• Nenhum resultado encontrado

Pesquisa em direito e desenvolvimento Direito GV

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Pesquisa em direito e desenvolvimento Direito GV"

Copied!
138
0
0

Texto

(1)
(2)

EDITOR DESDE 2004, JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ

DIREITO – PERIÓDICOS. I. São Paulo. DIREITO GV Todos os direitos desta edição são reservados à DIREITO GV

DISTRIBUIÇÃO

COMUNIDADE CIENTÍFICA

ASSISTENTE EDITORIAL

FABIO LUIZ LUCAS DE CARVALHO

PROJETO GRÁFICO

ULTRAVIOLETA DESIGN

IMPRESSÃO E ACABAMENTO

COPIBRASA

DATA DA IMPRESSÃO SETEMBRO/2008

TIRAGEM 500

PERIODICIDADE BIMESTRAL

CORRESPONDÊNCIA

PUBLICAÇÕES DIREITO GV

RUA ROCHA, 233 - 7º ANDAR 01330-000 SÃO PAULO SP WWW.FGV.BR/DIREITOGV PUBLICACOES.DIREITOGV@FGV.BR

CADERNOS DIREITO GV

v.5 n.5 : setembro 2008

CADERNOS DIREITO GV

v.5 n.5 : setembro 2008

PUBLICAÇÃO DA DIREITO GV ESCOLA DE DIREITO DE SÃO PAULO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ISSN 1808-6780

(3)
(4)
(5)

APRESENTAÇÃO

O objetivo deste evento, realizado em 03 de outubro de 2006, foi retomar o debate lançado em 2002 no evento "O que é pesqui-sa em Direito?" (cuja transcrição foi publicada em livro pela Editora Quartier Latin), partindo agora de um recorte temático específico, Direito e Desenvolvimento, campo em que se concen-tra a pesquisa de nossa Escola.

Tal campo, em nossa interpretação, pressupõe a existência de uma via de mão dupla: de um lado, o Direito sendo demandado por pautas de Desenvolvimento econômico, político e social e, de outro, o Direito conformando e regulando o Desenvolvimento conforme com sua racionalidade própria.

A proposta, portanto, é discutir, de um lado, como o Direito pode potencializar o desenvolvimento econômico, político e social e, de outro, como a pesquisa jurídica pode prestar a sua par-cela de contribuição para este debate; vistos o desenvolvimento da pesquisa em Direito e o Estado de Direito, em si mesmos, como fatores de desenvolvimento.

Este primeiro seminár io sobre o tema contou com a presen-ça de professores de dentro e fora da DIREITO GV, a quem agradecemos a colaboração neste debate que, a partir de agora, será contínuo.

(6)
(7)

ÍNDICE

PARTICIPANTES 9

ABERTURA

ARY OSWALDO MATTOS FILHO (DIREITO GV) 15

TEMA 1 PANORAMA ATUAL DA PESQUISA EM DIREITO NO BRASIL 17

MEDIAÇÃO RAFAEL FRANCISO ALVES (DIREITO GV) 17

EXPOSIÇÃO OSCAR VILHENA VIEIRA (DIREITO GV)1 18

DEBATE ROBERTO DA SILVA FRAGALE FILHO (UFF) 21

CELSO FERNANDES CAMPILONGO (USP) 32

OSCAR VILHENA VIEIRA (DIREITO GV) 42

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA (FGV/EESP) 48

PERGUNTAS JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ (DIREITO GV) 51

FLAVIA PORTELLA PÜSCHEL (DIREITO GV) 51

ARY OSWALDO MATTOS FILHO (DIREITO GV) 52

RESPOSTAS ROBERTO DA SILVA FRAGALE FILHO (UFF) 55

CELSO FERNANDES CAMPILONGO (USP) 57

OSCAR VILHENA VIEIRA (DIREITO GV) 58

TEMA 2 QUAL A IMPORTÂNCIA ATUAL DO DEBATE SOBRE 61

DIREITO E DESENVOLVIMENTO?

MEDIAÇÃO MARIA LUCIA LABATE MANTOVANINI PADUA LIMA (DIREITO GV) 61

EXPOSIÇÃO JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ (DIREITO GV) 61

MÁRIO GOMES SCHAPIRO (DIREITO GV) 67

(8)
(9)

GLAUCO ANTONIO TRUZZI ARBIX (USP) 80

LUIS CARLOS BRESSER-PEREIRA (FGV) 84

PERGUNTAS OSCAR VILHENA VIEIRA (DIREITO GV) 93

ESDRAS BORGES DA COSTA (DIREITO GV) 93

RONALDO PORTO MACEDO JÚNIOR (DIREITO GV) 94

MICHELLE RATTON SANCHEZ (DIREITO GV) 95

GLAUCO ANTONIO TRUZZI ARBIX (USP) 95

MARIANO FRANCISCO LAPLANE (UNICAMP) 97

RESPOSTAS JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ (DIREITO GV) 99

MÁRIO GOMES SCHAPIRO (DIREITO GV) 100

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA (FGV) 101

TEMA 3

MESA DE DEBATES:

PROJETOS DE PESQUISA EM DIREITO E DESENVOLVIMENTO2

MEDIAÇÃO MAÍRA ROCHA MACHADO (DIREITO GV)

DEBATE DIOGO ROSENTHAL COUTINHO (USP) MICHELLE RATTON SANCHEZ (DIREITO GV) RONALDO PORTO MACEDO JÚNIOR (DIREITO GV) SAMYRA HAYDÊE DAL FARRA NASPOLINI SANCHES (UNITOLEDO) VLADMIR OLIVEIRA DA SILVEIRA (FADISP) WELBER OLIVEIRA BARRAL (UFSC)

APÊNDICE PERSPECTIVAS PARA A PESQUISA EM DIREITO E DESENVOLVIMENTO

JOSÉ RODRIGO RODRIGUEZ 105

1 Como o professor Marcos Nobre (Unicamp) não pôde estar presente no evento, o texto “O que é pesquia em direito” foi apresentado pelo professor Oscar Vilhena Vieira (DIREITO GV).

(10)
(11)

PARTICIPANTES

Ar y Oswaldo Mattos Filho

Mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo (USP) e em Direito Tributário pela Harvard University (Estados Unidos) Doutor em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP) Pós-doutor em Direito pela Harvard University (Estados Unidos) Visiting Scholar na Harvard Law School (Estados Unidos)

Professor titular da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV/EAESP)

Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo Professor e diretor da DIREITO GV

Árbitro da Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA) e da Câmara de Arbitragem do Mercado (CAM)

Associado da Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT) Associado efetivo do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) Presidente da Comissão Federal para Reforma Fiscal

Ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) Ex-membro do Conselho Monetário Nacional (CMN)

Celso Fer nandes Campilongo

Mestre e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) Pós-doutor em Direito pela Universita degli Studi di Lecce (Itália) Livre-docente em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP)

Diogo Rosenthal Coutinho

Mestre em Msc Regulation pela London School Of Economics And Political Science (LSE) (Grã-Bretanha)

(12)

Glauco Antonio Truzzi Arbix

Doutor em Sociologia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP)

Pós-doutor em Sociologia pela Cornell University (Estados Unidos), pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) (Estados Unidos), pela London School of Economics and Political Science (LSE)

(Grã-Bretanha), pela Columbia University (CUNYC) Estados Unidos e pela University of California at Berkeley (UCB) (Estados Unidos) Livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP)

José Rodr igo Rodr iguez

Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo (USP)

Doutor em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Editor da Revista DIREITO GV

Coordenador de Publicações da DIREITO GV

Pesquisador do Núcleo Direito e Democracia do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

Luiz Carlos Bresser-Pereira

Mestre em Master of Business Administration pela Michigan State University (MSU) (Estados Unidos)

Doutor e livre-docente em Economia pela Universidade de São Paulo (USP)

Professor Emérito da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP)

Presidente e Editor da Revista de Economia Política do Centro de Economia Política

Maíra Rocha Machado

Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) Professora da DIREITO GV

(13)

Marcos Nobre

Mestre e doutor em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) Pós-doutor pela Universitat Frankfurt an Main - Johann Wolfgang Goethe (Alemanha)

Mar ia Lucia Labate Mantovanini Padua Lima

Doutora e mestra em Ciência Econômica pela Universidade de Campinas (Unicamp)

Coordenadora de Relações Internacionais da DIREITO GV

Mar iano Francisco Laplane

Doutor em Ciência Econômica e Professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

Már io Gomes Schapiro

Mestre e doutorando em direito econômico pela Universidade de São Paulo (USP)

Coordenador de Pesquisa da DIREITO GV

Pesquisador do Núcleo Direito e Desenvolvimento do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

Michelle Ratton Sanchez

Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) Professora da Direito GV

Oscar Vilhena Vieira

Mestre e doutor em Ciência Política pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP) Mestre em Direito pela Universidade de Columbia (Estados Unidos) Pós-doutor pela St. Antonies College, Universidade de Oxford (Estados Unidos)

(14)

Rafael Francisco Alves

Mestrando em Direito Processual Civil pela Universidade de São Paulo (USP)

Assessor da Diretoria da DIREITO GV

Professor do módulo de Mediação, Conciliação e Arbitragem do Curso de Especialização em Advocacia Cível do Programa GVlaw (Direito GV) e do DIREITO-PEC (DIREITO RIO)

Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr)

Roberto da Silva Fragale Filho

Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ)

Doutor em Ciência Política pela Université de Montpellier (França)

Ronaldo Porto Macedo Júnior

Mestre em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP)

Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) Pós-Doutor em Direito (Visiting Researcher) Yale Law School (Estados Unidos)

Visiting Scholar na Harvard Law School Harvard University (Estados Unidos)

Especializado em Direito do Consumidor pela Université Catholique de Louvain (Bélgica)

Professor da DIREITO GV

Samyra Haydêe Dal Farra Naspolini Sanches

Mestra em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP)

(15)

Vladmir Oliveira da Silveira

Mestre e doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP)

Professor da Faculdade Autônoma de Direito (Fadisp)

Professor assistente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP)

Welber Oliveira Barral

Especializado em Teoria e Análise Econômica pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul)

Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP)

Pós-doutor pela Georgetown University (GU) (Estados Unidos) Professor da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra)

Professor licenciado Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Professor visitante da American University (AU) (Estados Unidos),

Penn State University (PEU) (Estados Unidos), Vytautasmagnus University School of Law (VMU) (Lituânia), Universidad de Valencia (UV) (Espanha), Universidade Estadual de Londrina (UEL)

(16)
(17)

ABERTURA

Ar y Oswaldo Mattos Filho (DIREITO GV)

Bom dia a todos.

Uma das tradições que a Escola deseja quebrar é a de que o Diretor da Escola se limite a abrir e fechar os eventos. O Diretor, como qualquer ser humano, também gosta de aprender. Assim, declaro abertos os trabalhos e, logo em seguida, vou me sentar para escutar. Antes disso, gostaria de dizer algumas palavras sobre nossa Escola.

A DIREITO GV, desde a sua concepção, buscou criar alguns diferenciais. O primeiro deles relaciona-se com as metodologias para o ensino do Direito. É impressionante como os professores primários e os professores de jardim de infância se preocupam com metodologias de ensino em um grau bem maior do que no Direito. Depois, no ginásio, essa preocupação ainda existe, porém, vai diminuindo. Quando chega ao nível universitário, principal-mente no que diz respeito ao Direito, a metodologia não só é considerada irrelevante, como ninguém ensina um professor de Direito a dar aulas. Eu aprendi a dar aula tentando copiar meus bons professores. A sorte é que eu não optei por fazer Medicina. Se eu fosse praticar Medicina aprendendo por mim mesmo, sem ninguém para me ensinar como transmitir meu conhecimento, o resultado poderia ser uma bela condenação penal (risos).

A pesquisa é outra atividade fundamental no campo do Direito, mas pouco praticada. Nós realizamos, há um ano e pouco atrás, o primeiro seminário sobre metodologia de pesquisa. O que é pes-quisa em Direito? Como se faz pespes-quisa em Direito? Como adequar a pesquisa em Direito à realidade brasileira? Por meio da

(18)

pesquisa livresca, baixando uma biblioteca inteira de autores internacionais desligados do contexto nacional? A preocupação com a pesquisa em Direito faz parte da alma desta Escola.

Dou as boas-vindas aos Professores Celso Campilongo, Roberto Fragale Filho e Oscar Vilhena e ao nosso mediador Rafael Alves.

(19)

TEMA 1 - PANORAMA ATUAL DA PESQUISA EM DIREITO NO BRASIL

MEDIAÇÃO - Rafael Francisco Alves (DIREITO GV)

Bom dia a todos e ao Professor Ary Oswaldo, que acaba de abrir o evento.

Iniciaremos agora os debates de hoje, que conta com três pai-néis. O primeiro trata do “Panorama atual da pesquisa em Direito no Brasil”. Aproveito o momento para informar que o Professor Marcos Nobre, infelizmente, não poderá estar presente por moti-vos de saúde. O Professor Oscar Vilhena fará um relato sobre o texto da exposição encaminhado pelo Professor Marcos.

Antes de passar a palavra aos demais debatedores, gostaria de fazer algumas breves considerações sobre a importância e o significado deste evento.

Como o Professor Ary Oswaldo bem disse, passaram-se já alguns anos desde a realização do evento “O que é pesquisa em Direito”, realizado pela DIREITO GV em 2002. Eu dir ia que, de 2002 até o presente, tivemos muitos avanços, tanto do ponto de vista externo quanto do ponto de vista interno da ins-tituição. Do ponto de vista exter no, independentemente de concordar ou não com a tese do Professor Marcos Nobre, o texto teve uma repercussão muito grande, o que foi uma sur-presa, creio que para todos nós e para o autor. O texto teve grande repercussão na comunidade jurídica e de fato contr i-buiu para reavivar a discussão sobre pesquisa jurídica. Do ponto de vista inter no, aquele evento foi um marco para nossa pesquisa institucional. Foi naquele momento que definimos nossa linha de pesquisa, que passou a guiar nossos projetos e publicações. Nossa aposta se deu na vinculação da pesquisa ao contexto social em que se encontra o Direito, ou seja, pesqui-sas empír icas e aplicadas. Nossa escolha já rendeu bons frutos, como demonstram nossas publicações.

(20)

Assim, o evento tem dois propósitos: retomar o debate inicia-do em 2002 pelo texto inicia-do Professor Marcos Nobre sobre o que é pesquisa em Direito e iniciar um debate com a comunidade externa sobre o que seria pesquisa em Direito e Desenvolvimento, foco de pesquisa da DIREITO GV. Passo, então, a palavra ao Professor Oscar Vilhena.

EXPOSIÇÃO - Oscar Vilhena Vieira (DIREITO GV)

(trecho revisto pelo autor)

Gostar ia de agradecer imensamente ao Rafael Alves pelo convite e pelo empenho da DIREITO GV na organização deste evento, central para Escola. Como todos sabem, nosso progra-ma de pós-graduação, que vem sendo organizado no passar dos últimos anos, tem na pesquisa o seu eixo central. Daí a refle-xão sobre a pesquisa no campo do Direito ser premente para nosso programa.

O grande desafio desta Escola é superar o enciclopedismo e, de certa forma, romper um círculo autista que tem marcado de maneira tão acentuada a maior o parte dos trabalhos acadêmi-cos hoje produzidos no Brasil. Criar um campo propriamente jurídico de pesquisa, imbricado na realidade brasileira, capaz de responder aos grandes desafios de nossa sociedade e, mais do que isso, voltado a contr ibuir criticamente com a construção do desenvolvimento, nas suas vertentes política, econômica e social, é o que nos propomos.

Minha missão aqui seria relatar o tema do Professor Marcos Nobre, que infelizmente não pôde comparecer. Minha tarefa ini-cial, portanto, será apresentar o seu texto “O que é pesquisa em Direito”, escrito quando esta Escola ainda estava em processo de estruturação. Como tudo o que é produzido pelo Professor Marcos Nobre, trata-se de um texto instigante e provocador. Vindo de uma exper iência bastante sólida em pesquisa no campo das ciências humanas, lançou um olhar externo sobre o que é feito no campo jurídico. A perspectiva privilegiada de quem olha de fora é fundamental para aqueles que buscam fazer uma reflexão crítica sobre o pensamento jurídico.

(21)

que coordena o programa de Direito da Universidade Santo Andrés, em Buenos Aires. Ambos nos alertam sobre o problema de que grande parte da reflexão jurídica é produzida por auto-res que estão diretamente e, muitas vezes, profissionalmente liga-dos aos problemas sobre os quais estão escrevendo. O pensamento jurídico na América Latina desenvolve-se fundamentalmente em torno dos seus praticantes, daqueles que atuam diretamente no campo do Direito. Não há centros independentes de pensamen-to jurídico que produzam uma reflexão autônoma sobre as ins-tituições jurídicas e o próprio pensamento jurídico. Assim, grande parte das análises jurídicas é derivada de um pensamento auto-interessado, e não imparcial.

O Professor Marcos Nobre chamou isso de modelo do “pen-samento jurídico do parecer”, ou seja, os jur istas são, por excelência, parecer istas do mercado. Nor malmente, as ques-tões jurídicas são práticas, e os juristas são pagos para resolvê-las. Por exemplo, quando surge um problema relacionado à priva-tização de um deter minado setor, alguém encomenda uma justificativa jurídica para favorecer uma determinada for ma de resolver aquele problema. O jurista, então, desenvolve a “enco-menda”. Em um curto prazo, esse parecer vira um artigo e, eventualmente, um livro de natureza acadêmica.

Assim, segundo o Professor Marcos Nobre, grande parte da nossa reflexão acadêmica seria derivada dos impulsos que surgem do mercado para a resolução de problemas concretos. Ressalto que o professor não diz que esse seja o único modelo de reflexão aca-dêmica, mas que representa uma parte substantiva da mesma. Como conseqüência, a condição de verdadeiros e independentes acadêmicos seria furtada. Os juristas estariam simplesmente a reboque dos impulsos do mercado.

(22)

momento em que forem criadas as condições institucionais para desenvolver uma reflexão independente e autônoma para a reso-lução de demandas que provêem do mercado começaremos a fazer uma reflexão propriamente acadêmica no campo do Direito. Penso que este seja o cerne da questão posta pelo Professor Marcos Nobre. Reservo-me o direito de, posteriormente, fazer alguns comentários críticos em torno de suas proposições.

MEDIAÇÃO - Rafael Francisco Alves (Direito GV)

(23)

DEBATE

Roberto da Silva Fragale Filho (UFF) (trecho revisto pelo autor)

Bom dia. Inicialmente, gostaria de agradecer o convite que a DIREITO GV me fez por meio do Rafael. É uma oportunidade única para conhecer uma instituição que já vem se assumindo como referência, balizando a discussão sobre o que é pesquisa em Direito, que tenho acompanhando pela Internet. Até então, essa era a única forma por que eu tinha acesso às informações, além das publica-ções, e assim se torna mais concreto o relacionamento com a instituição. Aproveito para dar os parabéns ao Professor Oscar Vilhena, que conseguiu fazer um resumo absolutamente fantástico da proposta sustentada pelo Professor Marcos Nobre há alguns anos. Essa proposta, em um determinado momento e à medida que alguns de seus aspectos incomodavam ou suscitavam um problema que me parecia mais complicado, deu origem a um artigo que escrevi com o Professor Alexandre Veronese e foi publicado na

Revista Brasileira de Pós-Graduação (RBPG), editada pela Capes.

Lamento a ausência do Professor Marcos, não só pela impossibili-dade de conhecê-lo, e demonstro meu prazer em rever o Professor Celso Campilongo, que há muito tempo não encontrava.

(24)

Parece-me muito claro que o grande objeto de convergên-cia é a preocupação com a pesquisa em Direito. O objeto de reflexão que nos diz respeito são as formas e como pode ser construída a pesquisa em Direito, fazendo o que eu chamaria de um diálogo explícito com o sistema nacional de pós-graduação. Como trabalharemos a inserção da pesquisa nesse sistema?; como a pesquisa será introduzida em espaços institucionaliza-dos, em espaços educacionais, em laboratór ios?; como será trabalhada e como posso ter, depois, a socialização do conhe-cimento produzido? Esse me parece ser o grande ponto de convergência entre os textos.

Por outro lado, existem algumas divergências que não pre-tendo explorar, mas, ao contrário, prepre-tendo me fixar naquilo que o próprio Professor Marcos Nobre, no texto que nos enviou, sina-liza com o que ele chama de pequena divergência entre os dois textos. Que divergência é essa? Ele a coloca como uma espécie de pergunta: a perspectiva da discussão epistemológica e meto-dológica deve ser feita por meio de uma reformulação ou não da dogmática? Devemos fazer primeiro a reformulação da dog-mática e a discussão epistemológica e metodológica virá a reboque dessa modificação, dessa renovação da dogmática? Em um processo de renovação da dogmática, seremos obrigados a discutir os métodos que vêm sendo utilizados até então?

Mas, diz ele, há uma segunda perspectiva que consistiria em colocar a dogmática em segundo plano em favor de uma refle-xão inicial, epistemologica e metodologicamente mais consistente. A ordem aqui é invertida e se faz necessár io, antes de proce-der à renovação da dogmática, discutir a perspectiva epistemológica e a perspectiva metodológica daquilo que se rea-liza em ter mos de pesquisa na área do Direito. Entre essas duas alternativas será desenvolvido o debate entre os textos e, em linhas gerais, esses são os pontos de convergência e diver-gência entre eles.

(25)

Primeiramente, o Professor Marcos trabalha a reformulação da dogmática mediante o combate a um modelo de produção de pes-quisa que ele chama de “modelo de parecer”. É fundamental, a partir da linha de raciocínio desenvolvida por ele, combater esse modelo na medida em que estaria atrelado à lógica da prática jurí-dica e, por isso, sofreria um impacto ou influxo do mercado e da demanda em relação a determinadas circunstâncias particulares de conflito. Mas o Professor Marcos vai além e acrescenta que essa resposta de reformulação da dogmática tem que ser feita comba-tendo também o modelo em torno do produtor da pesquisa. Temos de romper com a lógica de que a pesquisa é feita apenas pelo prático e lutar pela institucionalização, criação de institu-tos de pesquisa e espaços dedicados à pesquisa.

Como essas duas perspectivas, esses dois modelos, esses dois instantes se traduzem? Como vamos observar esses dois mode-los? No primeiro texto escrito pelo Professor Marcos, “O que é pesquisa em Direito?”, o combate ao modelo do parecer tomou conta de sua reflexão. Já no texto que recebemos a reflexão do professor está voltada àquilo que ele chamará de uma crítica intra-dogmática, ou seja, uma crítica feita a partir da dogmática no interior da dogmática e que, no limite da sua atuação, possibili-tará uma reconfiguração da dogmática, aproximando-a da realidade social. Na medida em que repenso a dogmática por dentro, alcan-ço ou me aproximo de uma circunstância menos ideal e faalcan-ço com que a minha produção se abra à realidade.

Por outro lado, ele defende a profissionalização da ativida-de da pesquisa. Claramente aativida-dentramos no terreno da sociologia das profissões, em que uma nova profissão será criada. “Professor de Direito” ou “Pesquisador em Direito” não mais seriam ati-vidades representativas do prolongamento de uma determinada realidade judicial. Ao contrár io, são atividades por si, e ele sinaliza de forma muito clara como atividades full time, de

dedi-cação integral.

(26)

do meu roteiro, é sinalizar o que identifico como um problema na proposta do Professor Marcos Nobre.

Assim como dividi a proposta do Professor Marcos em duas partes, trabalharei também sua crítica em dois momentos: o primeiro chamarei de “reconfiguração da dogmática” e o segun-do de “profissionalização segun-docente na pesquisa”. O terceiro momento será, portanto, também tratado em dois tempos: os pro-blemas que identifico na reconfiguração da dogmática e os problemas que reconheço na institucionalização ou profissiona-lização por ele defendida.

É preciso, entretanto, ressalvar que boa parte dessas questões não significa necessariamente desacordo com o panorama que o Professor Marcos Nobre está traçando. Apenas me parecem ser problemas para alcançar aquilo que ele pôs como objetivo. Ele sinaliza de forma clara que deseja uma institucionalização, ou uma nova institucionalidade da pesquisa, e, nesse aspecto, acho que os nossos pontos de partida e de chegada são os mesmos. O que se me afigura ser diferente são os percursos realizados nas duas propostas ou naquilo que ofereço como alternativa ao problema que o Professor Marcos Nobre sinaliza. Quero deixar claro que não pretendo apresentar uma resposta a esses proble-mas, e sim juntar esforços para que eventualmente possamos combatê-los juntos.

A reconfiguração da dogmática é o primeiro problema trata-do pelo Professor Marcos Nobre. É inequívoco o que ele nos está sinalizando: o parecer é um modelo vigente na produção de pes-quisa em Direito. Se entrar mos em qualquer livrar ia, encontraremos laudas e mais laudas de livros, revistas e artigos em que temos a discussão quase inter minável construída em torno da lógica de um parecer. Nos textos e teses e dissertações de Direito que tenho examinado, em 99% das vezes, não é pos-sível identificar uma hipótese de trabalho. Os trabalhos são construídos por uma lógica argumentativa em que todo o percur-so realizado pela demonstração é uma tentativa de convencimento em torno de uma idéia inicial muito semelhante à resposta que ofereço quando sou consultado para elaborar um parecer.

(27)

ele diz, no seu primeiro texto, que a lógica do parecer consis-te em ignorar parconsis-te do maconsis-terial disponível, ou seja, é como se eu fizesse uma triagem, um processo seletivo em torno do meu objeto e utilizasse apenas aquilo que homologa ou ratifica a minha opinião inicial, o que me parece um equívoco. A lógica do parecer não é, ou pelo menos não me parece ser, exatamen-te essa. Na verdade, ela não consisexatamen-te em fazer uma seleção das fontes, mas, ao contrário, realizar um mapeamento das fontes e, em seguida, fazer prevalecer uma sobre as outras, sob o argu-mento da autoridade.

São lógicas absolutamente distintas. Não estou fazendo uma escolha prévia, mas recenseando. Pensem em uma peça proces-sual ou em um texto acadêmico: 99% das vezes o que lemos, e esse é um vício dos meus alunos, é que, para falar sobre um assun-to X, eu ciassun-to A, B, C, D, tenho de obrigaassun-toriamente me referir a Pontes de Miranda e, no final, concluo sempre com uma adjeti-vação bastante intensa: “na opinião do preclaro”, “na mais abalizada doutrina” ou “filio-me”. Nesse caso, existe uma lógi-ca quase partidária, filio-me à corrente de fulano, cicrano e beltrano. Construo meu argumento como um argumento de auto-ridade, em que a opinião de A prevalece sobre a opinião de B. Essa construção é parte de um longo processo que remete aos pruden-tes romanos. A lógica do parecer não está calcada em uma demonstração; não trabalha com a formulação de uma hipótese e sua demonstração. O que tenho é um recenseamento em que se utiliza, de forma inequívoca, um argumento de autoridade para dizer onde está a suposta razão.

O segundo problema que identifico na proposta do Professor Marcos Nobre é que ele negligencia na sua análise a capacidade de reapropriação que possui a dogmática. Como a dogmática e, sobretudo, a lógica do parecer estão construídas sobre o argumen-to de auargumen-toridade, argumenargumen-tos novos, ainda que sejam contrários ao que penso, podem ser reapropriados e alinhados ao meu modo de pensar. Essa capacidade de reapropriação vai além, ou seja, ela não é específica da dogmática, mas se faz presente quase que de forma difusa em todas as áreas do Direito.

(28)

a Portar ia que regulamentava os cursos jurídicos, resultante de quase dez anos de debates. A crítica aos nossos cursos de Direito era que eles seriam cursos homogêneos, repetitivos; que não responder iam mais às demandas do processo de redemo-cratização do País e à demanda de injeção de crítica em nossas salas de aula. Passaram-se dez anos, saímos de um contexto de 300, 400 cursos de Direito para mais de 1.000 e a palavra “crí-tica”, base do argumento de dez anos atrás, foi reapropr iada pelo discurso anterior. Hoje, posso andar pelo País inteiro, exa-minar os projetos pedagógicos existentes, e não haverá um que não diga que é um projeto crítico, engajado, transfor mador da realidade social, etc.

A dogmática tem essa capacidade de apropr iar-se do novo e reutilizá-lo em seu favor, o que provoca outro problema na área da pesquisa em Direito. Trata-se do que um colega nosso, o Professor Luciano Oliveira, da Universidade Federal de Pernambuco, chama de “sincretismo epistemológico”. Nesse contexto, sou capaz de citar alguém que defende a pena de morte e, ao mesmo tempo, outro que defende a abolição total da pena como se fossem absolutamente a mesma coisa. Cita-se todo mundo a torto e a direito sem analisar o contexto em que aquelas afirmações estão sendo feitas e qual é a base da formu-lação daquela afir mação. É preciso, então, que exercitemos enorme vigilância para romper com essa capacidade de reinven-ção, de reapropriareinven-ção, que a dogmática tem.

(29)

em oposição ao não anter ior. E, na medida em que assumo isso como um balizamento necessár io, absoluto, inequívoco, perco a minha capacidade de reflexão sobre essa nova circunstância. É o debate que vocês encontrarão, por exemplo, na trajetór ia do Direito alternativo.

Hoje, o que o Direito alternativo se coloca como questão é em que nós nos transfor mamos dentro desse processo. Construímos uma dogmática de combate que foi apropr iada. É genial: ano passado, um desembargador, com quase 70 anos, disse: “nós do Direito alternativo temos que transfor mar a opi-nião que não pode haver uopi-nião entre dois homens”. Ele proferiu uma decisão reapropriando um discurso que, no cenário da dog-mática de combate, ser ia inconcebível na boca daquele desembargador de 68, 69 anos, em uma sessão solene do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Enfim, parece-me que o combate ao modelo do parecer não pode negligenciar esses três aspectos que acabo de sinalizar: o argumento de autor idade, a capacidade de reapropr iação da dogmática e os riscos da produção de uma nova verdade ou o risco da produção de uma nova dogmática que se instituciona-lize e se transforme no que não desejamos.

Chego ao segundo momento de minha fala em que preten-do apresentar os problemas que identifico na proposta que chamo de “institucionalização investigativa ou profissionaliza-ção da pesquisa”.

(30)

O problema que vejo na proposta do Professor Marcos Nobre é: se trabalho por essa profissionalização da profissão, preciso cr iar as regras de entrada e saída. Construirei aquilo que chamaremos de “cor po” sem nenhuma conotação pejora-tiva e definirei quais são as regras de pertencimento ao meu cor po: quem pode nele ingressar, quais são as exigências para o seu ingresso e, com isso, cor remos o r isco de produzir o que eu chamar ia de um novo cor porativismo, em que o debate é feito, sobretudo, em tor no da idéia de quem possui a fala legí-tima para falar sobre pesquisa em Direito. Isso quer dizer o lugar onde reside ou residirá o critério de legitimidade das nos-sas falas.

Esse cr itér io se traduz essencialmente por duas coisas: titu-lação e produção científica. Quanto aos professores que entraram na faculdade há tr inta anos, nunca escreveram uma linha sequer, progrediram na carreira por decurso de prazo, che-garam ao seu topo porque a cada dois anos eram promovidos automaticamente? Nesse caso, acaba sendo cr iada uma rotina, uma lógica em que a titulação, a produção acadêmica ou os cri-tér ios que legitimam a car reira docente não são efetivamente implementados; pelo contrário, são tratados como quimera, dile-tantismo ou mesmo um prazer que alguns gostam, assim como há outros que gostam de fumar um charuto, colecionar selos, escrever, produzir, refletir, etc. Esse é um problema que pre-cisa ser enfrentado.

O segundo aspecto que gostaria de chamar atenção na dis-cussão da profissionalização diz respeito ao que eu chamaria de “um risco de afastamento”, de uma ruptura com o mundo da prá-tica. O que significa isso? Precisamos, na medida em que profissionalizamos, construir o que chamo de lógica do tempo integral, em que o profissional se afasta por completo do mundo da prática, o que não me parece ser uma boa idéia.

(31)

condições absolutamente precárias; recebemos o aluno no cor-redor, atendemos em nossas residências, enfim, as condições de trabalho são muito ruins.

Esses problemas não são facilmente superáveis, e me parece que a pergunta que temos de colocar é: como é possível seguir meu caminho em contraposição ao caminho do Professor Marcos Nobre? Gostaria de apontar algumas pistas sobre o rumo que devemos tomar. Tentarei ser breve com a esperança de que pos-samos recuperar esse tema em um possível debate. Não tenho uma receita de bolo para oferecer, mas há três passagens do texto que escrevi com o Professor Veronese que me parecem ser bas-tante interessantes para serem trabalhadas.

Primeiro, citarei uma passagem do texto que acho que deve ser vista com atenção: o objetivo da pós-graduação seria a for-mação de quadros docentes, e não de pesquisadores, diagnóstico feito pelo próprio comitê de Direito da Capes. Não é a nossa opi-nião, mas o diagnóstico feito pelo comitê da Capes. Na medida em que a Capes considera que o objetivo da pós-graduação é a formação de quadros docentes, e não de pesquisadores, o que tenho como conseqüência, e aqui fica a minha contribuição para a DIREITO GV, que está em processo de elaboração de um programa de graduação, é que acabamos por ter uma pós-graduação reprodutiva, pouco criativa, em quase nada diferenciada do modelo de graduação e, sobretudo, atrelada ao movimento expansionista do ensino superior, ou seja, começamos a pensar a pós não em função do que quero produzir, mas em função da pressão do mercado, em que há 500.000 alunos do curso de Direito, dos quais 50.000 se formam por ano (essa tem sido a média) e caminham para a pós, e isso já resultou no que chama-mos de “canibalização” da especialização ou MBA. Como resultado, temos uma grande pressão exercida pelos cursos de MBA, cursos em que não há nenhum controle sobre o que está sendo reproduzido, para que passem a integrar a pós-graduação

stricto sensu.

(32)

seguir, apresento rapidamente três referências para que vocês observem como estamos isolados:

1. Tabela de conhecimento: o CNPq iniciou uma enorme discus-são sobre a classificação de áreas em sua tabela de conheci-mento. O Direito ignorou essa discussão, apesar de ser importantíssima, pois define, entre outras coisas, onde temos de bater para pedir dinheiro e como fazemos os pedidos com relação aos nossos projetos. O Direito simplesmente não par-ticipou dessa discussão. Na verdade, a única proposta recebi-da pela Comissão Interinstitucional (Capes e CNPq, com o concurso de vários pesquisadores da área, com destaque para a Professora Rosali Fernandez de Souza, do IBICT), para reordenação da tabela de áreas de conhecimento, foi enviada pela Associação Brasileira de Ensino do Direito (ABEDi) e tem or igem em um trabalho feito pelo Professor Alexandre Veronese, com o meu concurso. A proposta não foi acatada por-que o amplo “silêncio” da comunidade jurídica foi entendido como desejo de manutenção dos padrões atuais, sem mudan-ças. Com certeza, foi uma oportunidade de debate perdida.

2. O caso da divulgação da recente portaria da Capes que obri-ga dissertações e teses a serem publicadas na Internet. Um aluno me disse o seguinte: “Professor, isso é inconstitucio-nal”. E logo respondi: “Como? Onde? Ao que você está se referindo?”. E os comentários que acompanho em nossa área têm sido no sentido de que “isso é um desrespeito ao direi-to do audirei-tor, isso direi-tolhe a capacidade de publicação posterior porque o editor não vai ter interesse em uma obra que está em domínio público”, sem perceber que, na verdade, o que temos aqui é uma lógica de transparência e verificação de pro-dução científica pela comunidade. Não estamos trabalhando na produção de um livro, e sim na criação de um produto aca-dêmico que deve ser exposto aos seus pares.

(33)

em 52 áreas de conhecimento, porém, só não chamou para uma área, a do Direito, e me parece que nosso comitê tem enorme dificuldade até mesmo em abrir essa discussão.

Encerro com a terceira e última passagem do meu texto que gostaria que ficasse talvez como um recado, como minha men-sagem final. Para que pesquisa e ensino sejam atividades complementares, é preciso recuperar e enfatizar preocupações metodológicas e epistemológicas.

Com o que temos que romper aqui? O mais importante não é o caminho da refor mulação dogmática, da reconfiguração da dogmática. É preciso pensar, de forma consistente e prévia, na epistemologia e na metodologia, porque só assim conseguiremos romper, em primeiro lugar, com uma pesquisa que vem se carac-terizando por ser manualesca, ou seja, mera reprodução reverente de manuais e, sobretudo – o que me incomoda profundamente –, evolucionista. Para citar o Ministério Público: há textos que encontram um embrião do Ministério Público no Egito antigo e fazem toda a reconstrução da trajetória de como ele se desen-volveu ao longo da Idade Média e terminou por ser consagrado pela constituição de 1988. É impressionante, inacreditável, não podemos aceitar isso.

Rompendo com esses vícios metodológicos, acho que será possível abr ir uma discussão que tematize dois aspectos funda-mentais. Pr imeiro, temos que romper definitivamente com uma prática na área do Direito caracterizada pela naturalização dos conceitos. O que significa isso? Trabalhamos na área do Direito como se as nossas categorias, os nossos conceitos, fossem já his-tór ica e ontologicamente perenes. Por exemplo, estudamos Direito de Família como se a família fosse a mesma na Roma antiga, na Idade Média e aqui no Brasil em 2006. E mais, pre-cisamos romper com esse deslocamento da realidade. Eu percebo muito claramente nos alunos com os quais eu dialogo que, antes de conhecer a realidade, eles já estão preocupados em me dizer como deve ser a realidade. Portanto, o segundo aspecto é o seguinte: vamos nos preocupar primeiro em conhecer a rea-lidade, o resto virá a reboque.

(34)

Celso Fer nandes Campilongo (USP)

Bom dia a todos. Gostaria de agradecer muitíssimo à Fundação Getulio Vargas e ao Rafael Alves, de modo especial, pelo con-vite, pela possibilidade de participar deste debate. É uma alegria muito grande compor a mesa com meus amigos Roberto Fragale, Oscar Vilhena Vieira, e com meu amigo Rafael Alves também.

Eu dividirei a minha exposição, mesmo porque sou o primei-ro expositor a falar a partir de uma posição externa ao debate travado entre os professores Marcos Nobre e Roberto Fragale. Como primeira observação externa ao debate, lembro que as minhas referências para a análise desses problemas são, de fato, distintas daquelas do Fragale e do Marcos. Não que sejam opos-tas ou estejam em contradição, mas representam uma outra maneira de olhar para o problema da pesquisa. Pretendo, por-tanto, colocar a minha maneira de ver o problema.

Antes disso, farei uma pequena reconstrução empírica e tra-rei alguns dados para que possamos mensurar o tamanho do problema que tratamos, a dificuldade que é a pesquisa em direi-to no Brasil.

No biênio 1997/98, integrei um comitê do CNPq que cuida da área do direito. Trata-se do comitê de economia, administra-ção e direito. À época, o comitê era for mado da seguinte maneira: três professores de economia, dois professores de admi-nistração e um professor de direito. Ou seja, o único com formação em direito no comitê naquela oportunidade era eu. Perguntei aos meus colegas porque essa formação e eles me res-ponderam: “a formação do comitê é proporcional ao volume da demanda por pesquisa”. Isso equivale a dizer que economistas demandavam três vezes mais recursos para pesquisa do que juristas e administradores, o dobro.

Em 2004, fui convidado para participar de uma reunião desse comitê do CNPq como convidado ad hoc, pois o representante

(35)

mesma posição e a administração tinha se equiparado à econo-mia com relação à demanda por pesquisa.

Um detalhe que me parece estarrecedor é que, naquela opor-tunidade, nós tínhamos no Brasil, além de pouca demanda por pesquisa em direito, apenas quatro doutorados em direito e sete ou oito mestrados. Tudo somado não passava de vinte cursos de pós-graduação, número muito pequeno naquela oportunidade.

De 1997/98 para cá, esse número cresceu de forma explosi-va. Em 2004, apesar do aumento significante desse número, continuávamos demandando a mesma coisa em pesquisa.

Em outras palavras: a explosão de pós-graduação em direi-to no Brasil não foi, de forma alguma, acompanhada por uma explosão de demanda por recursos em pesquisa. Esse é um pri-meiro dado que me parece preocupante.

Segunda infor mação: naquela oportunidade, a divisão dos recursos era feita também nesta proporção. O direito tinha a terça parte do que a economia recebia de dinheiro por pesqui-sa. Houve uma ocasião, por exemplo, em que, em uma das reu-niões que ocorriam a cada quatro meses, na distribuição de verba para pesquisa no Brasil inteiro com recursos do CNPq, a área do direito teve a fantástica quantia de R$ 16.000,00 para tor-rar Brasil afora. E, por maior que fosse a minha prodigalidade, a minha generosidade, o meu espír ito de gastança, examinan-do os pareceres que instruíam os processos, não consegui dis-tr ibuir mais do que R$ 5.000,00. Resultado: sobrou dinheiro para a área do direito. Apesar de o dinheiro ser diminuto, ainda sobrou por conta da péssima qualidade dos projetos apresen-tados. Essa avaliação não é pessoal. Os projetos já chegavam com pareceres em minhas mãos e, com base nos mesmos, eu fazia a ponderação quanto ao oferecimento de recursos públicos a bons projetos ou projetos qualificados por especialistas como sendo de péssima qualidade.

(36)

parecer (cabe ressaltar que um só negativo já era suficiente para que eu nem perdesse tempo) e o segundo parecerista tinha per-dido completamente a paciência: “confiram se este sujeito realmente é bacharel em Direito” (lembro que só pode pedir dinheiro para

pesquisa quem é doutor em direito). Mais ainda: “trata-se de um louco completo, de um arrematado idiota, duvido que seja doutor em direi-to”. Esse era o nível do parecer. Devo confessar que, realmente,

o segundo parecerista, o mais agressivo e que perdeu as estri-beiras, foi modesto nos comentários que fez.

Eu falo isso com muita dor, sobra dinheiro e faltam projetos de boa qualidade. Estamos falando de um deserto em que a téc-nica do parecer, quando incorporada à pesquisa, a desconfigura completamente. Evidentemente, estou de acordo, ainda que não seja isso uma necessidade. Eu poderia eventualmente ter pare-ceres conferidos ou produzidos com um caráter de cientificidade razoável, mas a técnica do parecer, sem dúvida alguma, compro-mete muito o nosso trabalho.

Partindo desse quadro desolador e que se perpetua já há mui-tos anos, quem eventualmente se der o trabalho de ler os relatórios do comitê do CNPq verificará que, mesmo antes de eu estar no CNPQ, os relatórios já eram extremamente críticos no que se refere à pesquisa em direito. Os meus relatór ios foram críticos e os dos meus sucessores igualmente. Todos con-cordavam que não existe pesquisa em direito no Brasil.

(37)

Partindo deste quadro desolador, gostaria de dividir a minha fala em quatro pontos. Em primeiro lugar, o ponto de vista teó-rico da pesquisa e, em segundo lugar, a relação entre pesquisa e dogmática jurídica, pois esse foi o tema que permeou o diá-logo entre o professor Fragale e o professor Marcos Nobre. Em terceiro lugar, apresentaria não uma receita de bolo, mas uma pauta temática que me parece importante para a pesquisa em direito no Brasil, para o adensamento da pesquisa em direito no Brasil. Finalmente, apresentarei uma lista com alguns problemas que me parecem relevantes para o encaminhamento da pesqui-sa jurídica entre nós.

Passo, em pr imeiro lugar, aos espaços reservados para a pes-quisa do ponto de vista teór ico, e não do ponto de vista institucional. Nós podemos entender um sistema jurídico como um sistema que funciona com base em duas metades: a metade prática e a metade operacional, que profere as sentenças, pro-duz os pareceres, os arrazoados jurídicos. Está é a dimensão operacional e prática do sistema jurídico.

O sistema jurídico tem, ao mesmo tempo, uma instância que eu chamaria de instância reflexiva; a instância que deveria se debruçar sobre a produção prática dos juristas e oferecer alter-nativas de expansão da ação prática, rumos para a ação prática, que é o papel da teor ia, particularmente da teoria do direito.

A meu ver, a pesquisa e o ensino dependem do tipo de fun-cionamento que possa ser aferido no interior do sistema jurídico. Pesquisa e ensino dependem dessas duas dimensões: operacional e reflexiva. Como a dimensão reflexiva, a teoria do direito é pouco adensada, o que acaba espairando-se para aspectos muito importantes da produção do conhecimento jurídico, mas que são, a meu ver, exteriores ao funcionamento do sistema jurídico.

(38)

A pesquisa em direito poder ia ser feita tranqüilamente com base em temas jurídicos, mas de um ponto de vista completa-mente exterior ao direito. É possível fazer análise econômica do direito, pesquisas sociológicas a respeito do direito ou uma lei-tura política a respeito do direito. Tudo isso é perfeitamente possível, uma pesquisa sobre o direito exterior do próprio direi-to, com metodologia de teoria política, metodologia econômica, por exemplo. Há quem esteja fazendo isso com muito sucesso, muito êxito.

A pesquisa em direito poderia igualmente adotar – o que seria legítimo - uma perspectiva interior ao próprio sistema jurídi-co, trabalhar com os planos das operações do sistema jurídico ou com o plano da teoria do direito, da reflexão a respeito das operações do sistema jurídico. Aqui, nós estaríamos em um ter-reno mais próximo daquilo que o Roberto Fragale e o Marcos Nobre chamaram de dogmática jurídica. A minha leitura é um pouquinho diferente, mas estamos todos no mesmo plano. É per-feitamente possível, a meu ver, realizar pesquisa em direito de um ponto de vista interno ao sistema jurídico.

Há um terceiro espaço teórico a ser explorado por juristas, o espaço da interconexão, da interdisciplinaridade, da relação entre o direito e a sociologia, da relação entre o direito e a eco-nomia, entre o direito e a política. São três perspectivas distintas, mas o grande problema da pesquisa quando tem por objeto, quer seja do ponto de vista interno, externo ou interdisciplinar, ou quando tem por objeto um tema jurídico ou o próprio direito, é o de não ter clareza, qualquer que seja a perspectiva, a res-peito do que é o próprio direito ou sobre sua função.

(39)

comum que tenhamos pesquisas muito interessantes a respei-to das profissões jurídicas, mas que abordam a sociologia das profissões, e não do direito. Uma sociologia jurídica parado-xal que pesquise sem o direito e uma análise econômica do direito que seja, pura e simplesmente, análise econômica não identificam nenhum status teórico ou operacional relevante para

o própr io direito.

Este me parece um problema crucial da pesquisa em direito. Talvez seja por causa dessa, digamos, fraqueza, do ponto de vista teórico da produção jurídica nacional, que nossa pesquisa seja frágil. Nossa carência acaba tendo um reflexo devastador e perigosíssimo sobre o ensino jurídico, mas é igualmente devas-tador o reflexo disso na pesquisa em direito.

O que os dados do início da minha fala revelam é que, pura e simplesmente, não temos pesquisa em direito no Brasil, seja por parte dos juristas, economistas ou por cientistas políticos que tomem por objeto o direito. Este é um problema sério e me pare-ce ser o problema pare-central da pesquisa em direito.

O segundo comentário diz respeito à dogmática jurídica. De uma forma geral, independentemente deste debate a respeito do estatuto teórico da dogmática jurídica (se a dogmática jurídica é arte, se é ciência, se não é arte nem ciência, etc), o fato é que boa parte da discussão sobre teor ia do direito atribui e identi-fica um espaço importante para a dogmática jurídica. Eu poderia, por exemplo, atrelar a idéia de dogmática jurídica à noção de formalismo, que pode ser interpretado de diversas maneiras.

O Bobbio diria que há um formalismo ético, uma concepção formal a respeito da justiça e um formalismo teórico, uma teo-ria do direito de inspiração formalista. Mas, para o autor, também há um formalismo científico, uma concepção formal a respeito do que seja a ciência do direito, e ele identifica o formalismo cien-tífico exatamente com o trabalho de construção dogmática.

(40)

apesar de ser o dogma algo aparentemente oposto à ciência, tem um espaço no pensamento dos juristas.

Segunda perspectiva: nós podemos tratar a dogmática jurí-dica com outras referências e defini-la a partir de três ou quatro elementos. Por exemplo, dogmática jurídica significa adesão incondicional ao direito positivo. Se, por outro lado, significa a adesão incondicional a um ponto de partida, alguém poder ia questionar que isto não é ciência, pois a ciência é justamente o questionamento incessante dos pontos de partidas, e não a ade-são sem questionamento a uma perspectiva.

Mas não podemos perder o ponto de vista de que esta ade-são ao direito positivo está atrelada à função prática que o direito desempenha na sociedade. O direito é um mecanismo de resolução aos conflitos e esta adesão ao direito positivo não é feita por conta de uma ingenuidade dos operadores jurídicos. Essa adesão respeita uma dimensão operacional inerente ao direito. E como fica o dogma da adesão ao direito positivo, atrelado ao dogma da completude do ordenamento jurídico? Por que a ade-são ao direito positivo? Porque o ordenamento é completo. E o dogma do legislador racional? A adesão ao direito positivo se dá também por conta da racionalidade do legislador.

Os juristas não são ingênuos a ponto de acreditar piamente na completude do ordenamento jurídico ou na racionalidade do legislador. Eles sabem que nem o legislador, nem o ordenamen-to vêm revestidos dessas características. Ainda assim, se valem e revestem de técnica dogmática para que o direito desempenhe sua função prática.

(41)

do direito, pode oferecer para a economia, para a política e para a análise da sociedade como um todo.

Eu teria um pouco de cautela ou tolerância com a dogmáti-ca jurídidogmáti-ca. Longe de mim ser um dogmata, mais ainda um dogmata de combate, mas eu teria um pouco de tolerância a res-peito da possibilidade de a pesquisa se relacionar com a dogmática jurídica.

Terceiro ponto da minha construção: eu apresentaria uma pauta temática, mas como nossa discussão será curta para apro-fundar essa pauta, partiremos para uma pauta temática capaz de resgatar um statusteórico à dogmática jurídica de um lado e capaz

também de resgatar um lugar próprio e específico ao direito, quer para a pesquisa interna do direito, quer para a pesquisa interdis-ciplinar, quer para uma leitura exterior que economistas ou sociólogos, por exemplo, possam fazer a respeito do direito.

Esta pauta, a meu ver, retoma alguns problemas clássicos de teoria do direito mal trabalhados pela teoria jurídica nacional, em minha opinião.

Em primeiríssimo lugar, seria muito bom que sociólogos ou economistas soubessem, assim como os juristas (ainda que, mui-tas vezes, nem os próprios parecem saber), em que consiste a normatividade especificamente jurídica. Este me parece ser um tema central e relevante, a base ou o ponto de partida para a pes-quisa em direito.

O direito inevitavelmente lida com normas. Qual é a norma-tividade especificamente jurídica? Para que não incorramos em confusões e atribuamos à norma jurídica coisas que ela efetiva-mente não pode nos oferecer, que escapam completaefetiva-mente às capacidades do direito. Essas demandas vêm, muitas vezes, de uma perspectiva externa ao direito e de uma perspectiva interior ao sistema jurídico devido à falta de capacidade teórica dos jur is-tas de identificarem os seus própr ios limites.

Em segundo lugar, em uma sociedade dinâmica, em uma sociedade complexa, o direito está exposto à constante muta-ção, a uma elevadíssima var iabilidade; o direito positivo é var iável por excelência.

(42)

elevada variação e quais são os mecanismos necessários para manter um sistema em constante mutação unido; em que con-siste a unidade do con-sistema jurídico exposto à variabilidade. Esse é um pressuposto para que o trabalho interdisciplinar seja pos-sível. É preciso compreender a normatividade especificamente jurídica, o tipo de variabilidade a que se expõe o sistema jurí-dico e em que consiste a sua unidade.

Ou eu parto desses pressupostos para, por exemplo, estabe-lecer uma relação entre direito e economia, ou essa relação se tor na impossível. Para que haja trabalho interdisciplinar, o ponto de partida lógico é que eu tenha disciplinas. Todo este esforço para a abertura da pesquisa jurídica para outros cam-pos tem desfigurado a capacidade de pensar teor icamente o própr io direito.

Finalmente, um terceiro tema que considero importante, em particular para o debate que se segue a essa nossa mesa e para o debate do seminário de hoje como um todo, um debate da rela-ção entre direito e desenvolvimento, é a discussão sobre a função do direito. Qual é a função que o direito pode desem-penhar, por exemplo, para a promoção do desenvolvimento econômico? Será que, com os limites que a nor matividade jurí-dica impõe ao direito e pensando no sistema jurídico como um sistema unitário, o direito tem capacidade por si só de promo-ver desenvolvimento econômico? É está a sua função? Se não tiver esta capacidade, ele pode contribuir para o desenvolvimen-to econômico com a normatividade especificamente jurídica? Pensando na variedade do sistema jurídico, ele pode contribuir para o desenvolvimento econômico com que ferramentas?

(43)

Finalmente, a quarta e última etapa do que eu pretendo comen-tar é um conjunto de problemas para a pesquisa em direito. Eu apenas alinhavarei problemas sem nenhuma pretensão de res-pondê-los, mas apenas lançá-los à reflexão de todos e ao debate. Nós vivemos um momento de elevadíssima fragmentação do conhecimento como um todo, o que não é distinto do que ocor-re com o conhecimento jurídico e, por conseqüência, com a pesquisa em direito. Há uma fragmentação grande nas relações sociais, uma fragmentação muito grande na produção do conhe-cimento, de modo que, por exemplo, muitas vezes, a fragmentação do conhecimento no campo do direito gera a sensação, a perple-xidade de que não estamos falando de direito, mas de cinema, teatro, economia etc. Esse é um problema da pesquisa em direi-to, um problema que se estende a outras áreas também. A fragmentação do mundo contemporâneo e do conhecimento jurídico contribui para a percepção, digamos, de esvaziamento e incapacidade do direito.

Minha segunda observação é muito próxima ao que o Fragale falou agora há pouco a respeito de projetos ou propostas de pes-quisa que não têm sequer uma hipótese de trabalho. Eu repetirei o que o Fragale disse: a construção de uma tese pressupõe uma idéia. Não é preciso quinhentas idéias pra construir uma tese. É preciso somente uma e que esta seja trabalhada no sentido da demonstração de uma tese. Na esmagadora maioria dos casos, o que falta à pesquisa brasileira, pelo menos quando a gente tra-duz esta pesquisa na leitura das teses, é justamente isso, uma idéia, que ele chamou de hipótese. Empiricamente, praticamente como uma recomendação geral à pesquisa em direito, eu diria o seguin-te aos pesquisadores: procurem seguin-ter uma idéia, basta uma. É isso que falta às nossas teses, às nossas pesquisas.

(44)

Fragale fez menção a uma dessas retóricas, a retórica crítica. Toda pós-graduação no Brasil de hoje é crítica, e a prática é esta que nós conhecemos, de uma pesquisa jurídica sem pesquisa jurídica. Mas, ao lado da crítica, nós temos outros chavões, por exemplo, a ética. Todo mundo é a favor da pesquisa crítica e da pesquisa ética. Todo mundo é a favor da pesquisa que se balize em referências democráticas, que contribua com o desenvolvi-mento econômico nacional, por exemplo. É com este conjunto de chavões, que não levam em consideração, quando se trata de pesquisa jurídica, as especificidades ao que me referi agora, e, ao invés de discutir a normatividade jurídica, a unidade do ordena-mento, a variabilidade das normas, a função do direito, adotam, no lugar da reflexão teórica, o discurso teórico (a ética, a demo-cracia, o desenvolvimento, a participação, a crítica), sem que levem minimamente em consideração aquilo que está ao alcance do direito e aquilo que deveria ser função da teoria do direito e da pesquisa em direito.

Enfim, foi o que me ocor reu comentar para os senhores. Muito obr igado.

Oscar Vilhena Vieira (DIREITO GV)

O Professor Marcos foi extremamente generoso com a comu-nidade jurídica ao estabelecer que o nosso modelo de produção acadêmica está calcado no “modelo de parecer” e que isso seria um problema, pois o pensamento jurídico não teria a necessá-ria imparcialidade ou autonomia. Quanto a isso estou de pleno acordo. No entanto, em face da sua generosidade, ele cometeu um erro. Grande parte do que se produz academicamente não deriva do modelo do parecer, mas da revisão de uma bibliogra-fia manualesca, baseada em argumentos de autoridade e uma erudição autista.

O modelo do parecer é apenas uma das formas de produção de pensamento jurídico e, embora possa ter problemas relativos à falta de imparcialidade, tem o benefício de não ser autista, pois deri-va de um problema concreto, que busca uma resposta prática.

(45)

poderia fazer. Trata-se de uma questão acadêmica legítima. O ordenamento jurídico brasileiro permite ou não que eu passe a fiação por baixo da terra? Ambas as perspectivas partem da mesma pergunta. Segundo: um parecerista, para sobreviver no mercado, tem de ter capacidade de responder com uma certa racionalidade a essa pergunta que lhe é feita por ele. Neste sen-tido, o parecerista que muda de opinião apenas para atender aquele que o paga perde prestígio em face da comunidade jurí-dica. Logo, há muitos parecer istas que produzem pareceres apenas quando a resposta a seus clientes está de acordo com suas próprias opiniões sobre aquele tema específico, recusando-se a vender sua autoridade apenas para atender os interesses dos clientes. Esses são os pareceristas que se notabilizam e que suas opiniões passam a ter mais valor.

Tenho a impressão de que o “modelo do parecer” pode, assim, ser um modelo mais sofisticado do que aquele que nós encontramos em bancas de mestrado ou doutorado em Direito em todo o País. O problema do parecer, como já foi dito, é que ele é orientado para uma demanda do mercado. No entanto, com as ressalvas acima feitas, pode gerar bons produtos, academica-mente falando, pela metodologia que se lhe impõe, ou seja, uma pergunta complexa que demanda uma resposta objetiva e fun-damentada, o que não é um modo ilegítimo de produção de conhecimento acadêmico. Este quesito não está necessariamen-te presennecessariamen-te em muitas das dissertações, que não conseguem formular pergunta alguma e muito menos uma resposta objeti-va e racionalmente fundamentada.

Eu diria que o Professor Marcos Nobre acerta ao afirmar que há pouca pesquisa jurídica de qualidade no Brasil, mas grande parte do que se faz não tem nenhuma relação com a lógica do parecer. Assim como Roberto e Celso falaram, e não serei aqui mais caricatural do que eles, gostar ia de também anotar algu-mas das características do tipo de produção acadêmica que hoje se faz no Brasil.

(46)

que o Celso tenha trazido. As pessoas não sabem o que é o Direito, não for mulam para si mesmas uma questão fundamen-tal: Que tipo de ciência pratico? Qual é o objeto da minha discussão? O autismo chega a esse ponto: não há auto-reflexão sobre a atividade de pesquisa.

Em segundo lugar, há uma profunda falta de compromisso com a realidade na qual estamos inser idos. O pesquisador não sabe quem é e muito menos em que realidade se encontra, por isso não é capaz de formular as perguntas relevantes.

Essas são as características principais do trabalho acadêmico atualmente. O parecer não tem nada a ver com isso. O parecer não é autista, o parecer é ligadíssimo à realidade. Ele é realista, pois parte de uma pergunta real, concreta, que, para ser respondida, demanda argumentação. Grande parte das dissertações não tem nada a ver com esse modelo.

Roberto tem razão quando afirma que o método no Brasil não é um verdadeiro método, pois é marcado por um sincretismo da pior qualidade. Não se consegue estabelecer uma categorização das fontes; usam-se as fontes que estão à mão sem estabelecer uma hierarquia entre elas. Eu me lembro de ter participado de uma banca de doutorado na USP, na área de Filosofia do Direito. O candidato citava Kant, Gandhi e Mario Carvalho de Jesus, que os mais velhos aqui talvez lembrem de ter sido um grande advo-gado trabalhista em São Paulo, autor de um bonito livrinho sobre a paz, o fim do conflito de classes, etc., conferindo a todos o mesmo status. Não se tratava de esgrimir idéias, mas de uma apresentação de frases lapidares como argumento de auto-ridade. Isso sem falar na fonte prevalente em nosso meio, os manuais, que se transformam em verdadeiras bíblias.

Confusões desse tipo são muito comuns. Esse estado de coi-sas se produz, em primeiro lugar, porque nós não temos boas bibliotecas e, em segundo lugar, não temos orientação. Qual é o material com que irá trabalhar um aluno de pós-graduação? Sua fonte será aquilo que ele conseguir comprar na livraria ao lado ou bibliotecas particulares. O recurso é o xerox ou a livraria ao

(47)

falar, mas o seu livreiro comprou. Isso gera uma anarquia abso-luta na forma como as pessoas coletam as fontes para responderem as suas “não perguntas”. As pesquisas não têm perguntas e não há uma sistematização do conhecimento para orientar o modo como se deve responder a uma pergunta. O que teremos são teses fundadas em manuais; as teses os reproduzem e se transformam em grandes enciclopédias desconectadas da realidade.

Finalmente, é importante dizer que a produção acadêmica em Direito no Brasil é fragmentada: cada um por si, cada um fazendo a sua “grande” pesquisa. Não há uma relação intelec-tual entre or ientador e or ientandos: estabelece-se um elo em que não há comunidade de reflexão, o que contribui para a frag-mentação do conhecimento. A fragfrag-mentação não se dá somente em razão da falta de interdisciplinar idade, mas pela produção absolutamente isolada de um corpo de saber que lhe dê respal-do e credibilidade.

Na última década, percebemos que um grupo de alunos, ao olhar para a confusão que eram os programas de mestrado e dou-torado em Direito, fugiu para disciplinas correlatas, como Ciência Política, Sociologia e Economia. Foram acolhidos nesses depar-tamentos, surpreendidos por verem não-advogados refletindo sobre o Direito. Assim, temos hoje, por exemplo, cientistas polí-ticos olhando para o Supremo Tribunal Federal e “advogados” pesquisando o Cade sob uma perspectiva econômica.

Esses pesquisadores trazem o rigor dessas outras ciências para o Direito e isso gera um refluxo, uma colisão com o tipo de pro-dução acadêmica que se fazia tradicionalmente nas faculdades de Direito. O aluno que vai para um departamento de Filosofia estudar Filosofia Analítica, ao voltar a ter aulas de Filosofia na faculdade de Direito, pode colocar seu professor em uma situa-ção difícil, pois, muito provavelmente, ele nunca estudou Filosofia Analítica a sério.

Referências

Documentos relacionados

Assim procedemos a fim de clarear certas reflexões e buscar possíveis respostas ou, quem sabe, novas pistas que poderão configurar outros objetos de estudo, a exemplo de: *

Considerando que, no Brasil, o teste de FC é realizado com antígenos importados c.c.pro - Alemanha e USDA - USA e que recentemente foi desenvolvido um antígeno nacional

By interpreting equations of Table 1, it is possible to see that the EM radiation process involves a periodic chain reaction where originally a time variant conduction

O desenvolvimento desta pesquisa está alicerçado ao método Dialético Crítico fundamentado no Materialismo Histórico, que segundo Triviños (1987)permite que se aproxime de

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

Finally,  we  can  conclude  several  findings  from  our  research.  First,  productivity  is  the  most  important  determinant  for  internationalization  that 

2 - OBJETIVOS O objetivo geral deste trabalho é avaliar o tratamento biológico anaeróbio de substrato sintético contendo feno!, sob condições mesofilicas, em um Reator