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MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA SÃO PAULO 2013

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Mariana Sarkis Braz

Prevenção de luto complicado em cuidados paliativos:

percepções dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições nesse processo

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

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Mariana Sarkis Braz

Prevenção de luto complicado em cuidados paliativos:

percepções dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições nesse processo

MESTRADO EM PSICOLOGIA CLÍNICA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Psicologia Clínica, sob a orientação da Profª. Dra. Maria Helena Pereira Franco.

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Banca Examinadora

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AGRADECIMENTOS

A concretização deste trabalho me alegra e me faz pensar não apenas nas pessoas que compartilharam comigo este período, mas também naquelas que fizeram parte da minha formação acadêmica, profissional e pessoal.

Agradeço principalmente:

À querida professora Maria Helena, pela confiança, incentivo, paciência e apoio. Por compartilhar comigo seu saber admirável e me fazer sempre refletir sobre como fazer melhor a minha psicologia. A realização deste trabalho certamente é um divisor de águas em termos de conhecimento e amadurecimento. A nossa primeira entrevista e o seu “bem-vinda” é uma lembrança que sempre me emociona.

Aos meus pais, Nadia e Sergio, eternos incentivadores do meu desenvolvimento pessoal e profissional, sempre prontos para me ajudar e sempre por perto. A certeza de poder contar com vocês a qualquer momento me transmite a certeza de que tudo é possível. Sergio, obrigada por acreditar em mim, me amar, me respeitar nos meus desejos. Mãe, obrigada pelo seu amor incondicional e irracional, pela compreensão e respeito pelo meu trabalho e escolha do que quero fazer. Sei que você gostaria que eu trabalhasse com coisas mais fáceis, mas também sei o quanto você me admira por isso.

Aos meus irmãos, Marcus e Fernanda, que são meus companheiros nesta vida. Obrigada pela escuta generosa, trocas, amor e por acreditarem em mim. Marcus, irmão gêmeo, irmão de alma. Fernanda, sempre protetora, carinhosa e preocupada. Ao meu cunhado Fabio, sempre interessado nos meus projetos. Aos meus amores Julia e Manuela, que me proporcionam momentos de pura alegria e ternura. Esses com certeza são os melhores momentos.

Aos meus tios, Lilian, Sandra, Álvaro e Nelson, mães e pais que a vida me deu e que sempre participaram da minha formação e educação. Amo muito vocês. Aos meus primos e priminhos, que sempre estão comigo e são como irmãos. Sempre muito bom compartilhar e perpetuar com vocês os valores da nossa família.

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Às amigas de infância, Luciana, Stefanie, Caroline e Flávia, pela amizade de mais de vinte anos que não me faz esquecer quem eu sou e de onde eu vim.

Aos meus queridos e amados amigos baianos, que vivenciaram comigo esse período de estudos. A energia de vocês que contagia e me faz querer sempre estar com vocês e me considerar tão baiana quanto.

Aos meus colegas de faculdade, Andrea, Camila, Tatiane, Gabriela, Bruno, Joana, Margarete, Gisela, Rosa e Ana Claudia, que iniciaram comigo essa empreitada de ser psicólogo e que me fizeram viver bons e inesquecíveis momentos.

Aos meus amigos queridos da PUC-SP, Francisco, Rosane, Marta, Lenia, Deria, que dividiram comigo esse período e fizeram deste mestrado um momento gostoso e motivador.

Às queridas colegas de profissão e amigas da Santa Casa de São Paulo, Rafaela, Nathalia, Ana, Mariana, por sempre vibrarem com as minhas conquistas.

À Gleice Luz e ao Núcleo Assistencial para Pessoas com Câncer, pela primeira oportunidade de ter contato direto com pacientes e essência do meu trabalho.

À Maria do Carmo, Fernanda, Suzy, Paty, Luane, Luciana, que no Hospital Aristides Maltez me proporcionaram momentos ricos de conhecimento e vivência. Obrigada por confiarem no meu trabalho e pelo incentivo até os dias de hoje. Me orgulho de poder ter sido estagiária desse Serviço de Psicologia que não forma apenas profissionais, mas pessoas. Às minhas grandes amigas de estágio, Aline, Fanny, Kátia e Taiana, que compartilharam comigo esse início de crescimento profissional.

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Ao Dr. Alze, pela oportunidade de estar trabalhando na equipe de cuidados paliativos do Hospital Paulistano. Obrigada pelas trocas, aprendizado, confiança, incentivo e pela vivência de momentos singulares.

Aos meus anjos da guarda na minha retomada em São Paulo: Sandra Mazutti, também pela oportunidade do trabalho, por nunca ter esquecido de mim. Por plantar em mim, junto com o Dr. Alze, a sementinha dos cuidados paliativos. Obrigada pela coordenadora generosa e compreensiva que você é. Pela amiga querida e de todas as horas e pela pessoa humilde e sábia que você é. Marcela Kitayama, supervisora, hoje querida amiga. Obrigada por acreditar em mim mais do que eu mesma muitas vezes, pela escuta tranquila e pelo incentivo.

À Veronica Montanher e Flávia Campos, que compartilham comigo o dia a dia do trabalho. Obrigada pela escuta, torcida e apoio.

À Ana Maria Magalhães, a quem admiro e me ensina a cada dia, pelo contágio de seu entusiasmo, confiança e torcida.

À minha querida equipe de cuidados paliativos, que me dá certeza de que o fazer cuidados paliativos é possível e gratificante. Carolina Paparelli, que no seu fazer enfermagem me emociona com o trabalho que vai além da técnica. À Dra. Carolina, Dra. Silvia, Dr. Marcel, Dra. Karen, por dividirem seus conhecimentos e acreditarem no meu trabalho. Tenho muito orgulho de trabalhar com vocês e perceber o quanto sou privilegiada por conviver com médicos humanos e responsivos. À Fernanda e Gabriela, assistentes sociais, pelos momentos de troca e apoio. Tenho certeza de que muito do prazer que hoje sinto na minha profissão vem por viver com vocês momentos únicos, emocionantes e que sempre nos ensinam.

A Dra. Daniele, Dr. José Fernando, Dra. Erika, Dra. Simone, Dra. Cidália e Fernanda Marchezini, pelas conversas enriquecedoras, pela confiança, pelo incentivo e apoio.

Ao Dr. Daniel Forte, por nutrir a minha biblioteca virtual e pelo apoio.

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pensamentos poderia pensar em uma banca examinadora com pessoas tão qualificadas e admiradas.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo incentivo através da bolsa de estudos concedida.

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BRAZ, M. S. (2013) TÍTULO. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

RESUMO

Os cuidados paliativos buscam qualidade de vida baseada principalmente na prevenção e no alívio do sofrimento de pacientes que possuem doenças ameaçadoras de vida, englobando as esferas de ordem física, psicossocial e espiritual. Além disso, estende-se ao pós-morte do paciente, oferecendo suporte e apoio à família no processo de luto. O tema proporciona discussões acerca de educação para morte e processo de morrer para os profissionais de saúde, que têm uma formação em sua maioria voltada para a valorização do saber técnico em detrimento de uma formação humanista, o que afasta o tema da morte como foco de aprendizado. Esta pesquisa qualitativa teve como objetivo compreender e analisar a formação dos profissionais em relação ao processo de morrer do paciente e as percepções daqueles em relação às suas contribuições para a prevenção de luto complicado da unidade de cuidado. A Teoria do Apego fundamentou teoricamente esta pesquisa, oferecendo respaldo para a análise. Participaram voluntariamente desta pesquisa profissionais de saúde, que integram formalmente equipes de cuidados paliativos. Foi utilizado um questionário auto-aplicativo para obtenção de dados acadêmicos, profissionais e de cursos realizados e uma entrevista semiestruturada, que permitiu compreender os seguintes tópicos: a escolha de trabalhar em cuidados paliativos; as estratégias utilizadas (para si mesmo e para com a unidade de cuidado) no dia a dia para lidar com a questão do processo de morrer e a percepção sobre a sua contribuição para a prevenção de um luto complicado de paciente e família. Os resultados confirmaram que a formação dos profissionais em relação ao processo de morrer é escassa. Ademais, observou-se que os profissionais de saúde que trabalham em cuidados paliativos possuem comportamentos de apego, os quais são identificados como naturais nesse contexto, o que acaba por dificultar a percepção de que são importantes contribuições para a prevenção de luto complicado da unidade de cuidado.

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BRAZ, M. S. (2013) TÍTULO. Dissertation (Master of Clinical Psychology Degree). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

ABSTRACT

Palliative care seek quality of life based primarily on prevention and relief of suffering of patients who have life threatening diseases, encompassing the areas of physical, psychosocial and spiritual. Furthermore, extending the post-mortem patient, it offers support the family support in the grieving process. The theme provides discussions of education for death and dying process for health care professionals who are educated mostly geared towards the enhancement of technical knowledge at the expense of a humanist education, which removes the theme of death as the focus of learning. This qualitative study aimed to understand and analyze the training of professionals in relation to dying patient and their perception regarding their contributions to the prevention of complicated grief care unit. The Attachment Theory grounded this research theoretically, providing support for the analysis. Health professionals who integrate palliative care teams voluntarily participated in this research . A questionnaire was used to obtain academic and professional data, besides courses taken. A semi-structured interview allowed us to understand the following topics: the choice of working in palliative care, the strategies used (by oneself and by the care unit) on a daily basis to deal with the issue of the dying process and the perception of its contribution to the prevention of complicated grief of patient and family. The results confirmed that the training of professionals in relation to the dying process is scarce. Moreover, it was observed that health professionals working in palliative care have attachment behaviors, identified as natural in this context, and that ends up to make it harder to realize that those are important contributions to prevent grief from becoming complicated in the care unit.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto

complicado... 37

Tabela 2 Fatores de risco que podem ser complicadores e contribuir para o

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

DELEtCC –Disseminating End-of-Life Education to Cancer Centers

DSM – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais ENNEC –End-of-life Nursing Education Consortium

EPEC –The Education for Physicians on End-of-life Care

LELu – Laboratório de Estudos sobre o Luto LEM – Laboratório de Estudos sobre a Morte ONG – Organização não governamental PCR – Parada cardiorrespiratória

PS – Pronto-socorro

PUC/SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido UTI – Unidade de Terapia Intensiva

WHO - World Health Organization

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 14

1 OBJETIVO GERAL... 16

1.1 Objetivos específicos... 16

2 CUIDADOS PALIATIVOS... 17

2.1 Cuidados paliativos e Bioética: implicações na tomada de decisão... 20

2.2 Cuidados paliativos e comunicação... 25

2.3 Decisão compartilhada e a teoria do apego... 30

3 O PROCESSO DE LUTO E SUAS IMPLICAÇÕES... 33

3.1 O fenômeno do processo de luto e suas dimensões... 34

3.2 Luto normal e luto complicado... 35

3.3 Depressão, luto e luto complicado: semelhanças e diferenças... 40

3.4 A construção social da patologização da experiência do luto... 42

3.5 Novas vertentes para o luto em relação a sua vivência... 43

4 FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE EM RELAÇÃO AO PROCESSO DE MORRER E DE MORTE... 45

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS... 50

5.1 Participantes... 50

5.2 Estratégias para obtenção de respostas dos participantes... 51

5.3 Estratégias para compreensão das respostas dos participantes... 51

6 PROCEDIMENTOS ÉTICOS DA PESQUISA... 53

7 RESULTADOS E DISCUSSÃO... 54

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 80

REFERÊNCIAS... 82

APÊNDICE A – DADOS ACADÊMICOS E PROFISSIONAIS 89

APÊNDICE B – ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA 90

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INTRODUÇÃO

A autora deste estudo é uma “soteropaulistana”, formou-se em Psicologia em 2009, trabalha na área hospitalar desde 2007, teve a oportunidade de ter grandes mestres e soube aproveitar as oportunidades. Nunca teve o sonho de ser psicóloga, mas assim como em todas as suas vivências, co-construiu consigo e com o mundo a sua volta – leia-se pessoas, relações, teorias e instituições – a dedicação e o amor pelo trabalho que faz.

Com formação em terapia familiar sistêmica, obteve a base e o entendimento de que não existe o certo ou o errado, mas aquilo que funciona para cada indivíduo. Diante disso, acredita em uma co-construção que ocorre a cada momento, com cada paciente, familiar ou colega de equipe. Uma co-construção que permite reflexões sobre postura e comportamento ético, profissional e pessoal.

Atualmente, trabalha em uma equipe de cuidados paliativos de um hospital particular de São Paulo. Essa equipe é que a faz crer que é possível proporcionar e desenvolver uma base segura para a unidade de cuidado e para os próprios membros que a compõe. Rotineiramente são realizadas conferências familiares e são discutidos, em situações de bastante emoção, objetivos de tratamento. Essa vivência e o cuidado que se tem para conversar com os envolvidos sobre isso revela o quanto os comportamentos dos profissionais podem contribuir para a prevenção do luto complicado – fato esse que pode ser confirmado com as famílias nos atendimentos pós-óbito.

Esta pesquisa é resultado, principalmente, de experiências nas quais a autora teve de ser assertiva, e às vezes nem tanto, para pontuar a importância de conversar com o paciente e sua família sobre o tratamento instituído, e não apenas fazê-lo porque enquanto técnicos a equipe entende o que é melhor. É preciso entender que em saúde trabalha-se com pessoas e relações nutridas de significados. A autora acredita que quando o paciente e sua família aceitam de coração o que está acontecendo, por meio de uma comunicação efetiva e afetiva, de disponibilidade e paciência, o processo de luto conta com fatores protetores que podem ser preventivos para o luto complicado.

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e importante ter um olhar crítico em relação à formação desses profissionais, a fim de que possam estar mais bem preparados para vivenciar e lidar todos os dias com o final de um ciclo. Isso pode contribuir para uma melhor assistência ao paciente e à sua família no processo de morrer, corroborando para a prevenção de lutos complicados.

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1OBJETIVO GERAL

O presente estudo pretende:

Compreender e analisar a formação dos profissionais que integram equipes multidisciplinares de cuidados paliativos acerca do processo de morrer do paciente;

Compreender as percepções dos profissionais de saúde acerca de suas contribuições para prevenção de luto complicado da unidade de cuidado.

1.1 Objetivos específicos

1. Investigar e analisar a formação dos profissionais de equipes multidisciplinares de cuidados paliativos em relação aos processos de morrer e de luto;

2. Compreender e analisar a percepção que os profissionais de equipes multidisciplinares de cuidados paliativos possuem em relação à necessidade de oferecer suporte e assistência à unidade de cuidado no processo de morrer do paciente;

3. Identificar e analisar as estratégias utilizadas pelos profissionais de equipes multidisciplinares de cuidados paliativos em relação ao processo de morrer do paciente;

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2 CUIDADOS PALIATIVOS

Os cuidados paliativos tiveram origem no movimento hospice. A palavra hospice foi usada em um primeiro momento para denominar os locais que abrigavam peregrinos e viajantes, com o objetivo de lhes proporcionar conforto e cuidados. O Hospício do Porto de Roma é considerado o hospice mais antigo (século V), onde Fabíola, que era discípula de São Jerônimo, prestava cuidados a viajantes da Ásia, África e do Leste (CORTES, 1998). Tal movimento tem como representante principal Cicely Saunders que fundou o St. Christopher´s Hospice, em Londres, em 1967. A ideia de proporcionar cuidado e conforto é a base dos cuidados paliativos, o qual estabelece uma nova forma de cuidar, baseando-se em dois elementos fundamentais: o controle efetivo da dor e de outros sintomas decorrentes de tratamentos de doenças em fase avançada e o cuidado que vai além da esfera física, estendendo-se para dimensões psicológicas, sociais e espirituais do paciente e família (MELO; CAPONERO, 2009). Tal linha de pensamento traduz o conceito de dor total, formulado por Saunders em 1967, o qual acarreta um cuidar integral, que abrange as dimensões citadas, assim como aspectos mentais e financeiros do paciente e da família (SAUNDERS, 1991). Esse conceito vai determinar e dar o tom ao tratamento paliativo, fornecendo um olhar não para o doente, mas para a pessoa, que tem uma história, uma família, um trabalho, pontos de vista e significados de realidade, espiritualidade, desejos e vontades, que devem ser respeitados, ideia essa que converge com o movimento da humanização hospitalar. Dentre os objetivos dos cuidados paliativos, os cuidados com os aspectos psicossociais apresentam-se como uma forma de minimizar a vulnerabilidade deste momento, oferecendo suporte ao paciente, à família e à equipe, o que acaba por incentivar a conexão entre os elementos dessa tríade para objetivos comuns e criação de significados diante da situação atual (LOSCALZO, 2008). Por conseguinte, nos cuidados paliativos a assistência é destinada ao paciente e à família, configurando-se como uma unidade de cuidado.

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possível e auxiliando cuidadores e família no processo de luto (SAUNDERS, 1991). Sustentam o olhar para trás e observar, perceber, sentir aquilo que se construiu e o que não pôde ser realizado. Proporciona o ressignificar de visões de vida, mundo e relações. A apresentação dessa definição traz consigo não mais o objetivo de aceitar a morte, mas de compreender o processo de morrer como o final de um ciclo. Assim, esses pressupostos que vão nortear essa dinâmica afirmam a vida e encaram a morte como um processo natural.

Na década de 1990, a medicina experimentava o boom do avanço tecnológico (máquinas de ventilação mecânica mais modernas, equipamentos de exames mais precisos, novas medicações e drogas vasoativas) que propiciou diagnósticos precoces e, principalmente, medidas de suporte de vida avançadas capazes de aumentar a sobrevida dos pacientes. Esse contexto acabou por fomentar ainda mais nas equipes médicas o desejo de cura dos pacientes, muitas vezes já fora das possibilidades terapêuticas curativas, mas ainda assim submetidos a medidas invasivas de suporte de vida. Nesse sentindo, podemos nos questionar sobre quem estava (e está) a serviço de quem: a tecnologia a serviço da medicina ou a medicina a serviço da tecnologia? O que se observa muitas vezes é a segunda opção, pois o médico confunde a possibilidade de agir, proveniente da técnica, com o dever de agir, contextualizado por um sistema de valores que justificam todo um processo (FLORIANI; SCHRAMM, 2008).

Logo, os cuidados paliativos eram a última escolha, instalados como conduta depois de inúmeras tentativas de cura e prolongamento da vida, utilizados somente quando o paciente estava na fase final da vida – os verbos estão no passado, porém esse ainda é um pensamento presente e compartilhado por médicos e instituições, o que demonstra a inadequada utilização desse tipo de tratamento visto ao que ele se propõe nos dias atuais. Tal inadequação, contudo, muitas vezes é confirmada no exercício da prática diária, em que as equipes de cuidados paliativos são solicitadas para avaliar e acompanhar o paciente já em fase final de vida. É frequente e errôneo o pensamento de que cuidados paliativos são destinados apenas àqueles pacientes em fase de terminalidade. Desmistificar essa ideia é obrigação dos profissionais da área de saúde, de forma a não restringir os cuidados paliativos ao momento da morte, uma vez que não atuam apenas na instalação dos sintomas estressantes e desconfortos, mas principalmente na prevenção de tais eventos. Essa é uma possibilidade de agir na educação da sociedade profissional e leiga.

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curativo (modificador da doença), e não apenas no final de vida (MELO; CAPONERO, 2009; LANKEN et al., 2007). Dessa forma, desde o início do tratamento curativo, o paciente e sua família passam a ter contato com a equipe de cuidados paliativos e à medida que a doença crônica progressiva evolui e o tratamento curativo perde sua eficácia em controlá-la ou modificá-la, os cuidados paliativos se tornam mais necessários, até figurarem como exclusivos em virtude do quadro de incurabilidade (MACIEL, 2008; LANKEN et al., 2007). Esse funcionamento propicia a construção de um vínculo de confiança entre a tríade paciente-família-equipe, o que facilita e contribui para a articulação e o desenvolvimento de planos estratégicos de assistência integral e contínua. Além disso, tal funcionamento causa um menor sentimento de ruptura para o paciente e sua família quando passa do tratamento curativo apenas para o paliativo, auxiliando na aceitação dessa nova conduta:

Para os pacientes, os membros da família e o time de cuidadores da saúde, a Medicina de cuidados paliativos com sua perspectiva da pessoa como um todo é fio de conexão altamente necessário de um sistema de cuidados da saúde altamente técnico e fragmentado (LOSCALZO, 2008, p. 482, tradução da autora).

Vale ressaltar que esse modelo de funcionamento de cuidados paliativos não termina com a morte do paciente. Ele se estende ao pós-morte, oferecendo suporte e apoio à família no processo de luto (WHO, 2004; LANKEN et al., 2007), o qual corresponde a uma resposta decorrente do rompimento de um vínculo (FRANCO, 2004).

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Além disso, o exercício da prática mostra que os limiares entre um tratamento curativo e um tratamento exclusivamente paliativo não obedecem à passagem de uma régua. O que comumente se vê é um processo de transição para paciente, família e equipes. O próprio cuidado paliativo exclusivo é bastante discutido e não há um consenso quanto à terapêutica: alguns acreditam que o paciente deva receber apenas analgesia e retirada de sonda de alimentação. Outros acreditam que o paciente deva receber medicação para controle de sintomas, alimentação (via oral ou por sonda) e antibiótico. Contudo, não se está falando apenas de medidas terapêuticas. A autora acredita que não há um consenso justamente porque se particulariza o tratamento paliativo não de acordo com o diagnóstico e suas comorbidades, mas de acordo com as preferências e os desejos do paciente e/ou família. Dessa forma, sempre se tem diferentes cenários.

2.1 Cuidados paliativos e Bioética: implicações na tomada de decisão

Abordar cuidados paliativos e discutir sobre objetivos de tratamento para o paciente que está internado no hospital é abordar e tratar de temas delicados como a morte e o morrer. De acordo com Silva, Dias e Vitorino (2010), nessa fase é comum que a família experimente sentimentos de impotência, ansiedade, angústia e tristeza. Nesse cenário, surgem outros assuntos, tornando complexo todo o processo de tomada de decisão: comunicação, bioética e limitação terapêutica, favorecendo a ideia de boa morte, que preconiza, além do favorecimento de medidas de conforto, em vez de medidas invasivas de suporte de vida avançado, uma morte sem dor, com os desejos do paciente respeitados (formal ou informalmente); morte em casa, cercado da família e amigos, com pendências resolvidas e uma boa relação entre a tríade paciente-família-equipe de saúde (EMANUEL; EMANUEL, 1998).

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livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. Isso é de suma importância para a tomada de decisões em cuidados paliativos e fio condutor desse novo modelo de decisão compartilhada entre paciente-família-médico, como a autora discutirá mais adiante.

Além disso, no artigo 41, o Código legisla que é vedado ao médico abreviar a vida do paciente, ainda que seja a pedido dele ou de seu representante legal; em parágrafo único pontua que nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal. Esse parágrafo traz à tona uma especificidade relevante e usual dos cuidados paliativos inserida no contexto de tomada de decisões e que vai agir sobre o impacto emocional do cuidador familiar: o fato de o paciente não estar apto para tomar decisões por si (uma vez que está com as funções cognitivas prejudicadas em razão de condições clínicas em coma ou com rebaixamento do nível de consciência). Logo, esse cuidador assume o papel de substituto na discussão sobre o delineamento e objetivos de tratamento, devendo guiar-se no sentido de respeitar os desejos, valores e preferências do paciente, os quais são difíceis de acessar quando o paciente não está com suas funções cognitivas preservadas (CARLET, 2004).

Ainda em relação ao Código de Ética Médica (2010), o qual cita as terapêuticas obstinadas, entende-se por obstinação terapêutica a defesa da vida acima de qualquer coisa, utilizando-se de forma persistente e continuada das mais diversas medidas invasivas de suporte de vida, para pacientes com doenças avançadas, prolongando a manutenção dos sinais vitais e consequente retardo da morte, caracterizando-se como um quadro de futilidade médica, já que tais medidas apresentam-se com pouca ou nenhuma utilidade operacional (SCHNEIDERMAN; JECKER; JONSEN, 1990). Por conseguinte, a futilidade deve ser analisada não só pela sua ineficiência frente aos objetivos propostos, mas também pelos seus possíveis danos. Vale acrescentar, contudo, que alguns autores pontuam a relatividade da futilidade médica em muitos casos, frente à dificuldade de fechar prognóstico dos pacientes e sobre o que seria qualidade de vida para eles. Além disso, deve-se destacar conflitos de interesses entre as partes envolvidas que se agravam, principalmente, entre esferas de poder de decisão, como a Medicina e o Direito (AMERICAN MEDICAL ASSOCIATION, 1999).

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prudência (SILVA; DIAS; VITORINO, 2010). De acordo com o Conselho Nacional de Saúde, por meio da Resolução nº 196/96, a não maleficência defende que a ação do médico

sempre deve causar o menor prejuízo à saúde do paciente. A beneficência compromete-se com o máximo de benefícios e o mínimo de riscos e danos. A justiça baseia-se em tratar o paciente com base no que é moralmente correto e adequado. Logo, os recursos devem ser distribuídos de forma equilibrada, objetivando alcançar com eficácia o maior número de pessoas assistidas. Por fim, a autonomia, que prega o respeito às decisões tomadas pelo indivíduo capacitado (CENTRO DE BIOÉTICA DO CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO). Esses princípios não estão dispostos em uma condição hierárquica, por isso ponderar cada um deles de acordo com a especificidade de cada paciente, família e equipe é o mais adequado, o que caracteriza a decisão dos cuidados paliativos como algo complexo, difícil para equipe e unidade de cuidado, carregado de emoções em um momento que lhes exige razão.

Segre (2008) realiza uma importante discussão acerca dos princípios citados, pontuando, antes de tudo, que a construção do princípio é precedida de uma tendência. Em relação à beneficência e não maleficência, considera como uma diferenciação que ocorre no sentido de tentar delimitar formalmente as responsabilidades e que depende de interpretações. Além disso, acredita que ambos os princípios são resultado “do medo que se tem de assumir a implementação dos próprios objetivos” (SEGRE, 2008, p. 36). A respeito da autonomia, discorre sobre o caráter abstrato e subjetivo, não apenas racional, que ela pode ter. Por essa razão, refere desistir de tentar conceituá-la, defini-la ou limitá-la para fins de estudo. Conclui que a autonomia e a sua busca tão somente podem resultar da percepção da própria pessoa de que há mais um caminho a seguir. A justiça, por sua vez, é percebida por Segre (2008) como mais decorrente de uma moral social, da lei, do que da individualidade da pessoa.

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Com base no que foi apresentado, questiona-se mais uma vez: o paciente tem essa autonomia descrita pela interlocução da ética com a vida?

Dentre esse emaranhado de perguntas, com inúmeras respostas e relativizações, a autora pontua que a diretriz antecipada de vontade traz consigo a possibilidade de o ser humano assumir uma nova postura diante de sua vida e escolhas, o que traz traz impactos de ordem política e econômica se se pensar em serviços de saúde e indústria farmacêutica, por exemplo. Abre-se a discussão para que as pessoas possam falar abertamente sobre o morrer, sem medo ou com caráter de morbidez. Logo, existe a possibilidade de uma mudança na comunicação entre equipe e unidade de cuidado, de forma a se estabelecer uma relação dialógica preocupada com o que foi apreendido e com a valorização das emoções, para que assim o ser humano possa fazer suas escolhas e exercer sua autonomia (FRANCO, 2002a). A autora deste estudo acredita em uma mudança antropológica do homem em relação à vida (já que quando falamos de morte, falamos do que vivemos), na possibilidade de aproximar as pessoas da sua própria finitude, tornando esse desconhecido momento de rompimento de vínculo como algo mais natural, o que pode ser percebido como um fator de proteção para um possível luto complicado.

Na perspectiva dessa discussão surgem, ainda, no âmbito da Bioética, motes como eutanásia, distanásia e ortotanásia. A primeira, que provém do grego e tem significado de boa morte ou morte digna, pode ser entendida como “o emprego ou abstenção de procedimentos que permitem apressar ou provocar o óbito de um doente incurável, a fim de livrá-lo dos extremos sofrimentos que o assaltam” (LEPARGNEUR, 1999, p. 43). Discute-se que a eutanásia pode apresentar-se de distintas formas, em relação ao ato em si, como apresentado em Zum Problem der Euthanasie, obra considerada um clássico de Neukamp (1937):

Eutanásia ativa: ato deliberado de provocar a morte do paciente, sem sofrimento. Tem como base fins humanitários.

Eutanásia passiva: quando a morte é provocada em razão da omissão em se iniciar uma ação médica que garantiria a perpetuação da sobrevida.

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A distanásia, por sua vez, é entendida como o prolongamento da vida, de forma sofrida e inútil, por meio de procedimentos e intervenções que visam ao distanciamento da morte (PESSINI, 2009). Essa perspectiva, converge com o avanço da tecnologia e da ciência, a qual busca a cura a qualquer custo, isto é, a quantidade da vida, colocando em segundo plano o paciente e sua história (idem, ibidem).Já a ortotanásia engloba a morte natural, no tempo certo, sem antecipar ou prolongar a vida, respeitando o bem-estar geral do paciente, garantindo-lhe dignidade no processo de morte. Converge com a ideia de cuidados paliativos uma vez que proporciona condições e qualidade de vida na fase final, permitindo alívio do sofrimento (físico, social, psicológico e espiritual) e proximidade de familiares e amigos junto ao paciente. Em ambas as concepções, a morte não é percebida como uma doença a ser curada, mas como o fim do ciclo vital (REIRIZ et al., 2006). Argumenta-se que a ortotanásia é considerada a terceira via entre a eutanásia e distanásia, já que proporciona ao paciente condições necessárias e importantes para a compreensão de sua finitude e preparação para partir em paz (idem, ibidem). A discussão fica acerca de se os cuidados paliativos não seriam um acelerar a morte, ou seja, se seriam uma prática de eutanásia, principalmente em razão do uso da sedação paliativa. Para tanto, faz-se necessário pensar e discutir sobre os objetivos de cada um: considera-se que a eutanásia ativa tem como finalidade exclusiva a morte. Os cuidados paliativos, com atuação no final de vida do paciente, visam ao alívio do sofrimento por meio da sedação paliativa quando todas as outras medidas de analgesia foram refratárias. Observa-se que a intenção dos atos e os respectivos resultados são diferentes (EUROPEAN ASSOCIATION OF PALLIATIVE CARE TASK FORCE, 2003).

No que tange à questão da sedação paliativa, vale destacar que devem existir critérios para a administração da mesma e que não há uma medida específica da quantidade de medicação a ser administrada. A quantidade utilizada será de acordo com a necessidade e grau de dor e/ou desconforto do paciente. Argumenta-se que não é essa conduta que abreviará a vida do paciente. Na realidade, pontua-se que essa é apenas uma escolha de como será o final de vida: mais ou menos sofrido. Moritz (2011, p. 108) reafirma que a sedação paliativa é

procedimento justificável do ponto de vista ético-legal. No entanto, faz-se necessário que sejam estabelecidos os critérios sobre as dosagens de medicamentos, bem como os de sua correta aplicação. A sedação paliativa devidamente protocolizada fundamenta a conduta dos médicos para salvaguardar a dignidade humana de seu paciente no sentido de evitar um final de vida com insuportáveis sofrimentos. Os pacientes devem ser mantidos sob vigilância contínua, para reavaliação de suas necessidades.

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terapêuticas: a não implementação ou utilização de determinadas condutas são pautadas, como já citado anteriormente, no seu caráter fútil. O objetivo não é a morte do paciente, e sim em não prolongar a vida de uma forma sofrida. Seguindo essa linha de pensamento, no que diz respeito ao aspecto legal da ortotanásia, Torre (2011, p. 171) afirma, com base em conceitos do sistema penal, que para a conduta do médico ser caracterizada como um homicídio, por exemplo, é necessário que primeiramente haja “a possibilidade material de evitar o resultado”. De acordo com o autor, o médico que suspender ou limitar procedimentos que apenas prolongam a vida de um doente, já que a situação não será modificada e é irreversível, não pode ser considerado como o causador da morte, ou seja, sua ação não pode ser enquadrada no tipo de homicídio. Ele argumenta que as ações de suspensão e limitações diante de um resultado sem possibilidade de modificação são caracterizadas como omissão de assistência inútil e não eutanásia passiva ou eutanásia ativa. Para o autor, a omissão não é considerada relevante para o direito penal e destaca novamente o caráter irreversível de modificação da doença e inevitabilidade da morte.

2.2 Cuidados paliativos e comunicação

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comunicação de más notícias, sendo sempre abordada a importância das conferências familiares, que será discutida mais adiante.

De acordo com Forte (2009), muitas vezes o profissional de saúde não sabe como abordar o paciente e a família sobre cuidados paliativos, ou teme fazê-lo, o que torna clara a importância da comunicação e suas respectivas estratégias nesse momento. A capacidade de se comunicar é entendida como uma habilidade do indivíduo em compreender as circunstâncias e expressar de forma apropriada suas intenções (MORITA; TEI; INOUE, 2003). Trata-se de um processo que abrange a percepção, compreensão e transmissão de mensagens por parte de cada sujeito envolvido. Tal processo pode ser expresso por meio de signos verbais, escritos, gestos, sons, expressões, postura corporal que revelam pensamentos e sentimentos (ARAÚJO, 2009). Por conseguinte, constitui-se como algo objetivo e expresso concomitantemente a um processo subjetivo em que coexistem (e se complementam) as linguagens verbal e não verbal. Na abordagem de cuidados paliativos inseridos no contexto de tomada de decisões, o médico deve atentar não somente a dar informações técnicas e objetivas, mas também ao seu tom de voz, ritmo do discurso, postura corporal, proximidade física. Sua atenção também deve estar voltada para as formas de comunicação verbal e não verbal utilizadas pela unidade de cuidado, pois isso propicia a percepção e compreensão de medos, fantasias, angústias e sentimentos (SILVA, 2003), permitindo-o ser responsivo às necessidades das pessoas, desenvolvendo, por sua vez, uma base segura com essa unidade de cuidado. Logo, a comunicação tem influência direta no modo como a família sente e vivencia o momento da hospitalização, e a depender de como a comunicação é desenvolvida, gera menor ou maior sobrecarga sobre a família, o que acaba por reverberar, posteriormente, além de outros fatores, na sua decisão em relação à aceitação de cuidados paliativos.

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em caso de PCR. Com base nesse estudo, muitas pesquisas sobre comunicação começaram a ser realizadas na área médica, principalmente no que se refere a UTIs e cuidados paliativos.

Um estudo prospectivo realizado com 164 famílias de pacientes internados na UTI, com o objetivo de correlacionar os níveis de satisfação da família com a percepção sobre a forma como recebeu informações da equipe de saúde e com a assistência que o paciente recebeu durante sua internação na UTI constatou que informações insuficientes determinaram o descontentamento. A acessibilidade aos médicos foi verificada como determinante principal de insatisfação, sendo associada a conflitos que dizem respeito a prognósticos. Logo, constatou-se que a satisfação da rede familiar e sua compreensão acerca da UTI podem melhorar com uma maior acessibilidade aos médicos e à equipe de saúde (FUMIS; NISHIMOTO; DEHEINZELIN, 2008). Faz-se necessário acrescentar que o fato de a equipe ser mais acessível às famílias, em relação as suas necessidades, emoções e dúvidas, contribui para o desenvolvimento e a construção de um vínculo de confiança (SILVA, 2001) e base segura.

A American Thoracic Society, com objetivos educacionais e prescritivos, desenvolveu um estatuto a fim de auxiliar os profissionais de saúde na prática dos cuidados paliativos à pacientes com doenças respiratórias e doenças críticas (LANKEN et al., 2007). Entre as descrições feitas encontram-se as Competências de Comunicação e Relacionamento que o profissional de saúde deve ter, desenvolver e se ater ao conversar e lidar com a família, com o paciente e com a equipe: capacidade de se comunicar com empatia(CURTIS; WHITE, 2008) e compaixão; capacidade para orientar a família durante as horas finais do paciente; capacidade para ajudar a família durante o período de pesar e luto; capacidade para identificar os valores do paciente, objetivos de vida e preferências em relação ao morrer; capacidade para identificar as necessidades psicossociais e espirituais dos pacientes e familiares e recursos para atender a essas necessidades; habilidade para trabalhar eficazmente em equipe interdisciplinar; capacidade para aplicar a tomada de decisões éticas e legais em situações de retenção ou retirada de suporte de vida avançado; usar o modelo de tomada de decisão compartilhada com a família e outros representantes para pacientes sem capacidade de decisão completa (CARLET et al., 2004).

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vínculo de confiança e empatia nas situações de tomadas de decisões. Baile et al. (2000) descreveram de forma didática seis etapas a serem cumpridas. A primeira etapa (Setting Up) refere-se à preparação do médico e ao espaço físico para a reunião com a unidade de cuidado. O segundo passo (Perception) preconiza a verificação da compreensão da unidade de cuidado sobre o estado de saúde do paciente. A terceira etapa (Invitation) propõe entender o quanto a unidade de cuidado quer saber sobre o quadro de saúde do paciente. O quarto passo (Knowledge) é a transmissão da informação, sendo necessário atenção no sentido de utilizar frases introdutórias que indiquem más notícias, não utilizar palavras técnicas em excesso e checar a compreensão das pessoas. O quinto passo (Emotions) refere-se a responder empaticamente às reações da unidade de cuidado. E por fim, a última etapa (Strategy and Summary) revela o plano terapêutico para o paciente.

Abordar a rede familiar sobre cuidados paliativos e discutir objetivos de tratamento e limitações terapêuticas para o paciente internado na UTI, enfermaria ou pronto-socorro faz parte do novo tipo de relação que os médicos vêm estabelecendo com essa rede: a decisão compartilhada. Diferentemente da relação paternalista, na qual o médico é o dono da verdade e é quem decide sobre as condutas a serem seguidas sem atentar para opinião, desejos e vontades de paciente e da família, o modelo de decisão compartilhada ou deliberativa sugere uma conversa e discussão entre médico e família, de forma a levantar as opções terapêuticas disponíveis e suas consequências em relação a valores e preferências do paciente e família, buscando-se um consenso sobre o que é melhor para o paciente (CONNORS et al., 1995). Além desses dois tipos de relações estabelecidas entre médico, paciente e família, vale destacar a existência das relações denominadas de informativa e interpretativa: na primeira, o paciente é visto como um cliente da assistência à saúde e o médico como especialista técnico, o qual informará sobre riscos e benefícios de cada tratamento, cabendo ao paciente e ou à família a decisão; já na segunda o médico tem papel de conselheiro, interpreta valores e preferências de pacientes e famílias frente aos riscos e benefícios de possíveis tratamentos propostos (FORTE, 2009).

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além de ajudar a promover o enfrentamento da situação – o que reverbera em segurança da rede familiar em relação aos cuidados com o paciente e com a equipe. O processo de tomada de decisão sobre preferências de tratamento em final de vida é complicado pelas emoções da rede familiar levando em conta a natureza complexa da doença versus capacidade médica de sustentar a vida (tecnologia). Faz-se necessário, portanto, que o profissional de saúde fale não apenas do que será descontinuado ou retirado, mas principalmente, que informe sobre o que será continuado, priorizando conforto e qualidade de vida do paciente (LANKEN et al., 2007).Ressalta-se, não obstante, que muitas vezes a rede familiar deixa a cargo da equipe a decisão sobre objetivos de tratamento e limitações terapêuticas, uma vez que não tem condição emocional para decisões dessa magnitude. Nessa última circunstância, fica claro e evidente que se estabeleceu uma base segura entre equipe e família.

Um estudo realizado a partir de conferências familiares sobre decisões de final de vida para pacientes internados na UTI teve como objetivo medir o grau de satisfação das famílias (HEYLAND et al., 2003). Para tanto, as conferências foram gravadas, medindo-se o tempo que os familiares falavam e que o médico falava. Observou-se que as famílias saíam mais satisfeitas das conferências nas quais o médico falava menos e escutava mais, provavelmente porque conseguiam compreender melhor as opções de condutas disponíveis e satisfazer suas necessidades. O grau de satisfação também acabou por se estender para a habilidade de comunicação do médico.

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este último, ocorrendo em até 48% dos casos (CARLET et al., 2004).Nesse sentido, destaca-se que todos os fatores citados sobre comportamentos, habilidades e postura do médico também contribuem para o estabelecimento do vínculo de confiança e para a construção de uma base segura entre a díade família-equipe (SILVA, 2001).

A tomada de decisão da unidade de cuidado sobre objetivos de tratamento e limitações terapêuticas ainda conta com outras variáveis. O estresse, a depressão e a ansiedade dos cuidadores influenciam na sua habilidade de tomar decisões (CURTIS; WHITE, 2008; POCHARD et al., 2001). Estudos relatam que a colaboração interdisciplinar entre os membros da equipe está associada a um decréscimo dos sintomas da ansiedade e depressão dos familiares, sendo um componente importante na comunicação com a família (CURTIS; WHITE, 2008).

Novamente observa-se que a responsividade da equipe às emoções e necessidades da família contribui para a construção de uma base segura que propicia um menor sentimento de insegurança. Aspectos como tipo de doença, tempo que o paciente já vem enfermo e está internado em hospital e UTI, cultura, religião, ciclo vital do paciente também são variáveis pertinentes e que influenciam na tomada de decisão da família. Finalmente, vale ressaltar, que independente da aceitação de cuidados paliativos e limitações terapêuticas estabelecidas, a família deve ser abordada novamente sobre essa questão (CARLET et al., 2004; CURTIS; WHITE, 2008), pois sua opinião pode variar de acordo com o prognóstico e evolução do paciente. Pode-se observar tanto pacientes e/ou famílias que posteriormente aceitam o tratamento, priorizam o conforto e as limitações terapêuticas, como aqueles que ficam em dúvida se essas foram as melhores escolhas após as terem aceitado – esse modelo de decisão compartilhada abre o discurso e permite novas configurações e revisitações, não sendo nada estático.

2.3 Decisão compartilhada e a teoria do apego

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momentos de medo (MAIN, 2001). Vale enfatizar que a criança está apegada ao seu cuidador, mas esse não está de forma recíproca apegado a ela, isso porque o fim primário dessa relação é atender às necessidade da criança. O apego adulto, por sua vez, é definido como a tendência do indivíduo em fazer esforços importantes a fim de procurar, manter proximidade e contato com uma pessoa ou pessoas específicas, que ofereçam potencial subjetivo para segurança física e/ou psicológica(SPERLING; BERMAN, 1994) – diferentemente do apego de infância, esse tipo de apego envolve maior reciprocidade. Essa tendência do adulto, de acordo com Bowlby (1990), é regulada pelo que ele denomina de modelos operativos internos, que se configuram como representações das experiências da infância relacionadas à percepção do ambiente, de si mesmo e do outro. Esses modelos não são estáticos e imutáveis e podem ser modificados e transformados a partir das experiências vividas; são construídos e se traduzem em algumas crenças e práticas consequentes delas. Neles, o indivíduo conta para si mesmo quais ferramentas e habilidades possui para lidar com as coisas da vida. Por conseguinte, acabam por guiar o comportamento da pessoa em relação às pessoas e situações.

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3 O PROCESSO DE LUTO E SUAS IMPLICAÇÕES

Houve um tempo em que o nosso poder perante a morte era muito pequeno. E por isso os homens e mulheres dedicavam-se a ouvir a sua voz e podiam tornar-se sábios na arte de viver.

(ALVES, 1991)

A autora do presente estudo considera que definir, conceituar e discutir o luto é uma tarefa difícil que exige explorar diversos âmbitos: a própria definição de luto e as discussões acerca disso; o fenômeno do processo de luto e suas dimensões; os fatores de risco e proteção para o desenvolvimento do luto complicado; a construção social que vem patologizando a experiência do luto e a sua inserção no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição – DSM-V (2013); e as novas vertentes para o luto em relação a sua vivência. Faz-se relevante sempre considerar tais questões em relação a um contexto sociocultural e espiritual, uma vez que vão contribuir para a construção do significado da experiência do rompimento de vínculo significativo.

Para discutir as definições de luto, a autora utilizou as discussões da literatura, incluindo autores como Stroebe et al. (2008), cuja obra apresenta os termos bereavement,

grief e mourning. Compreende-se que o primeiro termo refere-se a uma situação objetiva de perda de alguém significativo por morte e à própria vivência do processo de luto, sendo algo mais amplo. Nesse sentido, discute-se como definir quando alguém é significante. O termo

bereavement está associado a um intenso sofrimento (distresss) para a maioria das pessoas.

Grief, por sua vez, é definido como uma reação emocional negativa e primária, no nível afetivo, decorrente da morte de alguém que é significativo; tal reação envolve as esferas cognitiva, social, cultural, bem como manifestações físicas. Os sintomas e comportamentos devem ser considerados de acordo com a personalidade e cultura da pessoa, e podem ser diferentes de uma cultura para a outra – o que é aceitável e considerado moralmente correto em um grupo pode não ser considerado da mesma forma em outro grupo cultural. O termo

grief refere-se a uma reação normal e natural. Trazendo essa expressão para o português, a autora o compreende como o pesar. Mourning é definido como uma expressão pública do

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mesma coisa (percebe-se como uma tradução equivocada do que Freud escreveu em “Luto e Melancolía” [1917]): o processo de luto do indivíduo consigo mesmo, menos amplo que o

bereavement, ou seja, o que se vive e o que se expressa, respectivamente. De acordo com Parkes (1998), a ansiedade da separação constitui-se como a dor do grief (luto), pois está relacionada com o pesar e com a experiência que está sendo vivida.

3.1 O fenômeno do processo de luto e suas dimensões

De acordo com Bowlby (1990), o luto é a resposta à ruptura de um vínculo significativo, no qual havia um investimento afetivo entre o enlutado e o ente que se foi, elucidando que a dimensão do luto seja proporcional ao grau de apego, considerando-se fatores relacionados a perda e seus significados. De forma semelhante, Parkes (1998) conceitua o luto como uma categoria de respostas biopsicossociais que são esperadas quando há uma perda significativa e rompimento de um vínculo. Diante desse cenário, o enlutado vivencia uma série de mudanças relacionadas ao meio social, familiar, econômico, entre outras, de maneira particular e singular, as quais vão estar associadas a como o enlutado experienciou o processo (de doença, separação conjugal, mudanças geográficas etc.).

Desde a década de 1980 a conceituação do luto tem sido revisada, transcendendo a esfera afetivo-emocional, mais comumente reconhecida. Observa-se o desenvolvimento de uma maior consciência relacionada a questões sociais, acarretando modos particulares de morrer, como morte por fome, por exemplo. Além do âmbito afetivo-emocional, o processo de luto é composto por domínios que compreendem o cognitivo, o físico, o espiritual e o social, os quais podem apresentar reações comuns ao luto, a saber (PARKES, 1998):

Domínio emocional: tristeza, ansiedade, medo, choque, raiva, solidão, alívio, irritabilidade, culpa, negação, entre outros.

Domínio cognitivo: desconcentração, confusão, desorganização, intelectualização e negação.

Domínio físico: alterações no sono, apetite e peso; choro, exaustão, perda da libido, dispneia, boca seca, mudanças no funcionamento gastrointestinal.

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Domínio social: isolamento, perda da identidade, falta de interação com o meio.

Por conseguinte, tal processo constitui-se como uma experiência subjetiva, ou seja, dotada de significado, inserida em uma cultura e multideterminada (FRANCO, 2010). Falar em múltiplos fatores que constituem o desenvolvimento desse processo e contribuem para que ele ocorra é identificar o significado e ou função de determinada pessoa, animal ou coisa; o tipo de relação e vínculo estabelecido; em caso de morte, a idade e o tipo de morte (naturais ou esperadas, acidentais ou inesperadas e suicídios), se existe o corpo e se foi possível realizar os rituais funerários significativos para a família; crises vitais do enlutado; como foi a vivência durante o processo de rompimento (em caso de morte, separações conjugais ou conflitos familiares, por exemplo); se recebeu apoio efetivo e afetivo; se existe algum recurso espiritual (FRANCO, 2002b). Enfim, são variáveis que podem influenciar na forma como esse luto será vivido e administrado e, por consequência, contribuir tanto para o desenvolvimento do luto normal ou complicado.

3.2 Luto normal e luto complicado

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Rando et al. (2012) discutem também que a existência de complicações no processo de luto pode resultar em crescente morbidade física e mental, além de mortalidade. Afirmam que o luto complicado é complicado e que não há apenas uma forma desse tipo de luto. Logo, o luto complicado não pode ser reduzido a uma síndrome ou desordem. Eles acreditam que o reconhecimento do luto dentro de uma categoria é útil, em uma categorização que reconheça que entre o normal e o patológico há uma área cinza de sintomas e problemas que merecem atenção clínica.

O luto normal, segundo Ruschel (2006), é o processo pelo qual o indivíduo compreende e aceita a perda do ente querido, adaptando-se à condição de viver sem aquela pessoa. Evidentemente, esse tipo de luto permite que o enlutado fique triste, chore, sinta saudades. A questão não é não sentir a perda, mas como é ela é sentida e administrada. De acordo com Stroebe et al. (2008), o normal grief pode ser definido como uma reação emocional à situação de perda de alguém significativo, de acordo com as normas esperadas – construídas culturalmente – (citadas anteriormente, nas repercussões do processo de luto nas diversas dimensões), circunstâncias e implicações da morte.

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que ele necessariamente vai ter efeito no processo de luto, e sim que há uma possibilidade de ser protetor ou complicador.

A relevância de tal indagação tem como base não só a prevenção do luto complicado, mas também de transtornos psicológicos, alterações endócrinas e neuroendócrinas e alterações psicofisiológicas (sono, apetite, nível de cortisol, mudanças comportamentais em relação ao padrão anterior) que podem ser decorrentes daquele. Na Tabela 1, apresentada a seguir, estão elencados os fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto complicado; já na Tabela 2 estão relacionados os fatores de risco que podem ser complicadores e contribuir para o desenvolvimento do luto complicado – tais proposições sugerem padrões, não certezas. Novamente, ressalta-se que esses fatores podem variar de acordo com cultura, contexto, personalidade e significado que o enlutado confere ao acontecimento.

Tabela 1– Fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto complicado

FATOR POR QUÊ?

Apego seguro Pessoas demonstram maior organização e capacidade para integrar as (novas) informações; tendem a ativar a resiliência.

Qualidade do vínculo Uma relação sem conflitos e sem pendências tem um potencial complicador menor. Tipo de apoio (como é

percebido pelo enlutado; avaliação

subjetiva)

Adequado, necessário, suficiente (FRANCO, 2002b) e comunicação entre membros satisfatória. Configura-se como um apoio saudável e continente.

Realização de rituais Importante para o processo de separação e despedida; auxilia no fechamento do ciclo (FRANCO, 2002b).

Luto antecipatório Permite despedidas, resolução de pendências, início da construção de novos significados, identidades, relações (GILLIES; NEIMEYER, 2006).

Tipo de morte Morte por doença crônica, sem sofrimento, por exemplo, situação na qual as pessoas tiveram tempo de se despedir do ente querido, de resolver questões e pendências.

Luto reconhecido pelo enlutado e pela

sociedade

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Tabela 2– Fatores de risco que podem ser complicadores e contribuir para o desenvolvimento do luto complicado

FATOR POR QUÊ?

Apego inseguro Pessoas mais desorganizadas e com contradições, sem encorajamento para avaliar as situações e identificar que estratégia deve ser ativada. Como consequência, acabam por repetir padrões comportamentais fracassados. Qualidade do vínculo Relação com conflitos e pendências ou relação de dependência entre o

enlutado e o ente querido (BROMBERG, 2000) têm potencial complicador maior.

Ciclo vital Morte de crianças e jovens (FRANCO, 2002b).

Tipo de apoio (como é percebido pelo enlutado;

avaliação subjetiva)

Inadequado, abusivo, insuficiente (WORDEN, 1998; BROMBERG, 2000); comunicação entre membros comprometida.

Tipo de morte Morte repentina (PARKES, 1998; BROMBERG, 2000; FRANCO, 2002b), violenta (PARKES, 1998; FRANCO, 2002b); doença aguda; suicídio (PARKES, 1998; BROMBERG, 2000). Não permite despedidas, ajustes na relação. Muitas vezes pensa-se no sofrimento da pessoa. Pode variar de acordo com significado, por exemplo, o homicídio de um menino de 18 anos que morava em um bairro violento e perigoso: caracteriza-se por uma morte repentina e violenta, porém coerente com algo que podia acontecer nessa realidade (isso relativiza o repentino).

Não localização do corpo Não há a possibilidade de realizar rituais que gostaria; dificulta a aceitação da morte do ente querido.

Manutenção do vínculo de

forma idolatrada Enlutado mantém vinculação com quem morreu com idolatria. Não vive o processo dual de perda e reparação. Pode haver dificuldade para retomar atividades anteriores com a mesma qualidade, de construir novos significados a partir da nova configuração.

Condições prévias da personalidade e saúde mental

do enlutado

Rígido, dificuldade de adaptação a condições novas, transtorno psiquiátrico (depressão, por exemplo) podem ser fatores complicadores.

História de vida Enlutado que tem na sua história de vida perdas múltiplas e sucessivas (WORDEN, 1998; BROMBERG, 2000).

Luto antecipatório Afastamento do ente querido com possibilidade de morte iminente, não permitindo expressar sentimentos, resolver pendências; pode gerar culpa no enlutado após a morte da pessoa.

Pessoa que morreu e

respectivo significado Morte do cônjuge (BROMBERG, 2000). De acordo com Holmes e Rahe (1967), em cujo estudo pontuaram eventos considerados estressores (considerando as mudanças que ocorrem e os respectivos reajustes sociais), a morte do cônjuge está em primeiro lugar como um evento estressor (100 pontos). A morte de um ente próximo está em quinto lugar (63 pontos). Isso significa que tais rompimentos de vínculo podem ser fatores complicadores.

Luto não reconhecido ou não franqueado pelo enlutado e

pela sociedade

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A resiliência também pode ser considerada um fator de proteção para o desenvolvimento do luto complicado, pensando-a, principalmente, não só como uma expressão de ação após a morte de um ente querido, mas antes disso. Nesse sentido, é importante contextualizar a situação, as pessoas envolvidas, utilizando a resiliência como uma estratégia: capacidade de se perceber, a partir das habilidades, a fim de criar alternativas possíveis – depende da personalidade do enlutado, do seu senso de competência e se foi desenvolvido um apego seguro. A flexibilidade e a criatividade são características importantes na resiliência.

Além disso, uma observação crítica das tabelas apresentadas (tabelas 1 e 2) permite vislumbrar uma sistematização dos fatores (complicadores ou protetores) que mostra-se como de grande valia para o desenvolvimento da avaliação e discussão psicológica não só quando há o rompimento de um vínculo significativo, mas também na sua iminência, pensando mais uma vez no caráter preventivo do fenômeno do luto complicado.

Na continuidade da discussão a respeito do luto complicado, Parkes (1998) pontua que esse apresenta reações diferentes daquelas consideradas “esperadas” (de acordo com normas socioculturais de cada comunidade) ou quando estão ausentes. Esse autor identifica três formas de luto complicado:

Luto crônico – manifestação das reações do luto em um período de tempo prolongado e severo. Nessa situação, o enlutado sente-se incapaz de viver sem o ente querido e não utiliza suas habilidades e competências. Indivíduo normalmente se mantém em um aspecto do luto, podendo transformar tal situação em um estilo de vida. Esse tipo de luto pode causar incômodo no meio familiar ou os familiares podem manter essa condição colocando a pessoa como “a enlutada da família”.

Luto inibido – ausência de sintomas esperados no luto normal, não havendo uma expressão pública de respostas emocionais relacionadas à perda (decisão consciente e inconsciente).

Luto adiado – inibição das reações imediatas à morte, as quais são provocadas mais adiante por situações que não teriam força para isso.

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com o mundo (mundo presumido). A autora observa que a depender de como o indivíduo responde (de acordo com o significado de tal perda) à situação de morte do ente querido, ele pode ter um processo de luto normal ou complicado. Em uma situação como essa, de desorganização inicial, a pessoa pode tentar ir em busca do conhecido, da homeostase, do familiar. À medida que as tentativas são frustradas, já que não haverá reencontro ou volta da configuração anterior, ela pode começar a dizer a si mesma que tal situação é maior do que ela, de que não é capaz. Nesse momento, o indivíduo pode começar a adoecer.

Indicadores sobre a evolução do processo do luto são discutidos na literatura (CASELLATO et al., 2009), o que pode facilitar a identificação do luto normal ou complicado. Observa-se a diminuição da frequência e da intensidade de “ataques” de emoções dolorosas; o processo de viver a perda e a restauração (modelo do processo dual [STROEBE; SHUT, 1999]) – se o indivíduo está oscilando entre as duas esferas, se está mais na perda ou mais na restauração; se está em uma condição de apresentar-se como “ser a dor” ou se está em um processo de “ter a dor” (sente a dor na perda, porém retoma suas atividades anteriores com qualidade semelhante) (ATTIG, 2001) e por fim, a própria condição do indivíduo no mundo e sua relação com o morto – ou seja, se o ente querido vai deixando de ter um espaço menos “central” na vida do enlutado ao mesmo tempo que esse consegue estabelecer a manutenção de um vínculo saudável com a pessoa perdida.

3.3 Depressão, luto e luto complicado: semelhanças e diferenças

A depressão, de acordo com Del Porto (1999), pode se apresentar de três formas: sintoma, síndrome e doença. Na primeira opção, a depressão surge em diversos quadros clínicos, como estresse pós-traumático, alcoolismo, entre outros. Pode ainda ser resultado de situações estressantes ou circunstâncias sociais ou econômicas adversas. Na síndrome, a depressão inclui alterações de humor, cognitivas, psicomotoras, vegetativas e neuroendócrinas. Como doença, pode aparecer como transtorno depressivo maior, distimia, depressão integrante do transtorno bipolar tipos I e II, entre outros. A autora tratará aqui do transtorno depressivo maior.

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luto, o enlutado pode apresentar sintomas semelhantes (pensando que o luto não tem um tempo determinado para cessar, se é que cessa), como humor deprimido e falta de interesse por determinadas atividades, perda ou ganho de peso significativo, assim como aumento ou perda de apetite, insônia ou hipersonia, fadiga ou perda de energia e dificuldade de concentração. Destaca-se ainda que esse transtorno causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo ao funcionamento social ou ocupacional. Pode-se perceber que muitos dos sintomas descritos podem ser identificados em pessoas enlutadas, principalmente a tristeza, como discutiremos mais adiante. Logo, o “diagnóstico diferencial” não é algo fácil e simples. Em primeiro lugar, é importante enfatizar que o luto complicado não se desenvolve para a depressão. O que se pode ter é a presença do luto complicado concomitante a um episódio de depressão. Pessoas com histórico de depressão anterior à perda (ou até mesmo ansiedade) podem estar mais propensas a desenvolver depressão com o rompimento do vínculo significativo (terreno favorável para isso). Para tal diferenciação, é preciso não apenas atentar aos critérios do DSM-IV, mas também realizar uma avaliação clínica, ou seja, olhar para o fator gerador (morte da pessoa), investigando como se deu a morte, o papel da pessoa na vida do enlutado, o significado que esse dá para o evento, identificando, inclusive, os fatores de risco para o luto complicado. Salienta-se que fatores de risco para o luto complicado também podem ser observados em pessoas com depressão. Logo, é importante observar se o fator gerador tem força suficiente para desencadear determinada reação no indivíduo – nessa linha de raciocínio entram questões quanto ao gênero, construções culturais. Assim como existem reações esperadas no luto, a depressão não pode ser um constructo social?

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identificada como uma resposta ao luto (normal ou complicado), deve ter um espaço para ser expressa e trabalhada (FREED; MANN, 2007), por exemplo, com psicoterapia. Caso a tristeza seja identificada como um sintoma de uma depressão, outras medidas, além da psicoterapia, podem ser tomadas, de acordo com a necessidade, como o uso de medicações. É importante desmistificar o tratamento farmacológico, pois muitas vezes ele se faz necessário (em conjunto com um processo psicoterapêutico). O antidepressivo em casos de luto complicado não surtirá o efeito esperado, uma vez que que as alterações neuroendócrinas são distintas do que se observa em uma depressão.

3.4 A construção social da patologização da experiência do luto

O pesar, de acordo com Franco (2002b), constitui-se como um conjunto de pensamentos e sentimentos relacionados à perda e que são vivenciados internamente (no íntimo) pelo indivíduo. O luto, por sua vez, caracteriza-se pela exposição pública do pesar, ou seja, a vivência no contexto sociocultural. Adentrar nessa questão contextual da sociedade e da cultura é poder discutir sobre a questão da adequação, ou seja, dentro de um grupo familiar ou grupo social, inseridos em uma cultura, dotados de crenças e valores, pode-se ter acesso a como os membros do grupo lidam com crises, o que é esperado (comportamentos), a sua duração. Constitui-se um processo que é vivido no individual e que extravasa e se expressa no âmbito sociocultural.

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Tabela 1  –  Fatores de proteção que podem auxiliar na prevenção do luto complicado

Referências

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