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O regime jurídico da publicidade enganosa : a (des)proteção dos consumidores?

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O regime jurídico da publicidade

enganosa:

a (des) proteção dos consumidores?

Andreia Rodrigues Costa

Mestrado em Direito da Empresa e dos Negócios

Dissertação de Mestrado elaborada sob a orientação da Professora

Dra. Ana Isabel Afonso

Porto

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O regime jurídico da publicidade

enganosa:

a (des) proteção dos consumidores?

Andreia Rodrigues Costa

Mestrado em Direito da Empresa e dos Negócios

Dissertação de Mestrado elaborada sob a orientação da Professora

Dra. Ana Isabel Afonso

Porto

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AGRADECIMENTOS

Palavra nenhuma seria suficiente para demonstrar o meu apreço e reconhecimento a todos aqueles que me ajudaram a trilhar este caminho e que me deram a mão nos momentos de desamparo.

Cumpre-me por isso agradecer em primeiro lugar aos meus pais e à minha madrinha pelo apoio incondicional,

Ao Antony pelo milagre de todos os dias (“we never walk

alone”),

Aos meus amigos, muito particularmente à Ana Patrícia, ao André, ao Hélder e à Patrícia (“segredos desta cidade levo

comigo para vida”),

E sobretudo à minha orientadora, a Professora Dra. Ana Isabel Afonso, que foi muito mais e muito além de uma valiosa ajuda académica.

A todos vocês um obrigado, Andreia Rodrigues Costa

Dedicado ao Stefane.

“Quando viste na areia, apenas um par de pegadas, eram as minhas.

Foi exatamente aí,

que te carreguei nos braços”.

Margaret Fishback Powers, Pegadas na Areia, Estrela Polar, 2009.

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.

“Para encontrar as melhores regras da sociedade que convêm às nações, seria necessária uma inteligência superior, que compreendesse todas as paixões dos homens e não experimentasse nenhuma; não estivesse ligada à nossa natureza, mas que a conhecesse profundamente; cuja felicidade fosse independente da nossa e que, no entanto, quisesse dedicar-se a ela; enfim, que no decorrer do tempo, contentando-se como uma glória distante, pudesse trabalhar num século e repousar no outro. Seriam necessários deuses para darem leis aos homens”.

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ÍNDICE

SIGLAS E ABREVIATURAS ... 6 RESUMO ... 8 ABSTRACT ... 8 INTRODUÇÃO ... 9 Capítulo I – A Publicidade ... 11

1.1. Noção legal e doutrinária ... 11

1.2. Princípios gerais que disciplinam a publicidade ... 13

1.2.1. Princípio da licitude ... 14

1.2.2. Princípio da identificabilidade ... 15

1.2.3. Princípio da veracidade ... 15

1.2.4. Princípio do respeito pelos direitos dos consumidores ... 16

1.3. O regime dualista consagrado em matéria de publicidade: Diretiva 2005/29/CE versus Diretiva 2006/114/CE ... 16

1.4. Análise crítica da Diretiva 2005/29/CE ... 17

Capítulo II – A Publicidade Enganosa ... 21

2.1. Conceito ... 21

2.2. A publicidade enganosa por omissão ... 22

2.3. A qualificação de uma mensagem publicitária como enganosa – os requisitos ... 24

2.4. Os efeitos provocados pelas práticas comerciais desleais no consumidor típico... 26

Capítulo III – O Ilícito Contraordenacional ... 28

3.1. Sanções ... 28

3.2. Reclamações apresentadas na DECO – casos de estudo ... 30

3.3. A (des) proteção dos consumidores – posição adotada ... 32

3.4. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores – uma incumbência do Estado (art. 81.º, al. i) da C.R.P.) ... 34

CONCLUSÕES ... 37

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SIGLAS E ABREVIATURAS

 Ac.(s) – Acórdão(s)

 Al.(s) – Alínea(s)

 APAN – Associação Portuguesa dos Anunciantes

 Art.(s) – Artigo(s)

 Boletim do Ministério da Justiça – BMJ

 Boletim da Ordem dos Advogados – BOA

 CACMEP – Comissão de Aplicação de Coimas em Matéria Económica e de Publicidade

 CACMP – Comissão de Aplicação de Coimas em Matéria de Publicidade

 CC – Código Civil

 CCI – Câmara do Comércio Internacional

 C.I.P.L.P. – Código Internacional de Práticas Leais em Matéria de Publicidade

 CCICAP – Código de Conduta do Instituto Civil da Autodisciplina da Publicidade

 Cfr. – Confirmar

 CJ – Colectânea de Jurisprudência

 Colect. – Colectânea

 CPLMA/ICAP – Código de Práticas Leais em Matéria Ambiental do Instituto Civil da Autodisciplina da Publicidade

 CPLMP – Código de Práticas Leais em Matéria de Publicidade

 C. Pub. – Código da Publicidade

 C.R.P. – Constituição da República Portuguesa

 DECO – Associação de Defesa do Consumidor

 DGC – Direção Geral do Consumidor

 DL – Decreto-lei

 Ed. – Edição

 Esp. – Especialmente

 IC – Instituto do Consumidor

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 LPCD – Lei das Práticas Comerciais Desleais

 Par. – Parágrafo  p. – Página  pp. – Páginas  Proc. – Processo  Procs. – Processos  PGR – Procuradoria-Geral da República

 RLJ – Revista de Legislação e Jurisprudência

 ROA – Revista da Ordem dos Advogados

 ss. – Seguintes

 STJ – Supremo Tribunal de Justiça

 TRC – Tribunal da Relação de Coimbra

 TRL – Tribunal da Relação de Lisboa

 TRP – Tribunal da Relação do Porto

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RESUMO

O presente trabalho aborda a figura da publicidade enganosa. Focando a atenção no seu regime jurídico, quer a nível comunitário, quer a nível nacional, procurar-se-á perceber se este tratamento é ou não apto a proteger os interesses dos consumidores, a parte mais fraca da relação contratual.

No sentido de alcançar o desiderato supra referido analisar-se-ão os requisitos necessários para se qualificar uma mensagem publicitária como enganosa, assim como as consequências legais em que incorrem as empresas infratoras. Estudar-se-á com especial acuidade o ilícito contraordenacional expressamente consagrado no Código da Publicidade para fazer face, como veremos, ao ilícito mais frequente no âmbito da publicidade – o ilícito da publicidade enganosa.

ABSTRACT

The present paper approaches the figure of misleading publicity. It focus attention on its legal statute, both at communitarian level and at national level, and above all we will strive to understand whether or not its treatment is able to protect the interests of the consumers, the weaker part of the contractual relation. To achieve that the before mentioned goal, we will analyze the necessary requirements to qualify an advertising message as misleading as well as the legal consequences to the infringing companies. We will study with particular accuracy the administrative sanctions expressly set by the Code of Advertising to tackle, as we will see, that which is the most common offense in advertising – the offense of misleading advertising.

PALAVRAS-CHAVE:

publicidade enganosa, consumidores, ilícito

contraordenacional.

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INTRODUÇÃO

Num mercado de livre concorrência tal como os que imperam na maioria dos países industrializados, criar um excelente produto não é suficiente para ter sucesso garantido: “é preciso saber vendê-lo” (tradução nossa)1. Motivo pelo

qual, a publicidade desempenha nos nossos dias um papel de extrema importância, permitindo às empresas, por um lado destacarem-se dos seus concorrentes e, por outro conquistar atenção dos consumidores. É por isso inquestionável que os produtos e serviços, nos nossos dias, são pré-comprados pelos anúncios publicitários. Por este motivo as empresas, especialmente as grandes empresas, investem todos os anos avultadas somas de dinheiro em publicidade. Esta realidade não constitui, de per si, um problema, não obstante a ausência de um equilíbrio entre as funções informativa e persuasiva da publicidade, essa sim causa ou pode causar graves distorções ao bom funcionamento do mercado, gerando desigualdades que afetam, em primeira mão, os consumidores, mas também os concorrentes.

Foi esta notoriedade da publicidade que motivou a escolha do nosso tema. Assim sendo, ao longo das próximas páginas vamos debruçar-nos sobre a publicidade, em concreto, sobre o regime jurídico da publicidade enganosa e a sua aptidão para proteger os interesses dos consumidores.

No sentido de alcançar o desiderato a que nos propusemos, num primeiro capítulo (Capítulo I.) analisaremos a figura da publicidade. Por facilidade de exposição, o mesmo irá subdividir-se em quatro pontos: um onde se delineará a definição legal e doutrinária de publicidade, assim como os elementos fundamentais que enformam este conceito (1.1.), um outro onde se exporá os princípios gerais que regem esta matéria (1.2.), outro ainda onde dedicaremos umas breves linhas ao regime dualista consagrado em matéria de publicidade, (1.3.), e um último no qual avaliaremos as vantagens e desvantagens impostas pela Diretiva 2005/29/CE (1.4.).

1 RAPHAËL ARN, La Publicité Choquante – vers une nouvelle dimension du Droit de la Concurrence

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De seguida, irá colocar-se o acento tónico na publicidade enganosa (Capítulo II.). Prima facie, abordar-se-á este conceito legal (2.1.), atendendo não só às ações, como também às omissões enganosas (2.2.), para, depois, se considerar os requisitos exigidos, quer pela Diretiva 2005/29/CE, quer pela LPCD, para a qualificação de uma mensagem publicitária como enganosa (2.3.), terminando com uma análise dos efeitos provocados pelas práticas comerciais desleais no consumidor típico (2.4.).

Por fim, no terceiro capítulo (Capítulo III.), pretende-se refletir sobre o regime contraordenacional instituído para fazer face ao ilícito de publicidade enganosa (3.1.), analisaremos inclusive algumas das muitas reclamações apresentadas pelos consumidores na DECO (3.2.), manifestaremos também a nossa opinião quanto à aptidão do regime vigente para tutelar os interesses dos consumidores (3.3.), e, por último, abrangeremos a defesa dos interesses e direitos dos consumidores enquanto incumbência do Estado.

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Capítulo I – A Publicidade

1.1. Noção legal e doutrinária

O conceito de publicidade 2/3 encontra-se expresso no art. 3.º, n.º 1, do

DL. n.º 330/90, de 23/10 (C.Pub.) 4, o qual a define como “qualquer forma de

comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços; b) promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições”. Considera-se ainda publicidade “qualquer forma de comunicação da Administração pública (…) que tenha por objectivo, directo ou indirecto, promover o fornecimento de bens ou serviços”.

2 Apesar de o art. 1.º referir que o C. Pub. se aplica “a qualquer forma de publicidade”, convém esclarecer desde já que o presente código se aplica unicamente à publicidade desenvolvida no âmbito de “uma

actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal”. Ficando por isso excluídas da alçada do C. Pub.,

entre outras, a publicidade legislativa, a publicidade de atos judiciais e notariais, a publicidade a atos administrativos, a publicidade a atos fiscais, a publicidade registral, a promessa pública, os concursos públicos, a publicidade enquanto circunstância agravante ou atenuante de certos crimes em direito penal, as relações públicas, a rotulagem, as vendas no domicílio e as vendas agressivas. Todos os atos supra mencionados ficam fora da alçada do C. Pub. porque não visam a promoção de bens ou serviços com vista à sua aquisição ou alienação, nem tão pouco a promoção de ideias, princípios, iniciativas ou instituições. Excluída do conceito de publicidade fica ainda a propaganda política (art. 3.º, n.º 3, e art. 7.º, n.º 2, al. h)), visto não ter um escopo comercial, ou seja, o seu propósito é o de influenciar a opinião alheia sobre determinada ideologia e não apelar ao consumo. A atividade publicitária também se distingue da publicidade (cfr. art. 4.º, n.ºs 1 e 2), embora esta distinção nem sempre tenha sido pacífica, nomeadamente na vigência do DL. n.º 303/83 de 28 de Junho, onde a noção de publicidade era demasiado ampla, ao ponto de abarcar a atividade publicitária. JOÃO M. LOUREIRO auxilia-nos nesta tarefa de destrinça, referindo-se à publicidade como um ato de comunicação e à atividade publicitária como a prática organizada e sequencial de tal ato de comunicação. Consultar JOÃO M. LOUREIRO, Direito do

Marketing e da publicidade, Semanário, Lisboa, 1985, p. 305; e JOÃO M. LOUREIRO, «Regime Jurídico da

Publicidade e da Actividade Publicitária», in Textos de Gestão, Publicidade e Comunicação, Coordenação de António Silva Gomes, Texto Editora, Lisboa, 1991, pp. 107 a 122, esp. p. 112.

3 O conceito atual de publicidade surgiu na sequência da aprovação da Diretiva 84/450/CEE, do Conselho, de 10 de Setembro de 1984 (doravante abreviadamente designada por Diretiva 84/450/CEE), relativa à publicidade enganosa, alterada pela Diretiva 97/55/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Outubro de 1997; e pela Diretiva 2005/29/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho (doravante abreviadamente designada por Diretiva 2005/29/CE). Entretanto revogada pela Diretiva 2006/114/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2006 (doravante abreviadamente designada por Diretiva 2006/114/CE).

4 O C. Pub, DL n.º 330/90, de 23 de Outubro, foi alvo de sucessivas alterações, por treze diplomas distintos: DL n.º 74/93, de 10/03; DL n.º 6/95, de 17/01; DL n.º 61/97, de 25/03; Lei n.º 31-A/98, de 14/07; DL n.º 275/98, de 09/09; DL n.º 51/2001, de 15/02; DL n.º 332/2001, de 24/12; Lei n.º 32/2003, de 22/08; DL n.º 224/2004, de 04/12; Lei n.º 37/2007, de 14/08; DL n.º 57/2008, de 26/03; e a Lei n.º 8/2011, de 11/04, que constitui a versão mais recente do C. Pub.

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Do conceito legal de publicidade, assim como das diversas definições jurídicas apresentadas pela doutrina nacional resultam quatro elementos fundamentais, os quais caracterizam a publicidade como um ato ou uma forma de comunicação; a qual pode ser efetuada por pessoas singulares ou coletivas, sejam de direito privado ou de direito público 5; exercida no âmbito de uma

atividade comercial, industrial, artesanal ou liberal 6; e cujo objetivo é promover

a aquisição ou alienação de bens ou serviços, bem como promover a adesão a ideias, princípios, iniciativas ou instituições 7/8.

Resulta ainda dos diversos conceitos analisados que a doutrina reconhece à publicidade uma função informativa e uma função persuasiva 9.

VIEIRA DE ANDRADE destaca a importância da dimensão informativa esclarecendo que “a informação relativa aos produtos é decisiva para uma

5 Segundo o art. 5.º, n.º 1, estes sujeitos são o anunciante (a pessoa singular ou coletiva no interesse de quem se realiza a publicidade), o profissional ou agência de publicidade (pessoa singular que exerce a atividade publicitária ou pessoa coletiva que tenha por objeto exclusivo o exercício da atividade publicitária) e o titular do suporte publicitário (pessoa singular ou coletiva que disponibiliza o veículo utilizado para a transmissão da publicidade).

6 A limitação consagrada no art. 3.º, n.º 1, às atividades comercial, industrial, artesanal e liberal, ficou a dever-se à influência da noção de publicidade plasmada no art. 2.º, n.º 1, da Diretiva n.º 84/450/CEE. 7 Crf., entre outros, JOÃO M. LOUREIRO, Direito do Marketing…, cit., p. 14; CARLOS FERREIRA DE ALMEIDA, «Conceito de Publicidade», in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 349, Outubro de 1985, pp. 115 a 134, esp. p. 115; J. MARTINS LAMPREIA, A Publicidade Moderna, Editorial Presença, 3ª. Ed., Lisboa, 1992, p. 12; MÁRIO PAULO TENREIRO, «O Regime Comunitário da Publicidade Enganosa, Comunicação e defesa do consumidor», in Actas do Congresso Internacional organizado pelo Instituto Jurídico da Comunicação, FDUC, Coimbra, 1996, pp. 199 a 228, esp. p. 227; PEDRO QUARTIN GRAÇA SIMÃO JOSÉ, O Novo Direito da

Publicidade, Vislis Editores, 1999, p. 32; MARIA CARMEN SEGADE HENRIQUES, «Estudos sobre Publicidade

por Meios Aéreos», in Estudos de direito do consumidor, FDUC, Centro de Direito do Consumo, n.º 1, 1999, pp. 411 a 431, esp. p. 411; LUÍS BRITO CORREIA, Direito da Comunicação Social, Direito de Autor e

Publicidade, Vol. III, Almedina, Coimbra, 2005, p. 153; RUI MOREIRA CHAVES, Regime Jurídico…, cit., p.

172; CLÁUDIA MADALENO, «Informação e Publicidade. Em especial a Publicidade de Produtos Financeiros», in Liber Amicorum Mário Frota - A causa dos Consumidores, Almedina, Coimbra, 2012, pp. 61 a 101, esp. p. 61 e 62.

8 Também a doutrina estrangeira apresenta um conceito de publicidade, semelhante ao nosso, nomeadamente, em França, consultar por todos, JEAN CALAIS-AULOY, Droit de la Consommation, 3ª Édition, Dalloz, Paris, 1992, p. 86; em Itália, MAURIZIO FUSI, La Comunicazione Pubblicitaria nei suoi

Aspetti Giuridici, Giuffré Editore, Milano, 1970, p. 8; e em Espanha, MANUEL SANTAELLA, Introducción al Derecho de la Publicidad, Editorial Civitas, Madrid, 1982, p. 164, e HONÓRIO CARLOS BANDO CASADO, La Publicidad y la Protección de los Consumidores y Usuários, 3ª Edición, Instituto Nacional del Consumo,

Madrid, 1991, p. 23. Sobre este assunto RAPHAËL ARN, La Publicité Choquante …, cit., p. 49, refere que “

(…) da leitura das várias definições de publicidade existentes no direito dos países da União Europeia resulta uma nítida convergência (…). Esta convergência é explicada pela influência exercida pelo Código Internacional de Práticas Leais em Matéria de Publicidade (tradução nossa) ”.

9 Consultar em sentido contrário PAULO LUIZ NETTO LÔBO, «A Informação como Direito fundamental do Consumidor», in Estudos do Direito do Consumidor, Coimbra, n.º 3, 2001, pp. 23 a 45, esp. p. 23 e 24, o qual distingue e separa as duas realidades: por um lado a publicidade “tem por fito atrair e estimular o

consumo”, por outro lado a informação “visa dotar o consumidor de elementos objectivos de realidade que lhe permitam conhecer os produtos e serviços e exercer suas escolhas”.

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escolha minimamente consciente por parte de quem adquire bens ou serviços”

10, e no mesmo sentido, CALVÃO DA SILVA afirma que “ (…) o consumidor tem

o direito não somente de não ser enganado mas também de ser informado verídica e lealmente (…)” 11. Também a nós nos parece inegável esta função

informativa da publicidade, embora não sejamos ingénuos ao ponto de acreditar que se trate de uma informação puramente imparcial, até porque, a finalidade da publicidade é a promoção do consumo e, por esse motivo, a função persuasiva sobrepõe-se em larga medida à função informativa 12. Ainda assim, parece-nos

difícil desunir estas duas componentes da publicidade sendo, a nosso ver, duas faces da mesma moeda.

Por fim, cumpre-nos especificar que, para certa informação ser considerada como publicitária, esta deve conter uma finalidade promocional, isto é, tem de incentivar o consumidor a adquirir um determinado produto ou serviço, pois em boa verdade a ausência deste objetivo comercial faz com que a informação seja considerada mera informação, motivo pelo qual se diz que nem

“toda a informação é publicidade, nem a publicidade é só informação” 13.

1.2. Princípios gerais que disciplinam a publicidade

Os princípios que regem a publicidade em Portugal encontram a sua consagração no art. 6.º, a saber: o princípio da licitude (art. 7.º), da identificabilidade (art. 8.º e 9.º), da veracidade (art. 10.º e 11.º) e do respeito pelos direitos do consumidor (art. 12.º e 13.º). Estes preceitos traduzem-se em limites impostos ao princípio da liberdade publicitária – “por forma a que a mesma

[publicidade] seja correcta, moral e sã, e tenha utilidade social” e os

10 VIEIRA DE ANDRADE, «Os Direitos dos Consumidores como Direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, in Estudos de Direito do Consumidor, FDUC, Centro de Direito do Consumo, Coimbra, n.º 5, 2003, pp. 139 a 161, esp. pp. 156 e 157.

11 CALVÃO DA SILVA, «A Publicidade na Formação dos Contratos», in FDUL – Comemorações dos 35 anos

do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, Vol. II, A Parte Geral do Código e a Teoria Geral Do

Direito Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pp. 687 a 711, esp. pp. 697.

12 Nesta perspetiva escreveu RUTE COUTO, «Publicidade: Dimensão do Consumidor à Informação», in

Revista Luso-Brasileira de Direito de Consumo, Vol. III, n.º 9, Março de 2013, pp. 51 a 67, esp. p. 57, “que as decisões quotidianas de compra pelos consumidores apoiam-se mais nas sensações provocadas pela publicidade do que nas concretas características dos produtos e serviços a adquirir”.

13 CARLOS COSTA PINA, «Publicidade, Promoção e Prospecção nos Serviços Financeiros», Direito dos

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consumidores “não sejam explorados na sua boa-fé, na sua confiança e na sua

credulidade” 14/15.

1.2.1. Princípio da licitude

O princípio da licitude proíbe a publicidade que “pela sua forma, objecto

ou fim, ofenda os valores, princípios e instituições fundamentais constitucionalmente consagrados”, sendo por isso a sua função preservar a

ordem pública, proibindo a sua ofensa pela publicidade. Foi neste sentido que o legislador previu, nas várias alíneas do n.º 2 do art. 7.º, algumas das situações sobre as quais a publicidade não pode versar. Este princípio constitui ainda uma limitação ao uso de línguas estrangeiras na publicidade efetuada no território nacional, a qual deverá ser transmitida em língua portuguesa, salvo duas exceções, previstas nos n.ºs 3 e 4 do preceito em análise, isto é, quando os estrangeiros sejam os exclusivos ou principais destinatários da mensagem publicitária a transmitir; e ainda quando a utilização de palavras ou expressões estrangeiras sejam estritamente necessárias à obtenção do efeito visado na conceção da mensagem 16.

14 CALVÃO DA SILVA, «A Publicidade na Formação…», cit., p. 690.

15 Ao longo desta abordagem aos princípios gerais em matéria de publicidade vamos lançar mão de casos submetidos à apreciação da CACMP – embora esta comissão se encontre atualmente revogada, os casos em si mantêm a sua atualidade – de modo a exemplificar a aplicação prática de cada um destes princípios. 16 Sobre o princípio da licitude vejam-se ainda os seguintes casos apreciados pela CACMP, apresentados por RUI MOREIRA CHAVES, em Regime Jurídico …, cit., p. 189:

a) JOGO DE FUTEBOL - num jogo de futebol entre as seleções da Áustria e de Portugal, emitido pela televisão, foi difundida uma publicidade, em concreto uma faixa com as cores da bandeira nacional, tendo ao centro uma carica de cerveja, alusiva à patrocinadora da seleção nacional de futebol. A CACMP considerou não haver fundamento para punição, não integrando por isso o ilícito previsto no art. 7.º, n.º 2, al. a).

b) PERFUME TRÉSOR - foi emitido por uma estação televisiva um anúncio publicitário alusivo a uma marca de perfumes, em que a única frase proferida era: “Trésor, le parfum des instants précieux

…”. Entendeu a CACMP de que o anúncio não tem os estrangeiros como destinatários principais

ou exclusivos, nem se tratava in casu da utilização de uma palavra ou expressão em idioma estrangeiro que fosse indispensável à compreensão da mensagem publicitária, pelo que a CACMP considerou ter sido violado o art. 7.º, n.º 3.

c) MULHER - Uma empresa que comercializava carnes concebeu um calendário que expõe o corpo de uma mulher, o qual aparece retratado como se de uma vaca se tratasse (por exemplo aparece com uma cabeça de vaca). A CACMP condenou a referida empresa por violação do art. 7.º, n.º 2, al. c), aplicando-lhe uma coima.

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1.2.2. Princípio da identificabilidade

O princípio da identificabilidade salvaguarda o reconhecimento, pelo seu destinatário, da natureza publicitária da mensagem, ao impor que “a publicidade

tem de ser inequivocamente identificada como tal, qualquer que seja o meio de difusão utilizado”. Este artigo pretende que o destinatário da mesma “esteja de sobreaviso acerca das intenções comerciais dos textos ou imagens” 17, isto

porque, se este se encontrar desatento não se aperceberá que a finalidade do anúnico é vender-lhe um produto ou serviço. A complementar este princípio encontramos ainda a proibição da publicidade oculta ou dissimulada considerada precisamente como aquela em que os destinatários não tomam consciência da natureza publicitária da mensagem, sendo esta expressamente proibida pelo art. 9.º do C. Pub 18.

1.2.3. Princípio da veracidade

O princípio da veracidade estabelece que “a publicidade deve respeitar a

verdade, não deformando os factos”, e as afirmações relativas aos bens e

produtos publicitados devem ser exatas e comprováveis, isto é, passíveis de prova perante as instâncias competentes. Como manifestação deste princípio, a proibição da publicidade enganosa (art. 11.º), impõe o dever de respeito pela verdade da mensagem publicitária, proibindo como tal a publicidade que possa ser total ou parcialmente falsa e ainda aquela que possa induzir ou ser suscetível de induzir em erro o destinatário sobre um produto ou serviço 19.

17 CARLOS FERREIRA DE ALMEIDA, Os Direitos dos Consumidores, Almedina, Coimbra, 1982, p. 81. 18 Sobre a questão da delimitação da publicidade oculta e dissimulada vamos fazer referência a um caso referidos por LUÍS BRITO CORREIA, Direito da Comunicação Social…, cit., p. 177: o caso do boneco “Vitinho” (criado pela Milupa). A Milupa cedeu, posteriormente, por contrato, a exploração deste boneco à RTC/RTP, que o utilizou em programas (“Histórias infantis”…), sem fazer contudo referência à empresa que o criou. O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que, no caso em concreto, não houve publicidade oculta, porque esta figura acabou por criar uma autonomia própria, diferente da dos produtos que inicialmente publicitava (Ac. RL de 27.3.1990, in CJ, XV, T. 2, p. 176).

19 Em relação ao princípio da veracidade foram apreciados os seguintes casos pela CACMP, apresentados por RUI MOREIRA CHAVES, Código da Publicidade Anotado, Almedina, Coimbra, 2ª Ed., 2005, p. 47:

a) ACESSO À EXPO 98 – a empresa organizadora desta exposição, publicitou com alguma antecedência que as crianças com menos de 5 anos teriam direito a entrada gratuita, não especificando mais detalhes. No entanto, alguns meses antes do início da exposição, exigiu que

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1.2.4. Princípio do respeito pelos direitos dos

consumidores

O princípio de respeito pelos direitos dos consumidores proíbe qualquer publicidade que atente contra os direitos dos consumidores 20. Assume, a este

nível, especial relevância a proibição de mensagens publicitárias que incentivem a adoção de comportamentos prejudiciais ou que possam fazer perigar a própria saúde e segurança do consumidor (art. 13.º).

1.3. O regime dualista consagrado em matéria de

publicidade: Diretiva 2005/29/CE versus Diretiva 2006/114/CE

A nível comunitário a publicidade encontra a sua regulação na Diretiva 2005/29/CE, relativa às práticas desleais das empresas em face dos consumidores. Esta mesma Diretiva introduziu uma cisão entre o regime B2B e B2C, passando desta feita a existir um regime dualista em matéria de publicidade. Enquanto a Diretiva 2005/29/CE visa proibir as práticas comerciais desleais, de modo a contribuir para o funcionamento correto do mercado interno

as crianças nascidas em 1993 (que poderiam ter 4 ou 5 ano à data do início da exposição) teriam de pagar meio bilhete. A CACMP considerou ter havido violação do princípio da veracidade, pelo que aplicou uma coima à referida entidade.

b) ALMOÇO - um hotel publicitou um almoço por 1.850$00. Acontece que, num certo domingo, atraído pela dita publicidade, um consumidor almoçou no referido hotel, tendo sido contudo, confrontado com um preço superior ao anunciado. O hotel justificou-se afirmando que aquele valor encontrava-se em vigor, exclusivamente aos dias de semana. A CACMP condenou a empresa numa coima por violação do princípio da veracidade, uma vez que tal informação não constava do anúncio.

c) TELEMÓVEIS - uma operadora de telemóveis vendia um kit composto por um telemóvel e um cartão recarregável com 10.000$00 de chamadas. Não obstante, havia uma obrigatoriedade de recarregamento do mesmo valor, a qual não tinha sido referida pela empresa. Como tal decidiu a CACMP que esta conduta era uma afronta ao princípio da veracidade, pelo que foi aplicada à referida empresa uma pena de advertência.

20 Só a partir de 1960 é que se reconheceu a necessidade de proteção específica do consumidor, tendo assumido especial relevância nesta tarefa a mensagem do Presidente John F. Kennedy (15/03/1962), a qual contribuiu para a dignificação e universalização dos direitos dos consumidores. Nas palavras de ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, «A Protecção do Consumidor de Serviços Públicos Essenciais», in Estudos de

Direito do Consumidor, FDUC, Centro de Direito do Consumo, n.º 2, 2000, pp. 333 a 350, esp. p. 334, só

então se tomou consciência de que era imprescindível “ (…) proteger a vítima da moderna sociedade de

consumo em face, nomeadamente, das situações de desigualdade que esta potencia (…) ” e que os direitos

dos consumidores são nas palavras de VIEIRA DE ANDRADE, em «Os Direitos dos Consumidores…», cit., p. 142, “atributos necessários do estatuto da dignidade das pessoas” e como tal exigem prestações do Estado para a sua efetivação.

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e alcançar um elevado nível de defesa dos consumidores (art. 1.º); a Diretiva 2006/114/CE visa antes proteger os negociantes contra a publicidade enganosa, assim como estabelecer as normas permissivas da publicidade comparativa (art. 1.º).

Ora, facilmente se percebe a extrema dificuldade que esta dualidade de regimes veio impor, isto é, a tarefa árdua de distinguir a quem é que a publicidade se dirige – destrinçar as práticas comerciais de publicidade desleal que afetam os consumidores, das que afetam os concorrentes. Para além disso, esta opção em nada veio contribuir para a segurança e certezas jurídicas, tão ambicionadas a nível comunitário. Aliás, como bem reconhece J. PEGADO LIZ, esta distinção é, inclusive, um total “non-sense”, contrariando as mais recentes tendências de tornar a concorrência e a proteção dos consumidores, “quase como duas faces

da mesma moeda” 21. Com uma opinião convergente encontramos ainda

SILVANA NEWMAN RODRÍGUEZ a qual afirma que “esta segmentação

introduzida no regime da publicidade é artificial, forçada e desnecessária”

(tradução nossa) 22.

1.4. Análise crítica da Diretiva 2005/29/CE

Quanto à Diretiva 2005/29/CE é fundamental tecer alguns apontamentos. Reconhecemos que esta adotou duas medidas que contribuíram para uma proteção mais eficiente dos consumidores, nomeadamente, a proibição e condenação das práticas comerciais desleais nos vinte e sete Estados-membros da U.E.; e a iniciativa da Comissão Europeia ao ter publicado a chamada “Lista Negra” das práticas comerciais consideradas desleais em quaisquer circunstâncias. Estas opções comunitárias parecem-nos acertadas, no sentido em que contribuem para aumentar a confiança dos consumidores e agentes económicos nas transações transfronteiriças; mas também porque auxiliam o

21 Neste sentido consultar J. PEGADO LIZ, «Publicidade na União Europeia», in Revista Portuguesa do

Direito do Consumo, Coimbra, 2006, n.º 48, Dezembro de 2006, pp. 47 a 76, esp. p. 52.

22 SILVANA NEWMAN RODRÍGUEZ, «La protección de los Competidores en Europa: Directiva 2006/114/CE sobre Publicidad Engañosa y Publicidad Comparativa (Versión Codoficada)», in Scientia Iuridica, Revista

de Direito Comparado Português e Brasileiro, Tomo LX, 2011, n.º 325, Janeiro a Abril de 2011, pp. 7 a 35,

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consumidor na identificação de situações de risco, isto é, de possíveis práticas comerciais consideradas desleais.

No entanto, outras escolhas foram feitas com as quais manifestamos o nosso descontentamento.

Em primeiro lugar, cumpre notar que esta diretiva introduz uma harmonização máxima ou plena, reduzindo assim o espaço de manobra dos diferentes ordenamentos jurídicos, para adaptarem esta matéria aos níveis de instrução, cultura, desenvolvimento económico e jurídico, próprios de cada Estado-membro. Além disso, não nos parece coerente, atendendo aos objetivos de harmonização máxima, que o legislador comunitário delegue nos Estados-Membros a função de determinar as sanções aplicáveis às práticas comerciais desleais (artigo 13.º).

Em segundo, não podemos deixar de tecer um reparo ao conceito de consumidor médio adotado no texto da Diretiva em questão, o qual assenta na conceção que tem vindo a ser desenvolvida pelo TJUE 23 e, que corresponde a

um consumidor “normalmente informado e razoavelmente atento e advertido” (considerado 18). Consideramos a este nível que a Diretiva onera em demasia o consumidor, particularmente aquele com menor grau de instrução e menor acesso à informação, ao impor-lhe um dever de se informar, ao invés de um direito a ser informado – deparando-se desta forma com a obrigatoriedade de recolher e interpretar informação com elevado carácter técnico, na maioria das vezes pouco acessível à sua compreensão.

Em bom rigor, este conceito já foi deveras criticado pela doutrina, nomeadamente, por LUÍS SILVEIRA RODRIGUES que considera esta noção uma verdadeira ficção “principalmente num contexto europeu (…) onde o nível

de alfabetismo, de conhecimentos e de acesso à informação é verdadeiramente díspar” 24. Em sentido contrário, MAURIZIO FUZI, PAOLINA TESTA e

PIERLUIGI COTTAFAVIdefendem que “o consumidor de hoje não é mais aquele

dos anos 50/60, acabado de sair de uma sociedade tradicional e repentinamente

23 Consultar a título exemplificativo o Acórdão de 16 de Julho de 1998, o qual deu origem ao proc. n.º C-210/96 – disponível em www.curia.eu.

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inserido no contexto urbano-industrial. Ele encontra-se integrado na sociedade de consumo, familiarizado com a comunicação publicitária (…) e, portanto, dotado de uma posição crítica em relação à publicidade (tradução nossa) ” 25.

Todavia, a verdade é que grande parte dos Estados-Membros acolheram esta nova orientação, afastando-se assim do tradicional conceito do consumidor desatento e irreflexivo face às mensagens publicitárias 26. Neste contexto, o

professor ANXO TATO PLAZA dá-nos conta de que este entendimento foi seguido em muitos julgados da Espanha, citando como exemplo a Sentencia del

Juzgado de Primeira Instancia n.º 43 de Barcelona, confirmada pela Audiência Provincial de Barcelona (22/03/2002) 27. GUIDO ALPA informa que L´Autorità

Garante della Concorrenza e del Mercato tem seguido o conceito de consumidor

dotado de certa capacidade crítica, nomeadamente, na decisão da Cassazione

Civile, confirmada pela Corte d ´Apello di Bologna (13/06/1986) 28. Em França,

segundo FRANÇOIS GREFFE e PIERRE-BAPTISTE GREFFE adotou-se o conceito de consumidor médio, normalmente inteligente 29.ALEXANDER METZ

refere que na Alemanha rececionaram a figura do consumidor médio, destacando como paradigmática a decisão “Orient-Teppichmuster” 30/31. Em

Portugal também a doutrina e a jurisprudência se alinharam ao posicionamento

25 MAURIZIO FUZI/PAOLINA TESTA/PIERLUIGI COTTAFAVI, La Pubblicità Ingannevole, Giuffré Editore, Milano, 1993, p. 141.

26 Quanto a este conceito CARLOS FERNÁNDES NÓVOA, Algunas Consideraciones Generales sobre

Publicidad Engañosa, La Comunicación Publicitaria, Terceras Jornadas de Comunicación Social,

Universidad de Vigo, Facultad de Ciencias Sociales, Ed. Diputación de Pontevedra, 1996, pp. 126 e 127, informa-nos que “prima facie o TJUE adotou o protótipo tradicional alemão de consumidor médio, isto é,

um consumidor pouco reflexivo e carente de espírito crítico, mas aos poucos, foi introduzindo a conceção italiana de consumidor médio, enquanto consumidor com uma atitude crítica e cética face à publicidade”

(tradução nossa).

27 ANXO TATO PLAZA, «En torno a la Reciente Evolución de la Jurisprudência Publicitaria», in Boletin

Autocontrol de la Publicidad, n.º 71, enero de 2003, pp. 1 a 3.

28 GUIDO ALPA e LILIANA ROSSI CARLEO, Codice del Consumo: Commentario, Edizioni Scientifiche Italiane, Gennaio 2005, pp. 209 e 210.

29 FRANÇOIS GREFFE e PIERRE-BAPTISTE GREFFE, La Publicité et la Loi: Droit Français – Union européenne

– Suisse, 11ª Édition, Paris, Lexis-Nexis-Litec, 2009, p. 362.

30 Decisão do BGH GRUR 2000, 619 (Orient-Teppichmuster).

31 ALEXANDER METZ, Verbraucherchützende Informationspflichten in der Werbung, Munique, Herbert Utz Verlag, 2008, p. 125, citado por LÚCIA DE MAGALHÃES DIAS, Critérios para a Avaliação da Ilicitude na

Publicidade, Tese de Doutorado, Apresentada na Faculdade de Direito da USP, São Paulo, 2010, p. 112.

RAFAEL GARCÍA PÉREZ, «El concepto de Consumidor en la Jurisprudência Alemana sobre Publicidad Engañosa (Comentario a la Sentencia del Bundesgerichtshof de 20 de octubre de 1999)», in Actas de

Derecho Industrial y Derecho de Autor, Tomo XXII, 2001, pp. 619 a 634, esp. p. 631, avança ainda que a

decisão “Orient-Teppichmuster” foi um passo dado no sentido de “conciliar o modelo de consumidor

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do TJUE, conforme demonstrado pelos Acórdãos do S.T.J. de 13/07/2010 32 e

de 03/02/2005 33.

Seguidamente, importa ainda atender na redação dada ao art. 5.º, n.º 3, o qual admite “ (…) a prática publicitária comum e legítima que consiste em fazer

afirmações exageradas ou afirmações que não são destinadas a ser interpretadas literalmente” – mesmo quando dirigidas a grupos de consumidores

particularmente vulneráveis em razão da sua doença mental ou física, idade ou credulidade. Uma janela deixada aberta, que a nosso ver incentiva práticas publicitárias pouco rigorosas e nada transparentes, atendendo ao teor exagerado e persuasivo das mensagens publicitárias aqui em causa.

Por último, resta-nos referenciar a dificuldade instaurada com a dualidade de regimes impostos por esta Diretiva, no sentido em que implica distinguir a publicidade que afeta os consumidores, da que afeta os concorrentes. Difícil de perceber são também os objetivos da Diretiva supra mencionada – garantir práticas comerciais leais, assegurar a confiança dos consumidores no mercado, garantir a concorrência e promover o desenvolvimento de transações comerciais transfronteiriças – isto porque, ao final de contas, instauramos um regime dualista em matéria de publicidade, não obstante, consumidores e concorrentes continuam a disputar o protagonismo nas preocupações comunitárias e internas. Dito de outro modo, deixamos aqui firmada a nossa preocupação por a proteção dos consumidores não relevar como um fim em si mesma, mas apenas como meio de garantir o funcionamento do mercado interno, ou seja, não passando de um reflexo de outras necessidades 34. A este propósito vamos prosseguir com

uma citação de VIVANTE: “pode, pois, dizer-se que o legislador, perante uma

disciplina da publicidade, elaborada pelos representantes dos (grandes) industriais e dos (grandes) comerciantes, a transforma em lei, dizendo de

32 Proc. n.º 3/05.9TYLSB.P1.S1, Relator Fonseca Ramos, disponível em www.dgsi.pt. 33 Proc. n.º 05B2005, Relator Custódio Montes, disponível em www.dgsi.pt.

34 Neste mesmo sentido, escreveu LUÍS SILVEIRA RODRIGUES, em «Tendências recentes…», cit., p. 314, que parece “que a preocupação das autoridades comunitárias se centra mais em ganhar a confiança do

consumidor, dado que é essencial para que o mercado interno funcione, do que assegurar um elevado nível de protecção do consumidor ”.

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seguida aos consumidores: eis a lei que, para vossa defesa, foi imposta à indústria e ao comércio” 35.

Capítulo II – A Publicidade Enganosa

2.1. Conceito

No art. 11.º, n.º 1 do C. Pub., podemos ler que “ é proibida toda a

publicidade que seja enganosa nos termos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março 36, relativo às práticas comerciais desleais das empresas nas relações

com os consumidores”. Pelo que necessitamos de nos socorrer da LPCD para

apurar do carácter enganador de uma mensagem publicitária. Esta é uma opção legislativa com a qual manifestamos desde já o nosso desacordo, isto porque, em matéria de publicidade enganosa, o C. Pub. foi esvaziado de conteúdo. Ora, atendendo às exigências da tutela dos consumidores, consideramos essencial esta temática encontrar-se devidamente estruturada e compilada, não remetendo de diploma em diploma. Em primeiro lugar pela natureza fundamental que a publicidade assume nos nossos dias, manifesta por exemplo na sua enorme influência nas relações contratuais; e, em segundo plano, por a publicidade enganosa consistir num dos ilícitos contraordenacionais mais frequentes, conforme iremos verificar adiante.

A publicação da LPCD veio, portanto, revogar a noção legal de publicidade enganosa, que conhecia expressão no art. 11.º, n.º 1, do DL. n.º 275/98, de 09/09 37. Pelo que para determinarmos se uma publicidade é

35 Citado por M. NOGUEIRA SERENS, «A Proibição da Publicidade Enganosa: Defesa dos Consumidores ou Protecção de alguns Concorrentes?», in Separata do Boletim de Ciências Económicas, Vol. 37, 1994, pp. 63 a 96, esp. p. 96.

36 O DL n.º 57/2008, de 26 de Março, designado abreviadamente por LPCD - Lei das Práticas Comerciais Desleais – estabelece o regime jurídico aplicável às práticas comerciais desleais das empresas face aos consumidores, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2005/29/CE.

37 Esta noção legal, demasiado ampla e imprecisa, conheceu duras críticas por parte da doutrina, entre outros, OLIVEIRA ASCENSÃO, «Publicidade Enganosa e Comparativa…», cit., p. 26, manifestava o seu descontentamento quanto à parte final deste artigo «possa prejudicar um concorrente», no sentido em que a tutela dos concorrentes é levada a cabo através das leis de concorrência desleal, pelo que escasseia a aplicabilidade em matéria de publicidade enganosa, para além disso não se justifica um concurso entre normas da concorrência e da publicidade. Também SILVANA NEWMAN RODRÍGUEZ, «La protección de los Competidores…», cit., p. 7, e CARLOS FERNÁNDES NOVOA, Algunas Consideraciones Generales…, cit., p. 115, defendiam que esta era uma cláusula geral que proibia a publicidade enganosa que, de tão vaga, pouca utilidade prática conhecia, carecendo de concretização pela doutrina e pelos tribunais.

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enganosa, temos de nos auxiliar, nomeadamente, dos artigos 7.º, 8.º e 9.º da LPCD. O art. 7.º enumera, em abstrato, quais as práticas comerciais consideradas enganosas – a prática comercial que contenha informações falsas; a prática comercial que embora contenha informações corretas, induza ou seja suscetível de induzir em erro o consumidor; e a prática comercial que conduz ou é suscetível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transação que este não teria tomado de outro modo. O art. 8.º elenca, de forma exemplificativa, tipos de práticas comerciais consideradas enganosas em qualquer circunstância. Este artigo é fruto da Diretiva 2005/29/CE que criou uma "Lista Negra" que contém as práticas consideradas desleais em quaisquer circunstâncias e, por isso, proibidas independentemente de qualquer outro facto 38. O art. 9.º trata das

omissões consideradas enganosas.

2.2. A publicidade enganosa por omissão

No nosso ordenamento, a consagração expressa das omissões enganosas ficou a dever-se à LPCD, embora já antes da sua publicação se defendesse a sua relevância para efeitos de punibilidade da publicidade enganosa 39. RUI MOREIRA CHAVES, por exemplo,referia o seguinte: se para

determinar o carácter enganador de uma mensagem publicitária temos em conta os elementos e indicações referidos no art. 11.º, n.º 2, significa isto que basta a ausência de algum dado essencial relativo ao bem ou serviço previsto neste preceito, para que a publicidade seja considerada enganosa por omissão 40.

Neste mesmo sentido, MARIA MIGUEL MORAIS DE CARVALHO defendia que

“o princípio da veracidade não pode aplicar-se rigidamente: (…) ao ponto de os empresários estarem obrigados a manifestar os defeitos ou desvantagens das suas próprias mercadorias ou serviços ” 41 . Portanto, como bem observou J. DE

LA CUESTA RUTE, o anunciante não se encontra obrigado a dizer tudo o que

38 A “Lista Negra” das práticas comerciais desleais pode ser consultada em http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:32005L0029.

39 Ao contrário do nosso C. Pub., em Espanha, por exemplo, o art. 4.º da Ley General de Publicidad já previa a proibição da publicidade enganosa por omissão: “es asimismo enganosa la publicidad que silence

datos fundamentales de los bienes, actividades o servicios cuando dicha omisión induzca a error de los destinatarios”.

40 RUI MOREIRA CHAVES, em Regime Jurídico…, cit., pp. 196 e 197.

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sabe acerca da oportunidade que oferece no mercado 42, no entanto é

imprescindível que este publicite os elementos considerados essenciais pelo C. Pub, sob pena de incorrer num ilícito de publicidade enganosa por omissão.

JOSÉ MASSAGUER sublinha ainda que não é qualquer omissão informativa que configura um ilícito, “apenas a omissão de informação que tem

a qualidade de essencial poderá determinar que a prática considerada se constitua em prática enganosa” (tradução nossa) 43. Sobre o conceito de

essencialidade TERESA ANCONA LOPEZ esclarece que “somente é

considerado dado essencial aquele que não é de conhecimento público e notório” 44. A respeito de publicidade enganosa por omissão ANXO TATO PLAZA

faz referência a uma decisão do Juzgado de Primera Instancia n.º 51 de Madrid, de 04/05/95, confirmado pela Audiencia Provincial de Madrid, de 30/10/96 45. No

caso em apreço o Banco Barclays publicitou um anúncio onde promovia uma aplicação financeira com as melhores taxas de rendimento, omitindo todavia, de que para se obter tais taxas era necessário um depósito inicial de um milhão de pesetas. O Tribunal Espanhol entendeu que a ausência da informação sobre a necessidade de uma quantia mínima de investimento para que se obtivesse a remuneração dos juros anunciados configurava publicidade enganosa por omissão.

Esta opção legislativa faz, também em nossa opinião, todo o sentido, não só do ponto de vista da tutela dos consumidores, mas ainda porque o próprio TJUE já se pronunciou a favor da censurabilidade da publicidade enganosa por omissão, nomeadamente no Acórdão de 16 de Janeiro de 1992 46. Esta decisão

diz respeito a um anúncio promovido por uma garagem de Bergerac onde se podia ler “compre o seu veículo novo mais barato”. Não se fazendo qualquer

42 J. DE LA CUESTA RUTE, Curso de Derecho de la Publicidad, Navarra, Ediciones Universidad de Navarra, S.A., Eunsa, 2002, p. 155.

43 JOSE MASSAGUER, El Nuevo Derecho contra la Competencia Desleal – La Directiva 2005/20/CE sobre las

Praticas Comerciales Desleales, 1ª Edición, Cizur Menor, Thompson Civitas, Navarra, 2006, p. 125.

44 TERESA ANCONA LOPEZ, Nexo Causal e Produtos potencialmente Nocivos: a Experiência Brasileira do

Tabaco, São Paulo, Quartier Latin, 2008, p. 120.

45 ANXO TATO PLAZA, «La Publicidad Ilícita en la Jurisprudencia y el la Doctrina del jurado de la Publicidad», in Base de Datos sobre Regulación Publicitaria, Associación para la Autorregulación de la Comunicación Comercial (Autocontrol), p. 16.

46 Acórdão do TJ, de 16 de Janeiro de 1992, proferido no âmbito do Proc. C-373/90, no caso «Nissan», in Colectânea (1992), pp. 1 a 146, ponto n.º 15.

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menção a que estes veículos eram importados da Bélgica e dispunham de um menor número de acessórios, em relação aos que eram vendidos em França. O TJUE considerou a publicidade em causa enganosa por omissão.

2.3. A qualificação de uma mensagem publicitária como enganosa – os requisitos

A primeira exigência para considerar uma determinada publicidade como enganosa é que esta derive de uma mensagem com carácter enganador, sendo certo que o engano relevante não se cinge às falsas afirmações, abrangendo também as afirmações que embora não sejam falsas, possam induzir em erro o consumidor – relativamente a um ou mais dos elementos enumerados no art. 7.º da LPCD 47. O conceito de engano é por este motivo, um conceito lato, sendo

relevante qualquer que seja a forma utilizada, ou seja, o engano (ou a suscetibilidade de indução em erro) pode derivar de afirmações, como de omissões. Esta é também a posição adotada no plano comunitário, no âmbito da Diretiva 2005/29/CE (art. 6.º, n.º 1). O mesmo sucede no Anteprojeto do Código do Consumidor que estabelece no art. 132.º, n.º 1 “considera-se enganosa a

prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo quando veicule informações factualmente correctas, induza ou seja susceptível de induzir em erro (…) o consumidor (…) ”. Foi precisamente com o intuito de

proceder à distinção entre a publicidade que é suscetível de induzir em erro (mesmo que contenha afirmações verdadeiras) da publicidade que é estruturada com falsas afirmações, que OLIVEIRA ASCENSÃO, inspirado na doutrina francesa e italiana, distinguiu a “publicidade enganosa” da “publicidade mentirosa” 48.

A mensagem publicitária deve, igualmente, ser apta a induzir ou suscetível de induzir em erro os consumidores. Equivale isto a dizer que a mera

47 Em relação ao conceito de engano ADELAIDE MENEZES LEITÃO, em «A Concorrência Desleal e o Direito da Publicidade – um Estudo sobre o Ilícito Publicitário», in AA.VV., Concorrência Desleal, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 137 a 163, p. 147, refere que “ (…) fundamental é (…) a compreensão do engano, que

pode ser definido como a criação no destinatário, de uma informação falsa dos produtos ou serviços de um concorrente”.

48 Em Itália a doutrina socorre-se das seguintes expressões: a “pubblicità ingannevole” e a “pubblicità

menzognera”. Do mesmo modo em França recorre-se às expressões “publicité trompeuse” e “publicité mensongère”. Cfr. OLIVEIRA ASCENSÃO, Concorrência Desleal, Almedina, Coimbra, 2002, p. 520.

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possibilidade de indução em erro é suficiente para qualificar uma publicidade como enganosa, isto porque a Lei não exige o animus decipiendi (intenção de enganar). Daqui resulta, prima facie, que o destinatário da publicidade não tem de ser efetivamente enganado, bastando a mera possibilidade de indução em erro para qualificar uma publicidade como enganosa. Não obstante, o TJUE não se satisfaz com esta interpretação, exigindo, para além da suscetibilidade de indução em erro, um risco suficientemente grave e sério do engano do destinatário – de modo a compatibilizar as restrições publicitárias com as exigências da livre circulação de mercadorias 49.

A necessidade de influenciar o comportamento económico dos destinatários é um requisito exigido a nível comunitário – desde a Diretiva 84/450/CEE – que não conhecia expressão legal no nosso C. Pub. Era por isso apontada uma discrepância entre os requisitos exigidos pela legislação comunitária e pela legislação nacional, discrepância esta, que se ficou a dever a um erro de transposição do art. 2.º, n.º 2, da revogada Diretiva 84/450/CEE. Ainda assim, MARIA MIGUEL MORAIS DE CARVALHO, já defendia que este requisito devia ser exigível 50. Nós somos levados a concordar com a citada

Autora, até porque não vislumbramos qualquer interesse digno de tutela jurídica, nos casos em que o comportamento económico do consumidor não é suscetível de ser influenciado. Mesmo que assim não entendêssemos, a verdade é que o próprio TJUE exige para se provar o carácter enganador de uma mensagem publicitária, para além de uma influência do comportamento económico dos consumidores, uma influência que se faça sentir num “número significativo de

consumidores” 51. Seguindo as orientações comunitárias, Portugal, com a

49 Ver o Acórdão de 4/4/2000, proferido no âmbito do Proc. C-465/98, no caso «Naturrein», in Colectânea (2000), pp. 1 a 2321, nos pontos n.ºs 32 e 28, o qual opunha a Verein gegen Unwesen in Handel und Gewerbe Koln e V. e Adolf Dasrbo Ag. Neste processo o TJ considerou que “não obstante a presença de

vestígios ou de resíduos de chumbo (…) no doce d´arbo, a menção «puramente natural» no rótulo da embalagem (…) não é susceptível de induzir em erro sobre as características deste”, porque “(…)mesmo admitindo que, em certos casos, os consumidores possam ignorar esta realidade e ser por esse facto induzidos em erro, este risco é mínimo e não pode, consequentemente, justificar um obstáculo à livre circulação de mercadorias”.

50MARIA MIGUEL MORAIS DE CARVALHO, «O conceito…», cit., p. 690.

51 Cfr. Acórdão do TJUE, de 16/01/1992, proferido no âmbito do Proc. C-373/90, no caso «Nissan», in

Colectânea (1992), pp. 1 a 146, onde no ponto n.º 15, o TJUE sublinha que “a publicidade em causa pode considerar-se enganosa por omissão se for provado que um número significativo de consumidores (negrito nosso) efectuou a compra na ignorância de que o preço reduzido desses veículos se devia a um menor número de acessórios que equipam os veículos importados da Bélgica”.

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publicação da LPCD veio consagrar legalmente este requisito no art. 7.º. Ainda quanto a este assunto, ressalvamos que a verificação de um prejuízo económico não é um pressuposto necessário.

No âmbito da Diretiva 84/450/CEE, um outro critério assumia relevância para efeitos de qualificação de uma publicidade como enganosa. Esse critério prendia-se com a aptidão de uma mensagem publicitária para prejudicar ou ser suscetível de prejudicar um concorrente. Contudo, com a publicação da Diretiva 2005/29/CE, este critério perdeu interesse, uma vez que a publicidade passou a ser tratada distintamente, conforme seja dirigida aos consumidores ou aos negociantes.

Resulta do supra exposto que para qualificar uma mensagem publicitária como enganosa é relevante aferir o seu carácter enganador, a aptidão da mesma para induzir ou ser suscetível de induzir em erro os consumidores e, a sua influência (de forma significativa) no comportamento económico dos mesmos 52.

O TJUE, considerando o atual padrão de consumidor médio, entendeu ser exigível, ainda, um risco suficientemente grave e sério do engano do destinatário.

2.4. Os efeitos provocados pelas práticas comerciais desleais no consumidor típico

A Diretiva 2005/29/CE reconhece a necessidade de se proceder a uma avaliação dos efeitos das práticas comerciais desleais, como sejam a publicidade enganosa, produzidos num consumidor típico, mais concretamente no seu comportamento económico (considerando 18). Este entendimento é igualmente defendido por alguma doutrina que chama a atenção para o facto de

52 Com base nestes critérios MARIA MIGUEL MORAIS DE CARVALHO distingue a publicidade enganosa de outras figuras afins, tais como as afirmações triviais e não comprováveis, a publicidade de exclusividade, o exagero publicitário e a publicidade oculta ou dissimulada. As afirmações triviais e não comprováveis não estão sujeitas ao princípio da veracidade, como tal não podem constituir publicidade enganosa. A publicidade de exclusividade ou superlativa é aquela que, sendo objetivamente comprovável, divulga produtos, serviços ou mesmo empresas que ocupam uma posição de topo no mercado. O exagero publicitário consiste em fazer afirmações exageradas, as quais não são, à partida, levadas a sério pelos seus destinatários, como tal, estes não são suscetíveis de ser induzidos em erro. A publicidade oculta ou dissimulada é toda a publicidade que encobre a sua natureza promocional aos olhos do seu destinatário. Este tipo de publicidade é proibido porque, não sendo a sua natureza publicitária conhecida do destinatário, ele ficará mais exposto aos seus efeitos (cfr. MARIA MIGUEL MORAIS DE CARVALHO, «O conceito…», cit., pp. 700 a 706).

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ser no círculo dos destinatários da mensagem que o engano e a indução em erro devem ser apurados, sugere-se desta forma uma avaliação casuística da capacidade crítica dos consumidores, a qual MARIA ELISABETE LOPES designa por “mobilidade do conceito de consumidor médio” 53/54.

No seguimento do que ficou exposto, vamos destacar uma decisão italiana, da Autoritá Garante della Concorrenza e del Mercato 55, a qual revela

grande interesse. Esta decisão diz respeito a uma publicidade promovida por um canal de televisão pago, o “Stream”, na qual se anunciava que todos os jogos de futebol da Champions League seriam transmitidos exclusivamente no Stream. Em letras menores informava-se que a exclusividade versava sobre 157 jogos da liga de futebol. Na denúncia efetuada alegou-se que os consumidores seriam induzidos em erro ao acreditar que nenhuma outra emissora poderia transmitir eventuais jogos da Champion League. A autoridade administrativa supra mencionada afastou a potencial indução em erro com base em dois fundamentos. Em primeiro lugar esclareceu que as mensagens publicitárias

“devem ser interpretadas na sua globalidade (…) e no caso concreto as informações secundárias esclareciam o exato conteúdo da exclusividade de transmissão da emissora” (tradução nossa). Em segundo salientou que a

publicidade em questão “direcionava-se a um grupo específico de consumidores

(os fãs de futebol), os quais se encontravam em perfeitas condições de compreender a natureza da exclusividade dos direitos televisivos em questão”

(tradução nossa). A sentença aqui retratada recorda-nos que a capacidade crítica do consumidor não é estática, pelo que as autoridades competentes não podem perder de vista os seguintes critérios: primus a quem é que a mensagem se destina; secundus quais os veículos de comunicação utilizados; e tertius qual a natureza dos produtos ou serviços anunciados.

53 MARIA ELISABETE LOPES, «O Consumidor e a Publicidade», in Revista do Direito do Consumidor, Vol. 1, São Paulo – Revista dos Tribunais, 1992, pp. 149 a 163, esp. p. 161.

54 Este é também o entendimento de alguma doutrina italiana, nomeadamente, de MAURIZIO FUZI/ PAOLINA TESTA/PIERLUIGI COTTAFAVI, La Pubblicità Ingannevole…, cit., p. 130; e de GUIDO ALPA/LILIANA ROSSI CARLEO, Codice del Consumo…, cit., pp. 209 e 210. Assim como espanhola, entre outros, cfr. J. MASSAGUER, Comentario a la Ley de Competência Desleal…, cit., pp. 88 e 89; ANXO TATO PLAZA, «En torno a la Reciente…», cit., p. 2; e LEMA DEVESA, Problemas Jurídicos…, cit., p. 275.

55 Provedimento n.º 9062 (PI3056) de 21/12/2000, Stream Esclusiva Champions League, disponível em www.agcm.it.

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Em suma, sempre que aferimos da ilicitude de uma mensagem publicitária, não podemos prescindir da investigação dos efeitos que a mesma causou no grupo de consumidores típicos, isto porque, ignorar estes efeitos poderá gerar distorções indesejáveis – seja absolvendo situações que mereciam efetiva reprovação, seja condenando outras que não constituem um autêntico engano, nem mesmo potencialmente.

Capítulo III – O Ilícito Contraordenacional

3.1. Sanções

Qualquer violação ao art. 11.º constitui um ilícito contraordenacional 56, o

qual é punível com coima, a título de sanção principal (art. 34.º, n.º 1, al. a)), variável conforme se trate de uma pessoa singular ou coletiva. No primeiro caso a coima será fixada entre os 1.745,80€ e os 3.741,00€; e no segundo entre os 3.491,60€ e os 44.891,80€ 57. Esta poderá ainda ser complementada com a

aplicação de sanções acessórias, desde que se revelem adequadas às circunstâncias e exigências do caso concreto, como sejam (art. 35.º): a) apreensão de objetos utilizados na prática das contraordenações; b) interdição temporária, até um máximo de dois anos, de exercer a atividade publicitária; c) privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos; ou ainda, d) o encerramento temporário das instalações ou estabelecimentos onde se verifique o exercício da atividade publicitária, bem como o cancelamento de licenças ou alvarás. Especificamos ainda que a publicidade enganosa não precisa de ser dolosa para ser punível, uma vez que

56 Com a publicação do DL. n.º 330/90 de 23/10, o legislador nacional optou pela descriminalização de qualquer ilícito relativo ao direito da publicidade. Para tal contribuiu o facto de a atividade publicitária ser exercida, em regra, por pessoas coletivas, nomeadamente, agências de publicidade, e apenas as pessoas singulares estarem sujeitas à responsabilidade criminal (art. 11.º do C.P.). Entre outros, MÁRIO FERREIRA MONTE, na sua obra Da Protecção Penal do Consumidor – o Problema da (Des)criminalização no

incitamento ao Consumo, Almedina, Coimbra, 1996, p. 49, critica esta opção legislativa assumida no C.

Pub. por se tratar de infrações a princípios basilares, como o princípio da licitude, da veracidade, do respeito pelos direitos dos consumidores, da identificabilidade, princípios estes que constituem valores protegidos constitucionalmente, e por isso suficientemente dignos de tutela penal.

57 Apesar de o C. Pub. ainda referir valores expressos em escudos, é importante não esquecer que o DL. n.º 323/01 de 17/12 veio converter, em todos os diplomas legais, os valores expressos em escudos para euros, assegurando desta forma uma utilização mais simples dos textos legais.

Referências

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