COMUNICAÇÃO PRELIMINAR DA TÉCNICA MINIALIF PARA ARTRODESE CIRCUNFERENCIAL DE ESPONDILOLISTESE DEGENERATIVA
Comunicação preliminar da técnica
Minialif para artrodese circunferencial
de espondilolistese degenerativa
*DEUSDETH GOMES DO NASCIMENTO1, LUIZ CARLOS SANTELLI MAIA2, PAULO ROBERTO BRUM2, FLAVIO CAVALLARI2
SUMMARY
Preliminary communication of Minialif technique for cir-cumferencial arthrodesis of degenerative spondylolisthesis
The objective of this study is to demonstrate the new mi-crosurgical technique applicable for minimal invasive lum-bar arthrodesis (Minialif) introduced by Michael Mayer in 1996. The authors present 7 cases of circumferencial arthro-desis for degenerative spondylolisthesis. The procedures are carried out with a surgical microscope and/or lens and head light. The microsurgical approaches are differentiated in 2 segments of lumbar column: 1) Microsurgical retroperito-neal approach for levels L2-L3, L3-L4, and L4-L5; 2) Transperitoneal assessment (minilapararotomy) for L5-S1. The muscles and enervation of abdominal wall are preserved and muscle layers are divulsioned in the direction of its fi-bers. In general, the ligature of segmentary vases is not nec-essary. The advantage compared to conventional assessment is related to reduction of surgical trauma, low blood loss, reduction of incisional discomfort and esthetics, mostly in females. The authors register a preliminary note on the sur-gical procedures which have not yet been published in the national literature, with satisfactory results that encourage the continuation of the method.
Key words – Spine; spondylolisthesis; arthrodesis
INTRODUÇÃO
Tem sido demonstrada a vantagem da artrodese circunfe-rencial no segmento lombossacro, no tocante ao índice de sucesso da fusão. Porém, a alta morbidade do procedimento cirúrgico combinado para artrodese anterior da coluna lom-bar, per e pós-operatória, tem limitado sua aplicação(2,3,5).
Em 1996, Mayer(4) introduziu a nova técnica microcirúr-gica, a minimamente invasiva artrodese anterior lombar (Mi-nialif), para os níveis L2-L3, L3-L4, L4-L5 e L5-S1, com a * Trabalho realizado pela equipe da coluna do CECOL, Centro
Especializa-do da Coluna Vertebral, Rio de Janeiro, RJ. PremiaEspecializa-do no último Congr. da Soc. Bras. de Patol. da Coluna Vertebral, 12 a 15 de novembro de 1997, Gramado, RS.
1. Diretor do CECOL e cirurgião-chefe da equipe; membro staff do Grupo de Coluna do HTO-INTO.
2. Membro do CECOL e cirurgião da equipe.
RESUMO
O objetivo é demonstrar a nova técnica microcirúrgica aplicável para a artrodese lombar minimamente invasiva (Minialif), introduzida por H. Michael Mayer em 1996. Os autores apresentam 7 casos de artrodese circunferen-cial para espondilolistese degenerativa. Os procedimen-tos são realizados com auxílio de microscópio cirúrgico ou lupas e frontolux. As abordagens microcirúrgicas são diferenciadas em dois segmentos da coluna lombar: 1) abordagem microcirúrgica retroperitoneal para os níveis L2-L3, L3-L4 e L4-L5; 2) abordagem microcirúrgica transperitoneal (minilaparatomia) para L5-S1. São pre-servadas a musculatura e a inervação da parede abdomi-nal, tendo em vista que as camadas musculares são divul-sionadas no sentido de suas fibras. Geralmente não se faz necessária a ligadura dos vasos segmentares. Apresenta vantagem com relação à abordagem convencional, pela redução do trauma cirúrgico, baixa perda sanguínea, re-dução do desconforto incisional e a estética, principalmen-te no sexo feminino, que não deve ser subestimada. Os autores registram, em nota preliminar, procedimentos ci-rúrgicos realizados, ainda não citados na literatura na-cional, com resultados satisfatórios.
D.G. NASCIMENTO, L.C.S. MAIA, P.R. BRUM & F. CAVALLARI
artrodese circunferencial e/ou resultado, devido ao curto tem-po de seguimento(1,6).
Na presente série foi utilizada a técnica Minialif associa-da à artrodese póstero-lateral com enxerto ósseo autólogo e instrumentação pedicular.
MATERIAL E MÉTODO
No período de maio a agosto de 1997, sete pacientes fo-ram submetidos à artrodese circunferencial da coluna lom-bossacra pela técnica Minialif desenvolvida por H.M. Mayer. Os pacientes eram portadores de espondilolistese degenera-tiva da coluna lombar e apenas um fora submetido a cirurgia prévia (laminectomia L5 associada à artrodese póstero-late-ral in situ L5-S1); os níveis variaram entre L4 e S1, sendo 3 pacientes em L5-S1 e 4 em L4-L5. A idade mínima foi de 42 anos e a máxima, de 56,3 anos; 6 pacientes eram do sexo
Fig. 1a – Foto
demonstrando a inclinação lateral do paciente na mesa cirúrgica
Fig. 1 – Posicionamento do paciente após a abordagem posterior Fig. 2 – Foto demonstrando divulsão do oblíquo externo
Fig. 3 – Foto demonstrando divulsão do oblíquo interno
qual o grau de morbidade e complicações foi sensivelmente reduzido, proporcionando, dessa forma, maior aceitação da abordagem combinada e sua permissividade para pacientes que, pelo seu status, isto é, potencial de complicação, apre-sentam restrições à abordagem anterior convencional.
O propósito do presente trabalho é avaliar a exeqüibilida-de da técnica, consiexeqüibilida-derando o trauma cirúrgico, perda san-guínea, desconforto incisional, morbidade per e pós-opera-tória, complicações imediata e mediatas da técnica Minialif, não se propondo a discutir as vantagens ou desvantagens da
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feminino e 1 do masculino. O período de tratamento conser-vador variou entre 1 ano a 12 anos, sendo o período médio de 4 anos e 3 meses. A indicação cirúrgica foi devida à dor lombar associada à radiculalgia.
Foi utilizada artrodese póstero-lateral em todos os pacien-tes com fixação transpedicular e procedimento anterior com-binado em 6; em apenas 1 paciente foi realizada com inter-valo de 7 dias (1º caso, T.F.A.). O período médio de interna-ção foi de 4,7 dias (tempo mínimo de 4 dias e máximo de 10 dias).
O tempo do ato cirúrgico variou entre 250 e 425 minutos, sendo a média para ambos os procedimentos de 332
minu-tos. A perda sanguínea peroperatória média foi de 840ml; a menor perda sanguínea foi de 400ml e a maior, de 1.100ml. A maior perda sanguínea foi devida à abordagem posterior. Em um paciente (A.M.G.S.P.) foi feita a minilaparotomia para o nível L5-S1; foi diagnosticado cisto de ovário volu-moso que não permitia acesso à junção lombossacra, tendo sido necessária sua exérese (tabelas 1 e 2).
Descrição da técnica cirúrgica
As abordagens microcirúrgicas são diferenciadas em dois segmentos da coluna lombar: 1) abordagem microcirúrgica
Fig. 5 – Foto demonstrando descolamento do espaço retroperitoneal Fig. 4 – Foto demonstrando divulsão do transverso
TABELA 1
Abordagem retroperitoneal Minialif
Paciente Idade Sexo Grau Nível Tempo cirúrgico Perda sanguínea Complicações
T.F.A. 58 F II L4-L5 370 min. 1.000ml Não
R.L.M. 70 F I L4-L5 280 min. 900ml Não*
M.M.S. 70 M II L4-L5 300 min. 400ml Não
M.K.C. 53 F II L4-L5 360 min. 600ml Não
Revisão Artrodese de L5-VT 1989.
TABELA 2
Abordagem transperitoneal Minialif
Paciente Idade Sexo Grau Nível Tempo cirúrgico Perda sanguínea Complicações
C.C.R. 53 F II L5-S1 425 min. 1.000ml Não
A.M.S.P.G. 48 F I L5-S1 320 min. 1.100ml Não*
J.C. 42 F I L5-S1 270 min. 900ml Não
D.G. NASCIMENTO, L.C.S. MAIA, P.R. BRUM & F. CAVALLARI
retroperitoneal para os níveis L2 a L5; e 2) abordagem mi-crocirúrgica transperitoneal para o nível L5-S1.
1) Abordagem retroperitoneal
O paciente é posicionado em decúbito lateral direito. A mesa é ajustada para adquirir projeção paralela das placas terminais vertebrais. O tronco do paciente é inclinado para trás, de acordo com o nível a ser abordado: 20º para L4-L5; 30º para L3-L4; e 40º para L2-L3.
O controle radiológico é feito com intensificador de ima-gem dinâmica utilizando-se um fio de Kirschner para reparo do espaço discal alvo no plano sagital e coronal e
mapea-mento da incisão tomando-se como referência o ponto da intersecção das linhas. Marca-se a incisão oblíqua de 4cm. A incisão é realizada com auxílio de microscópio cirúrgico ou lupa e frontolux. São preservadas a musculatura e inervação da parede abdominal através de divulsão do: oblíquo exter-no, oblíquo interno e transverso.
O espaço ileocostal, retroperitoneal, que é virtual, é alar-gado com descolamento rombo com torunda. O músculo psoas é identificado e desinserido medialmente com microtesoura para seu afastamento e exposição vertebral.
A dissecção romba é completada para exposição de apro-ximadamente 5mm dos corpos vertebrais adjacentes para servir de ancoragem às valvas cranial e caudal nos dois para-fusos de distração. É feita acoplagem da moldura e valva. Nesse momento inserimos uma microcâmara dorsal proxi-malmente à incisão (não descrito originalmente), passando
Fig. 6 – Acesso com afastador inserido no espaço retroperitoneal Fig. 8 – Vista panorâmica do procedimento videoassistido (Minialif).
Fig. 9 – Foto com vista de acesso único para minilombotomia e para
retira-da do enxerto ósseo do ilíaco
Fig. 7
Penetração do enxerto autólogo de ilíaco para o espaço invertebral
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ao procedimento videoassistido. Procede-se à excisão do disco e preparo da área de artrodese, com paquímetro. A retirada de enxerto autólogo do ilíaco é feita com instrumental espe-cífico. Realiza-se impacção do enxerto ósseo e complemen-tação de enxertia com osso esponjoso no espaço residual in-tervertebral. Faz-se cobertura da área cruenta da artrodese com surgicel.
2) Abordagem transperitoneal
O paciente é posicionado na mesa cirúrgica em decúbito supino e Trendelenburg com a coluna lombar em hiperex-tensão e membros inferiores em máxima abdução. O cirur-gião posiciona-se entre os membros inferiores do paciente, obtendo desse modo condição confortável para abordagem do espaço intervertebral L5-S1. Uma incisão de 4cm é feita medialmente centrada na união dos dois terços superiores com um terço inferior da linha média infra-umbilical.
As alças intestinais são afastadas com auxílio de compres-sas devidamente preparadas. O afastador auto-estático é po-sicionado para exposição do promontório. O peritônio parie-tal é incisado com microtesoura no sentido craniocaudal. Os vasos médio-sacrais são isolados e clipados. A artrodese é procedida de forma usual com osso autólogo de ilíaco.
DISCUSSÃO
Não apresentamos os resultados por não ser o objetivo pro-posto devido ao seguimento ser de apenas 100 dias. O ques-tionamento de artrodese de 360º para o tratamento da
insta-Fig. 10a –Radiografia em AP evidencia
laminec-tomia e enxertia óssea póstero-lateral. Obs.: VT.
Fig. 11 – Foto da paciente R.L.M. com 3 meses de
pós-operatório que evidencia as cicatrizes da mi-nilombotomia da área doadora de externo e aces-so para a microcâmara
Fig. 10 – Radiografia em perfil evidencia bom
posicionamento do enxerto ósseo
bilidade lombossacra será abordado em outra oportunidade, por não ser objetivo do presente trabalho.
A técnica cirúrgica originalmente descrita por H.M. Mayer foi indicada na 2ª etapa operatória da estabilização da colu-na lombossacra em pacientes portadores de instabilidade degenerativa. Mantivemos a mesma indicação cirúrgica e o mesmo perfil do paciente do autor original. A primeira va-riação introduzida foi o ato operatório combinado ser reali-zado na mesma sessão cirúrgica. O primeiro paciente opera-do foi de acoropera-do com o proposto por Mayer, porém nos casos subseqüentes verificamos que a baixa morbidade associada com o baixo risco de acidente operatório nos incentivou à realização combinada do acesso posterior e anterior. Não hou-ve registro de complicações pós-operatórias devidas a esse procedimento e consideramos perda sanguínea média de 140ml e ato anestésico prologado em média de 120 minutos com baixo trauma cirúrgico como fatores que não impedi-riam o procedimento combinado e avaliamos as vantagens de um pós-operatório único.
A segunda modificação introduzida foi a utilização de mi-crocâmera de 30º instalada dorsal e proximalmente à ferida cirúrgica (VAM – videoassistida Minialif). Com isso obtive-mos magnificação do campo cirúrgico, melhor participação da equipe cirúrgica, menor perda sanguínea devido à facili-dade de hemostasia. Dessa forma, passamos a utilizar esse recurso em todos os procedimentos.
Reportamos uma intercorrência peroperatória ao abordar-mos o nível L5-S1. Havia voluabordar-moso cisto de ovário e fez-se
D.G. NASCIMENTO, L.C.S. MAIA, P.R. BRUM & F. CAVALLARI
necessária sua exérese, para ter acesso à junção lombossa-cra. Sugerimos avaliação por ressonância nuclear magnética prévia para planificar melhor o ato cirúrgico e, na impossibi-lidade desta, realização de ultra-sonografia abdominal.
Reconhecemos que a proposta da nota preliminar objetiva apenas avaliar essa nova técnica cirúrgica sem discutir suas indicações.
CONCLUSÃO
A minimamente invasiva artrodese anterior lombar (Mi-nialif) é uma nova técnica microcirúrgica para abordagem retroperineal e transperineal para os níveis L2-L3, L3-L4, L4-L5 e L5-S1, respectivamente.
Os resultados apresentados por seu autor e a praticidade de seu instrumental motivaram-nos para utilização do mé-todo.
Preliminarmente, avaliam-se o trauma cirúrgico, índice de complicações e morbidade pós-operatória.
Nossa experiência pessoal com essa técnica na série dos primeiros sete casos tem demonstrado que os resultados es-tão em consonância com os apresentados pelo autor original.
Os autores agregaram dois procedimentos ao método: – a videoassistida Minialif (VAM), que otimiza o método com a magnificação e iluminação adequada do campo ope-ratório, maior segurança e, conseqüentemente, redução do
potencial de complicação e monitoração do ato operatório pelos demais membros da equipe;
– realização da artrodese circunferencial combinada na mesma sessão cirúrgica.
A Minialif está associada à minimização do trauma cirúr-gico, preservando a musculatura e inervação da parede ab-dominal, baixa perda sanguínea e diminuição da morbidade pós-operatória; seu efeito cosmético não deve ser subesti-mado quando comparado com a abordagem convencional.
REFERÊNCIAS
1. Grob, D., Scherer, H.J.G., Dvorak, J. et al: Circumferential fusion of the lumbar and lumbossacral spine. Arch Orthop Trauma Surg 111: 20-25, 1991.
2. Hinkley, B. & Jamrewko, M.E.: Effects of 360 degree lumbar fusion in a workers compensation population. Spine 22: 313, 1997.
3. Kozak, J.A. & O’Brien, J.P.: Simultaneous combined anterior and poste-rior fusion – An independent analysis of a treatment for disabled low-back pain patient. Spine 15: 322-328, 1990.
4. Mayer, H.M.: A new microsurgical technique for minimally invasive an-terior lumbar interbody fusion. Spine 22: 69, 1997.
5. Selby, D. & Henderson, R.: “Circumferential (360 degree) spinal fusion”, in Frymoyer, I. (ed.): The adult spine, principle and pratice, New York, Raven Press, 1991. p. 1989-2055.
6. Takahashi, K., Kitaharo, H., Yamagoto, M. et al: Long-term results of anterior interbody fusion for treatment of degenerative spondilolysthe-sis. Spine 15: 1211-1215, 1990.