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Biblioteca. Mario Henrique Slmona.n
INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS EM EDUCAÇÃO
AGNELA DA SILVA GIDSTA
QUALIDADE DO ENSINO:
UM ESTUDO PRELIMINAR DE DOIS FATORES DETERMINANTES
'TIBAE .... 0538g
Rio de Janeiro, 1978
I
QUALIDADE DO ENSINO:
ur"
ESTUDO PRELHHNAR DE DOIS FATORES DETERflINANTES
AGNELA VA SILVA GIUSTA
Dissertação submetida como requisito, parcial, para a obtenção do grau de
mestre em Educação
Orientador:
CIRCE NAVARRO RIVAS
RIO DE JANEIRO FUNDAÇÃO GETOLIO VARGAS
INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS EM EDUCAÇÃO DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
1 9 7 8
Se fiz um hino de amor,
ele
é
um canto a StRGIO GIUSTA.Aos professores: RAYMUNVO MATTA
CIRCE NAVARRO RIVAS
THEREZINHA ROVRIGUES OLIVEIRA,
pelo estímulo intelectual e possibilidade que me dão de manifestar afeto.
INTRODUÇÃO
1. A RE~ruNERAÇÃO DO PROFESSOR ••••••••••••••
1.1. Motivos da falta de organização política
Pago 1
16
no seio do professorado ••••••••••••••••• 18
1.1.1. Posição da classe ••••••••••••••••••••••• 18
1.1.2. Origem social... 21
1.1.3. O magistério como profissão
predominante-1.1.4.
1.1.5.
mente exercida por mulheres •••••••••••••
Si tuaç ão de .6 .ta..tU.6 ••••••••••••••••••••••
. . .
Falta de consciência do professor com re-lação ao papel que exerce no sistema ••••
2. A FORMAÇÃO DO PROFESSOR NOS CURSOS DE
LI-CENCIATURA
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2.1. As Faculdades de Educação e a formação do
26 28
30
32
licenciado •••••••••••••••••••••••••••••• 33
2.2. A formação pedagógica do professor: dis
-- .. . 43
torçoes cr1t1cas ••••••••••••••••••••••••
2.2.1. Ausência de preocupação quanto a uma visão
global e crítica do processo educacional • 43
2.2.2. Superficialidade e parcialidade quanto aos pressupostos que embasam o trabalho pedagó
gico . . . 46
2.2.3. Distanciamento entre os pressupostos teóri cos e as técnicas pedagógicas que deles re··
sul tam . . . • . . 60
2.2.4. Caráter eminentemente teórico da formação d ...
pe agoglca . . . .
CONCL USÃO •••••••••••••••••••••••••••••••••••••••
B IBL IOGRAFIA ••••••••••••••••••••••••••••••••••••
ANEXOS
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IV
63
68
73
Acredita-se na possibilidade de a escola
exer-cer uma ação transformadora, o que justifica uma
preocu-paçao com a qualidade do ensino. Pensar em qualidade do
ensino
ê
se voltar, antes de tudo, para os dois fatoresque são de extrema importância em sua determinação: a
re-muneração do professor e sua formação profissional. Por
isso neste trabalho intentamos:
a) empreender um estudo preliminar, a nível
de reflexão teórica, da questão relativa à remuneraçao do professor;
b) analisar a formação do professor no curso de licenciatura, principalmente no que res-peita à formação pedagógica.
Esperamos que as idéias aqui contidas possam
contribuir para a viabilização de uma proposta
pedagógi-ca que atenda qualitativamente aos efetivos escolares.
Como toda produção intelectual, esta disserta-çao é o resultado de um esforço coletivo e, como tal,tem uma dívida muito grande para com as pessoas. Dai a ânsia para agradecer, o que dificilmente poderá ser feito com
justiça. Em primeiro momento, a gratidão assume a forma
de uma enorme saudade de meu pai, D. Iaiá e tia Chiquita.
Em um segundo, ela se dirige às pessoas que mais
direta-mente tornaram possível este trabalho:
- a Anna Vittoria, por existir como expressa0 de amor;
a minha família - aqui representada por mi-nha mãe, Ara, meus sogros, tio Agenor e tia
Beatrice - pela convivência afetuosa e
es-timulante;
- a Circe, pela excelente orientação;
- a Eliane Menezes, Glaura Guimarães,
There-ziriha Oliveira e Sérgio Giusta, pelo apoio intelectual, moral e afetivo durante a
rea-lização do trabalh~;
a J.laria Angela Faria Resende, pela disponi-bilidade efetiva de ajuda traduzida,
prin-cipalmente, na versão francesa do resumo
da dissertação;
- a Flávio Bracarense Silva, pelo esmero nos
\
serviços de datilografia e diagramação; a Laura Cançado Ribeiro, zé Arapiraca e Victor Valia pela cuidadosa análise e pelas contribuições valiosas no sentido de enri-quecimento futuro do trabalho;
- a Eneide Cazaes, Gilda Cedraz, Jandira San-tos e Lêda Jesuíno, pelo apoio recebido du-rante a realização do Mestrado e pela pro-funda amizade que mantemos;
- a Almir Pazzianotto, Luiz Tenorio e
Raymun-do Matta pela grande influência intelectu~
que exerceram sobre mim;
- aos meus alunos, aos meus amigos, aos
ex-co-legas do IESAE e da UFBa e aos coex-co-legas da
FAE/UFMG, pela riqueza das nossas trocas.
Esta dissertação sustenta que, em educação,uma
perspectiva política não existe isolada de uma
perspecti-va técnica e que, portanto, é a nível do trabalho pedagó-~5ico propriamente dito que o professor exerce uma prática política mais sistemática. A partir desta afirmação
justi-fica-se ~ preocupação desse trabalho com problemas
funda-mentalmente técnicos, tomando-se como interesse central o estudo de dois fatores que influem decisivamente na quali-dade do ensino: a remuneraçao do professor e sua formação profissional.
No que se refere à remuneraçao, procedeu-se a
uma reflexão sobre a situação profissional do professor e sobre os motivos que podem justificar a falta de organiza-çao política no seio do professorado.
Já quanto à formação do professor realizou-se
um recorte e tomou-se como unidade de análise a formação
do licenciado, especialmente no que se refere à formação
pedagógica.
Constatou-se que não existe uma instituição que assuma a coordenação da formação do professor a nível de
"
licencia tura, o que tr'az como consequência uma formação
fragmentada e desconexa. Ãs Faculdades de Educação, por'
sua própria definição, deveria caber a responsabilidade de coordenação.
Constatou-se, ainda, que a formação pedagógica
apresenta distorções críticas, não preparando os professo-res para um tipo de trabalho que atenda qualitativamente a todos que para a escola se encaminham.
Trata~se de um trabalho que poderá interessar
aos professores e às instituições que mantêm cursos ~e
ha-bilitação para o magistério, principalmente a nível de
graduação.
Os estudos que evidenciam o papel da educação na reprodução da sociedade têm sido alvo de crescente
in-teresse nos meios acadêmicos. Trabalhos nesta linha,
base-ados, predominantemente, nas formulações teóricas de
Bo~-"
dieu/Pa~~e~on e, com menos frequência, nas de G~am~ci e I
At~hu~~e~ vêm se desenvolvendo e alcançando elevado pre~
tígio. Observa-se, porém, que há uma tendência,por parte dos professores que valorizam as análises das contradições
do sistema educacional e da escola, em considerar como se~
ou de pouca importância, os estudos de caráter mais técnico, principalmente aqueles voltados para o trabalho peda -gógico propriamente dito.
Admite-se que muitos trabalhos relativos ao en-sino são passíveis de crítica por apresentarem uma superfi cialidade teórica digna de nota e uma característica de pedagogismo ingênuo que chega mesmo ao ponto de colocar no método de ensino a solução para os problemas da educação.
E
evidente que isso ocorre porque se desconhece que os problemas atinentes i educaçã~ são, em Gltima instância,
con-" .
sequentes da estrutura da sociedade ou, mais precisamente,
do regime de produção em vigor. \
Reconhecer a relação de dependência entre
edu-caça0 e regime de produção não significa, entretanto, que
se considera a educação como um mecanismo dispensável a um
projeto global de transformação. Por isso, assim como nao
toda pratica se viabiliza pelo metodo, razão porque não se
justifica o descaso com relação aos estudos de carater fu~
.damentalmente técnico. Seria, então, oportuno perguntar:
por que o descaso? Estariam os teóricos estudados levando
os professores a uma descrença quanto à participação da e~
cola num programa de transformação da sociedade? Duvida-se
que isto ocorra, pois se é verdade que Bou~dieu e Pa~~e~on,
realizando uma análise criteriosa acerca da função da edu-cação nas sociedades de classes, não deixam margem paraqle
se perceba uma saída, o mesmo não acontece com G~am~ei e
Al~hu~~e~ e, em geral, com os marxistas que sao, a um tem-po, teóricos e participantes de um programa de ação.
Bou~dieu e Pa~~e~on sustentam que em uma
socie-"
dade de classes e ,consequentemente , em uma sociedade com estruturas.de dominação, a educação funciona como um
pode-roso mecanismo de inculcação dos valores que legitimam e
dissimulam as relações de força entre as classes,contribu-indo, de forma efetiva, para o exercício e perpetuação do
poder. A educação implica, então, numa ação pedagógica
CAP)
que é definida como "uma violência simbólica enquanto impo
s ição, por um poder arbitrário, de um arbitrário cultural':
T
Nestes termos, toda AP, para atingir seu objetivo,
pressu-poe necessariamente a autoridade pedagógica (AUP) ,o traba~
lho pedagógico(TP) e, por extensão,o sistema de ensino(SE).
Quando Sou~dieu e P~~e~on levantam as
proposi-ções relativas a cada uma das condiproposi-ções básicas para 'a co~
cretização da AP, dão a perceber que não existe alternati-va possível para a mudança do papel da educação nas socie-dades de classes. Isto fica muito claro principalmente quando eles afirmam que:
a) "toda instância (agente ou instituição) que
exerce uma AP não dispõe da AUP senão a título de mandatá-ria·dos grupos ou classe dos quais ela impõe o arbitrário
BOURVIEU, Pie~~e ! PASSERON, Jean Claude. A Re~~odu
ç.ã.o - elemen~o~ pa~a uma ~eo~ia de en~ino • . • J.
..
cultural segundo um modo de imposição definido por esse
arbitrário, isto
é,
a título de detentor por delegação dodireito de violência simbólica"; 2
b) os agentes que incorporam uma autoridade
pe-dagógica reconduzem a ação pepe-dagógica
ã
sua verdadeobje-tiva de violência simbólica, sendo o desconhecimento
des-sa verdade uma exigência fundamental para que eles
reali-zem a sua prática;
c) o trabalho pedagógico só pode ser efetivado
como um trabalho de imposição e inculcação contínuas da
cultura tomada arbitrariamente como padrão, ou seja da
cultura da classe dominante, visando uma formação durável, um hab~t~ transferível e exaustivo, isto é, capaz de ser aplicado a diferentes campos de açao e reproduzir os
prin-cípios do. arbitrário cultural o mais amplamente quanto
possível;
d) uma política da educação baseada na hipótese da democratização do ensino pela racionalização da pedago-gia é visivelmente utópica. "Não se pode ter uma tal polí-tica como própria ao interesse das classes dominadas a nao ser com a condição de identificar o interesse objetivo des
sas classes com a soma dos interesses individuais de seus
membros (por exemplo, em matéria de mobilidade social ou
de promoção cultur~l), o que conduz de novo ao
esquecimen-to de que a mobilidade controlada de um número limitado de
indivíduos pode servir
ã
perpetuação da estrutura dasre-- 3
laçoes de classe";
e) o sistema de ensino institucionalizado toma ao seu encargo o trabalho pedagógico regulamentado, ou se-ja, o trabalho escolar (TE), dotando os agentes,
responsá-veis por este trabalho, de uma formação homogênea e de in~
trumentos, homogeneizados e homogeneizantes, a fim de
sal-2BOURVIEU,
P~e~ne
f PASSERON, Jean Claude. ARe§~odução
- etemento~ pana uma teon~a de en~~no. Rio e Janel
3 no, Livnania Fnanci~co Alve~ Editona, 1975. p.37
-IBIVEM, p.63
..
vaguardar a sua própria reprodução e a reprodução do
arbi-trário cultural e social. "O SE tende a garantir ao corpo
dos agentes recrutados e formados para assegurar a
incul-cação condições institucionais capazes por sua vez de dis-pensá-los e de impedí-Ios de exercer TE heterogêneos e
he-terodoxos".4
As afirmações ora apresentadas correm o risco
de serem tomadas para alicerçar uma dedução do tipo a
se-guir: se a educação
ê
um meio de transmissão de ideologiae se a educação escolar assegura, por recursos mais
aba-lizados, a transmissão da ideologia burguesa, o fato de as
classes dominadas não terem acesso
à
escola se constitui" num bem para elas, em primeiro lugar porque não a
frequen-tando, elas não serão, mais sis tematicamente, levadas ao
consenso de que o sistema de valor da classe fundamental
ê
o que de mais racional existe e, em segundo lugar, porque
elas nao serão expostas
ã
internalização de uma incapaci-dade natural, considerando que, em face do conteúdo e da
linguagem da pratica escolar, pouca chance de êxito têm as classes subalternas.
Essa dedução natural nao pode ser tomada como
verdadeira a nao ser que se adote a imagem do homem
autô-"
mato e, consequentemente, o ponto de vista de que nao se
pode criar uma alternativa possível pa.ra que a educação
funcione de outro modo. ~ claro que lutar contra uma
or-dem poderosamente instituída e controlada tanto mais
efi-ciente, quanto mais se apoia num processo de violência
simbólica, não
ê
um empreendimento fácil. Por outro lado,a dificuldade não foi, até hoje, suficiente para que se
considere a educação ã margem de um processo de
transfor-mação, tanto que a própria história da Ciência política
tem registrado preocupação de teóricos marxistas, e
mes-mo de líderes revolucionarios, quanto
ã
educação e quanto4BOURVIEU, Pie44e , PASSERON, Jean Ciaude. A Rep~odução
- eiemento~ pa~a uma teo~ia de en~ino. Rio de Janei
à formulação de uma pedagogia consonante com os cânones do materialismo histórico e do materialismo dialético.
Buscando G~am~~~ tem-se a comprovação do que
ora se afirma. Baseando suas análises nas sociedades oci-dentais industrialmente desenvolvidas e demonstrando que o marxismo não deve ser entendido como a ciência da estru tura, mas como a articulação complexa da teoria e da
prá-tica na relação estrutura e superestrutura, GJz.am.6~~ acaba
por elaborar o conceito de bloco histórico, no seio do qual distingue a estrutura sócio-econômica e a superestru
tura, camadas organicamente vinculadas por meio dos
tra-balhadores intelectuais.
No seio da superestrutura GJz.am.6~~ localiza a
sociedade política e a sociedade civil e as concebe como
uma unidade dialética, conforme ~xplicita a afirmação, a
seguir:
" ••• o Estado é costumeiramente entendido como sociedade política (ou ditadura, ou aparelho coercitivo
para submeter a massa popular ao tipo de produção e
eco-nomia de um momento dado) e não como um equilíbrio da so-ciedade política com a soso-ciedade civil (ou hegemonia de um grupo social sobre a sociedade nacional enquanto con-junto, através das organizações ditas privadas, como a ' igreja, os sindicatos, as escolas etc)".5
Sociedade política e sociedade civil sao, na
acepçao gramsciana momentos de um mesmo processo e mant~m
relações permanentes, já que nem a coerção, .nem o consen~
so, são capazes, por si sós, de manter uma dominação. Aqui interessa especificamente a contribuição de G~am.6~~ quanto ao conceito de sociedade civil, uma vez que ela constitui o domínio da ideologia e abrange o
con-junto dos organismos que operam no sentido de difundir a concepção de mundo da. classe dominante e dirigir intelec-tual e moralmente a sociedade. E esse interesse se
justi-5GRAMSCl,
Anton~o.
L'alte~nat~va
pedagog~~a.
F~~enze,
fica pelo fato do sistema escolar ocupar um lugar de
des-taque dentre os referidos organismos, sendo, por G~am~ci,
considerado como um instrumento técnico de difusão da ide
ologia. Desta forma, G~am~ci, como Bou~dieu e Pa~~e~on,
entrevia a função da educação, nos países capitalistas, como a de um mecanismo portentoso de justificação e desen volvimento da hegemonia burguesa, ressaltando o papel ne-gativo dos intelectuais, e entre eles os professores,
en-quanto agentes do grupo hegemônico, na medida em que
di-fundem a concepção de mundo da burguesia e a transforma
em senso comum. Afirma G~am~ci: "Os intelectuais são os
"comissários" do grupo dominante para o exercício das fun ções subalternas da hegemonia social e do governo
políti-co, isto é: 1) do consenso "espontâneo" dado pelas
gran-des massas da população
à
orientação impressa pelo grupofundamental dominante
à
vida social, consenso que nasce"historicamente" do prestígio (e, portanto, da confiança) que o grupo dominante obtém, por causa de sua posição e
de sua função no mundo da produção; 2) do aparato de
co-erção estatal que assegura "legalmente" a disciplina dos grupos que não "consentem", nem a ti va nem pass i vamen te, . mas que é constituído para toda a sociedade, na previsão dos momentos de crise no comando e na direção, nos quais
fracassa o consenso espontâneo". 6 Apesar disso, G~am~ci
não considera tal situação como irreversível, a ponto de partir dessa análise para elaborar uma estratégia
políti-ca, na qual deixa claramente expressa a necessidade e a
possibilidade dos organismos ideológicos da sociedade ci-vil serem utilizados para o fortalecimento de uma contra-hegemonia.
Começa-se por lembrar que G~am~ci salientava,
sobremaneira, que as sociedades ocidentais industrialmen-te desenvolvidas não poderiam passar ao regime socialista
nas mesmas circunstâncias e com a mesma facilidade das
sociedades orientais, uma vez que o desenvolvimento do
6GRAMSCI, Antonio. O~ inteleetuai~ e a o~ganização da
capitalismo longe de tornar as contradições mais aguçadas e claras, as mascara através da dominação ideológica
rea-lizada pela sociedade civil. Esta observação fez com que G~am~c~ concluísse que, no período pré-revolucionário,
nao somente os centros econômicos e pOlíticos deveriam
ser atacados, mas, também, os organismos ideológicos. E
isto porque G~am~c~ concebia o Estado não so como uma
for-ça repressiva e sim como uma forfor-ça também hegemônica,
de-vendo o processo revolucionário visar a derrubada da hege-monia do bloco burguês, antes mesmo da tomada do poder. As sim é que uma aliança entre operários, camponeses e inte
-lectuais passa a ser estratégica, justificando-se a
pre-sença dos intelectuais para organizar as bases e preparar as condições fundamentais para a tomada do poder num pri-meiro momento e, num segundo, para assegurar ao bloco his-torico revolucionário a elaboração de uma nova concepçao de mundo, difusão do consenso e organização da nova
socie-dade. A exigência da ligação entre os intelectuais e os
simples não deve ser tomada como uma limitação
ã
atividadecientífica, objeta G~am~c~, e sim como uma providência no
sentido de possibilitar um avanço intelectual e moral das
"-massas e, em consequencia disto, dotá-las de condições pa-ra assumir a hegemonia. E se os operários deverão ter o papel dirigente, sobre os demais elementos aliados, no cur so do processo revolucionário e na construção da nova so-ciedade, é imprescindível que eles se preparem, também, pa ra exercer atividades intelectuais, donde o .caráter de ne-cessidade de uma educação para todos, ainda durante a fase
de vigência do regime a ultrapassar. Obviamente G~am~~
comandaram as revoluções socialistas da história e são in telectuais os que desenvolvem, aprimoram e difundem o ma-terialismo histórico e dialético.
,
No momento em que G~am~ci concebe como
POSS1-vel a aliança, chama atenção para o fato de que quando a
superestrutura do bloco hegemônico se sente ameaçada, o
aparelho coercitivo se fortalece para sufocar as tentati-vas de ameaça. No entanto é necessário que, em um dado mo
mento, haja afrouxamento do aparelho repressivo para que
as pessoas tenham a sensação de liberdade e valorizando-~
valorizem, por extensão, o regime vigente. Tal política
visando reforçar o regime, abre uma brecha que pode ser utilizada para o desencadeamento da contra-hegemonia e pa
ra a conquista dos intelectuais, o que se dará, muito'
mais facilmente, nos momentos de crise de superestrutura.
Do exposto se depreende que a educação
conti-nua sua função de transmissão de ideologia só que, agora, de ideologia em favor da libertação das classes subalter-nas.
Atth~~e~, através da sua teoria dos aparelhos ideológicos de Estado (AlE), tem, também, trazido grandes
contribuições para uma avaliação do caráter político da
educação. Sua formulação neste sentido deve muito a G~am!
ci, a quem atribui a singularidade da idéia de considerar
o Estado mais do que um aparelho simplesmente repressivo, no momento em que percebe o domínio da sociedade civil.
Como os organismos da sociedade civil, os AlE (escolar, religioso, familiar, jurídico, político,
sindi-cal, de informação e cultural) ,permitem
à
classedominan-te exercer sua hegemonia. Eles são, portanto,
instrumen-tos que operam no sentido de ideologizar a consciência
das massas, neutralizar os conflitos de classe e, em
úl-tima análise, garantir a reprodução das relações de
pro-dução.
Para Atth~~ e.Je. a es cola "é o AlE mais
importan-te das sociedades capitalistas conimportan-temporâneas, ocupando
lado pela reprodução da força de trabalho que ela realiza,
suprindo as necessidades do mercado em termos de
mão-de-obra exigida pelos diferentes setores· da produção e, por outro, porque de forma sistemática inculca uma concepção de mundo, na qual se encontra implícita a legitimação e
dissimulação das desigualdades. Diz Al.thlL6.6 eJr.: "a escola
toma a seu encargo as crianças de todas as classes
soci-ais desde o Jardim de Infância e desde o ·Jardim de Infân-cia lhes inculca - com novos e velhos métodos, durante muitos anos, precisamente aqueles em que a criança impren sada entre o aparelho de Estado/família e o aparelho de Estado/escola é mais vulnerável - "habilidades" recober-tas pela ideologia dominante (o idioma, o cálculo, a
his-tória natural, as ciências, a literatura) ou, mais
dire-tamente, a ideologia dominante no estado puro (moral, ins trução cívica, filosofia)".7
O autor em apreço atr~bui também a outros
apa-relhos ideológicos de Estado a função que o AlE escolar
desempenha, porém admite que a escola é a instituição que age com mais probabilidade de prover, cada grupo, dos com
portamentos necessários
ã
manutenção da ordem.Apesar de sua aproximação com G~am.6ci,
Al.thlL6-.6e~ não deixa claro que a escola possa assumir uma opção
ideológica contrária
ã
da classe fundamental. Entretantoem nenhum momento explicita a impossibilidade disto vir a acontecer, ainda que chegue a expressar seu pensamento de
\
que só o Estado é capaz de uma ação ideológica eficaz.
Particularmente interpreta-se que Al.thlL6.6e~, '
ao reconhecer a existência de mestres que, "em condições espantosas, intentam se voltar contra a ideologia,· contra o sistema e contra as práticas de que sao prisioneiros",8
deixa margem para que se pense que tais professores que
são, segundo ele, raros possam ser reproduzidos, passando
7ALTHUSSER, Loui.6. Ideologia
e
apa~a.to.6 ideológico.6de
E.6.tado. Buel1O.6 A1..~e.6, EêUc1..ol1e.6 Nueva 01...61..011, i
8 1974. p.43
a ser esta reprodução u~ desafio e uma questão de estra tégia.
Convém, agora, assinalar que o próprio Marx se preocupou com educação, chegando mesmo a lançar uma pro-posta pedagógica, o que pode ser apreendido pela afirma-çao a seguir: "a ligação entre trabalho produtivo pago,
instrução intelectual, exercício manual e formação
poli-técnica erguerá a classe trabalhadora muito acima do ní-vel da aristocracia e da burguesia. O setor esclarecido da classe trabalhadora entende, contudo, muito bem que o
futuro da sua classe e, assim, da humanidade depende
in-teiramente da instrução da geração trabalhadora em
ascen-- 9
sao".
Para finalizar a discussão em curso,
acrescen-ta-se que, em termos práticos, a revolução chinesa, incl~
indo a revolução cultural,funcionou como um exemplo
con-creto de que os organismo~ da sociedade civil (G~am4ci) ou
aparelhos ideológicos de Estado (At~hU44e~) podem, num da
do momento, desempenhar uma função que não a de ajustame~
to dos valores das classes subalternas ao sistema de pro-dução.
A argumentação anterior é procedente não por-'
que se defenda a transmissão, por meio da escola, de uma
contra-ideologia, mas, porque, ela prenuncia a possibili-dade da escola se libertar' do compromisso com a dominação
da classe fundamental. A partir diss,o o trabalho em
edu-cação passa a ter um sentido, principalmente, para aque-les que, se tornando conscientes do papel que exercem no sistema, decidem pela ruptura do compromisso.
Nesta linha de análise salienta-se a validade
dos estudos referentes ao aspecto político da educação, no sentido da conscientização que possibilitam, mas
sali-enta-se, também, que toda destruição deve implicar numa
construção e que, portanto, a tomada de consciência do
seu papel como agente da dominação deve levar o professor
qMARX,
Ka~t.
apud. HEINZ, JoachimHeido~n.
Etemen~04
de uma ~eo~iade educacio. In: A C~i4tdo pen4ame~
a uma busca constante do que se pode fazer para mudar a situação. E considerando o âmbito de ação do professor,
4 enquanto profissional, acabar-se-á esbarrando numa
propos-ta pedagógica e concluindo que as agências encarregadas ' da formação de pessoal para o magistério deverão assumir a liderança de um programa que possibilite a substituição de uma ação educacional conservadora por uma ação trans-formadora, na medida em que se negue a ideologização da consciência e se parta para uma prática que vise o
desen-"
volvimento do pensamento e, consequentemente, a autonomia intelectual e moral.
Não se quer dizer com isto que se pensa que o
trabalho pedagógico possa ser 'destituído de uma ideologia, pois seria um absurdo. A ideologia é um atributo do homem
e é o que norteia e fundamenta a sua ~aneira de ser e
es-tar no mundo. O que, então, se quer precisamente deixar claro é que cada indivíduo deve ter a possibilidade de'
desenvolver o espírito crítico e, portanto, de chegar a
raciocinar sobre o sistema de valor que lhe foi imposto
desde a mais tenra idade. E é esta possibilidade de raci~
cínio e de atuação crítica, que deve ser preocupação da
escola. g claro que a proposta é também ideológica, mas
é fundamental discernir entre a ideologia subsidiando um trabalho pedagógico e a própria transmissão de uma ideolo gia, o que se constitui num ato de doutrinação.
Sabe-se que muitos não crêem que a escolapos-sa exercer uma ação transformadora, mas a descrença pode ser resultante de uma falta de visão mais ampla da praxis educacional e, por conseguinte, do desconhecimento de teo rias que possam embasar uma proposta pedagógica em prol da libertação do homem. Aliás, da falta de uma visão glo-bal da praxis educacional, não padecem apenas os
"pedago-gos", no sentido depreciativo do termo. Se, por um
encóntra-se um grande número de pedagogos que carece
lado, de
uma visão política dos problemas educacionais e que
rea-"
liza uma prática sem o conhecimento das consequências que
ela pode trazer, por outro lado, encontra-se, também, um
politizados) que tem se mostrado incapaz de uma prática coerente com a postura teórica que adota.
A incoerência referida se expressa tanto em termos de comportamento de vida, como em termos estrita -mente profissionais e isto porque, no fundo, tais educado res são pequeno-burgueses cristalizados, que assumem uma posição política renovadora apenas para terem o reconheci mento de que sao intelectuais avançados e para estarem na moda. Assim, procuram consumir, no plano intelectual, o que consomem ou desejariam consumir no plano material:pro dutos que atribuem,ao indivíduo, algum tipo de superiori-dade. E, em geral, as amarras pequeno-burguesas são
res-ponsáveis pela dificuldade dos intelectuais em
transfor-mar um comprometimento ideológico, a nível teórico, em vi vência concreta e, até mesmo, em descobrir as incoerênci-as entre uma idealização e uma ação exercida para reali-zá-la. Desta forma, não é raro encontrar-se, dentre os e-ducadores que se propõem a uma atuação histórica signifi-cativa, os que desenvolvem seus cursos com o objetivo pre cípuo de formar uma consciência crítica e fornecem aos alunos a crítica "pronta", "acabada", a ser, inclusive,
"
cobrada por meio de questões de estudo dirigido e de
tes-te de múltipla escolha. ~ claro que a prática educacional
dos que assim agem, ainda que animada pelo objetivo de '
formação de uma consciência crítica, é tão alienante
quanto a dos pedagogos acríticos e de todos os
professo-res a serviço da ideologia da classe detentora do poder,
pois, no momento em que enfatizam o estruturado, obstacu-lizam o desenvolvimento de um instrumental de análise e
de uma lógica para julgamento e ação, requisitos b~sicos
para que o homem exerça, conscientemente, seu papel na
história.
Sintetizando o que foi até agora exposto, pod~
se afirmar que a consideração de uma perspectiva política
isolada de uma perspectiva técnica ~ artificial e sem ca
bimento, o mesmo acontecendo com a consideração de uma'
perspectiva técnica sem a ligação necessária com uma per~
ê
fundamental, já que o processo educacionalé
globali-zante, requerendo, do professor, ao mesmo tempo,
engaja-mento e competência em sua arte. Neste· trabalho, o
inte-resse centraliza-se, fundamentalmente, no âmbito da com-petência, e justifica-se porque se acredita que uma
preo-cupaçao com problemas tipicamente pedagógicos tenha a
sua razão de ser e que os estudos, que desta preocupação possam resultar, têm uma importância muito grande, na
me-dida em que contribuirem para a viabilização de uma
pro-posta que possibilite
ã
escola exercer a açãotransforma-dora que lhe compete.
A preocupação desta dissertação
é,
então,fun-damentalmente, pedagógica e se traduz pelo tema de que
trata: "Qualidade do ensino: um estudo preliminar de dois fatores determinantes".
A escolha do tema teve como ponto de partida o
compromisso de nosso país em oferecer a todos iguais opor
.
-tunidades de educação, já que a realização deste
compro-misso está na dependência de um ensino que atenda
quali-tativamente a todos que para a escola se encaminham.
Considerando que a nossa sociedade
ê
umasoci-edade de classes e considerando que os interesses, a cul-tura e, enfim, o modo de vida diferem de uma classe para outra, o atendimento qualitativo,a todos que para a esco-la se encaminham, exige do. professor maior dedicação e
uma preparação mais ampla. E isto, \por sua vez, traz
ã
-
\-tona duas questoes fundamentais: a remuneraçao do profes-sor e sua formação profissional.
Um estudo preliminar de tais questões cons
-titui o objetivo deste trabalho.
Partindo do pressuposto de que o professor
é
mal remunerado, mas nao luta por uma remuneração
condi-zente com sua preparação e valor do seu trabalho, o
es-tudo da primeira questão se desenvolve objetivando
res-ponder aos seguintes questionamentos:
1- Existe justificativa para a baixa
2- Que motivos podem justificar a passividade do professor quanto ao problema de baixa re mune ração?
Já
a segunda questão - a formação doprofessor-teve seu âmbito limitado à formação do professor nos cur-sos de licenciatura, com ênfase especial na formação peda gógica. Seu estudo visa verificar
1) Como se realiza a formação do professor nos cursos de licenciatura;
2) Se a formação pedagógica, dos cursos de li-cenciatura, prepara o professor para desen-volver um ensino que atenda qualitativamen-te a todos que para a escola se encaminham.
A formação do licenciado foi escolhida para e~
tudo, em primeiro lugar porque se desconhecem trabalhos na área com as características do que foi aqui desenvolvido;
em segundo lugar, porque
é
nesta area que se tem umavi-vência concreta.
Na tentativa de resposta às questões levanta
-"
das, realizou-se uma dedução de consequências de teorias que podem ser aplicadas à realidade estudada, sustentando-se, este trabalho, fundamentalmente em pesquisa teórica.
\
..
A remuneração do professor é um ponto crítico
em quase todo mundo, como mostra P~aget num trabalho
rea-lizado pela UNESCO, para a detectação das tendências da
educação no mundo atual. Referindo-se ao crescente
aumen-to dos efetivos escolares, P~aget acrescenta: "como essa
explosão generalizada de quad~os em todos os escalões não
se fez acompanhar da revalorização social da profissão do magistério - que teria sido necessária nos níveis secun-dários e sobretudo primário - verificou-se uma carência
"
de professores e a consequente necessidade de recorrer às
suplências, daí resultando um problema de nível nem
sem-pre resolvido". 10
As implicações para a qualidade do ensino, ad-vindas da baixa remuneração do professor, são plenamente conhecidas por todos, mas esta questão não tem merecido,
das autoridades, a atenção devida. Aqui um fato curioso
se estabelece e diz respeito
à
contradição entre aimpor-tância da função do professor no sistema e a falta de re-conhecimento de seu valor em termos salariais.
Althu~~e~ sustenta que a escola é o aparelho
ideol6gico de Estado mais importante das so~iedades
capi-talistas contemporâneas, por dispor de mais tempo e de
meios de controle mais eficazes para o exercício da sua
função de manutenção da ordem. E, diz Althu~~e~: "natural
mente, os mecanismos que produzem este resultado vital
para o regime capitalista estão recobe~tos e dissimulados
por. uma ideologia da escola universalmente reinante, pois
10pIAGET, Jean.
Pa~a
ondeva~
a educaçio?R~o
deJane~
esta é uma das formas essenciais da ideologia burguesa do-minante: uma ideologia que representa a escola como um mei
o neutro (posto que
ê
laico), na qual mestres respeitososda "consciência" e da "liberdade" das crianças que lhes são confiadas por seus "pais" (que também são livres, isto
é, proprietários de seus filhos) as encaminham
à
liberdade,à
moralidade eà
responsabilidade dos adultos mediante seupróprio exemplo, ao conhecimento,
à
literatura e suasvir-tudes liberalizadoras". 11
O fato do professor exercer uma função de gran-de importância para a manutenção da orgran-dem justificaria um reconhecimento do valor do seu trabalho em termos de remu-neração. Sem embargo, uma análise mais profunda da função do professor permite compreender que a contradição
anteri-ormente referida é mais aparente do que real e é Gnam~c~
quem fundamenta esta conclusão, no momento em que traz
à
tona a questão da hierarquia qualitativa dos inte1ectua~
Diz Gnam~c..i.: " ••• a atividade intelectual deve ser diferen
ciada em graus, inclusive do ponto de vista intrínseco;es-tes graus, nos momentos de extrema oposição, dão lugar a uma verdadeira e· real diferença quali ta ti va: no mais a1t.o grau, devem ser colocados os criadores das várias ciências, da filosofia, da arte, etc; no mais baixo, os "administra-dores" e divu1gadores mais modestos da riqueza intelectual já existente, tradicional, acumulada".1"2
Ao distinguir os intelectuais criadores da con-cepçao de mundo a ser divulgada (os grandes intelectuais) dos intelectuais divu1gadores desta concepção de mundo (os
pequenos intelectuais), Gnam~c..i. possibilita a reflexão de
que, na realidade, aqueles
ê
que são as peças-chave do sistema e, assim sendo, aqueles é que ao.sistema importa ofe-recer boas condições de trabalho e remuneração atrativa.
Os professores, principalmente os da escola elementar, po~
ca importância têm, não pelo papel que exercem, mas pela
"ALTHUSSER, Lou~. op.c..i.t.p.45
12GRAMSCI, Anton..i.o. o~ ..i.ntetectua..i.~ e a onga.n..i.zaç.ã.o da.
dependência, no exercício deste papel, face aos grandes in telectuais. Além disso a afirmação de que o "professor é o proletário da classe instruída,,13 pode ser explorada para justificar o comportamento das autoridades em relação ao fato, em virtude do atendimento aos interesses do proleta-riado ser realizado nao a nível de concessão e sim de
con-quista, através das lutas de classes,manifestadas nas
or-ganizações políticas, que transformam uma classe "em si" em classe "para si". E se o professo:.rado não se organiza e não luta, não pode dar ao seu lamento a feição de reivindi cações significativas e aem ter os seus direitos reconheci dos. Entretanto cabe perguntar: por que o professorado não se organiza politicamente e não luta pelos seus direitos?
"
Na tentativa de resposta
à
questão apresentar-se-á, ase-guir, uma relação dos motivos que, dentre outros, podem justificar a passividade, do profissional do magistério,
"
quanto
à
questão em foco.1.1. Motivos da falta de organização pOlítica no seio do professorado
1.1.1. Posi~ão
----
---
de classeo
professorado nao constitui uma classeà
parte,situando-se em um estrato social sem tradição de luta e t
que é aliado da classe dominante, formando com ela um blo-co. Seria oportuno lembrar que o conceito de classe social é muito controvertido e não é uma empresa fácil posicionar o professor numa classe.
Para Ma.JLX as classes sao formadas a partir das
relações sociais de produção, distinguindo-se, de um lado, os proprietários dos meios de produção e, de outro, os
divíduos que vendem aqueles a sua força de trabalho. As-sim, uma classe existe sempre em relação a outra, o que ' dá lugar ao impasse, ainda não resolvido pela Sociologia, acerca da existência ou nao da classe média. Os marxistas afirmam que a classe média, a rigor, não tem objetivos di ferentes dos do proletariado, considerando que ela não detém os meios de produção. Desta forma, os indivíduos que se tentam situar na classe média nada mais são que proletários en,Çanados ou portadores de·uma "falsa consci-ência".
Já Max Webe~ desenvolve um conceito de classe
mais amplo, tomando como base: "1) um número de pessoas
que têm em comum um comportamento causal específico de ' suas probabilidades de vida, na medida em que 2) este com ponente é representado exclusivamente pelo interesse eco-nômico na posse de bens e das oportunidades de obter ren-das e 3) nas condições de mercado que permitem posicionar
" d" 'd 1 14 A "b~ " d
um ln lVl uo em uma c asse". s categorlas aSlcas e
todas as situações de classe são, para Webe~, a
"proprie-dade", mas ele admite uma classe intermediária - a classe média - constituída pela pequena-burguesia (artesãos da
cidade e pequenos comerciantes) e pela .<.ntett.<.gentz.-i..a e
es-pecialistas profissionais. Webe~ acrescenta, porém, que
apesar do ideal do trabalhador ter sido sempre o de se tornar um pequeno-burguês, as possibilidades disto vir a acontecer estão se tornando cada vez mais restritas.
Não compartilham do ponto de vista de Webe~ os
adeptos da corrente que, como assinala N'<'co~ Poutantz~.
chega mesmo a considerar a classe média como o "produto de uma dissolução progressiva, nas sociedades capitalis
-tas atuais, da burguesia e do proletariado em um cadinho
comum: "aburguesamento" de uma parte cada vez maior da classe operária, "desclassificação" de uma parte cada vez maior da burguesia. Tal "classe" constituiria o cadinho'
14
WEBER, Max. apud. REX, John. P~obtem~ 6undamentate~
de ta teo~ia ~oc.<.otõg.<.ca. Bueno~ Ai~e~, Amo~~otu
de uma mistura de classes e de dissolução de seus antago-nismos, principalmente enquanto lugar de circulação dos
indivíduos em um processo de "mobilidade" constante entre a burguesia e o proletariado". 15 Poula.ntza..6, entretanto, ao apresentar o ponto de vista da corrente em apreço, poe em cheque a sua base teórica, argumentando que, desta for ma, o próprio termo classe perde a sua utilidade, já que
ele é definido a partir de uma relação conflitual e esta
relação confli tual é amenizada por um grupo que, inapropri adamente, se denomina classe média. Acrescenta ainda que,
a par da função de diluição da luta de class~que se atri
bui a uma suposta classe média, os conflitos permanecerão, se o que ocorre é, na verdade, uma troca de lugar pelos componentes da burguesia e da classe operária.
A controvérsia quanto
à
existência da classemédia constitui um obstáculo
à
inserção do professor numaclasse, já que ele não detém meios de produção, mas nao
vende sua força de trabalho da mesma maneira como o faz
o proletariado. Suas atitudes mentais, motivações psico-lógicas e papéis o distanciam muito da classe
trabalhado-ra, entretanto o importante a considerar é que o grupo,
do qual faz parte, se se constitui numa classe, como
de-fendem alguns teóricos, se constitui numa "classe em si" e não "numa classe para si". E esta objeção é convincente,
principalmente com relação aos intelectuais que são, no
dizer de G~a.m.6c~, funcionários da superestrutura,
encar-regados, no regime capitalista, de promover o consenso em torno da hegemonia da burguesia.
Este elo orgânico entre os intelectuais e a
classe dominante é, sem dúvida, um dos motivos
primordi-ais para a justificação da atitude de passividade do pro-fessor diante da exploração de que é vítima.
15pOULANTZAS,
N~co.6.
A.6 cla..6.6e.6.6oc~a.~.6
noca.p~ta.l~.6mo
Além de se situar numa camada intermediária e manter com a classe dominante um vínculo orgânico, o
pro-fessorado, considerando a diversificação dos níveis em
que ele atua, emerge também da classe fundamental e alia-das, não tendo, portanto, vivenciado uma situação
concre-ta de luconcre-ta contra a dominação. Afirmar isto equivale a
dizer que a classe trabalhadora não tem tido a oportunida de de elevar seu nível de escolaridade até o grau que con
cede um diploma de professor, mesmo o de professor das sé
ries iniciais do 19 grau e certamente esta afirmação será
contraditada através da crença de que se tem um sistema ' de ensino aberto. Por outro lado, se é verdade que se tem um sistema de ensino aberto, não é verdade que a classe
trabalhadora esteja usufruindo desta abertura, a não ser
"com a condição de supor possível a generalização, ao co,.!! junto da classe, de propriedades que não podem sociologi-camente pertencer a certos membros da classe senão na me-dida em que elas permanecam reservadas a alguns e,por co,.!! guinte, recusadas ao conjunto da classe enquanto tal".16 Acredita-se, entretanto, que para uma objeção do tipo da que se presume como possível, a resposta mais propícia
provém de Luiz Antonio cu~a17 que afirma ter constatado
a existência de um hiato entre a ideologia oficial e a r~
velada pelos dados reais, demonstrando que a classe trab~
lhadora não tem possibilidades de galgar níveis mais ele-vados de escolarização, principalmente pelas razoes a se-guir relacionadas:
a) si tuação econômica da família que nao permite abrir mao da força de trabalho dos filhos, porque ela com titui uma oportunidade a mais de renda, sendo necessária
;;BOURVIEU,
Pie~~e
! PASSERON, JeanClaude.Op.~i~.p.64
O au~o~ ~i~ado ~~a~a exa~~ivamen~e ~ob~e a que~~ão
em ~eu liv~o "Educação e Ve~envolvimen~o So~ial no
para atenuar os transtornos causados pela crescente
dete-rioração do valor real do salário mínimo. Além disto a
gratuidade do ensino não prevê outros gastos, que não os 4decorrentes da oferta de vagas, ficando às expensas da fa mília a maior parte das despesas referentes a material, • transporte etc. E os custos são tanto maiores quanto mais elevado é o nível escolar a cursar;
b) prática excludente dos professores que
im-poeJTl uma cultura completamente alheia aos indivíduos da classe trabalhadora, além de levá-los ao convencimento, por um processo de violência simbólica, de que a sua
cul-tura é ilegítima e destituída de valor. Por conseguinte,
as prõ~rias mensagens lançadas pelo professor não são de-codificadas pelos alunos da classe trabalhadora, da forma como geralmente se espera, em virtude da não universali-dade dos c6digos de fala. "O resultado em termos puramen-te escolares, é a progressão "natural", esperada, das cri anças da classe dominante e das camadas médias através das séries da escola enquanto que os filhos dos trabalha-dores repetem a mesma série várias vezes, abandonam os es
tudos e passam a ser confinados em turmas especiais de
(ir) recuperação"; 18
c) acesso, pela classe trabalhadora, a escolas "
de qualidade inferior àquelas frequentadas pelas camadas mais altas, o que resulta em prejuízo para seus membros que, nos momentos de concorrência para obtenção de vagas,
nao conseguem vencer ã competição desleal e· acabam sendo
alijados do sistema de ensino;
d) desempenho insatisfatório, ocasionado pelas precárias condições de vida, dentre as quais se destaca a desnutrição, cujas conseqüências são desastrosas para o desenvolvimento mental do indivíduo.
18CUNHA, Lu-i.z Antôn-i.o. Educ.aç.ão e. Ve..6 e.nvolv-i.me.nto
Soc.-i.-al no B~a.6-i.l. R-i.o de. Jane.~~o, [~v~a~~a F~anc.~.6c.o
Apesar de a classe trabalhadora, enquanto clas-se, ter possibilidades limitadas de atingir níveis mais '
elevados de escolarização, alguns dos seus ~embros chegam
a se titular e ascender socialmente, via escolaridade, o
que
é
mesmo necessário para a sobrevivência do sistema emvirtude de tais casos funcionarem como testemunho da
vi-gência de uma sociedade aberta. Desta forma, se é levado a pressupor que dentre a categoria dos professores se situam pessoas provenientes da classe trabalhadora, na maioria
dos casos professores habilitados a nível de 29 grau
(ex-professores primários).
Com base neste pressuposto, seria, então, cabí-velo questionamento acerca da influência destes indivídu-os, aos quais se poderia atribuir uma consciência de clas-se, com relação à categoria como um todo. Na tentativa de respos ta, 'chama-se atenção para os se guin tes fatos:
a) O professor, em geral, não é um produtor de conhecimento e sim um repetidor, o que implica numa
vul-nerabilidade - tanto maior quanto mais baixo é seu nível
de formação - diante dos grandes intelectuais, dos quais
dependem para exercer a sua prática, não só no que respei-ta aos conteúdos a serem transmitidos e aos meios utiliza-dos para a transmissão, como também às formas que embasam a decisão acerca da possibilidade ou não de promoção dos alunos. Desta maneira, o professor, indepeniente da clas-se ou camada de origemJé facilmente absorvido pelos inte-lectuais criadores que, sob a égide da ciência e da moral, terminam por garantir a coesão necessária ao desempenho da função que exercem, como promotores do consenso, em fa-vor da classe fundamental.
b) Os teóricos da ideologia têm demonstrado que
a escola, ao tempo em que se encarrega da reprodução da
força de trabàlho, cuida também da difusão e legitimação ' da concepção de mundo d'a classe dominante, o que leva a ad
mitir que se elementos da classe trabalhadora chegam a se
titular
é
porque assimilaram a cultura da classe que detémre-..
sultado é o estabelecimento de um vínculo orgânico entre estes elementos e a classe dominante, uma vez que valores, ditados apenas por uma classe, passam a ser encarados
co-"mo pertencentes
ã
sociedade como um todo e justificados'pela racionalidade que se lhes atribui.
c) Além do que foi considerado, é preciso lem-brar que a origem - classe trabalhadora - não implica ne-cessariamente em dotação de uma consciência de classe e isto porque não existem, no seio da classe trabalhadora brasileira de hoje, organizações políticas que a definam como uma classe "para si". Ao contrario, sabe-se que o Es
tado ao assumir a proteção aos trabalhadores por meio da
legislação trabalhista, o fez·no sentido de enfraquecer os movimentos que vinham amadurecendo desde o princípio
do século. ~ certo que estes movimentos começaram a se ex
pandir principalmente pela influência de operarios estran geiros imigrados e, embora contassem com o apoio de inte-lectuais, não decorriam de uma coesão ideológica, sendo, por isso, movimentos dispersos e inconsistentes. No entan
to, entre períodos de repressão e de abertura,
caminhava-se para o fortalecimento das organizações populares, o '
que pode ser melhor explicitado pela afirmação de We~neek
Vianna, apresentada a seguir:. "a reconstituição da movi
-mentação operaria nos anos pré-30, como nos estudos de'
Azis Simão, Albertino Rodrigues e Leôncio Martins
Rodri-gues, não deixam dúvidas sobre sua natureza reivindicante, capacidade de organização, aglutinação de massas operari-as. Evidenciou-se também que o sentido da ação não se es-gotava numa pauta economicista, incluindo a luta por
di-. . . 1 " " " 19
reltos SOClalS e po ltlCOS •
Pelo caráter de força, de que se investiam os movimentos proletarios, na década de 20, se percebeu a
a-meaça à conseçução dos objetivos do capitalismo em
expan-são~ o que provocou a reação do Estado, conforme se pode
19VIANNA, Luiz
We~neek.
Libe~aii~mo
e~indieato~
no.25.
constatar pelo seguinte pronunciamento de Getúlio Vargas:
"O Estado não compreende, nem permite antagonismos de
classes nem explosões violentas de luta; para esse fim,
criou órgãos reguladores, que não só coordenam as
rela-ções como dirimem divergências e conflitos entre as
dife-t 1 . . " 20
ren es c asses SOC1a1S •
O pronunciamento em destaque vem reforçar o co
mentario que faz Everardo Dias acerca da aplicação, em
1931, da legislação trabalhista que, intencionando a paz
social, veio no sentido de amortecer o espírito de luta
entre os traba1hadores. 27 Também Otavio lanni
é
depare-cer que "no pare-cerne da doutrina de "paz social" havia uma política de controle e dominação da atividade e organiza-ção pOlítica do pro1etariado".22
Se a partir de 1931 a luta de classe trabalha-dora foi arrefecida, 23 passando, inclusive, as lideranças
operarias a serem absorvidas pe~a burocracia do Estado,
não se pode contar com professores que, dela sendo prove-nientes, exerçam algum tipo de influência sobre os demais, porque:
20 VARGAS, Ge.:túl'<'o. A.6 d.<.Jte.:tJt.<.ze..6 da. nova. pol1.:t.<.ca. do BJta..6'<'l. a.pud IANNI, O:tãv.<.o. E.6:ta.do e. pla.ne.ja.me.n:to e.conôm.<.co no SJta..6'<'l: (7930-7970). R'<'o de. Ja.ne..<.Jto,
Civiliza.~a.o BJta..6ile.'<'Jta., 7977. p.35
2 1 Em H'<'.6 .tõ Jt.<.a. da..6 L u:ta..6 S o c.<.a..<..6 no BJta..6'<'l, p. 66, a.
6'<'Jt-ma. Eve.Jta.Jtdo V.<.a..6: '"Em 7937, pJte.m'<'do o gove.Jtno poJt
uma. a.g.<.:ta.ção .6éJt.<.a. e. ca.da. ve.z de. ma..<.oJt a.mpl.<.:tude. e.
de.n.6'<'da.de., de. a.coJtdo com a. tla..6.6e. pO.6.6u'<'doJta. Jte.-.6olveu da.Jt a.pl.<.ca.ção ~.6 le..<..6 que. 6.<.guJta.m na. "cha.-ma.da. le.g.<..6la.ção :tJta.ba.lh.<..6:ta." e. conde.coJta.ndo-a..6
co-mo Jte..6olutiva..6 ou de. "pa.z .6oc.<.a.l". Ine.ga.ve.lme.n:te., e..6.6 a..6 le..<..6 v.<.e.Jta.m b e.ne. 6.<.c.<.a.Jt uma. pa.Jt:te. da. ,cla..6.6 e.
:tJta.ba.lha.doJta. e. Jte.pJte..6en:ta.m uma. conqu.<..6:ta. de. gJta.n-de. e.6e..<.:to. Ma..6, num e..6:tudo ma..<..6 pJt06undo,
ve.Jt'<'6'<'-ca.-.6e. que. a. ma..<.oJt be.ne.ó.<.c.<.a.da. 60.<. a. pJtópJt.<.a.
bUJt-gue..6.<.a. com e..6.6a..6 me.lhoJt.<.a..6 .<.me.d.<.a.:ta..6, a.moJt:te.ce.ndo o e..6p1.Jt'<':to de. lu:ta. e.n:t4e. a. ma..6.6a. :tJta.ba.lha.doJta.; a. ma..<.oJt.<.a. de..6:ta. cla..6.6e. continua. a. e..6pe.Jta.Jt qua.lque.Jt me.lhoJt.<.a." •
22IANNI, O:táv.<.o. E.6:ta.do e. pla.neja.men:to econôm.<.co no_ '
BJta..6'<'l: (793~70). R'<'o âe Ja.neiJto, C~v~R..~za.~a.o
B Jta..6 .{.le..<..Jta., 19 77. p. 36
23 Conv êm lembJta.Jt que. a. leg'<'.6la.~ão :tJta.ba.lh.<..6:ta. a.pJte..6e.n-:ta., :ta.mbém, .6e.u a..6pec:to Jte.6:tJt.<.:t.<.vo da..6 expJte.6.6õe..6
- :~esta época, o professor ,seguramente ,não saía da classe trabalhadora, pois o Brasil, embora em pleno re
gime republicano, conservava um modo de produção e
rela-ções de trabalho marcados pelas reminiscências do co10ni~
1ismo, sendo a educação privilégio das elites e, restrita
mente, das camadas medias em ascensão. Tanto que em •••
18/11/1930, em seu discurso de posse, o primeiro titular
do Ministério da Educação e Cultura e Saúde, afirmou: "s~
near e educar o Brasil constitui o primeiro dever de uma
revolução que se fez para libertar os brasileiros". 24 E
este dever se constituía numa necessidade, conforme evi -dencia Leôncio Basbaum ao afirmar: "em 1930 o nosso país figura nas estatísticas, em matéria de alfabetização en-tre os mais atrasados do mundo, ao lado da !ndia, do Egi-25 to, do Paraguai e do Equador, com 75% de analfabetos".
- Mesmo que, naquela época, houvessem professo-res provenientes da classe trabalhadora, hoje eles já es-tariam fora do sistema, por força de idade.
1.1.3. º_~~g!~!~!!Q_fQ~Q_Er~ft~~ª~_E!~ªQ~i~~U
!~~~~!~_~~~!~tª~_E~!_~~1~~!~~
Importância muito grande, dentro do quadro das razoes que podem justificar a falta de uma organização po
1ítica no seio do professorado, assume o f~to de o
magis-tério ser uma profissão predominantemente exercida por mu 1heres, principalmente o magistério correspondente ao an-tigo primário, onde se situa o ponto crítico do problema.
Logicamente não se trata aqui de um preconceito em
rela-ção
ã
possibilidade de atuação histórica da mulher, masde uma observação baseada fundamentalmente na posição de
24CAMPOS, F~an~~~~o. V~~~u~~o de po~~e, p~o6e~do em
18/11/1930. apud. AZEVEVO, Fe~nando. A t~an~m~
~~o da ~ultu~a. sio Paulo, C~a Melho~amento~,1976
p. 169
25BASBAUM, Leôn~~o. H~~tõ~a ~~n~e~a daRepúbl~~a: de
dependência em que a sociedade a coloca.
g
evidente quetal posição é reflexo de quase quatro séculos de regime
"
escravista e, consequentemente, de um período muito longo
de vigência do modelo familiar patriarcal. Luiz Pereira
afirma que "nas denominadas modernas sociedades
civiliza-das ocidentais, com estrutura de família com traços
pa-triarcais, pelo menos no plano das representações
coleti-vas ideais,
ã
mulher adulta reserva-se, tradicionalmente,um complexo de atividades "domésticas" não remuneradas,
composto pelos afazeres da casa e cuidados dos imaturos
do grupo familiar; e ao homem adulto, um complexo de
ati-vidades profissionais".26 Eva B.tay,em seu livro "Trabalho
domesticado: a mulher na indústria paulista", amplia esta análise de Luiz Pereira, no momento em que aborda o traba lho da mulher, embora acentue que suas oportunidades, no mercado de trabalho, geralmente se restringem a
profis-soes desprestigiadas e de remuneração mais baixa. Não se
deve esquecer, porém, que, na sociedade brasileira, a mu-lher vem sendo chamada a assumir funções muitas vezes
im-portantes no mundo do trabalho e já não são raros os cas~
em que ela chega a arcar com a carga maior das despesas
m
família. Entretanto, o importante a considerar é que da
mulher se exige um comportamento dentro dos moldes
tradi-cionais de dependência, mesmo quando ela exerce
ativida-des profissionais, o que dificulta a sua atuação numa or-ganização política. E no caso do magistério,
reconhecida-mente uma profissão que se adequa
ã
mulher porque lhe peEmite conciliar casa e trabalho, os obstáculos para se
le-var
ã
frente um movimento reivindicatório são aindamaio-res. E aqui cabe assinalar que a dependência da mulher
26pEREIRA, Luiz. E4tudo~ 40bne o Bna~i.t eontemponâneo.
" I " " " d" 27 f
expressa, 1nc US1ve, Jur1 1camente, az com que a sua
situação de classe fique, em geral, determinada pela situ açao de classe do pai ou do marido. Não resta dúvida que isto influi sobremaneira para a falta de uma coesão polí-tica no âmbito do magistério, já que para ele convergem pessoas das mais diversas camadas, pelo fato dos cursos' de formação de professores terem, de longa data, um cará-ter ambíguo, servindo tanto para profissionalizar, como
para possibilitar à mulher a cultura necessária ao casa
-mento e
à
educação dos filhos.o
que ocorre com o professor em termos de remuneraçao, nao ocorre, pelo menos com a mesma intensidade,
em termos de ~tat~ e este
é.
certamente, um dado que nãopode ser negligenciado na justificação de uma "falsa cons
ciência" por parte do professor.
13
oportuno perguntar:existe distanciamento entre uma situação de ~tat~ e uma
situação de classe? Webe~, que tratou da questão, assim
se expressa: "em contraste com a "situação de classe", de terminada de maneira puramente econômica, chamamos "si
tu-açao de ~tat~" a todo componente típico da vida dos
ho-mens que esteja determinado por uma estimação específica 2-8
de prestígio social, positiva ou negativa".
270 a4t. 233, do l~v~o 1, do Cõd~go C~v~l B~a~~le~~o
ê
exp~e~~ o no~ ~ egt..U.nte~ te~mo~: "O ma~do
ê
o c.he~6e da ~oc.~edade c.onju~al. Compete-lhe: 1- a ~ep~e
~entação legal da óam~l~a; 11- a adm~n~~t~ação d~
ben~ c.omun~ e do~ pa~t~c.ula~e~ da mulhe~ ... ;
111-o d~~e~to de 6~xa~ e muda~ o dom~c.Zl~o da 6amZl~a;
IV- p~ove~
a
manutenção da 6amZl~a".2 8 "
-WEBER, Max. ap~d. REX, John. P~oblema~ 6undamentale~