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Esperanças e Decepções: Uma análise crítica da prática pastoral do neopentecostalismo na Igreja Internacional da Graça de Deus sob a perspectiva da Práxis Religiosa

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

ESPERANÇAS E DECEPÇÕES

Uma análise crítica da Prática Pastoral

do neopentecostalismo na Igreja Internacional

da Graça de Deus sob a perspectiva da Práxis Religiosa

Paulo Rodrigues Romeiro

São Bernardo do Campo

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BANCA EXAMINADORA

___________________________________ Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva – UMESP Presidente

_____________________________________ Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos – UMESP

__________________________________ Prof. Dr. Clóvis Pinto de Castro – UMESP

_____________________________________________ Profa. Dra. Cristina Bardelli Cordeiro – Umiv. Ibirapuera

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Dedicatória

À minha esposa Simone, e aos meus filhos, Alyne e Adryel.

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Agradecimentos

À Universidade Metodista de São Paulo, que proveu estrutura e ambiente adequados para o desenvolvimento desta tese.

Ao IEPG (Instituto Ecumênico de Pós-Graduação), por prover parte da bolsa de estudo.

À Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal) pelo apoio financeiro, essencial para o incremento desta pesquisa.

Aos professores e professoras, colegas e funcionários do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, pelo companheirismo encorajador.

Aos membros da Igreja Cristã da Trindade, pelo apoio e paciência.

Ao Pastor Sérgio Salém, pela primeira revisão do manuscrito. Sua participação no ministério pastoral possibilitou esta pesquisa.

Ao Prof. Dr. Leonildo Silveira Campos, pela amizade enriquecedora.

Ao Prof. Dr. James Reaves Farris, pela atenção e suporte ao longo de todo o programa de doutorado.

Ao Daniel Godoy, por ter-me concedido, gentilmente, os seus préstimos. À Léia Alves de Souza, secretária do Programa de Pós-Graduação. Sua amabilidade e competência facilitaram minhas tarefas acadêmicas.

Ao prof. M.Sc. Edson d’Avila, pela sua importante participação nesta tese. Agradeço também às seguintes pessoas: Reverendo Eber Cocareli, Pastor Vilmar Choen, Pastor Isaías de Freitas, Gabriela Freitas, Pastor Joaquim de Andrade, Pastor Martinho Lutero, Prof. Dr. Ricardo Mariano e Paul Carden.

À minha esposa Simone, e aos meus filhos, Alyne e Adryel, que participaram da minha jornada.

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ROMEIRO, Paulo Rodrigues. Esperanças e decepções: Uma análise crítica da prática pastoral do neopentecostalismo na Igreja Internacional da Graça de Deus sob a perspectiva da práxis religiosa. Tese de Doutorado. Universidade Metodista de São Paulo – UMPESP. São Bernardo do Campo, SP. 2004.

Sinopse

O texto analisa a prática pastoral do neopentecostalismo na Igreja Internacional da Graça de Deus. Esta Igreja expandiu-se substancialmente no Brasil, conseguiu arregimentar um número enorme de seguidores e conquistou expressiva visibilidade na mídia. A pesquisa estuda a trajetória histórica do neopentecostalismo, o seu desenvolvimento no Brasil e os aspectos teológicos do movimento. Estuda-se também a Igreja da Graça, sua origem, sua teologia, sua estrutura de governo, seu ministério pastoral e expansão. Por estar inserida dentro do neopentecostalismo, a Igreja da Graça reflete também a sua teologia, que propõe banir a doença, a pobreza e todo o tipo de sofrimento da vida humana, a fim de produzir uma nova geração de fiéis: ricos e saudáveis. De acordo com a sua teologia, o cristão deve viver todo o tempo de sua vida livre de qualquer aspecto negativo da existência humana. Se isso não acontece, é porque ele não tem fé, está sob o poder de Satã ou tem um comportamento que desagrada a Deus. Assim, a marca do verdadeiro cristão é a plena saúde física e emocional, além da prosperidade financeira. Entretanto, a pregação neopentecostal tem produzido desapontamentos, principalmente, quando a cura física não acontece e o dinheiro não aparece. Portanto, esta tese formula uma proposta de prática pastoral de esperança que possibilite aos decepcionados com essa mensagem triunfalista retomarem a vida cristã dentro do seu espaço cristão.

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ROMEIRO, Paulo Rodrigues. Hopes and Deceptions: A critical analysis of the pastoral practices of Neo-Pentecostalism in the International Church of the Grace of God from the perspective of religious praxis. Doctoral Thesis. The Methodist University of São Paulo – UMESP, São Bernardo do Campo, SP. 2004.

Abstract

This text analyses the Neo-Pentecostal practices in the International Church of the Grace of God. This church has substantially expanded in Brazil, gathered an enormous number of followers and obtained marked visibility in the media. The research studies the historical trajectory of Neo-Pentecostalism, its development in Brazil, and theological aspects of the movement. The text also presents the Church of Grace, its origins, theology, governmental structure, pastoral ministry and expansion. Due to its insertion in Neo-Pentecostalism, the Church of Grace reflects a theology that proposes to ban sickness, poverty and all types of suffering from human life, in order to produce a new generation of believers: rich and healthy. According to this theology, Christians should live their lives free of any negative aspect of human existence. If this does not happen, it is because of a lack of faith, being in the power of Satan, or exhibiting behaviors that do not please God. As such, the mark of a true Christian is physical and emotional health, as well as financial prosperity. Nonetheless, Neo-Pentecostal preaching has produced disappointments, principally when physical cure does not occur, and financial riches do not appear. This thesis formulates a practical pastoral proposal that offers hope to those deceived by this triumphant message, with aims to return to Christian life within the space of Christian faith.

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ROMEIRO, Paulo Rodrigues. Speranzas y decepciones: Un analisis crítico de la práctica pastoral del neopentecostalismo en la Iglesia Internacional de la Gracia de Dios bajo la perspectiva de la praxis religiosa. Tesis de doctorado. Universidad Metodista de São Paulo - UMESP. São Bernardo do Campo, SP. 2004.

Resumen

El texto analisa la práctica pastoral del neopentecostalismo en la Iglesia Internacional de la Gracia de Dios. Esta iglesia creció substancialmente en Brasil, ganó un número grande de seguidores y conquistó una expresiva visibilidad en los Medios de Comunicación de Masa. La investigación estudia la trayectoria histórica del neopentecostalismo, y su desarrollo en Brasil y los aspectos teológicos del movimiento. Se estudia también la Iglesia de la Gracia, su origen, su teología, su estructura de gobierno, su ministerio pastoral y expansión. Por estar inserida dentro del neopentecostalismo, la Iglesia de la Gracia, refleja también su teología que propone expulsar la enfermedad, la pobreza y todo tipo de sufrimiento de la vida humana, cuyo propósito es producir una nueva generación de fieles: ricos e saludables. De acuerdo con su teología, el cristiano debe vivir todo el tiempo de su vida libre de cualquier aspecto negativo de su existencia humana. Si esto no ocurre, es porque el fiel no tiene fe, está bajo el poder de Satanás o tiene un comportamiento que desagrada a Dios. Así, la marca del verdadero cristiano es la plena salud física y emocional, además de la prosperidad financiera. Entretanto, la predicación neopentecostal ha producido frustraciones, principalmente cuando la cura física no se realiza y el dinero no aparece. Por lo tanto, esta tesis formula una propuesta de práctica pastoral de esperanza que posibilite a los decepcionados con este mensaje triunfalista volver a la vida cristiana dentro de su espacio cristiano.

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Abreviaturas

Abreviaturas das obras de Moltmann utilizadas:

CJC: O caminho de Jesus Cristo DC: O Deus crucificado

EV: O Espírito da Vida FV: A Fonte da Vida PV: Paixão pela vida TE: Teologia da Esperança TRD: Trindade e Reino de Deus AVD: A Vinda de Deus

Outras abreviaturas:

BLH: A Bíblia na Linguagem de Hoje

CPAD: Casa Publicadora das Assembléias de Deus IURD: Igreja Universal do Reino de Deus

NVI: Nova Versão Internacional

TP: Teología Práctica (Casiano Floristan)

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Sumário

Introdução... 13

Objetivos ... 14

Justificativa... 15

Referenciais teóricos ... 17

Metodologia ... 18

Pesquisas bibliográficas e documentais ... 18

Pesquisa de campo... 18

Pesquisa na Mídia ... 20

Método... 21

Definição dos termos esperança e decepção ... 21

Apresentação dos capítulos da tese ... 23

Capítulo 1. A trajetória histórica do neopentecostalismo... 23

Capítulo 2. Aspectos teológicos do neopentecostalismo brasileiro... 24

Capítulo 3. Análise da prática pastoral da Igreja Internacional da Graça de Deus e relatos de três casos de decepções... 24

Capítulo 4. Desafios e oportunidades para uma prática pastoral de esperança num contexto de decepção a partir de Jürgen Moltmann e Casiano Floristan... 25

Capítulo 1 – A trajetória histórica do Neopentecostalismo ... 27

1.1 O que é o neopentecostalismo? ... 27

1.1.1 Movimento ou denominação? ... 32

1.1.2 A forma de governo e organização do Neopentecostalismo ... 34

1.1.3 Origens e crescimento do Neopentecostalismo ... 36

(10)

1.1.5 A Raiz Pentecostal... 44

1.2 A implantação do Pentecostalismo no Brasil ... 47

1.2.1 Congregação Cristã no Brasil ... 47

1.2.2. Assembléias de Deus ... 50

1.2.3 Igreja do Evangelho Quadrangular... 52

1.2.4 Igreja O Brasil para Cristo... 54

1.2.5 Igreja Pentecostal Deus é Amor ... 54

1.2.6 Igreja de Nova Vida... 58

1.2.7 Igreja Universal do Reino de Deus ... 60

1.2.8 Igreja Apostólica Renascer em Cristo ... 63

1.2.9 Comunidade Sara Nossa Terra ... 66

1.2.10 Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo ... 66

1.2.11 Comunidade Cristã Paz e Vida... 67

1.2.12 Igreja Bola de Neve ... 68

1.3 Fatores de crescimento do neopentecostalismo ... 69

1.3.1 Liderança Carismática ... 69

1.3.2 Mudança de paradigma nos usos e costumes ... 71

1.3.3 A questão litúrgica... 72

3.1.4 O fator católico romano ... 74

1.3.6 A Mídia... 79

Capítulo 2 – Aspectos Teológicos do Neopentecostalismo Brasileiro ... 82

2.1 A influência da confissão positiva sobre o Neopentecostalismo ... 83

2.1.1 As raízes da confissão positiva ... 84

2.1.2 A conexão Kenyon _ Hagin ... 89

2.1.3 Expansão e controvérsias ... 93

2.2 A Hermenêutica Neopentecostal... 97

2.2.1 A ênfase veterotestamentária... 100

2.2.2 Símbolos, pontos de contato e experiências... 103

2.3 Enfoques neopentecostais ... 108

2.3.1 Doença e saúde ... 108

2.3.2 A doença e suas causas ... 111

2.3.3 Esperanças e decepções ... 114

(11)

2.3.5 As Forças do mal... 130

Capítulo 3 – Análise da prática pastoral da Igreja Internacional da Graça de Deus e relatos de três casos de decepção ... 135

3.1 O que é a Igreja Internacional da Graça de Deus? ... 135

3.1.1 Sua origem e expansão ... 135

3.1.2 Mídia... 139

3.2 Entrevista com Eber Cocareli... 141

3.2.1 O perfil do entrevistado ... 142

3.2.2 A teologia que sustenta o Ministério da Igreja da Graça... 143

3.2.3 A estrutura de governo da Igreja da Graça ... 144

3.2.4 O Ministério Pastoral da Igreja da Graça ... 146

3.2.5 Os resultados do ministério desenvolvido pela Igreja da Graça... 150

3.2.6 A visão da Igreja da Graça para o Brasil e o mundo ... 153

3.3 R. R. Soares em ação... 154

3.4 Ação Social e Educativa da Igreja da Graça ... 160

3.4.1 O programa de assistência social da Igreja... 160

3.4.2 O Programa Educativo da Igreja da Graça ... 163

3.4.3 O Ministério de Publicações da Igreja da Graça ... 164

3.5 Um caso de decepção na Igreja da Graça... 165

3.5.1 O relacionamento com R. R. Soares... 169

3.5.2 A Teologia da prosperidade na Bovespa... 170

3.6 Um caso de decepção na Igreja Renascer ... 171

3.6.1 Relacionamentos... 174

3.7 Um caso de decepção na Igreja Universal ... 177

3.7.1 Rotina diária ... 179

3.7.2 A bênção ou o dinheiro de volta! ... 181

3.8 Os nômades da fé ... 183

Capítulo 4 – Desafios e oportunidades para a prática pastoral de esperança num contexto de decepção a partir de J?rgen Moltmann e Casiano Floristan... 187

4.1 Teologia Prática e Teologia Pastoral... 187

4.1.1 Escritura e esperança ... 191

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4.2.1 Moltmann e o sofrimento ... 198

4.2.2 Moltmann e a oração ... 202

4.3 Uma pastoral de esperança à luz da Primeira Epístola de São Pedro ... 204

4.3.1 Esperança e ressurreição... 208

4.3.2 A realidade do sofrimento ... 209

4.3.3 Respondendo com amor ... 211

4.4 A Ação Pastoral da Igreja a partir de Casiano Floristan... 211

4.4.1 Missão – Kerigma... 212

4.4.2. Catequese – didaskalia ... 214

4.4.3 Liturgia, Homilética – Leitourgia ... 216

4.4.4 Comunidade – Koinonía ... 219

4.4.5 Serviço – Diakonía ... 222

4.5 Trilhas pastorais ... 223

4.5.1 Kerigma ... 226

4.5.2 Acolhimento ... 228

4.5.3 A Contínua celebração da esperança ... 233

Considerações Finais ... 235

Bibliografia... 241

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Introdução

Este é um estudo sobre esperanças e decepções, ambas produzidas por insti-tuições religiosas. Não é só a religião que oferece esperança e nem a única a produzir decepções. Esperanças e decepções estão em toda parte, tais como no futebol, na me-dicina, na política, na família e em muitas outras atividades da vida. Esta pesquisa se propôs a estudar um movimento religioso que, devido ao seu poder de mobilizar multidões, sua presença maciça na mídia e seu crescimento acelerado, exerce um extraordinário impacto na sociedade brasileira. Trata-se do neopentecostalismo, uma vertente do movimento pentecostal. No Brasil, as Igrejas alinhadas com esse movi-mento surgiram a partir da década de 70, e as que mais se destacam são a Igreja Uni-versal do Reino de Deus, a Igreja Apostólica Renascer em Cristo e a Igreja Internacional da Graça de Deus, que será o objeto principal da pesquisa. Há outros grupos que também recebem atenção no texto.

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atingido pelas vicissitudes da vida. Trata-se de um discurso que agrada, segundo Ari Pedro Oro:

Muito longe da exaltação da pobreza, cara a uma certa tradição católica, sua retórica consiste em proclamar que a pobreza não faz parte dos propósitos divinos. Ao contrário, e à sua imagem, Deus deseja, na verdade, distribuir riqueza, saúde e felicidade àqueles que têm fé e o exprimem intensamente. Mas é função dos pastores da Igreja precisar que, para que assim seja, para que os pobres tornem-se ricos, para que os desempregados encontrem um emprego, para que os “doentes incuráveis” sejam curados etc., é necessário dar muito, até mesmo se endividar, como se não tivessem nada a perder, ao contrário, tudo a ganhar. Melhor dizendo, trata-se de apostar tudo para que, imediatamente, ou num período curto de tempo, tudo mude radicalmente (é o que os depoimentos tentam fazer crer), e para que os pobres, principalmente, que não poderiam ser mais pobres, doem ainda que se endividem. Dessa forma, terão o sentimento de já estar no caminho da prosperidade.1

Diante desse quadro, foram levantadas as seguintes hipóteses:

Há diferença entre o que se prega e os resultados do que se prega no neopentecostalismo?

Qual tem sido o efeito da mensagem proclamada pelo neopentecostalismo nos seus adeptos? Tem gerado esperanças ou decepções? Tem sido um fator agregador ou um fator de dispersão?

E no Brasil, quais têm sido os resultados da pregação do neopentecostalismo? Por que ele faz tanto sucesso aqui? Ele tem uma prática pastoral? Ele vem produzindo igrejas e pessoas bíblica e emocionalmente equilibradas? Como os adeptos do movimento reagem às adversidades da vida que surgem, muitas vezes, de formas variadas e inesperadas?

Objetivos

1 Ari Pedro ORO et alli (org.). Igreja Universal do Reino de Deus – Os novos conquistadores da fé,

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A tese tem por objetivo, analisar, criticamente, as práticas pastorais do neopentecostalismo brasileiro na Igreja Internacional da Graça de Deus, com significativa visibilidade midiática. Os objetivos são: a) Estudar a origem histórica do movimento neopentecostal, o seu surgimento e desenvolvimento no Brasil. b) Constatar a influência externa sobre o neopentecostalismo da Confissão Positiva, uma vertente doutrinária surgida e difundida nos Estados Unidos. Verificar qual tem sido a atuação do neopentecostalismo brasileiro, se ele de fato corresponde à expectativa do seu público, e se cumpre na vida de seus adeptos as promessas de uma vida terrena financeiramente abundante e fisicamente saudável. c) Formular propostas para uma prática pastoral capaz de facilitar o processo de repatriamento e restaurar a esperança dos decepcionados com a pregação neopentecostal.

Justificativa

O tema escolhido tem a ver com um movimento de grande repercussão no cenário brasileiro das últimas décadas. Um movimento que consegue mobilizar as massas, que controla grandes somas de dinheiro e uma boa parte da mídia eletrônica. Sua atuação tem preocupado as Igrejas Protestantes Históricas, o catolicismo romano e a sociedade em geral. A originalidade justifica a pesquisa. Apesar do vasto material já existente sobre o neopentecostalismo, a maior parte produzida por sociólogos, não existe ainda uma pesquisa de orientação pastoral para ajudar os decepcionados do neopentecostalismo brasileiro. Por isso, a pesquisa passa a ser importante para a academia, sempre interessada na busca de novos conhecimentos. 2

Por estar inserido dentro do pentecostalismo, tenho visto as transformações que marcaram o movimento e isso despertou o meu interesse em pesquisar o tema. Minha inserção no pentecostalismo se deu através das Assembléias de Deus, em 1971, em São José dos Campos, SP. A partir de 1989, passei a ter a atenção voltada para um movimento importado dos Estados Unidos denominado “teologia da

2 Alberto Kenji Yamabuchi, Cura e poder na teologia de R. R. Soares. Embora essa Dissertação de

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prosperidade” e que se espalhava rapidamente pelo Brasil. Surgiu então o meu primeiro livro.3 Escrevi depois um segundo livro4 onde tratei de várias questões ainda presentes no mundo evangélico, tais como batalha espiritual, o culto a personalidade, a demonologia neopentecostal, a problemática dos milagres, os evangélicos e a política partidária,5 além de questões éticas.

Com a publicação dos livros, houve uma grande demanda por conferências, pois as Igrejas e Instituições Teológicas queriam saber mais. Viajei, intensamente, para muitas partes do Brasil, realizando seminários, participando de programas de rádio e TV, dando entrevistas para jornais e revistas sobre esses assuntos. Foi através das viagens e conferências que, nesses últimos dez anos, conheci um novo tipo de crente: o decepcionado. Pessoas que foram atraídas às igrejas com a promessa de ficarem ricas, serem curadas e resolverem todos os seus problemas, viram suas esperanças frustradas. É o que também foi constatado por pastoralistas latino-americanos, conforme relata Dennis A. Smith:

Muitos saem pela porta traseira das igrejas neopentecostais decepcionados, defraudados, enganados. E também de nossas igrejas. Com muita humildade, podemos oferecer comunidades de integridade e carinho a tantos que já estão cheios da religião organizada?6

Muitas vezes, as promessas dos pregadores neopentecostais não se concretizam. Nem todos são curados, nem todos ficam ricos e nem todos, em busca de um casamento, conseguem chegar ao altar. Isso acaba produzindo frustrações e decepções em muitas pessoas. Portanto, esta tese formula uma proposta de prática pastoral que possibilite a pessoa retomar a vida cristã dentro do seu espaço evangélico.

Embora todas as Igrejas decepcionem, numa proporção menor ou maior, a maioria das pessoas decepcionadas com quem tive contato era de Igrejas neopentecostais. Há relatos de decepções, frustrações e até mortes provocadas pela

3 Paulo ROMEIRO, SuperCrentes – O Evangelho segundo Kenneth Hagin, Valnice Milhomens e os profetas da prosperidade.

4 Paulo ROMEIRO, Evangélicos em crise – Decadência doutrinária na Igreja Brasileira.

5Para uma constatação do envolvimento dos evangélicos na política partidária, Paul FRESTON. Evangélicos na política brasileira: história ambígua e desafio ético.

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pregação do movimento. Isso foi um dos meus grandes incentivos para trabalhar nesta tese. A pesquisa será útil também para as igrejas, capelanias, seminários ou qualquer outra instituição religiosa que trabalhe na formação integral do ser humano. Ela será útil para os líderes religiosos que buscam desenvolver uma pastoral de acolhimento aos decepcionados pela religião, principalmente, pelo neopentecostalismo.

Referenciais teóricos

Os referenciais teóricos para uma pastoral de esperança nesta tese são Jürgen Moltmann e Casiano Floristan. Moltmann é chamado o teólogo da esperança. Em Teologia da Esperança, obra que o fez conhecido como um dos grandes teólogos da atualidade, ele segue a linha de Karl Barth e Ruddolf Bultmann.7 Moltmann produziu um projeto de teologia escatológica entendida como escatologia histórica, que ele desenvolveu como doutrina da esperança e da práxis da esperança. De acordo com Moltmann, a única certeza que se tem em relação ao futuro gravita em torno do Cristo crucificado e ressuscitado. A esperança em Cristo não significa que o mal no mundo será ignorado ou evitado. Para ele, a esperança é nutrida e purificada através da dor, do sofrimento e da dificuldade. Mesmo que o mundo esteja envolto em trevas, a base da esperança continua sendo Deus, Alguém maior do que o sofrimento que o ser humano enfrenta.

Para Moltmann, a compaixão cristã é o centro da vida cristã. Compaixão não é apenas uma maneira de fazer certas coisas em favor de uma determinada comunidade. É algo que tem a ver com o coração, uma forma de experimentar a vida de dentro para fora. Uma comunidade compassiva não está baseada em compatibilidade psicológica ou unanimidade teológica. Ser compassivo é estar com alguém no seu sofrimento. Deus não se revelou em Jesus Cristo para tirar nossa dor, mas para compartilhá-la. Em Jesus, Deus revelou-se a nós como um Deus sofredor. Deus entrou em solidariedade com a humanidade.

7 Karl BARTH, Introdução a Teologia Evangélica. No terceiro capítulo, Barth tratou sobre o tema da

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Casiano Floristan, teólogo católico da Espanha, é outro referencial teórico desta tese. Uma de suas obras principais sobre teologia prática8 serve de norte na formulação de uma prática pastoral para ajudar os decepcionados do neopentecostalismo. Floristan divide a ação pastoral da Igreja em cinco frentes: missão (kerigma); catequese (didaskalia); liturgia, homilética (leitourgia); comunidade (koinonia); serviço (diakonia). Todas essas frentes são úteis para uma ação comunitária de acolhimento aos que passaram por desapontamentos com a pregação neopenteocostal.

Floristan trata da ação pastoral desde a época do Novo Testamento, da Igreja primitiva e ao longo da história da Igreja. Para ele, a ação pastoral deve ser a ação dos cristãos, deve ser desenvolvida pela igreja e constituir o povo de Deus em comunidade. A ação pastoral deve estar a serviço do reino de Deus. A ação pastoral precisa de reflexão teológica e a reflexão teológica precisa da ação pastoral.

Metodologia

A partir do método crítico, histórico e dedutivo, o projeto de pesquisa terá os seguintes passos:

Pesquisas bibliográficas e documentais

As pesquisas bib liográficas usaram materiais produzidos pelo e sobre o movimento neopentecostal. As pesquisas documentais incluíram cartas, folhetos, cartazes de propagandas e documentos usados nesta tese que tratam das doutrinas e regimentos internos de algumas igrejas pesquisadas.

Pesquisa de campo

Foram realizadas várias visitas e participações em cultos na sede da Igreja Internacional da Graça de Deus, liderada por R. R. Soares, na Avenida São João, nº

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791, no centro da cidade de São Paulo, para analisar a atividade pastoral desenvolvida pelo grupo.9 Foram gravadas entrevistas com adeptos e dissidentes do movimento neopentecostal. Isso é apenas uma amostra de um contingente de pessoas que aumenta cada vez mais. Por não ser uma pesquisa quantitativa, não se buscou saber o número delas. Algumas entrevistas não foram aproveitadas, dada a irrelevância do seu conteúdo para a tese. As pessoas entrevistadas foram contatadas através das pesquisas de campo e tiveram seus nomes retidos a fim de garantir a privacidade. Assim, foram usados pseudônimos e as iniciais dos nomes ou uma parte deles para garantir o anonimato. Entretanto, todas assinaram uma declaração autorizando a publicação das entrevistas. Na seção Anexo, a íntegra das entrevistas utilizadas nesta pesquisa.

Os entrevistados são dissidentes da Igreja Internacional da Graça de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus e Igreja Apostólica Renascer em Cristo. A Igreja da Graça, por ser o objeto de estudo de caso desta tese; a Igreja Universal e a Igreja Renascer por representarem, juntamente com a Igreja da Graça, as maiores expressões do neopentecostalismo brasileiro. Todos os entrevistados exibiram um padrão de comportamento uniforme. Num primeiro contato com a Igreja ou com seu líder, veio o deslumbramento, a expectativa, a entrega de si mesmo pela causa e uma confiança despreocupada na proposta do grupo. Depois, com o passar do tempo, começam a surgir os questionamentos relacionados com a linha de pregação, a administração financeira ou questões éticas. Esses questionamentos vão se acumulando até provocar o rompimento.

Para se conhecer a Igreja da Graça, foi entrevistado o Rev. Eber Cocareli, assessor de R.R. Soares para assuntos doutrinários há quase sete anos. Tudo indica que Eber estava mais bem qualificado para fa lar sobre os assuntos teológicos da Igreja do que qualquer outro pastor. Eber conhece as questões doutrinárias, eclesiásticas e administrativas da Igreja da Graça e teve uma relativa liberdade para falar sobre elas. A entrevista com Eber Cocareli sobre a Igreja da Graça foi dividida em seis blocos:

9 Escolhi a igreja localizada no centro de São Paulo devido à constante presença do Missionário R.R.

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O perfil do entrevistado.

A teologia que sustenta o ministério. A estrutura da Igreja da Graça. O Ministério Pastoral.

Os resultados do ministério desenvolvido.

Expansão: A visão da Igreja da Graça para o Brasil e para o mundo.

Optou-se por destacar nesta pesquisa a Igreja Internacional da Graça de Deus, por duas razões: Primeiro, há pouco material publicado sobre essa Igreja. Ela começou a crescer nos últimos anos e somente agora passa a chamar a atenção dos pesquisadores, principalmente, das áreas de sociologia e teologia . A maior parte das pesquisas realizadas até agora sobre o neopentecostalismo destaca a Igreja Universal e, em segundo lugar, a Igreja Renascer. Talvez isso se dê devido às controvérsias provocadas por essas Igrejas. Têm havido muitas denúncias de abusos na área financeira, administrativa e doutrinária dessas igrejas. Processos têm sido instaurados contra elas e seus líderes. A mídia tem publicado um vasto material sobre tais acusações.

O mesmo não se dá com a Igreja da Graça. Não há material publicado na mídia que desabone a Igreja e seu líder principal. Pelo menos, por enquanto! Soares é tido como um gentleman. Não faz seções de exorcismo na TV, dificilmente ataca alguém ou um grupo religioso e usa um tom de voz normal, evitando gritaria. Tudo isso desperta a simpatia do público por ele. A segunda razão é a visibilidade alcançada pela Igreja da Graça na mídia. No momento, não há qualquer outra pessoa que apareça mais na televisão brasileira do que R.R. Soares.10 O histórico da Igreja da Graça não aparece no primeiro capítulo pela razão de ser um estudo de caso desta tese, no terceiro capítulo.

Pesquisa na Mídia

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As fontes de pesquisas midiáticas usadas na tese, tais como, jornais e revis tas semanais, fornecem, na maioria das vezes, informações atualizadas para o pesquisador. Por outro lado, é preciso ter em mente que muitos segmentos da mídia são tendenciosos, sendo necessário cuidado ao usar tal material. A pesquisa na mídia incluiu também a internet, pois muitos grupos religiosos já colocaram a sua home page na rede.

Método

Seguindo a linha de Casiano Floristan, pode-se dizer que o método é um conjunto de normas e procedimentos para ensinar, aprender ou levar algo a cabo, a fim de se obter resultados (TP, p. 353). Para ele, o método dedutivo “leva em conta os princípios abstratos e as idéias prévias” (TP, 361). Lakatos e Marconi entendem que para a metodologia “é de vital importância compreender que, no modelo dedutivo, a necessidade de explicação não reside nas premissas, mas, ao contrário, na relação entre as premissas e a conclusão (que acarretam)”.11 Quanto ao método histórico, Marconi e Lakatos comentam:

Partindo do princípio de que as atuais formas de vida social, as instituições e os costumes têm origem no passado, é importante pesquisar suas raízes, para compreender sua natureza e função. Assim, o método histórico consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar sua influência na sociedade de hoje, pois as instituições alcançaram sua forma atual por meio de alterações de suas partes componentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto cultural particular de cada época. Seu estudo, para uma melhor compreensão do papel que atualmente desempenham na sociedade, deve remontar aos períodos de sua formação e de suas modificações.12

Definição dos termos esperança13 e decepção

11 Marina de Andrade MARCONI e Eva Maria LAKATOS, Metodologia científica, p. 69. 12Ibid., p. 91.

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A Baker Encyclopedia of Psychology assim define esperança: “Um desejo acompanhado pela expectativa de que o desejo será obtido. É parcialmente cognitivo (é um pensamento), parcialmente emocional (envolve antecipação e outros afetos positivos), e parcialmente volitivo (contém crença). A esperança tem tido, tradicionalmente, conotações espirituais e religiosas. Por esta razão, a esperança não tem sido um foco importante do estudo psicológico apesar dos seus componentes emocionais óbvios. Entretanto, ela tem estado muito presente na literatura e é um conceito proeminente na Bíblia”.14

O Dicionário de Teologia Bíblica afirma que a esperança desempenha no Antigo Testamento um papel menos saliente do que no Novo Testamento. Outras informações do Dicionário elucidam o termo: “A raiz qwh é mais usada para exprimir o sentido de ‘esperar’, ‘aguardar’ alguém ou alguma coisa que não aconteceu (ver Is 5,2,4.7; 59,9,11, etc.) [sic] ora uma coisa que depois aconteceu (Jó 7,2; 17,13, etc.). Muitas vezes é Javé o objeto da esperança (Sl 25,3,5.21; 27,14: Is 8,17; Jr 14,22, etc.), também quando é empregado o substantivo miqweh (Jr 14,8; 17,13; 50,7, ver 1 Cr 29,15, Ed 10,2); o outro substantivo da mesma raiz, tiqwâh (freqüente em Jó, Prov, Sir), se relaciona com felicidade e alegria de viver. No Novo Testamento, o conceito de esperança é sobretudo expresso pelos termos gregos e?p?? e e?p???, que no grego profano significavam ‘prever, esperar, temer, presumir’. No Novo Testamento a esperança (e?p??) sempre se orienta a um bem, nunca para um mal, e tem, como na Septuaginta, o matiz da confiança, do refúgio”.15

O Dicionário de Filosofia define decepção como “uma burla que acontece a um desejo, por desequilíbrio entre a expectativa e o acontecimento. As decepções surgem de contrastes desfavoráveis”.16 O Diccionario Enciclopedico de la Psique define decepção como “simulação, fingimento”. Através da decepção, “os indivíduos transformam as coisas tais como eles gostariam que fossem, e possuem a forma de solucionar, de um modo menos direto, menos difícil, menos tedioso, os problemas da

14 David G. BENNER, Baker Encyclopedia of Psychology, p. 527-528. Tradução do pesquisador. 15 Johannes B. BAUER, Dicionário de teologia bíblica, p. 360-362. O termo septuaginta, que aparece

na citação, refere-se à versão grega do Antigo Testamento.

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vida”.17 Um outro dicionário define o termo como “desilusão, desapontamento, engano”.18

Apresentação dos capítulos da tese

Capítulo 1. A trajetória histórica do neopentecostalismo

O primeiro capítulo estuda a trajetória histórica do neopentecostalismo e várias questões foram tratadas tais como: o que é o neopentecostalismo? É um movimento ou uma denominação? Qual é a sua forma de governo e organização? A tese apresenta também as raízes históricas do neopentecostalismo, o seu desdobramento do pentecostalismo, desde o livro de Atos dos Apóstolos, passando pelo montanismo, pelo pietismo, até a sua inauguração em Topeka e a sua consolidação em Los Angeles, nos Estados Unidos, no início do século XX. Verifica-se depois a sua inserção no Brasil, começando com a Congregação Cristã no Brasil e as Assembléias de Deus. Estudam-se também, nesse capítulo, as três ondas do pentecostalismo brasileiro até desembocar no movimento neopentecostal a partir da década de 70.

Várias denominações foram mencionadas. Além das pioneiras, já citadas acima, acrescentam-se a Igreja O Brasil para Cristo, a Igreja do Evangelho Quadrangular, a Igreja Deus é Amor, a Igreja de Nova Vida, a Igreja Universal do Reino de Deus, a Igreja Renascer em Cristo, a Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, a Comunidade Cristã Paz e Vida e a Igreja Bola de Neve. Em seguida, o capítulo trata de alguns fatores de crescimento do neopentecostalismo brasileiro: liderança carismática, mudanças de paradigmas nos usos e costumes, liturgia espontânea, o êxodo de fiéis da Igreja Católica para as Igrejas Evangélicas e o fator midiático.

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Capítulo 2. Aspectos teológicos do neopentecostalismo brasileiro

Este capítulo trata das influências teológicas sofridas pelo movimento neopentecostal brasileiro. Uma dessas influências denomina-se confissão positiva, também conhecida como o Evangelho da Saúde e da Prosperidade. Para tanto, estudam-se também as raízes da confissão positiva, seus protagonistas principais, sua expansão e sua influência no neopentecostalismo e as controvérsias que essa corrente doutrinária tem causado. O capítulo trata também da hermenêutica neopentecostal, como o movimento interpreta a Bíblia e a ênfase veterotestamentária na sua pregação. Estuda-se também o emprego de símbolos, chamados de pontos de contato, e a importância da experiência na interpretação bíblica e na liturgia neopentecostal. O capítulo estuda ainda a visão que o movimento tem sobre a doença e a saúde, pobreza e riqueza e o tema do mal.

Capítulo 3. Análise da prática pastoral da Igreja Internacional da Graça de

Deus e relatos de três casos de decepções

O capítulo trata da origem e expansão da Igreja Internacional da Graça de Deus, objeto de um estudo de caso nesta tese. A vida do fundador, R.R.Soares, é contada com detalhes: sua infância, conversão, o desenvolvimento do seu ministério e a sua chegada à televisão. Para se conhecer melhor a Igreja da Graça, foi entrevistado o Rev. Eber Cocareli. Os temas principais da entrevista são: a teologia que sustenta o ministério, a estrutura de governo da Igreja da Graça, o Ministério Pastoral e a expansão dessa Igreja. Depois dessa entrevista, a pesquisa mostra o Missionário em ação, ao descrever um culto com ele ministrando, na sede da Igreja, em São Paulo. Em seguida, o capítulo trata da posição de Soares sobre os programas de assistência social na Igreja, e como é desenvolvido o ensino teológico, além de comentar sobre as publicações da Igreja.

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anos. Depois das entrevistas, o capítulo fala sobre o trânsito religioso, um fenômeno que já despertou o interesse dos pesquisadores de religião. O rompimento com o grupo produz um novo tipo de fiel: o nômade da fé. Ele terá dificuldade de permanecer numa comunidade e cultivar relacionamentos.

Capítulo 4. Desafios e oportunidades para uma prática pastoral de esperança

num contexto de decepção a partir de Jürgen Moltmann e Casiano Floristan

O quarto capítulo apresenta propostas pastorais de esperança num contesto de decepção. A pesquisa usou as obras de Jürgen Moltmann, principalmente, a Teologia da Esperança, como o referencial da esperança. Há relatos biográficos de sua vida que mostram a sua caminhada do contexto de desespero em direção à esperança. Seus conceitos sobre a esperança, sobre o sofrimento e a oração são mencionados. A tese foi buscar, em alguns textos da Primeira Carta de Pedro, o suporte bíblico para a esperança, interagindo com outros textos da Escritura. Para desenvolver uma prática pastoral de esperança, a tese usou a obra principal de Casiano Floristan, Teologia Práctica. Os seus conceitos de proclamação da palavra, ensino, liturgia, comunhão e serviço são usados para a proposta pastoral da tese.

O capítulo apresenta também trilhas pastorais para abrigar os decepcionados do neopentecostalismo. Uma delas é o alinhamento com a Bíblia. Uma ação pastoral deve ser desenvolvida, segundo Floristan, de acordo com a Escritura. Um outro aspecto importante neste momento é a sintonia do pregador com o contexto em que a sua comunidade vive. Uma outra trilha é a do acolhimento. Acolher significa aceitar, abraçar, ouvir, tocar e cuidar. E, por último, faz-se um apelo e um convite para a contínua celebração da esperança.

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idéias, novos escândalos e práticas difíceis de serem detectadas na sua maior parte. Assim, muitas questões, principalmente as pastorais, poderão precisar de modificações no futuro, para se adaptarem às constantes transformações que acontecem na Igreja Internacional da Graça de Deus e no neopentecostalismo em geral.

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Capítulo 1 – A trajetória histórica do

Neopentecostalismo

1.1 O que é o neopentecostalismo?

O neopentecostalismo tem suas raízes no movimento pentecostal surgido nos Estados Unidos no início do século XX. A discussão sobre o que seja esse movimento religioso tem sido ampla e controvertida, e as opiniões sobre o tema divergem muito de acordo com o pesquisador, ou com a vertente acadêmica ou com a região onde o assunto é tratado. Em relação a várias denominações cristãs, trata-se de um fenômeno recente. Apesar disso, sempre desperta o interesse dos estudiosos e da mídia.

O neopentecostalismo conquistou um grande espaço no cenário brasileiro nas últimas décadas. É um movimento que consegue mobilizar as massas, que controla grandes somas de dinheiro e uma boa parte da mídia eletrônica. Nem mesmo o pentecostalismo, sua fonte de origem, chegou a tanto. Por isso, o grupo agrada e incomoda ao mesmo tempo. Há alguns anos a revista Veja19 publicou uma reportagem de capa sobre a Igreja Universal intitulada: A igreja que assusta – O bispo Edir Macedo já tem mais de 3 milhões de seguidores.

A prática neopentecostal é dinâmica e inovadora, com um grau de criatividade bastante elevado. Muitas vezes, quem deixa de freqüentar por uma semana algumas de suas igrejas, corre o risco de ficar desatualizado. Mudam-se a liturgia, os líderes das igrejas que atuam nos escalões inferiores, as campanhas, os

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símbolos (Cálice da Libertação, Rosa Ungida, Águas que Saram), os candidatos políticos e os títulos ministeriais (de bispos para apóstolos, de pastoras para bispas e apóstolas). Novas terminologias vão sendo acrescentadas no dia a dia. Na Igreja Universal, por exemplo, culto de libertação virou Sessão de Descarrego. Na Igreja da Graça, o culto do missionário R. R. Soares chama-se agora Show da Fé. Até os nomes das igrejas são mudados. A IEFA (Igreja Evangélica do Fundamento Apostólico) agora é Igreja Cristã da Família. A Casa da Bênção (na Av. Jabaquara, 1785, em São Paulo) agora é Missão Caminhos da Vida. Essas mudanças assanham a mídia e os estudiosos, requerendo um monitoramento constante do fenômeno neopentecostal por parte dos seus pesquisadores.

Definir o que é o neopentecostalismo não é uma tarefa simples. As novas igrejas e os seus líderes multiplicam-se rapidamente, sempre introduzindo alguma novidade na liturgia e na teologia, tornando o tema cada vez mais amplo e complexo. Com o passar do tempo, os pesquisadores vão dando ao grupo diferentes nomes tais como pentecostalismo autônomo, isopentecostalismo, pentecostalismo neoclássico, pós-protestantismo, pós-pentecostalismo, pentecostalismo crioulo, pentecostalismo mestiço, protestantismo sincrético e ultra-pentecostalismo. 20

Mendonça divide o pentecostalismo em duas fases:

Os primeiros anos do século XX para o aparecimento do que chamamos de pentecostalismo clássico, e a década de 60 para o surgimento do neopentecostalismo (ou movimento carismático protestante), da renovação carismática católica e das agências de cura divina.21

Em sua pesquisa, Ricardo Mariano22 adota a linha de Paul Freston e também divide o pentecostalismo em três ondas. Na primeira onda, estão a Congregação Cristã no Brasil (1910) e a Assembléia de Deus (1911). A segunda onda, a partir dos anos 50, inclui a Igreja do Evangelho Quadrangular (1953), O Brasil para Cristo (1955), Deus é Amor (1962), Casa da Bênção (1964) e outras de menor expressão. A terceira onda começa na segunda metade da década de 70 e inclui a Igreja Universal

20 Paulo B. RIVERA. Tradição, transmissão e emoção religiosa, p. 234.

21 Antônio G. MENDONÇA e P. VELASQUES FILHO, Introdução ao Protestantismo no Brasil, p.

256.

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do Reino de Deus (1977), a Internacional da Graça de Deus (1980), a Cristo Vive (1986), a Comunidade Sara Nossa Terra (1976), a Comunidade da Graça (1979), a Renascer em Cristo (1986), a Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo (1994), a Comunidade Cristã Paz e Vida (1996), a Igreja do Avivamento Contínuo (2002). Os fundadores da Igreja Universal, Edir Macedo, e da Igreja Internacional da Graça de Deus, R. R. Soares, saíram da Igreja de Nova Vida, fundada no Rio de Janeiro, em 1960, por Roberto McAlister. Ricardo Mariano explica o motivo de empregar o termo neopentecostalpara a terceira onda, especialmente para a Igreja Universal do Reino de Deus:

O prefixo neo mostra-se apropriado para designá-la tanto por remeter à sua formação recente como ao caráter inovador do neopentecostalismo. Embora recente entre nós, o termo neopentecostal foi cunhado há vários anos nos EUA. Lá, na década de 70, ele designou as dissidências pentecostais das igrejas protestantes, movimento que posteriormente foi designado de carismático. 23

Leonildo S. Campos assim define o termo neopentecostal dentro do contexto norte-americano:

Naquele país, atribui-se o termo “neopentecostalismo” a pessoas com mentalidade pentecostal, mas que se consideram adeptas de uma “renovação espiritual” dentro dos próprios quadros denominacionais a que pertencem. De uma maneira geral, esse “neopentecostalismo” enfatiza o exorcismo, cura divina, dons espirituais, continuidade da revelação divina através de líderes carismáticos e uma parte dele aceita a “teologia da prosperidade”. Esse “neopentecostalismo” ganhou força no mundo religioso norte-americano nos anos 70, período em que também começou a penetrar na América Latina, provocando o surgimento de novas igrejas, seitas e denominações, assim como cisões nas principais denominações protestantes brasileiras, entre elas, Metodista, Batista, Presbiteriana, Congregacional e outras.24

É quase sempre tênue a linha que separa algumas igrejas da segunda onda das da terceira. A Casa da Bênção, por exemplo, surgida em 1964 e colocada por Ricardo Mariano dentro da segunda onda,25 tem quase todos os elementos que caracterizam o neopentecostalismo. Daniel Marins foi, por muitos anos, um dos líderes da Igreja do Evangelho Quadrangular (surgida em 1953). Entretanto, depois de romper com a sua

23 Ibid., p. 33.

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denominação em quatro de agosto de 2001, fundou a Igreja do Avivamento Contínuo em São Paulo, capital, em seis de agosto de 2001, uma Igreja que tem quase todos os ingredientes do neopentecostalismo. Marins prega a teologia da prosperidade e a quebra de maldições hereditárias. A maior parte das Igrejas neopentecostais aderiu à teologia da prosperidade, também conhecida como a confissão positiva, o emprego intenso das regras do mercado de consumo e de marketing usadas pelas empresas em geral, a promessa de uma boa vida (sem doenças, sem pobreza) para os seus adeptos, a solução imediata dos problemas do dia a dia. O neopentecostalismo é também caracterizado por uma liderança forte e centralizadora.

O diabo e seus demônios são os grandes trunfos do neopentecostalismo. Uma grande parte dos cultos neopentecostais é ocupada com os maus espíritos. Eles são a causa da separação de casais, do insucesso no amor, da falta de prosperidade da empresa e de tudo o que não presta. Por isso, nesses cultos, estão sempre expulsando os demônios da doença, das drogas, da pobreza e muitos outros. Se uma boa parte dos cultos é dedicada aos demônios, um outro tema, não menos importante para o neopentecostalismo, ocupa bastante espaço em tais reuniões: o dinheiro. Os apelos por dinheiro, sempre criativos e intensos, podem, muitas vezes, durar até mais de uma hora.

Os cultos neopentecostais introduziram uma liturgia mais aberta e alegre, com o uso das palmas, o levantar dos braços, danças e coreografias. Quase todas as Igrejas neopentecostais aposentaram os hinários e introduziram as músicas do mercado evangélico, estabelecendo a ditadura do retroprojetor. Os hinos tradicionais do pentecostalismo, com suas mensagens cantadas promovendo abnegação e a busca da felicidade após a morte, exaltando o sofrimento e condenando os prazeres do mundo, foram substituídos por músicas que incentivam a busca dos bens materiais e da felicidade terrena. Em meados da década de 1980, surge a música gospel, termo que se refere à produção musical dos novos cânticos religiosos cantados em muitas igrejas, principalmente, na Renascer. O gospel rompeu com os hinos tradicionais para usar estilos musicais como o rock e o funk.26

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O neopentecostalismo fez escola. Muitas Igrejas de fora do movimento clonaram suas práticas de proselitismo e de arrecadação financeira. Várias igrejas das Assembléias de Deus e de outros grupos considerados tradicionais passaram a realizar o culto da libertação, o culto dos empresários e o culto da prosperidade, algo nunca pensado pelos seus pioneiros ou líderes mais antigos. O movimento neopentecostal investe consideravelmente no televangelismo. Além disso, o neopentecostalismo introduziu uma série de práticas e doutrinas novas, tais como cura interior com regressão, um modelo de crescimento de igrejas chamado G-12 Igrejas em Células,27 mapeamento espiritual, espíritos territoriais, cair no espírito, gargalhada sagrada, dentes de ouro e muitas outras.28

Michael Moriarty pesquisou o neopentecostalismo dentro do contexto norte-americano e observou as seguintes características do movimento, muito parecidas com as do contexto brasileiro:

1. Sensacionalismo. A mensagem do evangelho foi subvertida por alegações de curas bizarras e anúncios exagerados de intervenção sobrenatural.

2. Culto a personalidade. Jesus Cristo não era o foco das reuniões de avivamento; ao contrário, a pessoa que realizava o “milagre” era o centro da atenção.

3. Pontos de vista exagerados de libertação. Os pregadores não apenas, erradamente, tratavam todas as doenças como resultado de

27 O G-12 é um movimento que propõe o crescimento das igrejas através de células, com reuniões nos

lares. As pessoas são evangelizadas através das células, das reuniões na igreja ou de eventos evangelísticos. Depois de evangelizadas, começa o processo de consolidação, constituído dos seguintes estágios: 1. Pré–encontro: constituído de quatro palestras preparatórias para o encontro de três dias. Nessa fase, o novo discípulo recebe orientações sobre a Igreja, o senhorio de Cristo, mordomia cristã e batismo. 2. Encontro: um retiro espiritual de três dias, onde o discípulo receberá instruções sobre arrependimento, perdão, quebra de maldições, libertação, cura interior, batismo no Espírito Santo e a visão da igreja. 3. Pós–encontro: quatro palestras para consolidação das vitórias alcançadas no Encontro. 4. Escola de Líderes: formação em três estágios de três meses cada para se tornar líder de célula e de um grupo de doze. 5. Envio: Depois de começar uma célula de evangelismo a partir de três pessoas, torna-se seu líder. Uma vez consolidada a sua célula, começa a formação do seu grupo de doze para discipulado, tornando-se líder de 12. Consolidado seu grupo de 12, ele estimula cada um a formar o seu próprio grupo de 12. Surge então o líder de 144, numa equação exponencial. Para saber mais informações sobre o movimento do G-12, esta pesquisa recomenda os livros de MILHOMENS, Valnice, Plano estratégico para redenção da nação e de CASTELLANOS, César, Sonha e ganharás o mundo.

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atividades demoníacas, mas sempre fizeram anúncios abusivos de curas milagrosas que, alegadamente, ocorreram em seus ministérios.

4. Levantamentos de fundos escandalosos. Técnicas cheias de truques e manipulações proféticas (“Deus me falou que você tem de apoiar este ministério”) eram tidas pelas Igrejas denominacionais como uma forma sutil de chantagem religiosa.

5. Fé falsa. Os avivalistas assemelham a fé a uma “força” com a qual os crentes podem mover Deus para fazer o que eles desejam. Esse tipo de teologia da fé parece despersonalizar Deus, pois Ele é tratado como uma força cuja vontade é subserviente aos apelos de crentes zelosos.

6. Uma preocupação com Satanás e seus demônios.

7. Novas revelações como uma forma de obter verdade espiritual.

8. Uma crescente desconfiança do raciocínio para obter ou avaliar verdades espirituais. A mente deve ser desviada (reino natural) para que o espírito do homem possa receber informações puras de Deus (reino espiritual).29

1.1.1 Movimento ou denominação?

O Dicionário Crítico de Sociologia afirma que os movimentos de inspiração religiosa são também movimentos sociais e que a história de todo movimento social começa com uma fase de mobilização ou de reunião. Diz que o primeiro recurso de um movimento é o carisma de seu líder, citando como exemplo o movimento de Ghandi, na Índia, parecido com os movimentos proféticos ao longo da história. E acrescenta: “O profeta contesta, denuncia: faz parte de seu papel perseguir e excluir – depois de ele próprio ter-se excluído do grupo que agora combate. Por outro lado, quer reunir seus discípulos e fazer deles, a despeito de rivalidades ou conflitos, uma falange mais unida que os cinco dedos da mão”.30 Já o dicionário Aurélio define movimento como uma mudança de lugar ou posição. É uma mudança de viver ou de pensar de um povo. É uma agitação produzida por uma multidão que se move em

29 Michael G. MORIARTY, The new charismatics, p. 41-42. Tradução do pesquisador.

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diferentes sentidos. É um impulso interior e mudança de valores. Em missões, movimento é um termo coletivo que se aplica a um grupo religioso. Ex.: movimento de santidade, movimento pentecostal, movimento carismático, movimento de crescimento de igrejas, movimento de igrejas em células, etc.

São vários os autores que se referem ao neopentecostalismo como um movimento, como Ricardo Mariano (1999, p. 13), Campos Jr. (1995, p. 145), Leonildo S. Campos (1997, p. 380-391), Mendonça (1997, p. 152, 157), Reily (1993, p. 367, 368) e Rolim (1985, p. 68). Movimento Pentecostal é o título do programa de televisão apresentado na RBN (Rede Boas Novas) por José Wellington Bezerra da Costa, presidente da CGADB (Convenção Geral das Assembléias de Deus no Brasil). No cenário, atrás do apresentador, o nome do programa aparece com destaque.31

O movimento neopentecostal não é uma denominação. Uma denominação tem linha doutrinária própria e estabelecida, tem sínodos ou convenções onde as lideranças são geralmente escolhidas por votos. É um grupo religioso já estabelecido. Normalmente, o esforço da maioria se concentra em torno dos mesmos projetos, sejam de cunho evangelístico, missionário ou social. Numa denominação, a liturgia não muda muito de um templo para o outro. Em relação à música, o hinário é o mesmo e a produção literária vai, em geral, refletir a posição doutrinária do grupo. Muitas vezes, até o formato de construção do prédio e a sua cor são os mesmos em toda a parte, como no caso da Congregação Cristã no Brasil. Já no século XVIII usava-se o termo “denominação” como “designação neutra de comunhões religiosas”, i.é., organizações eclesiásticas.32

Os diferentes segmentos do neopentecostalismo têm liberdade para crer e pregar o que bem entenderem. As igrejas que compõem o movimento agem de forma independente em todas as áreas. Valnice Milhomens, por exemplo, promove a guarda do sábado, algo que a maioria das outras Igrejas rejeita. A prática de cair para trás num momento de oração ou ministração acontece em muitos grupos. Entretanto, a Universal não aceita tal prática. Lá, apenas os maus espíritos derrubam as pessoas e, por isso, devem ser exorcizados. As manifestações de dons espirituais são

31Mensageiro da Paz, março de 2002, p. 16.

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constantes em muitas Igrejas. Porém, a manifestação do dom de profecia33 não é bem vinda na Universal. Embora algum grupo possa apresentar um ou mais ingredientes de uma denominação, eles não são suficientes para classificá-lo como tal.

1.1.2 A forma de governo e organização do Neopentecostalismo

Reed Eliott Nelson apresenta três modelos organizacionais no protestantismo brasileiro:

1. O modelo burocrático. É o modelo que foi importado com as primeiras missões protestantes, e que continua sendo usado pelas Igrejas Históricas em maior ou menor escala. Este modelo caracteriza-se por uma estrutura administrativa complexa, incluindo vários departamentos, conselhos, oficiais, posições hierárquicas e regras escritas. São comuns os relatórios, reuniões de planejamento e coordenação e treinamento formal.

2. O modelo personalista. O segundo modelo é geralmente encontrado nas Igrejas Pentecostais, às vezes misturado com traços burocráticos nas denominações maiores. No modelo personalista (ou de compadrio), pode existir alguma coordenação entre congregações e conselhos, ou outras estruturas formais às vezes existem oficialmente, mas as suas funções são mais simbólicas do que reais... A influência do pastor na vida pessoal dos seus membros pode ser considerável, e muitas vezes a maioria da congregação conheceu a fé por seu intermédio. Chamo este modelo de compadrio ou personalista por causa do relacionamento entre pastor e fiel, que se assemelha aos laços de dominação pessoal que ligam o agregado ao patrão no meio rural tradicional.

3. O modelo de parentesco. O terceiro modelo é o familiar, usado somente na Congregação Cristã no Brasil... Como outros grupos pentecostais, a Congregação Cristã não tem uma estrutura organizacional diferenciada, mas não dispõe de fortes pastores carismáticos, nem do controle formal das regras e normas escritas. Ainda assim, desfruta de unidade ideológica maior que as igrejas personalistas e de crescimento quase igual.... Os membros são regidos por normas informais e um sentimento de lealdade generalizada na entidade como um todo em vez de focalizada num departamento ou líder específico. A liderança é determinada por idade ou tempo de casa, mas

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decisões são geralmente tomadas consensualmente por um grupo dos mais antigos na organização.34

Os neopentecostais não têm uma forma de governo e estrut ura administrativa definidas. Cada segmento adota o que achar mais conveniente. Geralmente, o governo e a estrutura do grupo gravita em torno do líder. Por isso, dos modelos apresentados por Reed Nelson, o que mais se encaixa no movimento neopentecostal é o personalista. Em muitos casos, o líder neopentecostal está situado no topo da pirâmide de uma igreja ou organização, isento de qualquer questionamento. Ele não precisa prestar contas a qualquer pessoa sobre os seus atos morais ou éticos, sobre as finanças que administra, pois é o “ungido do Senhor”. Para tanto, ele já incutiu na mente de seus adeptos que não se pode tocar no “ungido do Senhor”, expressão extraída da Bíblia e usada com muita rapidez por tais líderes diante da possibilidade de serem questionados, ética ou doutrinariamente.35

Na busca de fortalecer o poder e garantir a posição como uma figura especial do sagrado, vários líderes passaram a adotar o título de “apóstolo”, como Estevam Hernandes (Igreja Renascer), Robson Rodovalho (Comunidade Sara Nossa Terra), Sérgio Lopes (Igreja da Comunhão Plena, em São Paulo), Miguel Ângelo (Ministério Cristo Vive, no Rio de Janeiro), René Terra Nova (Igreja Batista da Restauração, em Manaus) e Valnice Milhomens, fundadora e líder da Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo que, a partir de 2002, mudou o seu título de “pastora” para “apóstola”.

O líder neopentecostal distanciou-se da figura do pastor pentecostal de décadas atrás. Antes, a preocupação principal era visitar os enfermos, ler a Bíblia e orar a fim de preparar as pregações e atender, coletiva e individualmente, as necessidades dos membros da comunidade. Hoje, o líder neopentecostal, com algumas exceções, precisa ser um especialista de marketing, viver dentro dos aviões, ter tempo para as multidões mas não para as pessoas. Veste roupa de grife e precisa sair-se muito bem diante das câmeras de TV. Ele raramente atende a comunidade,

34 Revista Estudos de Religião, nº 17. São Bernardo do Campo, SP. UMESP, p. 41-43.

35 Gênesis 20:1-13 e 1 Samuel 24.6. Veja o livro do pesquisador, Evangélicos em crise (p. 40-42),

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dela dependendo o tempo todo para custear os seus desejos e projetos, sempre muito caros e demandando grandes somas de dinheiro. Mário Justino, ex-pastor da Universal, relata:

Nos bastidores, premiam-se os pastores que conseguem arrecadar mais dinheiro. As fofocas giram em torno do sucesso ou fracasso financeiro de tal filial. O poder sobe à cabeça, e um estilo de vida nada religioso passa a ser a norma entre os líderes da Igreja.36

1.1.3 Origens e crescimento do Neopentecostalismo

O neopentecostalismo tem a sua plataforma no movimento pentecostal surgido no início do século XX, nos Estados Unidos. Os adeptos do pentecostalismo passaram a enfatizar o batismo com (ou no) Espírito Santo como um revestimento de poder subseqüente à conversão e o falar em línguas estranhas como a evidência inicial desse batismo. Outros dons ou manifestações sobrenaturais passaram a fazer parte das reuniões pentecostais, tais como, as curas físicas, profecias, dons de realizar milagres, de discernimento e outros.

Os pentecostais defendem tais crenças e práticas com base no segundo capítulo do livro de Atos dos Apóstolos, onde os apóstolos, Maria – a mãe de Jesus – e vários discípulos (cerca de 120 ao todo), instruídos por Jesus, ficaram reunidos num cenáculo em Jerusalém esperando a vinda do Espírito Santo prometida por Jesus. No qüinquagésimo dia depois da Páscoa, após esperar por dez dias, a promessa de Jesus cumpriu-se. Lucas descreveu assim o evento:

Ao cumprir-se o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar; de repente, veio do céu um som, como de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados. E apareceram, distribuídas entre eles, línguas, como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e passaram a falar em outras línguas, segundo o Espírito lhes concedia que falassem.37

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Quanto à origem do termo Pentecostes, o Dicionário Bíblico informa:

Em Levítico 23:16, a Septuaginta empregou o termo pentêconta hêmeras como a tradução do hebraico hªmishshïm yom, “cinqüenta dias”, referindo-se ao número de dias partindo da oferta do molho de cevada, até ao início da Páscoa. Ao qüinquagésimo dia era a Festa de Pentecoste.Visto que o tempo assim escoado era de sete semanas, era chamada de hagh shabhu´ôth, ‘festa das semanas’ (Ex 34:22; Dt 16:10). Assinalava o término da colheita da cevada, que tinha início quando a foice era lançada pela primeira vez na plantação (Dt 16:9), e quando o molho era movido ‘no dia imediato ao sábado’ (Lv 23:11, 12a). É festa igualmente chamada de hagh haqqãçïr, ‘festa da colheita’ e de yôm habbikkürïm, ‘dia das primícias’ (Ex 23:16; Nm 28:26). Essa festa não se limitava aos tempos do Pentateuco, mas sua observância é indicada nos dias de Salomão (2 Cr 8:13), como o segundo dos três festivais anuais (cf. Dt 16:16).38

Para responder à pergunta sobre o que seria o fenômeno (At 2: 12) e refutar a sugestão de que estivessem embriagados, Pedro citou a profecia de Joel 2:28-32: “E acontecerá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão; vossos jovens terão visões, e sonharão vossos velhos; até sobre os meus servos e sobre as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e profetizarão. Mostrarei prodígios em cima no céu e sinais embaixo na terra; sangue, fogo e vapor de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que venha o grande e glorioso Dia do Senhor. E acontecerá que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo” (Atos 2:17-21). Ao longo da história, o pentecostalismo justifica as manifestações de glossolalia e outras relacionadas com fenômenos sobrenaturais citando uma variedade de textos bíblicos (Atos 2:16-21; 10:44-46; 19:6; 1 Co 12:10).

A manifestação dos dons espirituais não esteve restrita ao livro de Atos dos Apóstolos. O fenômeno de orar em línguas, por exemplo, tem sido constatado em grupos fora do cristianismo. Em sua pesquisa para a tese de doutorado na Universidade de St. Andrews, na Escócia, Ronald Kydd39 investigou e constatou a prática dos dons espirituais nos três primeiros séculos da Igreja Cristã. Kydd analisou vários documentos da Igreja primitiva, começando com o Ensino dos Doze

(38)

Apóstolos, conhecido como a Didaqué.40 Os escritos dos pais da Igreja também foram examinados, entre eles Clemente de Roma, Inácio de Antioquia, o Pastor de Hermas, Justino o Mártir, Irineu, Euzébio de Cesáreia, Hipólito, Novaciano, Tertuliano, Cipriano de Cartago, Orígenes e outros.

Mendonça comenta que dentro da história do cristianismo, a busca de um contato mais íntimo com Deus passa pelo misticismo, pietismo, movimentos que correm à margem da Igreja oficial. A característica principal desses movimentos é a aversão às normas e doutrinas da Igreja, pois entendem que o Espírito Santo revela tudo o que é necessário para a vida do crente. Mendonça trata sobre o montanismo, o movimento monástico, o dos “bega rdes” (de beggar, mendigo, pobre), um movimento do Espírito, de origem monástica.41

Foi no montanismo, liderado por Montano, que os fenômenos pentecostais encontraram ampla guarida. Segundo uma enciclopédia de história da Igreja Cristã,42

o montanismo surgiu na Frigia, na Ásia Menor Romana (Turquia), por volta do ano 172. Tertuliano foi um de seus adeptos mais importantes. Montano não tinha cargo eclesiástico e percorria os lugares acompanhado de duas mulheres, Priscila e Maximila, promovendo o que chamou de “Nova Profecia”, conclamando as pessoas para a volta de Cristo. Isso era feito através da voz do “Parácleto”, uma manifestação profética que falava através das duas mulheres na primeira pessoa. Walker comenta que eles se consideravam porta-vozes do Espírito, afirmando que estava próximo o fim do mundo e que a nova Jerusalém seria brevemente estabelecida na Frigia, para onde se dirigiam os fiéis. Como preparo para a próxima consumação, passaram a pregar um asceticismo rigoroso, o celibato, jejuns e abstinência de carne. Preocupados com o avanço do movimento, os bispos da Ásia Menor convocaram um ou mais sínodos, pouco depois de 160 e condenaram o montanismo.43

40 O Dicionário de Patrística informa que este é o documento mais importante da era pós-apostólica.

Não há consenso quanto à sua datação. Alguns datam o documento entre 50 e 70, outros entre 70 e 90 ou entre 110 e 150. A Didaqué é dividida em 16 capítulos. Até o dez, traz um conteúdo litúrgico. Do 11 ao 15, trata da disciplina eclesial. O último capítulo abrange a volta de Cristo (César Vidal MANZANARES, Dicionário de Patrística, p. 78, 79).

41 Antonio G. MENDONÇA, Protestantes, Pentecostais & Ecumênicos, p. 151-152.

42 Walter A. ELWELL (Ed.), Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, volume II, p. 551-

552.

(39)

Quanto a Montano, Desroche acrescenta:

Jerônimo, com seu estilo habitualmente rude, qualificou Montano como “pregador do espírito imundo [que], com ouro, corrompeu inicialmente muitas igrejas por meio de Priscila e Maximila, duas mulheres nobres e ricas, manchando-as em seguida com a heresia”.44

Paul Tillich comenta sobre a supressão do montanismo pela igreja e os seus resultados:

A igreja cristã excluiu o montanismo do seu seio. Contudo, a vitória sobre o montanismo resultou em perda. Podemos vê-la da seguinte maneira: 1. O cânon venceu sobre a possibilidade de novas revelações. A solução do quarto Evangelho de que sempre haveria novas percepções da verdade, sob a crítica do Cristo, foi, pelo menos, reduzida em poder e sentido. 2. A hierarquia tradicional triunfou contra o espírito profético. Com isto excluía -se, mais ou menos, o espírito profético da igreja organizada levando-o a se abrigar em movimentos sectários. 3. A escatologia perdeu grande parte da importância visível na era apostólica. A organização eclesiástica passou a ocupar o primeiro lugar. A expectativa do fim reduziu-se ao apelo aos indivíduos para que se preparassem para o seu fim pessoal que poderia vir a qualquer momento. Depois desse período a idéia do fim da história deixou de ter importância. 4. A rígida disciplina dos montanistas foi abandonada, substituída pelo afrouxamento crescente dos costumes. O que se passou nesta época tem-se repetido freqüentemente na história da igreja. Surgem pequenos grupos com rigorosa disciplina; tornam-se suspeitos dentro da igreja; separam-se e formam grandes igrejas; em seguida perdem o poder disciplinar original.45

Para Paulo Rivera, a expressão “religiões pentecostais” busca representar todas as religiões que descaracterizaram os fatos fundadores cristãos e os substituíram pela centralidade do Pentecostes, constituindo a nova referência fundadora. O autor acrescenta ainda:

Sociologicamente, o cristianismo caracterizou-se por definir suas origens em torno das doutrinas sobre Jesus Cristo. O protestantismo remetia -se ao mesmo fato fundador através da Bíblia. Já no pentecostalismo, opera-se uma mudança radical na referência ao fato fundador. O acontecimento de Pentecostes ocupa o lugar fundamental e as doutrinas em torno de Jesus

(40)

Cristo são relegadas. Os pentecostalismos contemporâneos representam uma radicalização desse distanciamento com as religiões cristãs.46

1.1.4 A influência pietista

O movimento metodista na Inglaterra, fundado por João Wesley (1703-1791), no século dezoito, contribuiria grandemente para o surgimento do pentecostalismo. Wesley foi influenciado por um grupo pietista na Alemanha em 1555, os Morávios, que pregavam a necessidade do novo nascimento e da conversão. Em 24 de maio de 1738, Wesley47 passou por uma experiência de conversão que mudaria totalmente a sua vida. Enquanto ouvia, numa reunião, a leitura do prefácio do comentário do Livro de Romanos, escrito por Martinho Lutero, seu coração foi “estranhamente aquecido”. Esta experiência fez dele um evangelista. Ele mesmo declarou: “Então, foi do agrado de Deus acender um fogo, que confio, nunca se apagará”.48

O Breve Dicionário de Pensadores Cristãos49 informa que o pietismo nasceu na Alemanha protestante do século XVII e estendeu-se por toda a Europa, promovendo a fé pessoal em protesto contra a secularização da Igreja. O movimento abraçou a “teologia do coração” baseada nos escritos de Johann Arndt, na leitura e meditação da Bíblia e nos hinos da liturgia luterana. O nome que mais se destacou no movimento pietista foi o de Phillip Jacob Spener (1635-1705). Ao ver a vida decadente da cidade de Frankfurt, organizou os primeiros Collegia Pietatis, que reuniam leigos cristãos para troca de experiências e leitura espiritual, e escreveu uma obra que se tornou um clássico do cristianismo: Pia Desideria. Nessa obra, apresentou seis propostas de reforma da Igreja:

1. Sugeriu divulgar a palavra de Deus entre o povo com maior abundância. Era, para ele, o melhor meio de melhorar a situação da Igreja.

46 Paulo B. RIVERA, op. Cit., p. 234.

47 Para mais informações sobre Wesley, ver as obras de HEITENRATER, R. P. Wesley e o povo chamado Metodista e RUNYON, T. A nova criação. A teologia de João Wesley hoje.

48 Douglas, J.D. (Ed.), The New Internacional Dictionary of the Christian Church, Zondervan

Publishing House, Michigan, EUA, 1978, p. 1034.

Referências

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