• Nenhum resultado encontrado

Hemodinâmica glomerular renal no roedor Calomys callosus.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Hemodinâmica glomerular renal no roedor Calomys callosus."

Copied!
7
0
0

Texto

(1)

R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 2 (1 ) : 3 1 -3 7 , ja n - m a r , 1 9 8 9

HEMODINÂMICA GLOMERULAR RENAL NO ROEDOR C A L O M Y S C A L L O S U S

/

M irian A. Boim e N esto r S chor /

A f u n ç ã o re n a l d o r o e d o r Calomys callosus, en v o lv id o no ciclo de tr a n s m is s ã o de d iv e r s o s ag e n te s p a to g ê n ic o s p a r a o h o m em f o i a v a lia d a no a n im a l in tacto, a tr a v é s da té c n ic a d e d e p u r a ç ã o e m ic r o p u n ç ã o ren al. O s r e s u lta d o s m o s tr a r a m q u e e ste r o e d o r

a p r e se n ta n ív eis p r e s s ó r ic o s , h e m a tó c rito e p r o te in a s p la s m á tic a s se m e lh a n te s a o s d o s

r a to s su b m e tid o s a o m e sm o p r o c e d im e n to ex pe rim en ta l. O s p e s o s c o r p o r a l e ren al, bem co m o a filtr a ç ã o g lo m e r u la r g lo b a l e p o r nefro a s s e m e lh a m -s e a o s d o ca m u n don go. S u r p re e n d e n te m e n te e stes ro e d o re s a p r e se n ta ra m sig n ific a n te n ú m ero d e g lo m é r u lo s su p e r fic ia is p o r rim , p e r m itin d o a a v a lia ç ã o d a h e m o d in à m ic a g lo m e r u la r. A p e s a r da

p r e s s ã o a r te r ia l s e m e lh a n te à d o s r a to s M u n ic h - W is ta r (M W ) , a p r e s s ã o h id rá u lic a in tr a g lo m e r u la r no Calomys callosus f o i inferior. E s t a re d u çã o f o i c on seq ü en te à m en o r re s is tê n c ia p ó s -g lo m e r u la r q u a n d o c o m p a r a d a à d o s r a to s M W . O flu x o p la s m á tic o

g lo m e r u la r a tin g iu v a lo r b a s ta n te e le v a d o em r e la ç ã o à f i ltr a ç ã o g lo m e r u la r p o r nefro,

f a t o q u e n ão s ó c o m p e n s a r ia a r e d u z id a p r e s s ã o in tra g lo m er u la r, co m o ta m b é m se r ia

s u fic ie n te p a r a e le v a r a f iltr a ç ã o ( p o r g /r im ) a n ív e is su p e rio re s n e ste roedor, p o i s o co efic ien te d e u ltr a filtr a ç ã o g lo m e r u la r (K j) f o i se m e lh a n te a o d o rato M W . O p re se n te tr a b a lh o su g ere q u e a p e s a r d a s d ific u ld a d e s té c n ic a s q u e e ste a n im a l im p õ e d e v id o ao se u re d u z id o ta m a n h o , o e stu d o d a fu n ç ã o re n a l g l o b a l be m co m o d a h e m o d in à m ic a

g lo m e r u la r é f a c tív e l, p o d e n d o p o r ta n to s e r u tiliz a d o co m o m o d e lo p a r a e stu d o d a fu n ç ã o re n a l em d o e n ç a s tro pica is.

Palavras-chaves: C a lo m y s c a llo su s. D oenças tropicais. Função renal.

Hemodi-nâmica glomerular. Microcirculação renal.

O pequeno roedor C a lo m y s c a llo s u s Rengger

1830 (Rodentia Cricetidae) presente nas regiões pla­ nas sul-americanas, destacando-se na Bolívia, Argen­ tina e Brasil, apresenta características relevantes para pesquisas em diversas áreas.

Semelhante ao camundongo12, este roedor possui a capacidade de participar no ciclo de trans­ missão de diversos microorganismos patogênicos para o homem, incluindo os agentes da febre hemorrágica, doença de Chagas, esquistossomose, leishmaniose, malária e leptospirose1 4 8 13 14 16

A utilização do C a lo m y s c a llo s u s tem sido

proposta como modelo para o estudo dos mecanismos de imunotolerância bem como da dinâmica do proces­ so infeccioso. Por outro lado, pouco se sabe sobre as funções fisiológicas deste roedor e, portanto, esta caracterização no animal intacto toma-se importante. D esta forma, o intuito deste trabalho foi carac­ terizar a função renal do animal normal, ou seja, livre

Estudos realizados no Laboratório de Hemodinàmica Glo­ merular da Disciplina de Nefrologia da Escola Paulista de Medicina, financiado pela F A P E SP , F IN E P e IP EP E N H I. Endereço para correspondência: prof. Dr. Nestor Schor, Disciplina de Nefrologia, Escola Paulista de Medicina, R. Botucatu, 720 - V. Clementino - 04023 São Paulo, SP.

Recebido para publicação em 3/8/88.

de qualquer agente infeccioso, visando posteriormente utilizá-lo como modelo experimental no estudo dos efeitos de doenças tropicais sobre a função renal, especialmente sobre a hemodinàmica glomerular e a microcirculação renal.

M ATERIAL E M ÉTO DO S

O animal foi cedido ao Biotério Central da Escola Paulista de Medicina pelo Biotério de Camun­ dongos Isogênicos do Departamento de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas da U SP, onde iniciou-se a criação de uma cepa de animais não contaminados pelos agentes patogênicos referidos.

Foram utilizados animais adultos, submetidos a estudos de função renal e hemodinàmica glomerular através das técnicas de depuração e micropunção, estabelecidas neste Serviço^.

(2)

B o i m M A , S c h o r N . H e m o d in â m ic a g lo m e r u la r n o ro e d o r Calomys callosus. R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 22: 3 1 -3 7 , ja n - m a r , 1 9 89 .

A veia jugular esquerda foi cateterizada (PE 10) para a infusão de soluções de inulina a 10% e PA H a 2% em soro fisiológico na velocidade de 2 jul/min, bem como de soro homólogo na velocidade inicial de 5,2 jul/min, para reposição das perdas cirúrgicas, ficando o animal em condições de euvolemia1 1. Procedeu-se à cateterização da bexiga (PE 50) para a coleta de urina em tubos graduados para a determi­ nação do volume minuto e dosagem urinária de inulina e PA H 7 17. A filtração glomerular e o fluxo plasmático renal foram obtidos através das depurações de inulina e PA H , respectivamente. Adicionalmente, o rim es­ querdo foi preparado para o emprego da técnica de mícropunção3, que permite avaliar a função glome-rular de nefros Superficiais. Em resumo esta técnica

consiste em coletar amostras de fluido tubular obtidas

de túbulos proximais através de uma micropipeta com bisel em tom o de 8 micras. Posteriormente, o volume foi determinado2 e a amostra destinou-se a dosagem da concentração de inulina através de método fluorimé-tricolS. Com este procedimento foi possível a deter­ minação da filtração glomerular por nefro (SN G FR ).

Surpreendentemente, estes animais apresen­ taram significante número de glomérulos superficiais,

Tabela 1. D ados gerais do C a lo m y s c a llo s u s

o que permitiu a determinação de pressões hidráulicas a nível do capilar glomerular

(P

cg

),

que foram obtidas através de aparelho “ Servo-Null” , (modelo 4A , IPC, U SA ), que permite medidas de pressão hidráulica diretamente das microestruturas do rim. Além do

P

cg

foram obtidas as pressões hidráulicas de arteríolas eferentes superficiais

(P

a e

),

de capilares peritubulares (P c ) e de túbulos proximais

(P

t

),

atra­ vés de técnica utilizada neste Serviço3.

R ESULTA DO S

N a Tabela 1 estão expressos os valores indivi­ duais e as médias+erro padrão (X ± E P ) do peso corporal (PC), peso do rim esquerdo (PR), pressão arterial média (PA M ), hematócrito (H tc) e proteínas plasmáticas (Prot). O PC no animal adulto variou de 28 a 45 g sendo em média de 3 5 ±3 g , e o PR foi em média de 0 ,1 9 ±0 ,0 3 g . A PA M no animal sob aneste­ sia com inactina manteve-se em níveis semelhantes aos obtidos em nosso Laboratório para ratos sob as mesmas condições, sendo em média 99±7m m H g. O Htc e Prot apresentaram valores médios de 41+ 2% e 5 ,3 ± 0 ,lg /d l, respectivamente.

N ° PC PR PAM

mmHg

HTC %

PROT g/dl

1 35 0,21 _ _

-2 32 0,19 - -

-3 28 0,14 105 43 5,1

4 30 0,17 90 37 5,1

5 40 0,20 115 41 5,6

6 45 0,21 85 42 5,3

X 35 0,19 99 41 5,3

± E P 3 0,03 7 2 0,1

Tabela 2. Função renal global de C a lo m y s c a llo s u s

N? V’ V’ F G F G FPR FPR F F

(2 rins) ,(g/rim) (2 rins) (g/rim) (2 rins) (g/rim)

..ul/min. .ml/min... %

1 0,5 1,2 0,05 0,12 0,17 0,81 29

2 0,4 1,1 0,06 0,16 - -

-3 0,8 2,9 0,20 0,71 2,30 7,62 8

4 2,6 7,6 0,23 0,68 1,66 4,91 10

5 0,3 0,8 0,08 0,20 - _ _

6 2,0 4,8 0,17 0,40 - -

-X 1,1 3,1 0,13 0,38 1,38 4,44 17

± E P 0,4 1,1 0,03 0,11 0,63 1,95 6

Os dados de função renal global, ou seja, do rim como um todo, estão apresentados na Tabela 2 .0 volu­ m e minuto (V’), a filtração glomerular global (F G ) e o

(3)

B o i m M A , S c h o r N . H e m o d in à m ic a g lo m e r u la r n o ro e d o r Calomys callosus. R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 2 : 3 1 - 3 7 , j a n - m a r , 1 98 9.

ram em média de 1,1 ±0,4/xl/m in, 0 ,1 3 ± 0 ,0 3 ml/min e 1,3 8 + 0 ,6 3 ml/min, respectivamente, e quando corri­ gidos por grama de tecido renal, 3,1 ±1 ,1 /xl/min, 0,3 8 + 0 ,1 1 ml/min e 4 ,4 4 + 1 ,9 5 ml/min, respectiva­ mente.

O fluxo plasmático renal apresentou valores elevados em relação ao que foi filtrado (F G ), resul­ tando em uma fração de filtração (F F ) relativamente menor (17+6% ) nestes animais, quando comparada com outros mamíferos.

A filtração glomerular por nefro (SN G FR ) obtida através de micropunção de nefros superficiais

(Tabela 3) foi em média de 9, 1 5+ 1,4 5 nl/min, valor reduzido quando comparado com outras espécies. Porém, quando corrigido por grama de rim (46,57+7,61 nl/m in/g rim) mostrou-se maior ao observado para o rato Munich-Wistar (M W ), em condições euvolêmi-cas (Tabela 4 e 5). A s pressões hidráulieuvolêmi-cas obtidas por punção direta das microestruturas superficiais do rim mostraram valores médios para

P

cg

de 3 5 ±1 mmHg,

PT de 9±1 mmHg, PAE de 16 ± 2 mmHg e para P c de

5±1 mmHg. A pressão hidráulica transglomerular (AP), obtida através da diferença entre

P

cg

e PT foi em média de 26 mmHg.

Tabela 3 - Hemodinàmica glomerular de C a lo m y s c a llo s u s

SN G FR

...nl/min. SN G FR

g/rim

P

cg

Pt

...mmHg...

P ae P c

7,84 37,33 34 10 12 8

9,46 45,05 37 10 10 5

11,51 54,81 34 10 13 4

5,15 27,11 30 12 14 2

5,44 28,63 28 10 24 5

10,59 55,64 36 12 20 6

11,66 61,38 34 10 22 6

3,15 16,58 34 8

17,57 92,48 38 10

40 6

11 9 8 6

9,15 46,57 35 9 16 5

X

± E P 1,45 7,61 1 1 2 1

Tabela 4 — Dados comparativos entre C a lo m y s c a llo s u s e outros roedores

Animal PC PR

- g ...

F G

..ml/min.. F P R

nl/min

S N G FR F G F P R

.m l/m in ..

S N G FR

nl/min

C a lo m y s c a llo su s 35 0,19 0,13 1,38 9,45 0,38 4,44 46,57

camundongo9 30 0,23 0,20 - 9,10 0,44 - 39,56

rato do deserto9 100 0,95 1,34 - 11,70 0,71 - 12,32

rato Munich-wistar15 277 1,08 1,92 6,76 30,44 0,89 6,76 30,44

A Tabela 4 apresenta dados comparativos entre o Ç a lo m v s callosu sj camundongo15, rato do deser­

to 15 e rato Munich-wistar9. Os resultados mostram que o C a lo m y s c a llo s u s se assemelha ao camundongo,

tanto em relação aos pesos corporal e renal, quanto a

função renal global e por nefro, ressaltando que a SN G F R quando corrigida por grama de rim, tanto no

C a llo m y s c a llo s u s quanto no camundongo é maior

(4)

B o im M A , S c h o r N . H e m o d in ã m ic a g lo m e r u la r n o ro e d o r Calomys callosus. R e v is ta d a S o c ie d a d e B ra s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 2 : 3 1 -3 7 , j a n - m a r , 1 98 9.

Na Tabela 5 apresentamos dados comparativos (F P R /22.000) foi de 63 nl/min e de 332 nl/min de hemodinãmica glomerular entre o C a lo m y s ca llos u s quando corrigido por grama de rim. A semelhança do

e rato MW. Com relação as pressões hidráulicas, os que ocorre para o FPR, o

Q

a

atinge um valor bastante valores obtidos para todas as estruturâs foram infe- elevado em relação a SN G F R resultando em uma riores aos observados para o rato MW, destacando-se fração de filtração por nefro ( SN F F) diminuída (14% ) a

P

cg

,

que foi em média, lOmmHg menor, salientan- quando comparada com outros mamíferos, como por do que esta diferença é bastante significativa, resul- exemplo o rato M W que possui SN F F de 30% (Tabela tando em um AP também inferior, sendo 26 mmHg 5). Por outro lado a SN F F calculada (14%) é bastante

no C a lo m y s c a llo s u s e 31 mmHg no rato M W . semelhante àfração de filtração global(FG), que como

apresentado foi em média de 17%, neste roedor. Embora tenha sido possível a determinação de A partir da estimativa do

Q

a

e da SN F F e, alguns parâmetros da hemodinãmica glomerular no através de cálculos matemáticos usualmente

utili-C a lo m y s c a llo s u s , em especial pela presença de zados. determinamos os outros parâmetros envolvidos

glomérulos superficiais, a determinação de todos os no processo de filtração glomerular. Assim, consi-parâmetros não foi possível devido às dificuldades derou-se que a SN G F R = Kf.

P

uf

,

onde

JM

jf

é a técnicas envolvendo principalmente o tamanho do pressão de ultrafiltração, ou seja, PUF = AP,

7

tCG,

animal e das estruturas a serem micropuncionadas. onde t t cge a variação de pressão oncótica

intraglome-Tabela 5 - Hemodinãmica glomerular: dados comparativos entre C a lo m y s c a llo s u s e rato Munich-Wistar

Calom ys callosus Munich-wistar

S N G F R (nl/min) 9,15 30,44

S N G F R (nl/min/g rim) 47,57 30,44

Q A (nl/min) 63 103

Q

a (nl/min/g rim) 332 103

SN FF (%) 14 30

P

c g(mmHg) 35 45

PT (mmHg) 9 14

AP, mmHg) 26 31

P

a e(mmHg) 16 19

Pc (mmHg) 5 8

RA (1010.din.s.cm"5) 0,92 2,79

Re (1010.din.s.cm"5) 0,30 1,52

RT (1010.dm.s.cm‘5) 1,22 4,31

K f (nl/s.mmHg) 0,1174 0,0860

N este sentido, parâmetros como a concentração pro­ teica da arteríola eferente (C e) não puderam ser determinados diretamente. Entretanto, o fluxo plas-mático glomerular (Q a) estimado pode ser calculado admitindo-se que o Calomys callosus possua número de nefros semelhante ao camundongo (22.000 ne-fros/2 rins)15. N este caso, o Q a calculado

(5)

B o i m MA , S c h o r N . H e m o d in à m ic a g lo m e r u la r n o ro e d o r Calomys callosus. R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 2 : 3 1 - 3 7 , j a n - m a r , 1 9 8 9.

lação AP, / 7tE foi maior do que 1, caracterizamos situação hemodinàmica glomerular de desequilíbrio, ou seja, ao longo das alças capilares do glomérulo, a pressão hidráulica sempre é maior que a oncótica, ocorrendo fenômeno de ultrafiltração. Esta situação de desequilíbrio em euvolemia é semelhante àquela observada em ratos MW. D esta maneira é possível utilizar o modelo matemático desenvolvido por Deen e cols6, possibilitando o cálculo dos outros parâmetros envolvidos na dinâmica glomerular. Assim, pode-se obter os valores estimados das resistências das arterío-las aferente (R a), eferente (R e) e total (R t), que foram 0 ,9 2 ,0 ,3 0 e 1,22 xlOlÒ.din.s.cm'5, respectiva­ mente. Estes valores são inferiores aos observados para ratos M W em nosso laboratório (Tabela 5). Por outro lado, o coeficiente de ultrafiltração glomerular (Kf) no C a lo m y s c a llo s u s (0,1174 nl/s.mmHg) foi

semelhante ao observado para ratos M W (0,0860 nl/ s/mmHg).

Portanto, ressaltamos que nestes experimentos, somente a

C

e

foi estimada, sendo os demais parâme­ tros calculados, segundo os modelos matemáticos vigentes para o estudo da hemodinàmica glomerular nos outros mamíferos.

D ISC U SSÃ O

O interesse no estudo do C a lo m y s callosu s,

bem como a caracterização da sua função renal advém do fato deste roedor participar do ciclo de transmissão de várias doenças tropicais, desconhecendo-se em qual delas este animal poderia, além de ser reserva­ tório destas patologias, adquirir a doença. Este aspec­ to é de importância pois os modelos experimentais de doenças tropicais para o estudo da função renal em ratos ou no cão, até o presente momento, são inade­ quados. Mais ainda, esta situação gera um desconhe­ cimento signifícante das patologias nefrológicas tro­ picais, comuns no nosso meio, como a nefropatia da malária, esquistossomose, leptospirose, etc. Portanto, o presente trabalho pretende iniciar, sistematicamen­ te, a busca de modelos experimentais acessíveis ao estudo da função renal em animais passíveis de serem infectados com estes agentes de patologias tropicais.

O estudo realizado mostrou que pelo menos dois aspectos podem ser ressaltados. Primeiro, é que embora este animal seja bastante pequeno e de manuseio relativamente difícil no que diz respeito aos procedimentos cirúrgicos (cateterização das estru­ turas), ele suporta a agressão da anestesia, cirurgia,

bem como o tempo da duração do experimento ( ~ 4 horas), sendo portanto factível a sua utilização neste tipo de manobra experimental. O outro aspecto que despertou interesse foi o fato deste roedor apresentar grande número de glomérulos superficiais ( ~ 12 por

rim), característica que permite a avaliação quase completa de toda a hemodinàmica glomerular. Vale a pena salientar que esta característica descoberta inicialmente em uma colônia de ratos Wistar mutan-tes, denominados Munich-wistar (M W ), propor­ cionou importante progresso no entendimento da fisiologia renal, pelo fato de permitir o estudo deta­ lhado da função glomerular5. Sabe-se que em geral os mamíferos apresentam poucos glomérulos superficiais sendo que os ratos M W e os macacos10 são os que melhor fornecem esta disposição anatômica.

Com relação à função renal global e glomerular do C a lo m y s ca llo su s, vários aspectos interessantes

foram observados no presente estudo. O processo de filtração quando analisado para o rim total (FG ) ou para o nefro único (SN G F R ) comportou-se de forma diferente quando considerado como percentual dos valores obtidos para os ratos MW, ou seja, a SN G F R do C a lo m y s c a llo s u s foi 15% do valor observado nos

M W , enquanto a F G atingiu um percentual de apenas 6%. Algumas justificativas poderiam ser apresentadas para explicar a SN G F R relativamente maior do que a FG . Estes roedores poderiam apresentar um aumento na função glomerular de nefros superficiais em relação aos nefros médio corticais e justamedulares que teriam esta função diminuída, contribuindo para a FG mais baixa. Uma outra hipótese seria a de que estes roedores apresentassem reduzido número de nefros superficiais quando comparado com os nefros justa­ medulares, propiciando uma hipèrfunção dos nefros superficiais, porém não em número suficiente para elevar a filtração renal global. Finalmente, a possibi­ lidade de erro na coleta da urina através da bexigf. não pode ser afastada, levando-se em conta o espaço morto que contribuiria de maneira signifícante para erros de coleta e determinação da função renal global. N os ratos M W , bem como em espécies animais de maior porte, a coleta de urina é feita através da cateterização do ureter, eliminando-se este tipo de erro. Entretanto, no C a lo m y s ca llo su s, este procedimento não foi

possível pelo fato de se tratar de uma estrutura muito pequena e frágil.

Por outro lado, os parâmetros obtidos da he­ modinàmica glomerular mostraram que o C a lo m y s c a llo s u s apresenta valores de pressão hidráulica das

microestruturas do rim inferiores aos observados para ratos M W (Tabela 5), sendo que a diferença mais importante foi observada com relação à pressão hidráulica intraglomerular (P

cg

).

Este dado é intri­ gante, visto que a pressão arterial sistêmica é seme­ lhante entre ratos M W e o C a lo m y s c a llo s u s (Tabela 1)

(6)

B o i m MA , S c h o r N . H e m o d in ã m ic a g lo m e r u la r n o ro e d o r Calomys callosus. R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 2 : 3 1 -3 7 , j a t i-™— 1089.

seja maior neste roedor do que nos M W. Entretanto, os valores das resistências arteriolares calculadas indicam que a

P

cg

não se mantém nos mesmos níveis dos obtidos nos M W devido à resistência eferente ser proporcionalmente menor (20%) no C a lo m y s c a llo su s

em relação aos ratos MW, quando comparada com o valor da R a (33%). Apesar de menor

P

t

,

a redução da P c g no C a lo m y s c a llo s u s contribuiu de forma

signi-ficante para adiminuição da pressão hidráulica trans-glomerular (AP = P c g - PT), a qual expressa a força hidráulica efetiva que favorece o processo da ultrafil-tração. Por outro lado, o fluxo plasmático glomerular (Q a) apresentou valor elevado em relação à filtração glomerular por nefro (SN G F R ) implicando na dimi­ nuição da fração de filtração por nefro (S N F F ), à semelhança do que ocorreu para a F F por rim total. Uíiíiz&ndo os cálculos matemáticos referidos, pudemos determinar o valor do Kf, sendo semelhan­ te, em média, ao obtido para os ratos MW.

A o considerarmos os determinantes da filtração glomerular que são a AP, QA, CA e o Kf, podemos sugerir que em média a

C

a

e o K f dos C a lo m y s c a l­

lo s u s são semelhantes aos ratos M W . Apesar de me­

nor pressão hidráulica transglomerular (AP, a filtração glomerular por nefro (g/rim) é substancial­ mente maior nestes pequenos roedores às custas de reduzidas resistências íntra-renais (RA e RE) que propiciariam aumento do fluxo plasmático glomerular

(Q

a

).

Portanto, o elevado fluxo plasmático glomerular

no C a lo m y s seria o responsável pela maior filtração

glomerular por nefro determinada.

Finalmente, utilizando esta metodologia de micropunção, pudemos avaliar o fenômeno da hemo-dinâmica glomerular e a microcirculação renal deste roedor, o qual enfatizamos ser um modelo importante para a pesquisa básica, onde não só os mecanismos imunológicos podem e devem ser estudados, mas também os mecanismos fisiopatológicos das doenças tropicais que comprometem a função renal podem, potencialmente, ser desenvolvidos.

S U M M A R Y

R e n a l fu n c tio n w a s c h a r a c te r iz e d in C a lo m y s c a llo su s, a r o d e n t w hich can p a r tic ip a te in th e tr a n s­

m is s io n o f s e v e r a l h u m an d isea ses . T h e re s u lts sh o ­ w e d th a t th e p r e s s u r e s levels, h e m a to c r it a n d p l a s ­ m a tic p r o te in s w ere s im ila r to r a ts s u b m itte d to th e

s a m e e x p e r im e n ta l m an e u v e r s. T he c o r p o r a l a n d r e n a l w eigh ts, w h o le a n d sin g le n eph ron g lo m e r u la r

f i lt r a tio n ra te s w ere s im i la r to th e m ou se. T h is ro d e n t p r e s e n te d a s ig n ific a n t n u m b e r o f s u p e rfic ia l g lo m e ­

ruli, a llo w in g to e v a lu a te g lo m e r u la r h e m o d y n a m ic s a n d re n a l m ic r o c ir c u la tio n p a r a m e te r s . D e s p ite

m e a n a r te r ia l p r e s s u r e s im ila r to th e M u n ic h - W is ta r

( M W ) rats, m ea n g lo m e r u la r c a p illa r y h y d r a u lic p r e s s u r e w a s lo w e r in Calomys callosum du e to a lo w e r p o s t g lo m e r u la r re s is ta n c e in th is ro d e n t w hen c o m p a r e d to M W rats. T h e m ea n g lo m e r u la r p la s m a f l o w ra te w a s r e la tiv e ly e le v a te d w h en c o m p a r e d w ith

sin g le n eph ron g lo m e r u la r f ilt r a tio n rate, w h ich in tu rn b lu n te d th e lo w e r in tr a g lo m e r u la r h y d r a u lic p re ssu r e , a n d th u s in c r e a s e d th e sin g le n eph ron g lo ­

m e ru la r f iltr a tio n ra te p e r g /k id n e y . T h e p r e s e n t w o rk su g g e sts th a t d e s p ite o f th e te c h n ic a l d iffic u ltie s im p o ­ s e d b y th e r e d u c e d s iz e o f th e Calomys callosus, the s tu d y o f th e re n a l fu n c tio n a n d g lo m e r u la r h e m o d y ­

n a m ic s is p o s s ib le , e s ta b lis h in g therefore, a m o d e l f o r

th e s tu d y su c h r e n a l fu n c tio n .

Key-words: C a lo m y s c a llo s u s. Renal function.

Glomerular hemodynamics. Renal microcirculation.

A G R A D E C IM E N T O S

Agradecemos aos responsáveis pelo Biotério Central da Escola Paulista de Medicina, especial­ mente à Dra. Adela Rosenkranz e à Miriam A. Ghiraldini, pelo fornecimento do C a lo m y s ca llos u s.

R E FER ÊN C IA S BIBLIOGRÁFICAS

1. Almeida CR. Relatório das Pesquisas do Plano de Peste de Exu. Agência Magalhães, Ministério da Saúde, 1973. 2. Andreucci VE. Calibrations. In M anual o f renal micro­ puncture. Ed.: Vittorio E. Andreucci, Naples, pp.283-287, 1978.

3. Barros E JG , Boim MA, Ajzen H, Ramos OL, Schor N. Glomerular hemodynamics and hormonal participation on cyclosporine nephrotocixity. Kidney International 32: 19-25, 1987.

4. Borba CE. Infecção natural e experimental de alguns roedores pelo Schistosoma mansoni, Sambom, 1907. Tese de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, 1972.

5. Brenner BM, Troy JL, Daugharty TM. The dynamics of the glomerular ultrafiltration in the rat. Journal of Cli­ nical Investigation 50: 1776-1780, 1971.

6 . Deen W M, Troy JL, Robertson CR, Brenner BM. Dynamics of glomerular ultrafiltration in the rat: deter­ mination of the ultrafiltration coefficient. Journal of Clinical Investigation 52: 1500-1508, 1973.

7. Fuhr J, Kaczmarczyk J, Kruttgen CD. Eine einfache colorimetrische method zur inulin bestimmvmg for nie- renclear anceuntersuchungen bei soffwechselgesuden and diabetibem. Klinical W ochenschrurt 33: 729-730,

1955.

8. Johnson KM, Mackenzie RB, Webb PA, Kuns M L Chronic infection o f rodents by machupo virus. Science

150: 1618-1619, 1975.

(7)

re-B o i m MA , S c h o r N . H e m o d in ã m ic a g lo m e r u la r n o ro e d o r Calomys callosus. R e v is ta d a S o c ie d a d e B r a s ile ir a d e M e d ic in a T ro p ic a l 2 2 : 3 1 - 3 7 , ja n - m a r , 1 98 9.

nina angiotensina, prostaglandina e vasopressina. Tese de Doutoramento, Escola Paulista de Medicina, 1986. 10. Maddox DA, Deen WM. Dynamics of glomerular

ultrafiltration: Studies in the primates. Kidney Interna­ tional 5: 271-278, 1974.

11. Maddox D A , Price D C, Rector FC Jr. Effects of surgery on plasma volume and salt and water excretion in rats. American Journal of Physiology 233:600-606, 1977. 12. M assola E, Fom es A. Nuevos dados sobre la morfologia

distribucion geografica y etoecologia de Calomys callo­ sus (Rengger) (Rodentia Cricetidae). Physis 25: 325, 1965.

13. Mello DA. Infecção experimental de Calomys callosus (Rengger, 1830), (Cricetidae-Rodentia) a quatro espé­ cies de parasites. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 13: 101-105, 1979/80.

14. Mello DA. Aspectos do ciclo silvestre do T ry p a n o s o m a c r u z i em regiões de cerrado (município de Formosa, Estado de Goiás). Memórias do Instituto Oswaldo Cruz 76: 227-246, 1981.

15. Renkin EM , Gilmore JP. Glomerular filtration. In Handbook of Physiology (Renal Physiology), Ed: Ste­ phen R. Geiger, pp. 185-248, 1973.

16. Ribeiro RD. Novos reservatórios do Trypanosoma cruzi. Revista Brasileira de Biologia 33: 429-536, 1973. 17. Smith H W , FinkeLstein N , Aliminosa L, Crawford B,

Graber M. The renal clearances of substituted hippuric acid derivatives and other aromatic acids in dog and men. Journal of Clinical Investigation 24: 388-404, 1945. 18. Vurek G G , Pegran SE. Fluorimetric method for the

Referências

Documentos relacionados

Dessa forma, os níveis de pressão sonora equivalente dos gabinetes dos professores, para o período diurno, para a condição de medição – portas e janelas abertas e equipamentos

A dose inicial recomendada de filgrastim é de 1,0 MUI (10 mcg)/kg/dia, por infusão intravenosa (foram utilizadas diversas durações: cerca de 30 minutos, 4 horas ou 24

“Porque quando um homem fala pelo poder do Espírito “Porque quando um homem fala pelo poder do Espírito Santo, o poder do Espírito Santo leva as suas palavras ao Santo, o poder

Nessa situação temos claramente a relação de tecnovívio apresentado por Dubatti (2012) operando, visto que nessa experiência ambos os atores tra- çam um diálogo que não se dá

Considerando que o MeHg é um poluente ambiental altamente neurotóxico, tanto para animais quanto para seres humanos, e que a disfunção mitocondrial é um

Para tal, constou de pesquisa de natureza aplicada à 4 sujeitos, os quais foram selecionados devido às suas condições de paraplegia Os dados coletados foram analisados de

5 “A Teoria Pura do Direito é uma teoria do Direito positivo – do Direito positivo em geral, não de uma ordem jurídica especial” (KELSEN, Teoria pura do direito, p..

62 daquele instrumento internacional”, verifica-se que não restam dúvidas quanto à vinculação do Estado Brasileiro à jurisdição da Corte Interamericana, no que diz respeito a