INSTITUTO SUPERIOR DE ESTUDOS E PESQU.ISAS PS'ICOSSOCIAIS
CENTRO DE PÓS-GR'ÂbUAÇÃO
EM
PSICOLOGIA
AS POSSIBILIDADES DE SATISFAÇÃO NA ADOçÃO
NATÉRCIA POINHO FERREIRA DOS SANTOS
, . . .
,
.
~,,FGV/l$Opl CPGP
CENTRO DE PÔS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
AS POSSIBILlDADES"nt"SATlSFAÇÃO NA ADOçÃO
POR
-NATERCIA POINHO FERREIRA DOS SANTOS
DISSERTAÇÃO SUBMETIDA COMOREQU.ISITO PARCIAL PARA
OBTENÇÃO DO GRAU
DEMESTRE EM
PSICOLOGIA
RIO DE JANEIRO" JUNHO DE
1987
i i i
Ao meu. maJÚdo,
pOIL tudo que. palLtLlhamo.6.
Ao
meu.frUho,
Ao longo deste trabalho tive o privilégio de, a
cada instância, encontrar pessoas que muito me facilitaram a
caminhada e a elas dirijo agora meus profundos sentimentos
de gratidão:
Ao Professor Dr. Cílio Rosa Ziviani, pela sua
orien-tação segura, encorajadora, incentivo, decisivo para a
rea-lização deste trabalho,
 Professora Dr~ Anna Edith Bellico da Costa, pelo privilégio de ter podido contar com seu apoio e seu
acompa-nhamento lúcido, atento e desprendido,
Aos colegas psicólogos, que me deram sua preciosa
colaboração na etapa da validação do conteúdo dos
instrumen-tos utilizados na pesquisa,
A Maria Clara Nunes Gavantini, Secretária Geral do
Centro de Pós-Graduação da Fundação Getúlio Vargas, pela
atenção e boa vontade com que sempre me atendeu,
A Maria Lucia Delamare, pelo seu apoio e atenção no processamento dos dados estatísticos~
A Débora Pint otoni, que tão bem cuidou da dati-lografia e apresentação física deste trabalho,
suas casas e sem as quais este trabalho não teria sido
pos-sível,
Aquelas pessoas amigas que, em Vitória, no
Espíri-to SanEspíri-to, em Belo Horizonte e principalmente em Governador
Valadares, Minas Gerais, muito me ajudaram no sentido de me
por em contato com as famílias que eu precisava encontrar,
Aos colegas e funcionários do Departamento de
Psi-cologia da UFES, ao qual pertenço, onde sempre encontrei boa
vontade nos vários momentos de decisões relativas ao meu
arastamento para cursar o mestrado,
A LNCC (Laboratório Nacional de Computação
Cientí-fica), do CNPq, pelo uso da computação,
Ao PICO (Programa Institucional de Capacitação de
Docentes), um programa da CAPES, através do qual me foi
con-cedida uma bolsa de estudos,
Ao Norman, meu marido, pelo incentivo constante e
apoio incondicional,
Meus sinceros agradecimentos.
Com este trabalho se teve a intenção de penetrar
um pouco na natureza da adoção, avaliando comparativamente
alguns aspectos da interação pais-filhos adotivos e
pais-fi-lhos biológicos.
Ser adotivo constitui urna das características dos
heróis mitológicos. Sendo terna tão antigo e calcado em
fan-tasias universais da humanidade, talvez seja por isto que
ele ainda conserve um tanto de mito e um tanto de tabu que
sempre lhe dificultam um tratamento científico.
Em comparaçao
à
quantidade de estudos de que di's-poe a Psicologia, relacionadosà
interação pais-filhos, o terna da adoção não tem sido muito estudado,no nqsso país.
principalmente
Com base teórica na Psicanálise e inspirados no
trabalho de Wish & Kaplan (1977) (que apresentaram urna forma de comparar relações diádicas), foram propostas hipóteses de
que algumas diferenças seriam encontradas ao compararmos as
interações pais-filhos adotivos e pais-filhos biológicos.
Para a realização deste estudo contou-se com a
co-laboração de vinte e quatro (24) famílias, sendo doze (12)
biológicas e doze (12) adotivas. Estas corresponderam todas à adoção plena, isto
é,
àquela na qual "todos os laços deWith this work there was an intention to penetrate
somewhat in the nature of the adoption theme, estimating in
a comparative way some aspects of the adopted
and biological parents-sons interactions.
parents-sons
Being adopted is one of the characteristics of the
mythological heroes. As i t is such an antique theme with
origin in the universal humanity fantasies that's
perhaps that i t still preserves some of the myth and
that always impede a scientific treatment.
In comparison to the amount of studies
Psychology has set in order, related to parents and
interactions, the Adoption Theme hasn't been studied
much, mainly in Brazil.
why,
taboo
that
sons
very
With theoretic foundation in Psychoanalysis and
inspired in the work of Wish and Kaplan (1977) (who presented
a way to compare dyadic relations), hypoteses that some
differences would be found were proposed, in comparing the
adopted parents-sons and biological parents-sons interactians.
Due to the collaboration of twenty-fcur (24) families,
twelve (12) biological and twelve (12) adopted, that this
study could be achieved. AlI of these corresponded to the
full adoption, that is, the one which alI the blood links
The hypotheses,in the majority weren't confirmed
having been bigger the tendency of not finding significant
differences in comparing the adopted parents-sons and
biological parents-sons interactions. It was evident with a
bigger persistence an interaction difference between
father--son and motherfather--son in general, free of the condition of
being adopted or biological children. The insistence with
which the roles of father and mother were discriminated was
analysed through the maternity and paternity evolutional
lines theories and in this reflections we found support in
Langer's (1981) and Aberastury's (1985) works.
Though we cannot lose sight of the reduced ~city
of generalization of this study which was made
quantitatively" reduced universe, the consistency
results suggests that if the adoption is
upon a
of the
, gestated
approapriately, the possibility for adopted parents and sons
to be happy will be practically the same of that of biol<;>gical
parents and dons.
Such conclusions reinforce even more the necessity
of extending the studies about the theme in order to reduce
the prejudice and the mythification related to adoption.
~
PAG.
AGRADECIMENTOS ...
I • • I • I • • • • • • • • • • • I I • • I • • I • ivRESU~10
...
I I • • • • • • • • • • • • • • I • • • • • • • • • • • I • • • • • • • • • • • • • • • viSU~1r1ARY I I I • I • • I • I • • • • • • I I • • • • • • I • • • • • I • • • • • • • I • • • • • • • viii
CAPÍTULO I -- O PROBLEMA
1 -
I NTRODUCÃO .•.
I • • • • • • • • • • • • • • • • I • • • • I I I • • • • I • • • • I1
2
3
4
5
6
~1.1
1.2
,
INTERAÇÃO ENTRE PAIS E FILHOS .•••..•.••..
A ADOÇÃO
I . I I I • • I • I I I I I I • I • I • I • I I I I • I I I I I JOBJETIVOS
I I I I I • I I • I • • • • • , I I • I • • I I • I I I I I • I I I I I • I IDEF I N I çÃO DO PROBLEMA ...••••.•.••••••..•••..•.
H I PÓTESES •••• I I I , I I I I • I I I • • I • I I I I • I • I I I • I I • • • • I I
4.1
4.2
HIPÓTESES GERAIS •••••.•••••.••••••.••••..
SUBHI PÓTESES ...••.•...••••.••.••...•.
-
-DELIMITAÇOES E LIMITAÇOES .•....•...•..•..•.•...•.
DEFINIÇÕES DE VARIÁVEIS E TERMOS •••.••.•••.•••..
CAPITULO 11
FUNDAMENTAÇÃO TEORICA
1 --
UMA FUNDAMENTACÃO DE PSJCÁNALISE
' 1 1 1 1 1 " , • • • , • • •2
3
4
,
AS RELAÇÕES OBJETAIS ••••••..•.••••...••
1.1
1~2
INTERAÇÃO ENTRE PAIS E FILHOS E ADOÇÃO •••
UMA APORTE DA PSICOLOGIA SOCIAL •••.••..••....••.
A LEI
I I • I • • I • I • • I • I I I • I I I • • I • I I I I • • I I • • I I I • I I • • •ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI
I ' I • I • I I • I I I • I ICAPÍTULo III -- METODOLOGIA
1 8 9 la 12 12 12 14 15 17 18 27 40 47 49
1 --
MODELO DA INVESTIGAÇÃO ••..•••.••.• /.. •.•••.••••.
553.1
3.2
--VALIDAÇÃO DE CONTEÚDO DOS INSTRUMENTOS
•••
PRE-TESTE
• • • • I I • • I • • I • • I • I I • • I • I I • • I • • I I ICAPÍTULO IV
ANÁLISE DOS RESULTADOS
1
2
3
4
5
6
HIPÓTESE GERAL
I I • I • I I I I • • , I • • • • • I • • I I I I • I I • • , • • IFATOR PROXIMIDADE
FATOR AFETIVIDADE
• I I • I • I I I • • • I I • • I I • • • • I • • I I I I I I
I ' I • • I • • , I • • I I I , I I I • I , I I I I I I • I I
FATOR PRESTIMOSIDADE
. , • • • • • • • • • • • • ' • • , 1 1 • • • • • • • •FATOR EGOCENTRISMO
• I I I I I I • I • • I I • I I I I • • I I I • • I I • I IFATOR GENTILEZA
• I • • I I • • I • I I I • I • I I • • • I • I • I I I I I • • ICAPITULO V -- CONCLUSÕES E SUGESTÕES
1
CONCLUSÕES
2 -
SUGESTÕES
• • • • I • I • • • • I I • I I I I I I I I I I I I I I I I I • I I I I I I
I I I I I • • • • • I I I • I • I • • • I • • I • I • • • • • • I I I I • • •
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
I I I • I • • I I ' I I I • I I I • I • I • I • • I IANEXOS
I ' I I I I I • I • • I I • I , I I I I • I I • I I • I • I • I • • I • • I I I • • I • • I IO PROBLEMA
1 --
INTRODUÇÃO
1.1 --
INTERACÃO ENTRE PAIS E FILHOS
,
A qualidade da interação mãe-filho desde os
primei-ros tempos de vida tem sido tema de grande interesse para a
Psicologia, pois os psicólogos vêm nela um fator
determinan-te de caracdeterminan-terísticas perduradouras na personalidade. A
im-portância destas primeiras experiências foi antes de maisn~
da demonstrada pelos efeitos funestos que a ausência de uma
figura materna acarreta. A privação da figura materna, em
diferentes graus de intensidade e ocorrendo em diferentes m~
mentos da vida da criança, acarreta distúrbios e atrasos
di-versos no desenvolvimento da criança, como têm demonstrado
diversos autores desde Freud.
Assim, psicólogos de diferentes posições teóricas
têm estudado e pesquisado os fatores da interação mãe-filho.
Nesta busca de conhecimento deu-se, num momento, ênfase a
personalidade da mãe, tendo-se em vista a disparidade dos
graus de estruturação das personalidades de mãe e de filho.
Rappaport (1981) cita vários pesquisadores nesta linha
uni-direcional (que enfatiza a influência dos pais), dentre eles,
na linha da aprendizagem social. Também do ponto de vista da
Psicologia cognitiva, foram feitos estudos sobre a
influên-cia dos pais sobre a criança.
Mas as características congênitas da criança como
fonte de estímulos para os pais, logo veio a ser considerada
nas observações e estudos dos psicólogos. Rappaport (1981)
cita Bell corno o propositor de um modelo bidirecional ou
diádico para a pesquisa sobre a interação pais-filhos. Tais
estudos apontam o estado psicológico da mãe antes do
nasci-mento da criança como antecedente influente nas atitudes e
comportamentos da mãe em relação
à
criança e esta, desde lo-go, tendendo a agir de forma a aumentar ou a diminuir ases-timulações que a mae lhe oferece. Assim focaliza-se o fato
de que a variação no comportamento da criança pode levar a
diferentes experiências com a mãe. Robson & Moss, citados por Rappaport (1981), relatam mudanças nos sentimentos
sub-jetivos das mães para com os seys bebês nos primeiros três
meses após o nascimento, em função do excesso de choro,
ma-nha e outras exigências de cuidados fisiológicos. Blurton
Jones (In Rappaport, 1981, v.2, p.55) realça a complexidade
desse processo interativo, admitindo que não se pode
compre-ender um comportamento dentro dele como resultante de uns
poucos fatores. Segundo ele, a multiplicidade dos fatores
que influenciam tal processo exigem o concurso de várias
ciências para a sua compreensão (da Farmacologia a
Sociolo-gia) .
bidire-cional, realizados tanto no exterior como no Brasil, sao
ci-tados por Rappaport, estudos que vêm demonstrar as muitas
possibilidades desta abordagem bidirecional e a sua
abrangência do processo interativo mãe-criança.
maior
Na busca de um enfoque mais abrangente, termina-se
por defrontar o contexto no qual se insere a cupla
interati-va, contexto esse constituído de fatores externos que
certa-mente influenciarão a interação. Os organismos não são
re-ceptitores passivos dos estímulos ambientais, mas eles
sele-cionam e metabolizam esses estímulos conforme suas
caracte-rísticas ontológicas e idiossincráticas. A consideração
des-se contexto maior corresponde ao modelo da aprendizagem
so-cial.
Se a criança pequena come bem e dorme bem, isto
indica que a relação com a mãe está começando bem. A mae
es-tará bem em relação a criança e esta eses-tará bem em relação à
mae. Portanto, será dentro do espaço das interações que
po-deremos detectar a satisfação ou nao que possa existir na
relação entre pais e filhos.
A Psicanálise veio demonstrar que a existência d~ fantasmas
é
própria da vida psíquica e necessáriaà
sua evo-lução. Melanie Klein (in Baranger, 1981), como terapeutainfantil se interessou pelo modo como a criança, logo cedo,
situa a si e a sua família num mundo fantasmático. O mundo
imaginário de pais e filhos vai se estruturando ao longo de
adotiva ou biológica. Mas se considerarmos a criança ~
recem--nascida, veremos que é grande a disparidade das condições
estruturais do seu psiquismo em relação ao de seus pais. Além
disto, não há propriamente um acordo entre os psicanalistas
a respeito do momento em que se pode falar de um ego
estru-turado. Contudo, do ponto de vista psicanalítico, a vida
fantasmática antecede a estruturação do ego e, assim, desde
muito cedo a criança fica sujeita
à
ameaça de um agressor l l rterior que, projetado no exterior, lhe desvenda um
mundo--ambiente sentido como perigoso a nível fantasmático.
Segun-do Melanie Klein, toSegun-do ser humano passa, nos primórdios do
seu desenvolvimento, por etapas psicóticas e o papel da mae
real é modificar a vida fantasmática do bebê, opondo aos seus
terrores imaginários uma presença estimulante que se traduza
num discurso sensato. Podemos dizer que a prática
psicanalí-tica tem demonstrado que pais e filhos transformam as
reali-dades de suas vivências (em variados graus) em função de
seus temores, suas culpas, suas defesas e sentimentos
agres-sivos. Tudo isto tem a ver com a qualidade da motivação para
a paternidade, da qual falaremos mais adiante.
o
ciclo da vida se mantém graças ao instinto daprocriação. Mas, no ser humano, com sua natureza complexa e
paradoxal, procriar envolve mui to mais do que mecanismos
ins-tintivos. Assim, se muitas pessoas são capazes de gerar
fi-lhos sem muitas dificuldades, outras admitirão
consciente-mente terem medo de tê-los ou nao os desejar e muitas nao
conseguirão tê-los ou só os terão apos vencer muitas
fecun-didade sao valores de nossa sociedade que podem pressionar
homens e mulheres no sentido da procriação. Segundo Langer
(1981) muitos desejos da mulher seriam satisfeitos com a
sa-tisfação do instinto maternal, desejos esses que podem ser
mais ou menos conscientes, mais ou menos infantis: ter um
filho pode significar a recuperação em si de sua própria mae
e também permitir a identificação com ela •.. pode ser a
com-provaçao de sua fertilidade .•. pode corresponder
à
fantasia infantil de presentear o pai com uma criança .•. pode aindaser a chance de reviver e resgatar a própria infância ..• p~
de ser um recurso para reter o marido .•. rivalizar com
ou-tras mulheres ... Ter um filho pode ser ainda uma maneira de
ultrapassar-nos a nós mesmos e de aplacar o nosso grande
de-sejo de vencer a morte.
Podendo assumir tantos significados, a
procriativi-dade na dimensão humana defronta muitas vezes com
dificulda-des. Lanter (1981) expõe vários casos clínicos, na base dos
quais vários tipos de conflito com a feminilidade dificultam
ou impedem a gravidez.
Além dos impedimentos a nível intra-psíquicos sao
inegáveis as dificuldades de origem sócio-cultural:
"cada
é;O-c~edade
é;e adapta a
é;eué; p~econce~toé; 6~ente ã~ nun~õe~ p~oc~~at~va~
da
mu.e.he.~". Na nossa sociedade atual os desejos deser mãe não são facilmente compatibilizados com outras
ambi-ções e necessidades da mulher de hoje. A Antropologia
Cultu-ral fornece-nos exemplos de diferentes concepções de
o comportamento das maes pode parecer às pessoas da nossa .s~
ciedade corno desprovido de sentimentos maternais. E ainda,
podemos encontrar justificativas para os sentimentos que
es-tão na base de muitos casos de infertilidade, no paradoxo
existencial humano, esse mesmo paradoxo que já mencionamos
corno possível suscitador do desejo de procriar, pode também
ter a ver com o medo à procriação: a idéia de procriação
tam-bém se liga à de finitude da vida. Becker (1976) pondera que,
se por um lado
"a ~atu~~za V~~~~ a mo~t~ ~ão ~~ia~do o~9a~i~mo~
~t~~~o~ ma~ po~~ibilitando ao~ o~gani~mo~ ~6~m~~o~
~~ p~o~~~a~~m, po~ out~o lado, ~~~a p~o~~ia~ão ~~ ~o~da ao hom~m qu~ ~l~ ~ada ma~~ ~ ~~~ão um ~lo ~a
~ad~ia d~ ~~~~~, i~t~~mutãv~l ~omo qualqu~~ out~o
~, po~ i~to, di~p~~~ãv~l".
Isto destrói-lhe a individualidade, justamente o que o homem
mais persegue. Becker (1976) prossegue com suas idéias
vi-sando mostrar corno é importante para o homem a sua
autoper-petuação espiritual e corno isto irá, de certa forma,
expli-car os tabus sexuais. Para nós, tais idéias são aqui
evoca-das'com o intuito de focalizar que o desejo de ter filhos,
embora possamos conhecê-lo muitas vezes tão forte e decidido,
pode ser também conflituado. Isto parece justificar porque
certas pessoas não querem ter filhos, ou mesmo tenham medo
de tê-los e ainda a existência de diferentes mecanismos
im-plícitos no desejo de ter filhos. Segundo Soulé & Lebovici (1980), tanto em pais biológicos quanto em pais adotivos, o
desejo de ter filhos pode representar mecanismos do tipo de
uma formação reativa ou de uma sublimação. O primeiro tipo
seria de mecanismos mais arcaicos, que dificultariam mais a
adaptação. Os pais motivados por urna formação reativa terão
pode-rá satisfazê-los e eles, por sua vez, nao serao bons pais.
Seria, por exemplo, o caso de pais que tiveram ou adotaram
uma criança esperando com isto salvar o casamento que já nao
ia bem. Seria o que Ajuriaguerra chama de criança "tábua de
salvação" .
Já se o desejo de ter filhos, corresponde a urna
su-blimação, o prognóstico será bem melhor, pois as
possibili-dades de suportar as possíveis dificulpossibili-dades são bem maiores.
"Só pode.mol.J
.6 e.Jr..bom pa-i.1.J
e.boa mãe. quando nol.J
Jr..e.-conhe.ce.mol.J no 1.Je.Jr.. que. amamol.J
e.quando pode.mo.6
te.Jr..
pJr..aze.Jr.. com e..6.6a l.de.n,ti.6icaç.ão e..6pe.cu.taJr.."
(Soulé & Lebovici, 1980, p. 574)."Ce.Jr..tal.J mãe.1.J
1.Je.d-i.ve.Jr..t-i.Jr..ão comp.tace.n,te.me.nte.
e.não
l.Je.m uma ponta de. de.l.JpJr..e.zo mai.6 ou me.nol.J
agJr..e.I.J.6-i.vo
com al.J ,te.n,ta,t-i.val.J -i.nce.l.Jl.Jan,te..6 da cJr..-i.anç.a ao daJr.. 0.6
pJr..-i.me.-i.Jr..o.6 pa.6.6O.6. OutJr..al.J mãe.l.J, e..6.6a.6
.6e.m
duv-i.da
ma-i..6 nume.Jr..o.6a.6, 6-i.caJr..ão oJr..gu.tho.6a.6 ao
ve.Jr..e.m
.6e.U.6
6-i..thol.J
.6e.de.l.Je.nvc.tve.Jr..e.m.
A
cJr..1.anç.a não pode. de.-i.xaJr..
de. l.Je.n,t-i.Jr.. a,tJr..avel.J de. me.-i.ol.J da comun-i.caç.ão que.
.6 e.e.1.J,tabe..te.ce. e.ntJr..e. a mãe.
e.e..ta pJr..ópJr..-i.a, 0.6
d-i.ve.Jr..l.Jo.6
l.Je.nt-i.me.n,tol.J que. a l.Jua at-i.v-i.dade. .túd-i.ca .6ul.Jc-i.ta.
Ae.xpJr..e.l.Jl.Jão me.,ta6óJr..-i.ca de.I.JI.Je.1.J l.Je.nt-i.me.ntol.J
e,
de.
ce.Jr..-ta mane.-i.Jr..a, tJr..anl.Jm-i.,t-i.da pOJr.. e.1.J1.Je. cana.t.
t
como
1.Je.a mãe. pude.l.Jl.Je. d-i.ze.Jr.. d-i.ante. dol.J pJr..-i.me.-i.Jr..ol.J
pa.6.6O.6
a.te.gJr..e.1.J do 6-i..tho: 'E.te.
e
a.tguem que. l.Jabe. andaJr..
e
a.tguem que. -i.Jr..á .tonge. ••• a.tguem que. cam-i.nha
.60-zinho ••.
li' (Soulé e Lebovici, 1980, p. 168).Mas, como coloca Winnicot (1982),
"1.Je. OI.J be.bê.1.J não
l.Jao de.l.Je.jadol.J, e..te.1.J l.Jao uma caJr..ga
de.tJr..aba.tho
e.um
e.mbaJr..aç.o
P0I.J-i.t-i.vo".
Se os filhos nao são desejados, os pais naocon-seguem urna identificação especular com eles e o mais
prova-vel é que se transformem num mau objeto. Neste caso, pais e
filhos serão infelizes.
Nem sempre a situação se configurará num dos
muito bem motivados no início podem evoluir favoravelmente.
Tanto mae biológica quanto mãe adotiva pode ser acometida de
sentimentos ambivalentes, que interferirão na relação
filho.
mae-Portanto, através de suas interações, pais e
fi-lhos farão o discurso da sua satisfação ou da sua
insatisfa-çao.
1.2 -
A ADOÇÃOA adoção sempre ocorreu nos países de direito
ro-mano e só após a primeira guerra mundial, ocorreu nos países
de direito anglo-saxão. Certamente no mundo sempre nasceram
crianças que, por motivos morais, legais e sociais, ficaram
sem famílias.
Ao longo da história, encontraremos a lei e a
re-ligião ora se encontrando, ora se divergindo nesse sentido.
O certo
é
que desde os tempos mais remotos as sociedades hu-manas tiveram o incômodo dos filhos sem pais. Emcontra-par-tida, sempre existiram no mundo inteiro (e parece que se to~
nam cada vez mais freqllentes) os casais sem filhos e esses
casais, de maneira aberta ou não, são em geral alvo da
cu-riosidade ou preocupação dos que os cercam. E o que acontece
é
que medos, sentimentos bem e mal fundados permeiam o en-contro desses dois segmentos da sociedade ou, muitas vezes,Assim, alguns casais já se colocam em
contra a idéia da adoção. Outros, por sua vez, que
principio
desejam
adotar uma criança, não encontram um caminho muito
facilita-do, do ponto de vista da lei, atribuindo-se às suas
exigên-cias não razoáveis a não realização da adoção ou a sua
rea-lização por uma forma ilegal, coisa muito comum no nosso
meio.
Apesar de toda a evolução de nosso tempo, sabemos
que existe uma discriminação entre as crianças nascidas
den-tro e fora do casal. As instituições que abrigam menores
abandonados lutam com muitas dificuldades quando pretendem
implementar programas de adoção, indo de encontro a uma
se-rie de dificuldades por parte da sociedade, todas elas, no
fundo, alimentadas pela incerteza da adoção, incerteza
quan-to à verdadeira integração desse filho adotivo no seio da
familia. A concepção que, em geral, se tem da adoção é cheia
de mitos e preconceitos alimentados pela ignorância do
as-sunto ou pela atenção seletiva aos casos mal sucedidos.
Acreditamos que muita infelicidade poderia ser
evi-tada e mais casos felizes poderiam acontecer se
dispusésse-mos de um pouco mais de conhecimentos que viessem iluminar
um pouco mais a nossa mentalidade sobre o assunto.
2 --
OBJETIVOS
comparativo das interações pais e filhos adotivos e pais e
filhos biológicos, avalia~ a~ po~~ibilidad~~ d~
na adoCão
po~~ibilitandoum
maio~ conh~cim~ntodo
a~~unto ~m~lho~ comp~~~n~ão
do
p~obl~ma.Na busca dos objetivos gerais, esperamos atingir
outros mais específicos, como:
Id~nti6ica~ al9un~ indicado~~~ d~ ~uc~~~o
na
adoCão.
Id~nti6ica~ 6ato~~~ d~ ~~m~lhanca~
na
int~~acãopai~ ~ 6ilho~ biolô9ico~ ~ pai~ ~ 6ilho~
adoti-vo~.
Id~nti6ica~ 6ato~~~ d~ di6~~~nça~
na
int~~ação~nt~~ pai~ ~ 6ilho~ biolô9ico~ ~ pai~ ~ 6ilho~
adotivo~.
3
DEFI~IÇAO
DO PROBLEMA
Já
mencionamos que muito se critica a lei da ado-çao e muita discussão é cabida em relação às suas exigências.Mas nao nos parece que o motivo pelo qual muitas adoções
dei-xem de ser realizadas ou ainda, mesmo que realizadas, nao
-sejam tão felizes, tenha tanto ou tão somente a ver com a
lei. Parece-nos que tais motivos têm mais a ver com a
menta-lidade e a opinião pública: o filho adotivo sempre despertou
curiosi-dade, rejeição, compaixão, estranheza •.• sentimentos
nasci-dos de preconceitos, fábulas e da falta de conhecimentos.
Uns proclamarão a adoção como ato de caridade, prova de
ab-negação, outros a desaconselharão a quem quer que seja e
cen--
-surarao a mae que abandonou o filho.
Pelo exposto, muitas sao as questões que
interes-sam a Psicologia responder quanto ao sucesso na adoção e
neste estudo pretendemos tratar de algumas.
-- Podená um
ea~aloeupan no mundo
de
uma
eniança
que não genou, todo o
e~paçoque oeupam
a~ 6iguna~panen-tai~,
pneenehendo na vida
de~taeniança todo
oque um pai
e
uma mãe bem
~ueedido~pneenehem?
não a genou, tudo o que pode
~igni6ieanum 6ilho
de~ejado?-- Podenão
pai~e
6ilho~ adotivo~ eon~tnuinentne
hi uma nelação equipanável
ã
dOh
pai~e
6ilho~ biolõgieo~?~ interessante observar que o tema da adoção está
presente nos mitos e Freud atribuiu aos mitos valor
univer-sal por estarem eles calcados na vida psíquica. Assim,
segun-do Lebovici, a análise segun-dos mitos corresponde ao que se
modo p4ivilegiado
de
d~amatizaçãodo conólito edipiano
e
da
angú~tia
de
ca~t~ação" (Lebovici, 1980, p. 593). Segundoes-te autor, as fantasias elaboradas pelos pais adotivos sao as
mesmas de todos os pais quando o conflito edipiano se torna
consciente como, por exemplo, na análise.
4 -
H I PÓTESES
4.1 --
HIPÓTESE GERAL
"A interação entre pais e filhos bio16gicos tende
a ser mais cooperativa e amiga do que a interação entre pais
e filhos adotivos".
4.2 --
SUBHIPÓTESES
"Os componentes da família bio16gica percebem - se
como mais 'proximos' do que os componentes da família
adoti-vali.
"Os componentes da família bio16gica percebem-se
como mais 'afetuosos' do que os componentes da família
ado-tiva" .
"Os componentes da família adotiva, percebem-se
como mais 'egocêntricos' do que os componentes da família
"Os componentes da família biológica percebem-se
como mais 'gentis' do que os componentes da família adotiva ".
"OS componentes da família biológica percebem-se
como mais 'prestativos' do que os componentes da família
adotiva" .
Na hipótese geral, testaremos, na interação de
pais e filhos adotivos e de pais e filhos biológicos, a
pre-sença da dimensão "Cooperativo e amixo x Competitivo e
Hos-til" proposta por Wish
e.:t
al..i.i (1976). Falaremos sobre estadimensão mais adiante.
No nosso trabalho essa dimensão está representada
por determinados itens dos questionários. A determinação
des-tes itens se deve ao fato de terem sido eles percebidos
pe-1 os ]U1ZeS " (1) que co a oraram conosco, como componen es 1 b t da
referida dimensão. Os juizes indicaram vários itens no
tionário A-I (respondido pelos pais) e vários itens no
Ques-tionário A-2 (respondido pelos filhos). Consideramos esses
itens como 11 fatores 11 da dimensão "Cooperativo e amigo x
Com-petivivo e Hostil".
Dentre os itens selecionados (2) , cinco estão
apre-sentados na mesma forma e conteúdo nos 'dois questionários,
(1) Exporemos o trabalho dos juizes ao tratarmos da valida-ção de conteúdo dos instrumentos utilizados.
correspondendo-se perfeitamente; sao eles: "Proximidade",
"Afetuosidade", "Egocentrismo", "Gentileza" e
"Prestabilida-de". Estes cinco fatores constituem as variáveis de nossas
subhipóteses.
5 --
DELIMITAÇÕES E LIMITAÇÕES
Nosso estudo se restringe a um universo
constituí-do de pais e filhos aconstituí-dotivos e pais e filhos biológicos.
Dentre aqueles estão tanto os pais adotivos que têm também
filhos biológicos como os que apenas têm filhos adotivos.
Filho adotivo no nosso trabalho, é aquele que está
registrado como filho do casal que o adotou, em idade
preco-ce, pelo processo de adoção plena, de caráter irrevogável.
Poderá também incluir aqueles casos que nao passaram pelos
trâmites legais, mas que tendo o filho sido registrado desde
cedo com filho legítimo do casal, correspondem, pois,
à
mes-ma situação da adoção plena, de caráter irrevogável.No nosso trabalho, os filhos adotivos deverão
tê--lo sido com o máximo de seis meses de idade. Consideramos
a idade máxima de seis meses fundamentando-nos nos
conheci-mentos de que dispomos em relação
à
evolução de "uma percep-ção diacrítica" e da personalizapercep-ção; a partir de seis mesesOs filhos adotivos, assim corno os biológicos,
de-verao contar no momento da pesquisa, com a idade minima de
dez anos para que possam compreender e responder
mente aos questionários.
adequada-Urna restrição se prende ao nivel sócio-econômico
da familia que deverá pelo menos corresponder ao que se pode
chamar de classe média-inferior.
Corno nao podemos contar com levantamentos nem
in-formações estatisticas a respeito dessa população no Brasil
e tendo em vista os limites de tempo, só podemos contar com
reduzido número de casos. Portanto, não são aleatórias as
informações obtidas e, assim sendo, a generalização dos
re-sultados será reduzida.
6
DEFINIÇÕES DE VARIÁVEIS E TERMOS
Cooperativo e Amigo x Competitivo e Hostil: urna
das dimensões propostas por Wish et alii(1976) corno próprias
das interações diádicas. Neste estudo, o indice desta
dimen-sao é obtido pelos escores das respostas dos sujeitos aos
itens apontados pelos juizes corno componentes desta
dimen-são: quanto mais baixa a contagem, mais cooperativa e amiga
é a relação.
proximidade: indice dado pelas respostas ao item I
mais baixa a contagem, mais próximo, o sujeito que responde
percebe o outro, sobre o qual responde o questionário.
Afetividade: índice dado pela resposta ao item 26
do Questionário A-I e ao item 29 do Questionário A-2. Quanto
mais baixa a contagem, mais afetivo, o sujeito que responde
percebe o outro, sobre o qual responde o questionário.
Egocentrismo: índice dado pelas respostas ao item
24 do Questionário A-I e ao item 21 do Questionário A-2.Quillr
to mais baixa a contagem, menos egocêntrico o sujeito que
responde percebe o outro, sobre o qual responde o
questio-nário.
Gentileza: índice dado pelas respostas ao item 28
do Questionário A-I e ao item 27 do Questionário A-2. Quanto
mais baixa a contagem, mais gentil, o sujeito que responde
percebe o outro, sobre o qual está respondendo o
questioná-rio.
Prestabilidade: índice dado pelas respostas dadas
ao item 25 do Questionário A-I e ao item 22 do Questionário
A-2. Quanto mais baixa a contagem, mais prestativo, o
sujei-to que responde percebe o outro, sobre o qual está
respon-dendo o questionário.
A contagem em cada um destes itens vai de 1 a 5
CAPITULO I I
FUNDAMENTAÇÃO TEORICA
1 --
UMA FUNDAMENTAÇÃO DE PSICÁNALISE
Quanto
à
fundamentação teórica do nosso trabalho, buscamo-la em duas vertentes: uma, a da psicanálise e outra,a da psicologia social. A primeira refere-se à interação en-tre pais e filhos como fator decisivo na formação da
perso-nalidade. A literatura psicanalítica enfatiza a relação
mãe--filho nos primeiros anos de vida e, neste sentido, nos
orien-tamos pelo trabalho de René Spitz, Bowlby e outros, que
atra-vés do tratamento psicanalítico de crianças e adultos e da
observação direta com crianças, propoem uma gênese da
rela-ção objetaI. No estudo destes autores, esperamos antever as
possibilidades que têm pais e filhos adotivos de construírem
entre si uma interação comparável à dos pais e filhos
bioló-gicos.
Da psicologia social buscamos os trabalhos de Wish,
Deutsh e Kaplan a respeito das dimensões das interações
in-terpessoais. O trabalho destes autores inspirou-nos um
es-quema de trabalho, uma maneira de orientar-nos dentro do
campo das interações.
Para uma avaliação da problemática da adoção no
discussão sobre alguns aspectos da lei.
1.1 --
AS RELAÇÕES OBJETAIS
Assim os psicanalistas denominam as relações que o
bebê recém-nascido estabelece com a mae ou substituta na sua
estréia interativa no mundo e que o levará a se diferenciar
como sujeito distinto do outro, o objeto.
Para que esse pequenino ser imaturo evolua e venha
a se tornar uma pessoa, não basta o fato instintivo da
"ma-ternagem" bio16gica, mas será ainda necessário o cuidado
de-liberado, prudente e dedicado, fruto de toda uma aquisição
cultural e humana. Winnicott reserva para se referir à
qua-lidade desse cUidado, o termo "devotamento". Portanto, o c~
portamento que a criança desenvolve não resulta
exclusiva-mente do desenvolvimento do seu sistema nervoso, pois muito
dependerá da relação que venha a se estabelecer. Spitz (1983)
denomina "diálogo" ao ciclo de reações ação-reação-ação
se-qüencial no quadro de referência das relações mãe-filho e o
considera o fator mais importante para tornar a criança
ca-paz de construir gradualmente uma imagem coerente de seu mwr
do, transformando os estímulos sem significado em signos
sig-nificativos.
Na etapa bio16gica (in utero) as relações do feto
com a mae são parasíticas. Parece um tanto difícil acreditar
isto
é,
antes de um senso de individualidade, ou pelo menos antes de uma integração. Os diversos autores atribuem maiorou menor importância ao que possa acontecer na vida fetal ou
logo após o nascimento. Diante de estudos e observações de
vários autores, podemos aceitar que por volta dos seis meses
ocorre um avanço na capacidade do bebê de relacionar-se com
a mae: nesta época o bebê já é capaz de agarrar e soltar um
objeto, ele já dispõe de um senso de que existe ele e os
ob-jetos, ele e a mãe distintamente. Daí para a frente, a
soa da mae será muito importante para ele e a separaçao
pes-
de-pois desta fase, será, sem sombra de dúvidas, muito
prejudi-cial. Mas, corno lembra Winnicott (1982), isto não quer dizer
que as fases anteriores foram destituídas de importância;nas
fases anteriores, os cuidados adequados, "o devotamento" da
mãe foram condição "sine qua" , para que agora o bebê esteja
despontando na sua personalização. Só que enquanto muito
pe-queno o cuidado certo era sentido pelo bebê corno mais
impor-tante do que a pessoa específica que o dispensava. Acontece
que "normalmente essa pessoa, capaz de dispensar os cuidados
certos, é a mãe ou quem verdadeiramente assumiu o seu lugar.
Aceitando-se que em geral o bebê não se conhece
como individualidade antes dos seis meses, a separaçao da
mãe dentro desse período não o afetará tanto quanto se
ocor-resse mais tarde. A prova da importância desse período para
os psicanalistas está no fato de nele se encontrar o
escla-recimento para a origem das psicoses. Será necessário que
desde bem cedo a criança disponha de alguém "devotado", pois
garantidos simplesmente pela natureza.
Um fato importante na fase precoce e bastante
dis-cutido entre os psicanalistas ã o do "trauma do nascimento".
Freud acreditou nele e a ele ligou a sintomatologia da
an-siedade.
Winnicott (1982), baseado na sua prática
psicana-lítica, divide a experiência do nascimento em três
catego-rias:
la -- Experiência do nascimento normal, saudável;
fornece padrão de vida natural e será um entre os vários
fa-tores do desenvolvimento da confiança, do sentido de
seqüên-cia, estabilidade, segurança, etc.
2~ -- Experiência traumática comum. Se misturará a
vários fatores traumáticos subseqüentes.
3~ -- Experiência extrema do nascimento traumátic~
Esse autor evolui suas idãias no sentido de nao
considerar que a ansiedade seja determinada pelo trauma do
nascimento pois, se assim o fosse, as pessoas que nasceram
naturalmente nao teriam ansiedade. Ele prossegue ainda
de-monstrando a inadequação do termo ansiedade como atributo de
um bebê ao nascer, pois para Winnicott, ansiedade implica em
inconsciente reprimido, e repressão ã coisa de que ainda nao
dú-vida a ligação entre ansiedade e trauma do nascimento e
su-gere, a partir de sua prática clínica, que um nascimento
traumático pode determinar sim o padrão de perseguição
(pa-ranóia) ou ter ligações com doenças psicossomáticas.
Winni-cott lembra que Freud já mostrara também que a experiência
do nascimento não tem a ver com qualquer espécie de
separa-ção do corpo-da-mãe, pois o feto não dispõe ainda de uma
consciência de si como objeto.
Durante o primeiro ano de vida a criança passa por
um estágio de simbiose psicológica com a mãe a partir do qual
a criança estará preparada para o próximo estágio em que se
desenvolverão as relações sociais. A figura do pai ganhará
destaque na medida em que a criança crescer mas, na verdade,
a eficiência da mãe terá muito a ver com o apoio emocional
fornecido pelo pai. O sistema fechado que constitui a
rela-ção mãe-filho, no período inicial, está inserido num
univer-so maior, que e a família ou a instituição em que a criança
esteja. Este universo é transmitido para a criança através
-da pessoa que satisfaz as necessi-dades dela, a mae ou
subs-tituta. Há uma diferença muito grande no que a criança
rece-be desse universo maior caso seja ele a família ou uma
ins-tituição.
Para a criança inserida no universo da família, a
simples presença da mãe será estímulo para as suas respostas.
A busca de comunicação do bebê para com o parceiro (mãe) e
evidente e cada vez mais dirigida. O bebê logo será capaz de
par-ticipa dele. O êxito aumenta o prazer e a criança logo
de-monstrará tendência a repetir toda ação que dá prazer, assim
como a de evitar toda ação que leva ao fracasso. Também a
mae, por sua vez, facilitará todas as ações que lhe são
agra-dáveis. Portanto, as preferências da mãe terão muita
influên-cia sobre o desenvolvimento da criança. Segundo Spitz (1983),
se a atitude da mãe é maternal e carinhosa ela aprecia
ticamente todas as atividades do filho, sendo que "0
g!1.au de
6acitita~ãopa!1.a
a~ a~õe~do bebê
é
p!1.opiciado
peta~ a~õe~ con~ciente~
da mãe
e
~impO/1.
~uaó atitude~ con~ cie.nte~".
pra-ma-i-o/1.
-nao
Essas atitudes inconscientes têm duas origens
di-ferentes: uma se liga às solicitações do superego materno e
a outra, às aspirações do ideal do ego materno. As do
pri-meiro tipo, tenderiam a ser mais controladas e as do segundo
-tipo, seriam mais facilitadoras. Mas nao devemos tomá-los
como rigidamente divididas, pois tal nao e a natureza da
vi-da psíquica: nenhuma mãe é so facilitações ou só restrições;
em toda mãe "boa e normal" há os dois tipos de correntes
ope-rando nas relações e que propiciarão à criança desenvolver os seus próprios controles e mecanismos de defesa (Spitz,
1983) .
Nessa relação há um gradiente da mae para o filho,
mas também um gradiente do filho para a mãe. Se a presença da
mae provoca respostas no bebê, também a presença deste
eli-cia respostas na mae. Durante o seu caminho para se tornar
imoul-sos, tanto os libidinais quanto os agressivos, tendo corno
alvo a mãe. Tendo deitado luz sobre o desenvolvimento
psi-cossexual, a psicanálise considera hipócrita a afirmação de
que a criança é inocente, isto porque nega os fatos,
princi-palmente aquele de que presenciar certas atividades infantis
suscita tensão no superego do adulto. Por isso, a mae sera
mu"i to mobilizada diante das seduções apresentadas por seu
fi-lho, e várias defesas entrarão em ação. Spitz (1983)
salien-ta o quanto e especial o relacionamento na díade mãe-filho
mantida por vínculos afetivos extraordinariamente poderosos.
Ele ressalta corno de certa forma, ainda não é explicável
co
-mo que a boa mae parece muitas vezes advinhar as
necessida-des do filho. A boa mãe apresenta aguçada sensibilidade e i~
tuição do que se passa com o filho. Por outro lado, o bebê
também capta o humor da mãe, seus desejos conscientes e
in-conscientes. Se ele se molda conforme os desejos da mãe, e
porque de alguma maneira os percebe. Essa comunicação
pre--verbal entre mãe e filho, segundo Spitz, ainda não foi
con-venientemente estudada e ele acredita que a cibernética e a
teoria da comunicação serão muito úteis nas futuras
investi-gaçoes desse assunto.
Voltando ao recém-nascido, ele apenas pode
descar-regar a tensão que surge de suas necessidades, manifestando
emoçoes difusas, por exemplo, com gritos. Assim, ele
desper-ta a atenção de alguém, podendo eventualmente obter ajuda
externa de que necessita. E Spitz (1983) lembra o comentário
de Freud
(apud
Spitz, 1983) de que "~~~a v~a d~ d~~eangaoca..6iona.Jt
Oentendimento c.om ou.tJta..6
pe.6.6 oa.6".Fazendo incursões na comunicação animal, Spitz
en-contra aí uma semelhança, num aspecto, com a comunicação do
recém-nascido: o egocentrismo dessa comunicação no sentidode
que constitui apenas a expres~ão de processos interiores e nao se destinam a ninguém. Posteriormente, o ser humano em
evolução, chegará
à
comunicação dirigida (volitiva e alocên-trica) que opera por meio de signos e sinais semânticos, cu~minando posteriormente na função simbólica.
Portanto, antes da formação das relações de objeto,
as formas de comunicação mãe-filho se originam a partir de
afetos e não são dirigidas. Trata-se de uma comunicação
di-ferente da comunicação entre adultos em vários aspectos.
Es-ta diferença começa pela notável desigualdade das mensagens
procedentes da criança (apenas sinais) e as mensagens
proce-dentes da mãe, que sao dirigidas. E e esta diferença, aind~
que provoca a questão de como o bebê é capaz de receber
men-sagens da mãe se elas pertencem a uma categoria que ele
ain-da não está capacitado a perceber. Segundo Spitz, já foi
ex-perimentalmente demonstrado que o primeiro reflexo
condicio-nado no bebê surge como uma reação a uma estimulação da
sen-sibilidade profunda, isto é, do sistema cenestésico. Para
Spitz, a ausência de percepção diacrítica intensifica a
re-cepçao cenestésica no recém-nascido, enquanto que o adulto
parece inconsciente dos signos de comunicação cenestésica,
a nao ser que se trate de pessoa excepcionalmente sensível.
re-primimos as mensagens de nossas sensaçoes profundas,
tentan-do negá-las ou racionalizá-las. Ele acredita que as mães
de-senvolvem esta sensibilidade durante a gravidez e pós-parto
e, como reforço dessa idéia, lembra a freqllência de
proces-sos de regressão que ocorrem na gravidez, parto e lactância.
Os intercâmbios entre mae e filho continuam sem
interrupção, mesmo que a mãe não esteja consciente deles.
"con.6cie.n-te. ou incon.6cie.nte., cada pafLc.e.ifLo na
du-pla mãe.-6ilho pe.fLce.be. o a6e.-to do OU-tfLO e., pOfL
.6ua
ve.z,
fL~.6ponde.c.om a6e.to, numa -tfLoca a6e.-tiva,
fLe.CZ-pfLoca e. c.ontZnua. E.6-ta.6 -tfLOc.a.6 .6ão
6undame.ntalme.l1--te. di6e.fLe.n6undame.ntalme.l1--te..6 da.6 que. 6undame.ntalme.l1--te.mo.6 opofLtunidade. de.
Ob.6e.h-vafL e.ntfLe. adul-to.6. Be.m no inZc.io da in6ânc.ia
o~pfLOCe..6.60.6 a6e.-tivo.6 ainda não 60fLam con-taminado.6
DO~e.le.me.n-to.6 ofLiginado.6 da pe.fLce.pção diac.fLZ-tica:
tam-pouco 60fLam .6ubme.-tido.6
~e.labofLaçâo
.6e.cund~fLiape.-lo.6 pfLOCe..6.60.6 do pe.n.6ame.nto. Até:m di.6.6o, a.6
con.6e-qa~ncia.6
da.6 -thOc.a.6 a6e.-tiva.6 e.ntfLe. mãe. e. 6ilho .6ão
ace..6.6Zve.i.6
~Ob.6e.fLvação difLe.ta, o que. e.m
adulto.6
.6e.fLia e.xce..6.6ão. No
be.b~e..6tamo.6 lidando c.om
pfLO-c.e..6.60.6 a6e.tivo.6 e.m .6tatu-ó na.6ce.ndi,
Ob-óe.fLV~ve.i.6,pOfL a.6.6im dize.fL A..n vivo"
(Spitz, 1983, p. 132).E, invariavelmente, é de suprema importância essa
primeira relação do bebê com um parceiro humano. No primeiro
ano de vida os afetos de prazer e os de desprazer têm igual
importância para a formação da personalidade. A própria
na-tureza se encarrega de impor certas frustações: o nascimento,
que para alguns seria sempre traumático, depois as sensaçoes
de fome e de sede a que a criança ocasionalmente estará
su-jeita, o desmame e ainda toda a tendência para a autonomia e
separação imporá a criança certas frustrações ao mesmo tempo
que a ativa e desenvolve. são frustrações que ocorrem
Spitz lembra Freud:
".6e.I1.6açõe..6 de. l1atuILe.za agILadá.ve.l l1ão têm l1ada
c..a-paz de. impe.lZ-lo.6 paILa além de.la.6 me..6ma.6, ao pa.6.60
que. a.6 de. de..6pnaze.n têm e..6.6e. 6aton
110mai.6
alto
gILau, a.6 de. de..6pnaze.IL impe.le.m
l1adiILe.ção de.
mudal1-ça ... " .Nem todas as frustrações são evitáveis e, corno lembra Bowlby
(1982), a arte de ser bons pais está em saber distinguir as
frustrações evitáveis das inevitáveis.
Quando a criança se torna capaz de urna percepçao
diacrítica (aos 6-8 meses), ela distinguirá um estranho de
um amigo e geralmente rejeitará o estranho. Este
comporta-mento
é
carregado de ansiedade, a primeira manifestação de ansiedade e Spitz a destacou corno a "ansiedade dos oitome-ses". Trata-se de urna resposta a urna situação de desprazer
específica e não mais difusa corno as primeiras tensões
fi-siológicas. A crianç~então, já transmite signos voluntários e deliberados, aos quais o meio ambiente responde de modo
mais ou menos consistente, satisfazendo suas necessidades.
Dispondo cada vez de um número maior de traços de memória, a
criança, por volta dos oito meses, ao perceber a face do
es-tranho corno face e nao mais corno um sinal gestáltico, e
con-frontada com os traços de memória da face materna e,
reco-nhecendo a diferença, rejeitará o objeto estranho. Isto
su-gere que os traços de memória da face materna são
catexiza-dos e que, portanto, urna relação objetaI se estabeleceu, ou
seja, a mae se tornou no seu objeto de amor. A isto
corres-pondem grandes evoluções no nível somático corno a
o
ponto em que a diáde atinge este estágio variará,pois dep~nderá dos dois indivíduos e ainda das condições am-bientais e culturais. Em nossa cultura, a relação íntima
en-tre o bebê e urna única figura materna, no primeiro ano de
vi-da, tem sido tradicionalmente asseguravi-da, embora a vida
mo-derna tenda cada vez mais a dificultar esta exclusividade da
figura materna.
Mas se o universo maior no qual a criança está
in-serida for uma instituição, ela, muito provavelmente, nao
-contará com a figura constante que a poderia satisfazer e
com a qual construiria toda uma relação objetaI. Toda
esti-mulação que a presença da mãe significa, todas aquelas
tro-cas às quais já nos referi~os, não terão como ocorrer. As
conseqüências de situações assim tão dráticas têm sido de~
cri tas por vários autores, dentre e,les, René Spitz (1983),
Bowlby (1981, 82) e Lebocici (1980).
1.2 --
INTERAÇÃO ENTRE PAIS E FILHOS E ADOÇA0
Talvez em diferentes culturas e em diferentes
epo-cas, ter filhos tenha tido diferentes significados para
ho-mens e mulheres mas, em qualquer época e em toda cultura,
is-to sempre demandou cuidados por parte dos pais ou
substitu-tos, cuidados estes que tanto mobilizam quanto dependem das
condições psíquicas desses pais, seus conflitos, suas
Os pais biológicos podem tornar-se pais sem terem
tido tal pretensão; a mãe biológica pode dizer "fui pega".
Assim, a paternidade poderá criar desde uma situação de
ple-na aceitação a ~ma de plena rejeição, esta evidenciada, as vezes, em casos de abortos. Já os pais adotivos têm que
to-mar uma decisão num nível a que não precisam chegar os pais
biológicos. O casal que decide adotar uma criança terá que
mostrar-se muito desejoso de fazê-lo, pois terá decidido
transgredir a esterilidade, "contrariar o oráculo". Não
que-remos com isto dizer que os pais adotivos possuam sempre as
melhores motivações e que a plena aceitação do filho adotivo
esteja sempre garantida. Os conflitos que estão na base das
dificuldades procriativas de uma mulher podem ser tais que
venham também determinar o seu insucesso como mae caso ela
venha adotar uma criança. Já comentamos na introdução, que a
qualidade da motivação dos pais, tanto adotivos como
bioló-gicos, pode variar desde uma formação reativa a urna
sublima-ção, isto é, desde mecanismos mais regredidos a mecanismos
mais adaptados. Nosso intuito aqui é focalizar que a
consan-gninidade entre pais e filhos pode nao coincidir com uma
aceitação plena (assim corno a ausência de ligação de sangue
não impede a possibilidade de uma plena aceitação). Além
disto, como vimos até aqui, a respeito da importância da uma
figura materna para o desenvolvimento da criança, fica
evi-denciado que a culminância da paternidade estará na
satisfa-ção que ambas as 'partes, pais e filhos, possam experimentar
nessa interação ou, por outras palavras, será mais
Encontramos na obra de Soulé & Lebovici (1980) ,
que na prática clinica lidaram com pais e filhos adotivos a
descrição de vários aspectos interessantes da dinâmica
in-trapsiquica e que subjazem na interação entre esses pais e
filhos.
Os filhos existem na fantasia dos pais muito antes
de realmente existirem, em fantasias carregadas de
diferen-tes afetos, diferendiferen-tes receios. Mas alguns casais
enfrenta-rao o problema da esterilidade. Destes, alguns casos serao
de esterilidade propriamente dita, isto é, causada por
ano-malias anatômicas, infecções agudas ou cirurgias. Outros,
viverão o drama da esterilidade psicogênica, uma das
mani-festações do paradoxo da natureza humana. são os que, por
conflitos intrapsiquicos, enfrentarão dificuldades para
pro-criar. Alguns dirão, a nivel consciente, que não desejam ter
filhos ou admitirão o seu temor. Outros só terão consciência
de seu desejo de tê-los, mas nao o conseguem realizar. Na
crença popular, este tipo de esterilidade é visto como um
castigo de Deus. Como observa Langer (1981), apesar do
avan-ço das técnicas 'ginecológicas, a freqüência da esterilidade
psicogênica parece aumentar nos nossos tempos e o baixo
in-dice de sucesso das técnicas mecanicistas (como a
insemina-ção artificial) (Silber, p. 139) vêm mostrar a eficácia dos
mecanismos psicológicos.
Assim, muitos casais viverão uma longa frustração
permeada de muitas relações infrutiferas e de muitas
De qualquer forma, a esterilidade constituirá
sem-pre uma perda nascísica, pois procriar constitui um ideal do
ego e a esterilidade impõe uma renúncia a esse ideal. Os
ca-sais conseguirã~então, diferentes graus de elaboração da sua problemática, de acordo com as suas condições
psicológi-cas. Uns recusarão de pronto a adoção, por mecanismos
diver-sos: repressão, fuga do problema, ressentimento,
intelectua-lização .•. outros, relutarão por vários anos ante a idéia de
adotar urna criança; ficarão em moratória, corno diria
E.Erik-sono Outros ainda poderão se precipitar, tornando decisões
mal pensadas e correndo o risco de ser presa fácil de
pes-soas inescrupulosas, corno nos casos que têm sido mostrados
na televisão ultimamente.
Kraft e colaboradores (1980) estudaram as reaçoes
psicológicas de casais sem filhos e encon-traram que, além da
perda narcisística, as tarefas intrapsíquicas dessa
elabora-ção incluem a restituielabora-ção da deficiência da imagem corporal
e estabelecimento da importância da paternidade como fase do
desenvolvimento. Esses autores acreditam que urna resolução
adaptativa será condição para o sucesso da paternidade na
adoção.
Noutro estudo, Brand, Roos e Merwe (1981)
investi-garam as diferenças sexuais na aceitação da infertilidade e
encontraram que a aceitação dessa condição se desenvolve mais
lentamente na mulher.
castração e ilustrar a transgressão da esterilidade.
Para muitos pais adotivos a angústia se concentra
na imperiosidade de revelar à criança as circunstâncias de sua filiação. Esta é uma grande verdade a ser enfrentada na
adoção. A dificuldade em enfrentá-la se prende à necessidade de negar a cena primitiva, necessidade presente tanto nos
pais adotivos quanto nos biológicos. A necessidade de levar
a criança a negar a cena primitiva, porque as crianças devem
ser inocentes, é prática comum na nossa sociedade e no caso
dos pais adotivos, corno informar urna criança a respeito das
circunstâncias de sua vinda ao mundo, se não lhe fornecermos
urna clara informação sexual? Ao refletir sobre essa
interdi-ção que leva os pais a negar a cena primária, e toda essa
dificuldade em relação a dar aos filhos claras informações
sexuais, lembramo-nos aqui outra vez das considerações de
Becker (1976) a respeito dos tabus sexuais sempre
resguarda-dos pelo homem, pelo fato de o sexo apontar para o ciclo da
vida e este lembrar ao homem a sua finitude.
Mas, voltando à dificuldade dos pais, e corno
ana-lisa Soulé & Lebovici (1980), para os pais adotivos, revelar ao filho a sua adoção, significa dizer: "nô~
não
~ô mantemo~~elaç~e~, ma~ ela~ ~ão 4uin~'I. Já os pais biológicos tenta-rao negar suas relações sexuais contando estórias da
cego-nha ou outras semelhantes. Assim, nos dois casos, os pais
buscarão aliviar a angústia e elaborar seus fantasmas, uns
fazendo crer que procriaram e outros tentando negar suas
Para os pais adotivos motivados por urna formação
reativa, a necessidade de revelação constituirá urna angústia
pungente, pois para eles a adoção visa urna cura e a
revela-ção fará retornar o reprimido, isto é, a angústia de
castra-çao, a ferida narcísica. Revelar será defrontar o trauma e,
então, é preciso impedir essa revelação. Essa necessidade de
negar pode atingir um nível patológico. Os pais nestas
con-dições poderão chegar a extremos de manter expedientes
ab-surdos a fim de salvaguardar o segredo. ~ o caso daqueles
que se mudam, cortam relação com parentes e amigos ou
inven-tam estórias descabidas com a pretensão de negar
criança a sua condição (a cena primitiva) .
para a
No entanto, parece impossível imaginar que urna
criança possa crescer, tornar-se adulta e viver a sua vida
inteira ignorando sua condição de adotada. Se os pais
tende-rem mais para urna sublimação e estivetende-rem bem identificados
com seus filhos, a revelação não será tão penosai pelo menos,
eles conseguirão, ao fazê-la, passar sentimentos e atitudes
adequados, pois o importante não estará só na revelação em
si, mas no que eles passarem quanto ao que pensam do
adulté-rio, da mãe solteira ou do que quer que tenha a ver com os
pais naturais da criança. Esses sentimentos e atitudes
pas-sados para a criança, em relação a sua origem e aos seus pais
biológicos terão muito a ver com a reaçao que a criança
pos-sa apresentar.
Quanto a oportunidade do momento, a maioria dos