

do Programa ABC (Programa de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) e sua

inclusão no Plano Agrícola e Pecuário 2010-2011, para financiar os agricultores que

adotem práticas adequadas, tecnologias e sistemas produtivos eficientes que contribuam

para a mitigação dos gases do efeito estufa. O valor disponibilizado naquele ano-safra

foi de R$ 2 bilhões. Já, no ano de 2011-2012, chegou-se a R$ 3,15 bilhões e, em

(23)

12

2.2 Fundamentos técnicos

Como dito anteriormente, havia, em 2009, total condição técnica e científica

para propor o Plano ABC. Porém, como o conhecimento científico, na sua maioria,

estava restrito aos meios acadêmicos e a projetos-piloto (exceto para a Fixação

Biológica de Nitrogênio, amplamente adotada no plantio da soja, e o plantio direto),

torna-se necessário descrever minimamente as suas bases científicas e tecnológicas.

2.2.1 Recuperação de Pastagens

A degradação de pastagens é o processo progressivo de perda de vigor, de

produtividade e de capacidade de recuperação natural das pastagens para sustentar os

níveis de produção e qualidade exigidos pelos animais, assim como para superar os

efeitos nocivos de pragas, doenças e invasoras. Esse processo é resultado de manejo

inadequado, culminando com a deterioração dos recursos naturais. Com o avanço do

processo de degradação, verifica-se a perda de cobertura vegetal e a redução no teor de

matéria orgânica do solo, o que causa a emissão de CO2 para atmosfera (Tabela 2.01).

Com a recuperação das pastagens, inverte-se o processo e o solo passa a acumular

carbono.

(24)

13

Sistema

1 - Degradada – Brachiaria

decumbens 137 26.880 4.086 1.355 32,3

2 - Bom manejo sem N – B.

decumbens 191 13.714 2.675 847 17,2

3 - Consórcio – B. decumbens

e Stylosanthes guianensis 364 7.226 1.921 684 9,8

4 - Com 150 kg de N –

Panicum maximum 904 2.036 470 698 3,2

Emissão de CO2 eq. /kg GPV

Pastagem

Ganho de peso (g/cab/dia)

Emissão de CH4

(g)

Emissão de N2O

(g)

Emissão de CO2

(g)

Emissão total GEE

(kg)

Na tabela 2.01. é possível verificar que, com a recuperação da pastagem,

reduz-se em pelo menos 60% a emissão de CO2 no sistema de produção. Tal fato abre

caminhos importantes para reduzir barreiras não tarifárias e buscar a certificação

ambiental da carne brasileira.

A estratégia proposta para recuperação e manutenção da produtividade das

pastagens contribui para mitigar a emissão dos GEE, resultando em aumento

significativo na produção de biomassa. Isso, por sua vez, permite um aumento da

capacidade de suporte2 dessas pastagens dos atuais 0,4 para 1 ou mais unidade animal

por hectare (UA/ha)3, reduzindo a pressão pela conversão de novas áreas em pastagens.

Por outro lado, a reposição de nutrientes na pastagem assegura uma dieta de melhor

qualidade para o gado, reduzindo o tempo de abate e, consequentemente, a emissão de

gás metano (CH4) por meio de fermentação entérica (Kurihara et al., 1999).

A recuperação da pastagem proporciona ao sistema um maior estoque de

carbono quando comparado a um pasto degradado, uma vez que o sistema radicular das

forrageiras, naquela condição, é mais abundante, e o acúmulo de matéria orgânica no

solo diminui as perdas de CO2 para a atmosfera, conforme ilustrado na figura 2.01.

2

Capacidade de suporte: função da disponibilidade de forragem (MS, ou matéria seca) no pasto e do consumo de MS pelos animais.

3

(25)

14

Figura 2.01 Esquema representativo da degradação de pastagem (Foto: Embrapa CNPGL).

Para o cálculo do balanço de GEE em recuperação de pastagens degradadas,

foram utilizados os seguintes parâmetros (Tabela 2.02):

• Emissões de N2O de fertilizantes aplicados no solo agrícola, onde um valor médio de 100 kg de N produz emissões equivalentes a 645,5 kg CO2 eq. ha-1

(IPCC, 2006);

• Considerando a taxa de ocupação de 1 UA ha-1 ano-1, os bovinos de corte emitem anualmente o equivalente a 410 kg CO2 eq. ha-1 ano-1 (excretas

bovinas) (IPCC, 2006); e,

• Os bovinos emitem de 50 a 55 kg de CH4 ano-1 cabeça-1. Utilizando 21 como GWP (Global Warming Potential, ou potencial de aquecimento)4 do metano,

isso representa de 1.000 kg a 1.155 kg CO2 eq. cabeça-1 ano-1 (Lima et al,

2001)5. Com base nos fatores de emissão do IPCC (2006), Nível 1, o total de

N excretado por 1 UA é estimado em 162 g N dia-1, sendo que as emissões

4

GWP é uma medida de como uma determinada quantidade de gás do efeito estufa (GEE) contribui para o aquecimento global. Também é comumente identificado apenas pela sigla GWP ou GWF, em referência aos nomes em inglês. O GWP é uma medida relativa, que compara o gás em questão com a mesma quantidade de dióxido de carbono (cujo potencial é definido como 1). O potencial de aquecimento global é calculado sobre um intervalo de tempo específico e este valor deve ser declarado para a

comparação.

5

Existe, no âmbito do IPCC, uma discussão científica sobre se se deve considerar o GWP (que dá uma relação metano CO2 de 21) ou o GTP (Global Temperature Potential, ou potencial de temperatura global,

no qual a relação metano-CO2 cai para 5, devido ao menor tempo de residência do metano na atmosfera).

(26)

15 diretas de N2O de excretas (fezes e urina) bovinas equivalem a 2% do total

de N presente nas excretas. As emissões indiretas são calculadas para cada kg

de N na forma de excreta depositada no solo, onde 20% são volatilizados e

30% lixiviados; dos 20% volatilizados, 1% é emitido como N2O, e, dos 30%

lixiviados, 0,75% é emitido como N2O. Assim, com 1 UA ha-1, são

produzidos 59,13 kg N ha-1 ano-1 na forma de excretas. Deste total, 50%, ou

29,6 kg N ha-1, ficam no solo, e o restante é volatilizado ou lixiviado. De

forma direta, é emitido 0,59 kg N-N2O, ou 0,93 kg N2O ha-1 ano-1.

Indiretamente, é emitido 0,25 kg N-N2O, ou 0,39 kg N2O ha-1 ano-1.

Tabela 2.02. Parâmetros utilizados para o cálculo da redução das emissões nas propostas referentes à Recuperação de Pastagens Degradadas e ILP.

Parâmetro Unidade Valor

Taxa de lotação ILP e de pastagens recuperadas UA ha-1 1

Taxa de lotação em pastagem de baixa produtividade UA ha-1 0,4

Emissão por unidade animal (UA) kg CO2 eq. UA-1 ano-1 1866

Variação do estoque de C no solo (ILP e recuperação) kg CO2 eq. ha -1

ano-1 3791

Variação do estoque de C no solo (pastagem de baixa produtividade) kg CO2 eq. ha -1

ano-1 -4752

Unidades animais (UA) por cabeça UA cabeça-1 0,75

Área para a recuperação de pastagens milhões de ha 15

Área de ILP milhões de ha 4

Adubação nitrogenada na ILP kg N ha-1 ano-1 100

Adubação nitrogenada em pastagens recuperadas kg N ha-1 ano-1 100

Fator de emissão do N aplicado (kg CO2 eq. kg N-1) kg CO2 eq. kg N-1 6,45

Período Anos 10

Em resumo, para bovinos de corte, 1 UA ha-1 emite anualmente 1,32 kg N2O ha

-1

, ou o equivalente a 410,5 kg CO2 eq. ha -1

ano-1, na forma de N2O. Experimentos de

campo feitos pela Embrapa Agrobiologia indicam que, no caso específico das excretas

bovinas, o fator de emissão do N2O em área tropical é de 0,6% a 0,7%, e não 2%, como

indicado no Nível 1 (“tier 1”) do IPCC. Esses trabalhos estão sendo avaliados para

publicação.

Considerando tais parâmetros para o cálculo de redução de emissões, tem-se que

um pasto degradado possui capacidade de suporte média de 0,4 UA ha-1 ano-1. Nesse

caso, são emitidos pelos animais 1.866 kg CO2 eq. ano-1. Para efeito de cálculo, são

consideradas duas situações: a região de interface Cerrado-Amazônia (Cerrado 1) e a

região do Cerrado padrão (Cerrado 2). Essas informações mais detalhadas podem ser

obtidas nos trabalhos de Carvalho et al. (2010) e Salton (2005), corroborados por

diversos trabalhos científicos com experimentos de longa duração, feitos na Embrapa,

(27)

16 redução de carbono nos solos, interpretada aqui como variação do estoque de carbono

ou carbono emitido na forma de CO2 equivalente, será (estimativa média):

• Cerrado 1 = entre 5 t e 6 t CO2 eq. ha-1 ano-1; • Cerrado 2 = entre 3 t e 4 t CO2 eq. ha-1 ano-1; • Valor médio = 4 t CO2 eq. ha-1 ano-1.

Por sua vez, a variação do estoque de carbono no solo (com adoção de ILP e de

Recuperação de Pastagens Degradadas) é positiva, em torno de 3,5 t CO2 eq. ha-1 ano-1.

Com a recuperação de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas, tem-se,

portanto, uma redução de emissões superior a 100 milhões de t CO2 eq. até 2020,

definida originalmente por ocasião da estruturação do plano ABC (Tabela 2.03).

Tabela 2.03 Resumo das emissões em pastagens com e sem recuperação na proposta referente à Recuperação de Pastagens Degradadas.

(milhões de ha) sem recuperação com recuperação redução

1 1,5 104.479,1 72.314,4 10.169,1 2 3,0 104.479,1 62.145,3 20.338,2 3 4,5 104.479,1 51.976,2 30.507,3 4 6,0 104.479,1 41.807,1 40.676,4 5 7,5 104.479,1 31.638,0 50.845,5 6 9,0 104.479,1 21.468,9 61.014,6 7 10,5 104.479,1 11.299,8 71.183,7 8 12,0 104.479,1 1.130,7 81.352,8 9 13,5 104.479,1 -9.038,4 91.521,9 10 15,0 104.479,1 -19.207,5 101.691,0

Ano Área Implantada

Emissões

(milhares de t CO2 eq. ano-1)

Em trabalhos de levantamento de estoque de carbono no solo em diferentes

localidades do Brasil (Tabela 2.04), observa-se a diferença entre o estoque de carbono

num pasto degradado e num pasto bem manejado.

A resposta do aumento do estoque de carbono numa pastagem é lenta.

Considerando que, num intervalo de dez anos, seria possível atingir o valor médio da

diferença entre o estoque de carbono em pastos degradados e o estoque de carbono em

pastos bem manejados, é possível evitar as emissões em aproximadamente 340 milhões

de t CO2 equivalente. É importante salientar que existem, no Brasil, em torno de 60

milhões de hectares de pastos degradados. Assim, o potencial de mitigação é quatro

vezes maior, uma vez que, no Plano ABC, é contemplada a recuperação de apenas 15

(28)

17 O estoque médio a ser alcançado pode aumentar ou diminuir dependendo do bioma

onde se encontra o pasto.

Tabela 2.04. Estoques de Carbono (t C ha-1) no solo em pastagem degradada, pastagem manejada e vegetação nativa em diferentes localidades no Brasil (0-30 cm).

Local Vegetação Nativa Pastagem degradada Pastagem manejada Referência

BA 55,1 56,1 65,4 Costa et al., 2009

DF 60,8 63,4 69,6 Marchão et al., 2009

GO 51,2 41,1 45,5 Freitas et al., 2000

MS 54,0 53,5 58,6 Salton et al., 2005

GO 81,9 71,1 74,2 Freitas et al., 2000

MT 74,1 54,3 62,8 Carvalho et al., 2010

Média 62,5 56,5 62,6

2.2.2 Integração Lavoura-Pecuária–Floresta (ILPF) e Lavoura-Pecuária (ILP)6

Os sistemas de Integração Pecuária (ILP), Integração

Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e os sistemas Agroflorestais (SAFs) são estratégias de

produção sustentáveis que integram na mesma área atividades agrícolas, pecuárias e

florestais, em cultivo consorciado, em sucessão ou rotacionados. Buscam efeitos

sinérgicos entre os componentes do agroecossistema. Essas estratégias contemplam

quatro modalidades de sistemas, assim caracterizados: Integração Lavoura-Pecuária ou

ILP (agropastoril), Integração Lavoura-Pecuária-Floresta ou ILPF (agrossilvopastoril),

Integração Pecuária-Floresta (silvopastoril) e integração Lavoura-Floresta.

O alto teor de matéria orgânica (MO) na superfície do solo é um dos principais

benefícios do sistema integrado, uma vez que isso melhora as condições físicas,

químicas e biológicas do solo. Por outro lado, a adoção de um sistema de monocultura

por alguns anos ocasiona ao sistema a perda de MO constante e, consequentemente,

compromete a qualidade do solo. Nesse sentido, Sousa et al. (1997) e Corsi et al. (2001)

estudaram os teores de MO em diferentes sistemas de cultivo – monocultura, integração

lavoura-pecuária, pastagem – e observaram níveis inferiores no sistema de monocultura

(Figura 2.02).

6

(29)

18

Figura 2.02 Dinâmica da matéria orgânica do solo na camada de 0-20 cm em dois sistemas de cultivo em experimento de longa duração (Souza, 1997).

A adoção de sistemas de ILP (sistema agropastoril) promove fixação de carbono

no solo pelo grande aporte de resíduos vegetais que produz. A adoção da ILP em 4

milhões de hectares corresponde a uma redução de emissões de 18 milhões a 28 milhões

de t CO2 eq. ou mais. Nesse caso, haveria, adicionalmente, o benefício do poupa-terra,

ou seja, considerando a taxa de lotação de 0,4 UA ha-1 nos pastos degradados e

elevando-se esta taxa para 1 UA ha-1, a diferença será de 0,6 UA ha-1. Com a adoção da

ILP e da recuperação de pastagens, tem-se o adicional de 0,6 UA ha-1 x 19 milhões de

ha, o que seria 11,4 milhões de novas UA no sistema, ou equivalente a 15,2 milhões de

cabeças de gado. Se for mantida a mesma capacidade de suporte nos pastos degradados,

para atingir 11,4 milhões de novas UA, seria necessário desmatar mais 28,5 milhões de

hectares. Este número equivale a setenta e uma vezes a atual taxa de desmatamento

anual da Amazônia.

Os sistemas integrados mais complexos, como ILP, ILPF e SAFs, podem gerar

valores de redução de emissão ainda maiores devido à fixação adicional de carbono na

biomassa florestal e no solo. Com a adoção do sistema ILP, considerando valores

médios de 1,5 t C/ha em dez anos – menos do que o indicado nos trabalhos de Alves et

al. (2008) –, em 2020, atingem-se 21 milhões de t CO2 eq. Somando-se as emissões

evitadas pela recuperação de pastagens à ILP, atingem-se 361 milhões de t CO2 eq., ou

seja, um pouco mais do que o dobro da meta de 133 milhões a 166 milhões de toneladas

(30)

19 equivalente considerada em Copenhague. Para o balanço final, é necessário

descontar as emissões por fermentação entérica dos bovinos (de cerca de 230 milhões

de t CO2 eq.).

2.2.3 Plantio direto na palha

A perda de carbono orgânico por ação antropogênica deve-se à erosão dos solos

e à oxidação provocada pelo desmatamento e queima da vegetação natural e pela

oxidação microbiana estimulada pelo preparo do solo agrícola. Essas operações de

revolvimento do solo com discos e hastes promovem aeração do solo e aumento da

atividade microbiana aeróbica, que utiliza o carbono orgânico do solo como substrato de

crescimento, reduzindo os teores de matéria orgânica (MO) do solo, além de promover

exposição e erosão deste. Dessa forma, dependendo do sistema de manejo do solo

adotado, a MO pode ser fonte ou sorvedouro de CO2 atmosférico.

O sistema de plantio direto (SPD) consiste num complexo de processos

tecnológicos destinados à exploração de sistemas agrícolas produtivos, compreendendo

a mobilização de solo apenas na linha ou cova de semeadura, a manutenção permanente

da cobertura do solo, a diversificação de espécies e a minimização ou supressão do

intervalo de tempo entre a colheita de uma safra e a semeadura da seguinte.

Este sistema contribui para a conservação do solo e da água, o aumento da

eficiência da adubação e da Fixação Biológica de Nitrogênio (FBN), o incremento do

conteúdo de matéria orgânica do solo, o aumento na relação custo-benefício, a redução

do consumo de energia fóssil e do uso de agrotóxicos. Além disso, a adoção do SPD

contribui para o aumento da resiliência do solo e resulta na redução da emissão dos

gases do efeito estufa, mediante redução da degradação da MO e do uso de

combustíveis fósseis, já que o plantio direto demanda menor uso de maquinário. A

técnica também permite reduzir o uso de adubo, devido à melhoria que provoca na

qualidade do solo.

A tecnologia do plantio direto é bem difundida e utilizada em grande parte das

áreas atualmente cultivadas, especialmente com soja, milho e trigo, nas regiões do Rio

Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e parte de São Paulo e Mato Grosso do Sul. No

entanto, as regiões do Centro-Oeste, Norte e Nordeste aumentam a cada ano a

(31)

20 Propõe-se o aprimoramento da técnica utilizada nessas regiões, ou o “SPD de

qualidade”, que é o plantio direto que tem a capacidade de potencializar todos os

benefícios do sistema. Uma boa referência sobre a definição de SPD de qualidade está

disponível no site do Instituto Agronômico do Paraná7. O SPD de qualidade é baseado

na rotação de culturas e na cobertura permanente do solo, visando a aumentar a retenção

de MO, bem como sua disseminação para outras regiões, em especial o Centro-Oeste, e

para outras culturas, como o algodão.

A principal questão que se coloca sobre o plantio direto diz respeito à sua

qualidade, pois, dependendo da palhada, o acúmulo de carbono não chegará aos 500

kg/ha/ano, valor adotado para calcular as emissões evitadas por esse sistema no Plano

ABC. Mesmo assim, diversos trabalhos na literatura comprovam a eficiência do SPD

em comparação ao SPC (Sistema de Plantio Convencional) em acumular carbono no

solo (Tabela 2.05).

Com um SPD de qualidade, observa-se que, em algumas situações, o acúmulo

de carbono no solo pode, até mesmo, ser maior do que o estoque de carbono da

vegetação nativa (d’Andréa et al., 2004), demonstrando o seu grande potencial em

estocar carbono. Isso porque os sistemas de manejo menos perturbados apresentaram

uma tendência em armazenar mais carbono orgânico no solo. Nos exemplos

apresentados na tabela 2.05, a diferença entre a média do estoque de carbono no sistema

convencional e a média do SPD é de 10,2 t C/ha ou, simplificando, 1 t C/ha ano. Para os

cálculos das projeções do plano ABC, utilizou-se 0,5 t C/ha/ano.

Tabela 2.05. Estoques de Carbono (t C ha-1) no solo em Sistema Plantio Convencional (SPC), Sistema Plantio Direto (SPD) e vegetação nativa em diferentes localidades no Brasil (adaptado para a profundidade de 0-30 cm).

Local Vegetação Nativa SPC SPD Referência

GO 45,8 44,0 51,6 d’Andréa et al., 2004 SC 128,3 82,1 98,2 Bayer et al., 2002 GO 60,5 46.5 60,0 Siqueira Neto, 2006

DF - 55,0 70.0 Oliveira et al., 2004 MG - 46.8 57,5 Leite et al., 2004

PR - 40,6 49.6 Castro-Filho et al., 1998 RS - 68,1 78.1 Sisti et al., 2004 RS - 51.1 62,2 Lovato et al., 2004

Média - 54.4 66,0

7

(32)

21 Existem, atualmente, 25 milhões de hectares (FBRPDP, 2012 disponível em

http://www.febrapdp.org.br/ ) nos quais se adota o SPD no Brasil. Considerando-se que

a meta é atingir 33 milhões de hectares em plantio direto (“de qualidade”) até 2020, a

proposta é de incorporar ao sistema produtivo mais 8 milhões de hectares. Assim,

somente com o incentivo para a adoção do sistema em 8 milhões de hectares adicionais

(800 mil hectares ano-1), seriam mais 14,64 milhões de t CO2 eq. retirados da atmosfera

e retidos na MO. Os resultados das estimativas de redução de emissões pela adoção do

SPD são apresentados na Tabela 2.06.

A evolução natural deste sistema no Brasil e todas as suas consequências

positivas têm mostrado que essa meta será de fácil alcance. Nas Figuras 2.03 e 2.04, é

possível verificar a evolução da área cultivada com SPD no mundo e no Brasil, sendo

que, já na safra de 2011, atingiu-se 31 milhões de hectares no Brasil.

Tabela 2.06. Redução das emissões (em milhões de t CO2 eq. ha-1 ano-1) na proposta referente à adoção do Sistema Plantio Direto (SPD) em 8 milhões de hectares.

(milhões de ha) Emissões sem SPD Redução

1 0,8 18.696 1.464 2 1,6 17.232 2.928 3 2,4 15.766 4.392 4 3,2 14.304 5.856 5 4,0 12.840 7.320 6 4,8 11.376 8.784 7 5,6 9.912 10.248 8 6,4 8.448 11.712 9 7,2 6.984 13.176 10 8,0 5.520 14.640

Ano Área Implantada

Emissões (milhares de t CO2 eq. ano

(33)

22 Safra 11/12; 31.811.000 ha 0 5000000 10000000 15000000 20000000 25000000 30000000 35000000 72/7 3 74/7 5 76/7 7 78/7 9 80/8 1 82/8 3 84/8 5 86/8 7 88/8 9 90/9 1 92/9 3 94/9 5 96/9 7 98/9 9 00/0 1 02/0 3 04/0 5 07/0 8 Ano Safra H e c ta re s

Figura 2.03. Área de plantio direto no Brasil – evolução entre 1972 e 2012 (Fonte: FEBRAPDP).

(34)

23 0 5.000.000 10.000.000 15.000.000 20.000.000 25.000.000 30.000.000 EU A A rg en ti n a B ra si l A u st rá lia C an ad á P ar ag u ai C h in a C as aq u is tã o B o liv ia U ru gu ai Es p an h a Á fr ic a d o S u l V en ez u el a Fr an ça Fi n lâ n d ia C h ile N o va Z el ân d ia C o lô m b ia U cr ân ia O u tr o s (E sti m ati va )

Á

re

a

sob

S

P

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h

a)

e

m

2

007/

2008

País

Figura 2.04. Área total sob SPD em diversos países. Até 2008, o Brasil era o terceiro país do mundo em área plantada com SPD (Fonte: Derpsch e Friedrich, 2009).

Os produtores praticam, em sua maioria, um sistema de plantio direto parcial e

caminham para o SPD com qualidade. Os fundamentos do SPD com qualidade

pressupõem (Medeiros e Calegari, 2007):

• Revolvimento mínimo do solo;

• Manutenção do solo permanentemente coberto por palha e culturas;

• Planejamento da propriedade com culturas para renda e uso de plantas de cobertura que podem também oferecer rendimentos em curto prazo.

O tempo necessário para os produtores atingirem o SPD com qualidade depende

de vários fatores: exercitar um planejamento mínimo de três anos para a implantação de

sequência de culturas nas glebas da propriedade; dispor de assistência técnica por um

período suficiente, no qual seria realizada a conversão do SPD parcial para o SPD com

qualidade; adotar um novo enfoque de análise dos resultados da propriedade, baseado

no potencial econômico da rotação e não somente na contribuição das culturas

(35)

24 Sá et al. (2004) ressaltaram a importância do tempo de adoção do PD para que as

alterações, tais como acúmulo de matéria orgânica, agregação do solo e ciclagem de

nutrientes, se processem.

2.2.4 FBN (Fixação Biológica de Nitrogênio)

A Fixação Biológica de Nitrogênio é o processo pelo qual o gás N2 atmosférico

é capturado por microrganismos e convertido em compostos nitrogenados disponíveis

às plantas. O ar constitui um suprimento abundante de N2 (gás que compõe 79% da

atmosfera). Porém, na forma gasosa, o nitrogênio não está diretamente disponível para

as plantas. A captura do elemento é realizada por bactérias do gênero Rhizobium ou

Azorhizobium, que vivem em simbiose com a planta, habitando seus nódulos

radiculares (Figura 2.05) e, em certos casos, também seus colmos.

A FBN pode ser chamada de “fábrica biológica”, com capacidade para suprir as

necessidades de nitrogênio da planta, substituindo total ou parcialmente a adubação

nitrogenada.

Figura 2.05 Bactérias do gênero Rhizobium ou Azorhizobium em simbiose com a planta, vivendo nos seus nódulos radiculares (Foto: Marisa Piccolo).

O sucesso da soja no Brasil está relacionado ao processo de fixação biológica,

capaz de fornecer todo o nitrogênio necessário à planta, mesmo para variedades de alto

rendimento. A tecnologia, hoje, é adotada em todas as áreas cultivadas com a soja no

(36)

25 com fertilizantes nitrogenados em torno de US$ 7 bilhões. Outro exemplo importante da

utilização da tecnologia é nas lavouras de feijão. A inoculação com bactérias

selecionadas por pesquisadores tem resultado em rendimentos com o dobro da média

nacional, o que pode gerar uma economia anual de US$ 500 milhões. A tecnologia

também está sendo desenvolvida para gramíneas como o milho, o trigo e o arroz e está

em fase de testes com a cana-de-açúcar e a braquiária (cartilha Embrapa-FBN,

disponível em http://www.agrosustentavel.com.br/).

A FBN tem papel relevante na redução da emissão de gases do efeito estufa

relacionados à fabricação e ao uso de adubos químicos (Tabela 2.07). Ela também

facilita o sequestro de carbono em situações específicas. Estudos indicam que a fixação

de 90 milhões de toneladas de nitrogênio equivale ao sequestro de quase 1 bilhão de

toneladas de carbono por ano (cartilha Embrapa–FBN).

Tabela 2.07 Aspectos relacionados ao processo de fixação do nitrogênio atmosférico por via industrial e biológica.

Fixação Industrial Fixação Biológica de Nitrogênio

Fertilizantes FBN Nutriente mais caro, utiliza energia fóssil

para produção e distribuição, contribuindo para a emissão de GEE.

Segundo processo biológico mais importante do Planeta depois da fotossíntese. Não é poluente, utiliza energia

solar, recicla CO2.

Têm baixo aproveitamento agronômico e são poluentes de solo, água e atmosfera.

Mecanismo responsável por 65% do N2

incorporado aos seres vivos do Planeta.

Representam de 5% a 20% do custo da produção agrícola.

Consome em torno de 2,5% da energia da fotossíntese do Planeta.

Representam apenas 2% da absorção total de nitrogênio pelas plantas.

A vida no planeta acabaria em trinta anos se a FBN parasse.

Fonte: Franco e Balieiro (1999).

Nas etapas de produção e transporte de adubos nitrogenados, as emissões de

gases do efeito estufa decorrentes do consumo de energia fóssil representam entre 40%

e 50% das emissões totais pelo uso de fertilizantes nas lavouras. Em média, o uso de 1

kg de fertilizante nitrogenado emite o equivalente a 10 kg de CO2 (cartilha

Embrapa-FBN).

Em 1950, a produção nacional de N foi de 700 toneladas, correspondente a

apenas 7,1% da demanda interna do nutriente. Neste mesmo período, foram importados

13,4 mil toneladas de N. Em 1986, a produção nacional de N foi de 712 mil toneladas,

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