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Capítulo 3 – Análise da prática pastoral da Igreja Internacional da Graça de Deus e

3.2 Entrevista com Eber Cocareli

3.2.4 O Ministério Pastoral da Igreja da Graça

A Igreja da Graça estabelece alguns critérios para alguém chegar ao ministério pastoral, que inclui homens e mulheres. O desenvolvimento espiritual da pessoa é constantemente observado pelo pastor da igreja local. Segundo Eber, eles dizem que isso acontece por revelação, não sendo uma revelação propriamente mística. E Deus vai dando as dicas: “repara nesse irmão, repara nessa irmã”, comenta Eber. Em seguida, a pessoa é chamada para se tornar um obreiro voluntário e passa a ajudar nos cultos e em outras tarefas da igreja, seja limpando salão de reuniões, preparando o cafezinho, recepcionando os fiéis, distribuindo literatura ou recolhendo ofertas. Esse obreiro voluntário, como também os evangelistas, estarão na igreja sempre que possível, participando de reuniões sistemáticas e semanais organizadas pela Igreja da Graça. Foi dito que a Igreja é muito organizada.

O evangelista da Igreja da Graça é alguém que passou pela fase de obreiro e teve a sua vocação para o ministério confirmada, tanto no seu coração quanto no coração do seu pastor. Ele deve então deixar suas atividades profissionais ou o emprego, se o tiver, passando a viver da Igreja da Graça, recebendo o salário mínimo. Segundo Eber, é mínimo mesmo. É o período de teste, de sua provação, não recebendo nem ajuda financeira para o aluguel. Ele estará vivendo pela fé. Vários deles passam a morar na igreja, cuidam dela em todos os seus aspectos e começam a dirigir as reuniões menores. Essa é também uma época de aprendizado e, a exemplo dos moços dos profetas no Antigo Testamento, continuam recebendo instruções de seus pastores. É um processo que se estende por um período de tempo.

Quando o pastor percebe que um evangelista já é capaz de dirigir uma reunião, já sabe pregar, administrar uma igreja, recomenda-o ao seu líder estadual e ele passa a ser considerado o evangelista do pastor líder. É esse pastor líder quem vai indicá-lo para ser ordenado a pastor pelo Missionário. Na Igreja da Graça, apenas o Missionário tem autonomia para ordenar alguém ao ministério pastoral. É o líder estadual quem o designa para cuidar de uma igreja. De acordo com Cocareli, a Igreja da Graça tem poucos pastores ordenados, pois o Missionário leva extremamente a sério, chegando às raias do absurdo, aquele texto que diz: “A ninguém imponhas precipitadamente as mãos” (1Tm 5.22). Esses são os passos: obreiro, obreiro voluntário, evangelista e pastor. Não há bispos ou apóstolos na Igreja da Graça.

Para ser pastor na Igreja da Graça, não é imprescindível ter formação teológica ou superior. Entretanto, há uns seis anos, o Missionário criou uma escola chamada AGRADE (Academia Teológica da Graça de Deus) e passou a encorajar os obreiros e evangelistas a estudarem teologia ou um outro curso superior. Soares tem dado muita ênfase ao desenvolvimento cultural de seus pregadores, pois entende que o mundo de hoje exige muito mais das pessoas. Se chegar alguém na igreja e ouvir um pastor falando errado, não ficará bem. Assim, R. R. Soares tem, de vez em quando, investido na formação de seus pastores, pagando do próprio bolso para lhes dar cursos intensivos de português, de Bíblia e matérias teológicas. Havia uma atividade bimestral na Igreja da Graça, que reunia de 200 a 300 pastores, num certo local, para um curso de reciclagem, com duração de 30 dias. Os pastores participavam acompanhados de suas esposas. Os temas eram variados: português,

administração eclesiástica, aconselhamento pastoral, homilética e problemas familiares.

A AGRADE funciona como um seminário teológico. Eber conta que no início as pessoas pensavam tratar-se de uma academia de ginástica. A Igreja da Graça está tentando transformá-la numa faculdade com o reconhecimento do MEC. Tanto o corpo docente quanto o discente são formados por pessoas de quase todas as denominações. O curso da AGRADE é composto de 36 disciplinas divididas em três áreas: Cultura Bíblica, Instrumentação Teológica e Cultura Geral.

A rotina de trabalho de um pastor depende da região onde a sua igreja se encontra. Durante o dia, a igreja é administrada pelo evangelista que ministra nas reuniões menores. Os cultos geralmente acontecem às 9 horas, às 14 horas e um à noite. As reuniões diurnas têm menos pessoas e, por isso, são chamadas reuniões menores. Já nos grandes centros urbanos, todas as reuniões atraem grandes multidões, exigindo uma presença constante do pastor e seus auxiliares. A rotina de trabalho do Missionário foi descrita por Eber como uma “loucura”, pois ele não pára. Eber tem certeza absoluta de que se trata de um workaholic. A esposa do Missionário não consegue acompanhar o seu ritmo e, na maioria das vezes, ele acaba viajando sozinho. O casal tem cinco filhos homens: Davi, André, Marcos, Daniel e Felipe. Devido aos muitos compromissos do Missionário, a educação de todos eles ficou por conta da mãe. Até o momento, os filhos de R. R. Soares não parecem inclinados a seguir os seus passos em direção ao púlpito. Todos eles, com exceção do caçula, estudaram Direito. Davi é mais administrador do que pastor.

O Missionário passa o tempo todo envolvido com a obra de Deus, seja realizando uma campanha, gravando programas para a televisão ou preparando estudos bíblicos. Uma boa parte do seu tempo é consumida escrevendo livros ou artigos que publica na Revista Graça Show da Fé, além de se envolver com parte da administração da Igreja. Com tanta atividade, não há espaço para lazer na vida de R. R. Soares. Como disse Eber: “Lazer para o Missionário é pregar”. Se alguém perguntar ao Missionário como ele descansa, responderá que é pregando. Eber acha que ele se diverte pregando e diz que prefere conversar com ele sempre depois de algum culto em que ele pregou, pois parece ser outra pessoa. Antes do culto, ele

geralmente está tenso, preocupado, cansado, ou aborrecido com alguma coisa. Mas, nunca alguém o vê mal depois de um culto, quando ele mais parece uma criança. Ele se diverte.

Quanto ao relacionamento dos pastores com as ovelhas, Eber comentou que isso depende da personalidade de cada um. Há pastores que são mais abertos e solícitos. Soares é da opinião de que todo pastor deveria ficar na calçada da igreja convidando as pessoas para entrar na reunião e cumprimentando as que saem. Nas igrejas de bairro é mais fácil fazê-lo. Se realmente acontece, Eber não sabe. Por outro lado, o Missionário fez muito isso quando era jovem, ao iniciar o ministério. Não é de praxe o pastor freqüentar a casa de um membro para tomar cafezinho ou para outras atividades sociais. Quando alguém está com algum problema familiar ou enfermidade e solicita a visita do pastor, ele atende. Se for de uma igreja sede, um dos pastores assistentes é orientado a ir.

Não há contato pessoal de R. R. Soares com seus adeptos. Ele nunca aparece conversando com alguém num diálogo informal. Quando conversa, é para saber mais detalhes sobre uma cura, uma bênção financeira ou um milagre, mesmo assim, à distância, durante a gravação de um culto para a televisão. Para atender aos seus fiéis, existe um link da “On Grace” denominado “Fale com o Missionário”, para receber o e-mail das pessoas. É Eber quem filtra os e-mails de Soares. No dia desta entrevista, no fim da tarde, Eber ainda tinha 460 e-mails para ler.

Não existe Escola Dominical na Igreja da Graça. Há uma atividade para as crianças denominada “Escolinha”, que acontece durante os cultos. Ao chegar à igreja, acompanhada de seus pais ou por uma outra pessoa adulta, a criança é encaminhada por uma obreira para a “Escolinha” aonde os obreiros voluntários vão dar-lhe assistência espiritual e recreativa durante o culto. Não se adota uma faixa etária específica para selecionar as crianças. Quanto aos jovens, toda igreja local tem um evangelista ou um pastor responsável pela reunião da juventude, que acontece, geralmente, aos sábados à tarde.

Um dos grandes desafios para R. R. Soares e seus pastores é distribuir o tempo entre o ministério, família, descanso e lazer. Contrariando o ponto de vista da

maioria dos líderes evangélicos, Soares prioriza o ministério acima da família. Em outras palavras, primeiro o ministério, depois a família. E isso é, enfaticamente, ensinado aos pastores da Graça. Para o Missionário, a família do pastor deve estar dentro da igreja, com ele. Por essa razão, não apenas o pastor, mas também a sua família deve ter o chamado para o ministério pastoral. Para Eber, Soares é um dos poucos líderes que defende e ensina tal posição.

Não há na Igreja da Graça uma preocupação com a assistência social. Eber afirma que cada igreja local trata dessa questão da forma que puder ou achar melhor. A Igreja da Graça arrecada doações em dinheiro mas nunca dá dinheiro. É proibido dar dinheiro. Não se dá dinheiro a ninguém. Há doações de gêneros alimentícios de cesta básica que são distribuídos aos membros carentes da Igreja na medida da disponibilidade e da procura. Contudo, não há ênfase no ministério de assistência social. Quando perguntado por que isso não ocorre, Soares diz que existe o risco da Igreja perder-se na ação social e deixar o evangelho de lado. Certa vez, ao questioná- lo sobre o assunto, Eber citou-lhe Mateus 25274 e obteve do Missionário a seguinte explicação: “Eber, isso aí é espiritual. Quando diz fome, significa fome da Palavra de Deus, quando diz sede, é sede de Deus, nu significa sem as vestes de justiça”.