• Nenhum resultado encontrado

v. 32, n. 1, 2021 ISSN Uma sequência didática para discutir temáticas sociocientíficas: o uso do Ensino de Ciências por argumentação

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "v. 32, n. 1, 2021 ISSN Uma sequência didática para discutir temáticas sociocientíficas: o uso do Ensino de Ciências por argumentação"

Copied!
49
0
0

Texto

(1)

Ricardo Rangel Guimarães Maria Aparecida Couto Ramos Neusa Teresinha Massoni Uma sequência didática para discutir temáticas sociocientíficas:

o uso do Ensino de Ciências por argumentação

(2)

2

Textos de Apoio ao Professor de Física, v. 32, n. 1, 2021 Instituto de Física – UFRGS

Programa de Pós – Graduação em Ensino de Física

Editores: Marco Antonio Moreira Eliane Angela Veit

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Setor Técnico da Biblioteca Professora Ruth de Souza Schneider

Instituto de Física/UFRGS

G963s Guimarães, Ricardo Rangel

Uma sequência didática para discutir temáticas sociocientíficas: o uso do ensino de ciências por argumentação / Ricardo Rangel Guimarães, Maria Aparecida Couto Ramos, Neusa Teresinha Massoni – Porto Alegre: UFRGS, 2021.

49 p.; il. (Textos de apoio ao professor de física / Marco Antonio Moreira e Eliane Angela Veit, ISSN 2448-0606; v.32, n.1).

Disponível em:

https://www.if.ufrgs.br/public/tapf/tapf_v32n1.pdf

1. Planos de aulas 2. Ensino de ciências 3.

Ensino e aprendizagem I. Guimarães, Ricardo Rangel II. Ramos, Maria Aparecida Couto III. Massoni, Neusa Teresinha IV. Título V. Série.

PACS: f01.40.

(3)

3

SUMÁRIO

Introdução ...5

Referencial Teórico ...7

Epistemologia de Stephen Toulmin ...7

Argumentação científica segundo Stephen Toulmin e Anthony Weston ...9

Planejamento da Sequência Didática ... 13

Planos de Aulas - Cronograma Provisório (a ordem das aulas, dependendo do andamento do módulo, pode ser alterada, antecipando ou colocando para mais tarde determinadas aulas) ... 15

Primeira Aula

... 15

Segunda Aula

... 16

Terceira Aula ... 18

Quarta e Quinta Aulas

... 19

Sexta, Sétima e Oitava Aulas

... 21

Estudo de caso: Temáticas sóciocientificas trabalhadas através da análise conceitual seguindo os referenciais teóricos e epistemológicos da argumentação - transcrições das aulas e identificação/construção de argumentos ... 25

Transcrições das falas dos alunos das Aulas 1 e 2 ... 26

Análise e construção, identificação de estruturas argumentativas e de argumentação através das falas e discussões das Aulas 1 e 2 ... 28

Transcrições das falas dos alunos nas Aulas 3 e 4 ... 30

Análise e construção/identificação de estruturas argumentativas e de argumentação através das falas e discussões das aulas 3 e 4 ... 31

Transcrições das falas dos alunos nas Aula 5 e 6 ... 33

Casos mais conhecidos de acidente nucleares: Chernobyl (URSS), Césio 136 de Goiânia e a usina de Fukushyma, no Japão (tsunami). Relevância das questões sociopolíticas destes acidentes no contexto científico (questões sociocientpificas) ... 34

Análise e construção/identificação de estruturas argumentativas e de argumentação através das falas e discussões das aulas 5 e 6 ... 36

Lista de autores, textos e materiais de apoio (vídeos, palestras online, etc.) a serem/que foram utilizados durante a realização do módulo ... 37

Conclusão ... 39

Referências ... 41

TEXTOS DE APOIO AO PROFESSOR DE FÍSICA ... 43

(4)

4

(5)

5 Introdução

Prezado Colega Professor:

O presente trabalho apresenta e discute resultados de uma sequência didática que faz uso da argumentação no ensino-aprendizagem de Ciências para abordar, particularmente, questões sociocientíficas na Educação Básica, baseada em ideias epistemológico-metodológicas de Stephen Toulmin e de Anthony Weston.

Alinhamo-nos ao entendimento atual de que refletir temáticas sociocientíficas auxilia os professores a aprofundar-se, junto com seus estudantes, em diálogos iniciados virtualmente pertinentes ao ensino de Ciências como, por exemplo, educação popular, educação para as relações étnico-raciais, divulgação científica, docência na pandemia, enfim, temas que entrelaçam ciência e sociedade (GALIETA, 2021).

Nesse caminho, o objetivo geral deste texto de apoio ao professor é o de esboçar, em linhas bastante gerais, como temáticas sociocientíficas podem ser trabalhadas e abordadas em sala de aula através de um módulo de ensino a ser aplicado em turmas do Ensino Médio, podendo ser adaptado para o Ensino Fundamental. Este trabalho é parcialmente resultante de uma pesquisa de Pós- Doutorado que investiga como utilizar a ferramenta didático-metodológica da argumentação no ensino de Ciências, no sentido de poder promover aprendizagem e pensamento crítico nos estudantes.

O módulo referido, que se utilizará da ferramenta da argumentação dentro de uma proposta de ensino por investigação, terá a duração aproximada de um mês, com aulas de dois períodos de 45-50 minutos por semana, totalizando em torno de quatro semanas (entre 7 e 8 horas-aula, aproximadamente), será aplicado na disciplina de Física, ou Ciências, onde serão tratados e trabalhados temas que digam respeito a temáticas sociocientíficas interdisciplinares, como, por exemplo, questões envolvendo Inteligência Artificial (IA) e tecnologia em um futuro pós-pandêmico;

negacionismo científico, Fake News, desinformação e teorias da conspiração; energia nuclear e meio ambiente, e derivado daí também discussões acerca da natureza da ciência, incluindo aí as ciências naturais, além das ciências humanas e das relações destas com as ciências da natureza; questões relativas ao que vem a ser o conhecimento científico e como este é produzido; o que é o método científico e críticas ao mesmo, assim como a problematização de casos da História da Ciência, questões de gênero e mulheres na ciência e tantos outros.

Dentro de todo esse contexto, discutir-se-á também o valor da ciência e da tecnologia para a sociedade, tanto no sentido pragmático quanto moral, como, por exemplo, procurando enfatizar a importância da ciência socialmente, em detrimento de movimentos como o negacionismo científico, que disseminam concepções anticientificistas como, por exemplo, o terraplanismo, a negação das mudanças climáticas e do aquecimento global e os movimentos antivacinação.

(6)

6

Assumimos que o conhecimento científico é uma das formas de dar significado ao mundo, possivelmente não a única maneira de produzir saberes (FEYERABEND, 2011), que não podem ser tomados como resultantes de uma Ciência & Tecnologia neutra e salvacionista (ROSA; AULER, 2016), mas defendemos que é preciso auxiliar os estudantes a construírem pensamento e atitudes críticas frente ao problema da pós-verdade e das fake news, procurando discutir seus reflexos na educação, e fortalecer as plataformas e as políticas públicas voltadas à educação e à divulgação científicas no Brasil contemporâneo (ALVES-BRITO, MASSONI, GUIMARÃES, 2020).

Assim, a dinâmica do módulo se dará a partir de algumas aulas expositivas e também através do uso de outros recursos didáticos, como textos de apoio e também vídeos educativos e aulas gravadas, ou palestras, que procurarão explorar alguns conceitos e discussões importantes acerca dessas temáticas, a fim de fornecer aos estudantes ferramentas mínimas para as aulas de discussão e debates que virão na sequência, e sob as quais o módulo justifica-se na sua proposta de trabalho, em que a metodologia da argumentação científica propriamente se dará e se procurará aplicá-la neste contexto.

O objetivo é que, ao final de todas as atividades, os estudantes saiam mais engajados e autônomos nos seus posicionamentos sobre estas questões, sendo capazes de oferecer razões para os argumentos que apresentarem a favor e/ou contra determinada posição, defendendo os seus pontos de vista de forma racional e logicamente consistente e coerente.

Enquanto referencial teórico e metodológico de pesquisa pretende-se utilizar e aplicar, como já dito, essencialmente as concepções de Stephen Toulmin, especialmente aquelas desenvolvidas e expressas em seu livro “Os Usos do Argumento”, uma vez que é possível usar seus pressupostos para analisar a “solidez dos fundamentos que produzimos para apoiar nossas alegações, da firmeza do suporte que lhes damos” (TOULMIN, 2001, p. 9) quando operamos na avaliação prática dos argumentos que, em nossa pesquisa se voltam às formas práticas como os estudantes “pensam” e argumentam para justificar seus posicionamentos em relação a questões sococientíficas e das relações da Física e das Ciências Naturais com a sociedade. Além de Toulmin, outros autores também servirão de baliza como referenciais teóricos e epistemológicos, a fim de oferecer o estofo conceitual necessário que irá embasar as aulas do módulo de ensino aqui proposto. Estas questões serão devidamente desenvolvidas e detalhadas na próxima seção, fundamentando a sequência didática proposta e as atividades práticas de debates argumentativos em sala de aula que virão posteriormente

.

(7)

7 Referencial Teórico

Epistemologia de Stephen Toulmin

O referencial teórico deste trabalho centra-se na visão epistemológica de Toulmin, que foi um dos mais influentes epistemólogos do século XX. Toulmin percebe a ciência como um processo evolutivo e histórico, coloca centralidade nos “conceitos”, tomando-os como os “átomos do pensamento”, tanto ao cientista e seu trabalho como ao aprendiz de Ciências, pois ambos passam por modos de captação e transformação dos conceitos científicos, o que envolve várias etapas do que ele chama de processo de “enculturamento”.

A chave da compreensão humana está, para Toulmin, na aquisição gradual de conceitos, tomados de uma “ecologia conceitual” ˗ as disciplinas científicas, e na transformação decorrente do uso e da ação intelectual dos sujeitos sobre eles, em um processo que é evolutivo, estendido no tempo, como o que ocorre com a evolução das espécies biológicas proposto por Darwin. A ação intelectual sobre os conceitos acaba gerando variações, inovações conceituais, que passam por um processo de seleção, de maneira que sobrevivem as novidades, as ideias mais bem adaptadas. É neste sentido que o empreendimento científico é, para a epistemologia toulminiana, uma construção evolucionária. Os cientistas propõem novidades intelectuais constantemente; estas são postas à comunidade científica que as analisas, critica-as; a comunidade científica faz o papel de filtro seletivo, de maneira que nem todas sobrevivem ao processo de inovação e seleção.

Toulmin entende que as diferentes atividades intelectuais do ser humano dividem-se em disciplinas (as disciplinas científicas) que reúnem em torno de si populações de conceitos, populações de cientistas, métodos, objetivos, e ideais intelectuais em desenvolvimento histórico. A inovação se dá quando os profissionais de uma determinada disciplina se reúnem e passam a ver as coisas de forma diferente de seus antecessores, e por um processo de seleção submetem os conceitos inovadores a um debate e consulta, ao que Toulmin chama de “fórum de competições”. É por esse processo, comum nas diversas disciplinas científicas, que os conceitos mais sólidos (mais bem adaptados) irão sobreviver ao fórum e acabarão por se estabelecer como substitutos, ou revisões das concepções tradicionais.

Cada um de nós pensa seus próprios pensamentos; mas os conceitos, compartilhamo-los com nossos semelhantes (TOULMIN, 1977, p. 49). Somos responsáveis pelo que cremos, como indivíduos, porém a linguagem na qual se articulam nossas crenças é pública. Para compreender o que são os conceitos e o papel que desempenham em nossa vida precisamos considerar a relação entre nossos pensamentos e crenças individuais e a herança linguística e conceitual, que é coletiva. Os métodos coletivos de pensamento (isto é, a herança linguística) exercem autoridade intelectual sobre os pensadores individuais da mesma forma que as regras e costumes morais, as leis e instituições coletivas exercem autoridade sobre os membros individuais de uma sociedade. Em outras palavras, a

(8)

8

articulação de pensamentos individuais pressupõe a existência da linguagem, assim como o exercício de direitos individuais (normas e regras sociais) pressupõe a existência da sociedade.

Para Toulmin, as teorias são entendidas como artifícios formais ou abstrações, tomadas de uma empresa em desenvolvimento histórico (a ciência, constituída de distintas disciplinas) cuja racionalidade reside principalmente em seus procedimentos (crítica e autocrítica) para levar a cabo a mudança conceitual. A mudança conceitual e o progresso da ciência são, assim, impulsionados pela inovação. E para compreender a inovação devemos compreender os processos históricos pelos quais novas famílias de conceitos e crenças se geram, se aplicam e se modificam na evolução de nossas empresas intelectuais.

O conteúdo de uma ciência e os problemas relevantes se transmite de geração em geração de cientistas por um processo de enculturamento. Trata-se de um processo de aprendizagem, pela qual certas habilidades explicativas se transferem, com ou sem modificação, da geração mais velha para a mais jovem. Nesta aprendizagem, o núcleo da transmissão – o elemento primário que deve ser aprendido, provado, aplicado, criticado, modificado – é o repertório de técnicas, procedimentos e habilidades intelectuais e métodos de representação (os modelos) que se empregam para “dar explicações” de sucessos e fenômenos no âmbito da ciência envolvida (TOULMIN, 1977, p. 168/169).

Quando refletimos em termos de ensino-aprendizagem de Ciências, o que ocorre é um lento e progressivo enculturamento (captação de conceitos, técnicas, procedimentos, métodos de representação etc.) que se dá ao longo da escolarização: os aprendizes vão aprendendo a retirar conclusões de experiências e vivências práticas, mas essas conclusões devem ser justificadas através do pensamento crítico ˗ que é uma característica fundamental da argumentação científica.

(9)

9

Argumentação científica segundo Stephen Toulmin e Anthony Weston

Todas as pessoas, em maior ou menor grau, possuem opiniões sobre diversos assuntos, e muitas vezes expressam essas opiniões, seja em ambientes públicos ou privados, de forma veemente, fazendo questão de enfatizá-las e de tentarem convencer seus pares de que esta opinião é importante e relevante e deve ser levada em consideração, como em um debate ou uma discussão, por exemplo.

Dependendo do contexto em que se está inserido, tais opiniões necessitam de um embasamento maior, diferentes muitas vezes de situações do senso comum, que não exijam um rigor no discurso. Tal embasamento pode ser traduzido como um pedido de razões que o interlocutor solicite na discussão, fundamentando adequadamente sua opinião, que deve ter em sua base lógico-estrutural determinadas premissas para, a partir destas, mediante raciocínio inferencial, se chegar a uma terminada conclusão. A estrutura que acabou de ser explicitada recebe o nome de argumento, e um debate ou uma discussão que envolva a presença destas opiniões fundamentadas na forma de argumentos, onde os interlocutores assim também o façam, em um processo de natureza dialética, pode ser denominado de debate ou discussão argumentativa, que envolva o processo lógico de argumentação.

A argumentação tem uma virtude intrínseca no sentido de poder gerar, através do diálogo fundamentado em razões, pensamento crítico amparado em critérios de racionalidade, que visem à procura e a obtenção da verdade através do discurso racional e consistente: nesta perspectiva, pode- se dizer que o processo de argumentar pode ser entendido e interpretado como uma espécie de virtude epistemológica. Vários autores trabalharam com o conceito de argumento e de argumentação dialógica, muitos deles oriundos da Filosofia e da Ciência do Direito, que exigem nos seus discursos um rigor metodológico fundamentado em boa argumentação, mas onde se busca, também, trazer seus elementos de análise para outros contextos discursivos, como no caso do conhecimento científico e do ensino de ciências, de forma bastante genérica.

Stephen Toulmin e Anthony Weston, por excemplo, dois autores fundamentais nos estudos sobre teorias da argumentação, com os seus livros seminais “Os Usos do Argumento” (TOULMIN, S., 2001) e “A Arte de Argumentar” (WESTON, A., 1996) respectivamente, vão nessa linha e nesse viés investigativo, e podem muito bem servir como referenciais teóricos, epistemológicos e metodológicos em um ensino que se pretenda ser baseado na argumentação científica, por exemplo. Nesta concepção que estamos enfatizando aqui, a da construção do argumento e da sua estrutura, e também da sua importância para o discurso, seja ele científico ou de outra natureza, faz-se pertinente e relevante citar o que Weston fala acerca disto no início do seu livro “A Arte de Argumentar”, onde ele destaca a importância do argumento e da argumentação para o discurso racional, e as virtudes de tais estratégias metodológicas e lógico-conceituais:

Algumas pessoas pensam que argumentar é apenas expor os seus preconceitos de uma forma nova, e por isso, que muita gente considera que argumentar é desagradável e inútil, confundindo argumentar com discutir. Dizemos por vezes que discutir é uma espécie de luta verbal. Contudo, argumentar não é nada disso.

Neste livro «argumentar» quer dizer oferecer um conjunto de razões a favor de

(10)

10

uma conclusão ou oferecer dados favoráveis a uma conclusão. Neste livro argumentar não é apenas a afirmação de determinado ponto de vista nem uma discussão. Os argumentos são tentativas de sustentar certos pontos de vista com razões. Neste sentido, os argumentos não são inúteis; na verdade, são essenciais.

Os argumentos são essenciais, em primeiro lugar, porque constituem uma forma de tentarmos descobrir quais os melhores pontos de vista. Nem todos os pontos de vista são iguais. Algumas conclusões podem ser defendidas com boas razões e outras com razões menos boas. No entanto, não sabemos na maioria das vezes quais são as melhores conclusões. Precisamos, por isso, apresentar argumentos para sustentar diferentes conclusões e, depois, avaliar tais argumentos para ver se são realmente bons. (WESTON, 1996, grifos nossos).

Como podemos interpretar a partir desta citação de Weston, esta “arte” de argumentar tem relação direta e intrínseca com apresentar e/ou fornecer boas razões para fundamentar uma opinião, opinião esta que deve ter uma estrutura lógica encadeada em um conjunto de determinadas premissas que fundamentem e deem um suporte justificacional adequado para uma conclusão a partir destas premissas. Em “Os Usos do Argumento”, Toulmin propõe uma estrutura lógico-conceitual que ele denominou de “layout de argumentos”, onde além das premissas e conclusões, são utilizados outros conceitos como dados, garantias e qualificadores modais, dentro do jargão técnico toulminiano. Na perspectiva deste autor, argumentar é pensar logicamente, segundo regras de inferência e de raciocínio. Nesse sentido, uma passagem da introdução do seu livro é esclarecedora quando trata de relacionar a lógica com uma espécie de “ciência do pensamento”, não no sentido psicológico e subjetivista, mas sim de uma determinada normatividade no pensar que deve ser aprimorada no exercício das práticas argumentativas:

A lógica [...] é como a Medicina – não apenas ciência, mas também arte. Seu objetivo não é descobrir leis do pensamento, em nenhum dos sentidos científicos do termo

“lei”, mas, sim, descobrir leis ou regras de argumento – como orientação ou sugestões para quem deseje argumentar sólida e corretamente. É a art de penser, a ars conjectandi, não a science de la pensée ou a scientia conjectionis. Deste ponto de vista, o modelo implícito não é o da lógica como ciência explanatória, mas o da lógica como uma tecnologia. Um manual de lógica passa a ser, por assim dizer, um manual de instruções. “Se você quiser ser racional, aqui está a receita.” (TOULMIN, 2001).

Vemos aqui que Toulmin fala em regras ou leis lógicas do pensamento, mas não no sentido da lógica meramente formalizada e restrita às regras puramente formais e instrumentais da inferência e dos cálculos sentenciais (proposicional e de predicados). Sua metodologia está centrada no caráter da informalidade e da possibilidade pragmática dos raciocínios práticos e dialéticos que muitas vezes não podem, e nem mesmo devem, ser formalizados dentro de um rigor conceitual que permita apenas uma interpretação possível em um universo de discurso restrito. Também nesta linha das regras dos raciocínios e dos argumentos práticos envolvendo o discurso interpessoal, dialógico e por vezes retórico e/ou persuasivo, Alvin Goldman, um epistemólogo analítico estadounidense, formulou as seguintes regras para o raciocínio prático e a comunicação interpessoal através do recurso da argumentação:

(1) Um falante deve asserir uma conclusão apenas se ele nela crê; (2) Um falante deve asserir uma premissa apenas se ele nela crê; (3) Um falante deve asserir uma premissa apenas se ele está justificado em nela crer; e (4) Um falante deve afirmar uma conclusão com base nas premissas estabelecidas apenas se: (a) estas

(11)

11

premissas fortemente apoiam a conclusão, (b) ele crê que elas fortemente apoiam a conclusão, e (c) ele está justificado em crer que elas fortemente a apoiam. (5) Um falante, tendo em vista uma audiência em particular, deve restringir suas premissas a enunciados tais que a audiência esteja (ou possa estar) justificada em crer, e deve restringir a si mesmo as relações entre premissas e conclusão tais que a audiência seja capaz de reconhecer e apreciar. (REGRA ADICIONAL) (GOLDMAN, 1994, grifos nossos).

Nestas regras elencadas acima, Goldman apela essencialmente para aspectos epistemológicos na sua análise da argumentação, ao falar de crença e justificação, bem como dos conceitos de assentimento e de premissas e conclusão em um argumento, dentro das suas regras inferenciais. A distinção goldmaniana entre crer justificadamente nas premissas e na conclusão (nos enunciados que constituem as mesmas) e estar justificado em crer nas mesmas é um tecnicismo muito específico da epistemologia analítica contemporânea, que de certo modo é um referencial teórico aqui e que em grande medida é indissociável do cerne conceitual das teorias da argumentação.

Também a herança aristotélica da lógica silogística e das técnicas de argumentação já delineadas e desenvolvidas em boa parte pelo filósofo estagirita estão amalgamadas e são inerentes a estes referenciais, pois Aristóteles, no corpo dos seus escritos na sua obra Organon (Primeiros e Segundos Analíticos e Refutações Sofísticas), desenvolveu os fundamentos da lógica informal e da argumentação através de estudos sobre silogística, dialética e retórica, ao abordar o raciocínio dedutivo e a demonstração rigorosa através do silogismo premissas-conclusão, e da dialogia da maiêutica socrática e platônica como método dialético na busca e obtenção pela verdade, que foi sistematizado posteriormente no Organon, assim como a arte da persuasão da retórica dos sofistas no convencimento dos seus pontos de vista.

Lógica, argumentação e epistemologia sempre estiveram inerentemente não dissociadas, e na filosofia analítica contemporânea isso fica muito claro e explícito, e dada a extrema importância que estes expedientes têm para o discurso de modo geral, seja no senso comum, no cenário da ciência jurídica/direito ou na educação, por exemplo, a sua importância dentro do contexto do ensino de ciências já se justifica por si só. A necessidade de se discutirem questões sociocientíficas no contexto das ciências exatas, particularmente no ensino de Física e de temáticas interdisciplinares entre estas, justifica também a utilização do recurso da argumentação, da dialogia orientada e de questões de natureza epistemológica dentro deste contexto investigativo, que exigem reflexão e criticidade não apenas acerca dos conceitos e dos conteúdos, mas sim de colocar o sujeito em uma posição de agente questionador, onde o seu(s) interlocutor(es) também devem possuir esta postura a fim de que a discussão e o diálogo avancem no sentido da construção do conhecimento, através da elaboração de raciocínios e de argumentos tendo estes referenciais como baliza teórica.

Nesse sentido, também o livro de Michael Bruce e Steven Barbone, “Os 100 argumentos mais importantes da Filosofia Ocidental” (BRUCE; BARBONE, 2011), mais do que um manual didático para o ensino de Filosofia, é também, e pode e deve ser utilizado para isso, um manual para o ensino de ciências de modo geral, onde o recurso da construção do argumento como

(12)

12

instrumento pedagógico é o objetivo a ser perseguido dentro de uma perspectiva do desenvolvimento da argumentação científica e dialógica. Ao apresentar um problema filosófico e/ou científico na forma de um argumento, com premissas e conclusões, e dispondo o estudante de ferramentas lógicas básicas de identificação destas estruturas de premissas e conclusões no processo de argumentação, juntamente com uma epistemologia inerente que explique esta passagem das premissas para a conclusão em um argumento, é possível desenvolver um aprendizado significante e eficiente através das explicações que o estudante pode fornecer diante deste arcabouço teórico. Além disso, as capacidades de virtudes epistêmicas e autonomia intelectual e moral nos estudantes podem e devem ser plenamente exercitadas através destes expedientes, se gerando com isso criticidade e pensamento reflexivo sobre questões e conteúdos científicos e sociocientíficos.

Diante deste quadro de fundo apresentado e balizado por estes referencias é que se procurará fundamentar epistemologicamente a sequência didática a ser implementada neste módulo, cuja apresentação será feita na próxima seção, e tem o ensino por argumentação como seu substrato teórico-conceitual, metodológico e epistemológico.

(13)

13

Planejamento da Sequência Didática

A dinâmica desta sequência didática faz uso da argumentação científica na acepção de Toulmin complementada por ideias de Weston, como discutido na seção precedente, sendo que as temáticas que servirão de “fio condutor” para todo o módulo podem ser escolhidas pelos estudantes a partir de um elenco oferecido pelo educador. O objetivo é o de promover debates para que o processo argumentativo possa ser utilizado de forma significante pelos educandos para refletir criticamente sobre temas sociocientíficos e suas implicações na vida social moderna.

No Quadro 1, que se segue, apresentamos uma visão geral da proposta de intervenção didática.

Quadro 1: mostra a sequência da intervenção didática proposta.

Tempo Tema Objetivos de ensino

Encontro 1

45-50 min

O que você entende que seja a ciência e o conhecimento científico?

- Propiciar um diálogo inicial

- Apresentar as temáticas a serem trabalhadas

- Desencadear uma conversação que permita avaliar as concepções dos estudantes sobre a natureza da ciência - testar as concepções prévias dos estudantes sobre diversos temas sociocientíficos.

Encontro 2

45-50 min

A concepção de ciência em Aristóteles, Galileu, Newton e Copérnico;

Visões epistemológicas de Bacon, Popper e noções do Movimento CTS.

- Propiciar um breve apanhado histórico sobre o desenvolvimento científico e tecnológico ao longo da história;

- Oferecer um panorama geral para os estudantes do estado da arte da história da ciência até os dias atuais.

Encontro 3

45-50 min

Aprofundamento do apanhado histórico sobre o desenvolvimento científico;

Visões de ciência de Thomas Kuhn e Paul Feyerabend

- dar continuidade ao apanhado histórico sobre o desenvolvimento da ciência

- dialogar e refletir sobre os pressupostos do movimento CTS e o papel do conhecimento científico na sociedade

- expor e discutir sobre o negacionismo científico e determinadas práticas decorrentes desta postura anticientificista.

Encontro 4

45-50 min

Em que a ciência difere de outras formas de

conhecimento? Qual a relação entre Ciências Naturais e Ciências Humanas?

- promover discussões epistemológicas (o que distingue o conhecimento científico de outros saberes? Que metodologias cercam o conhecimento científico? a estratégia hipotético-dedutiva; os experimentos mentais etc.)

- apresentar e discutir a importância do argumento no ensino de ciências.

Encontro 5

45-50 min

Experimentos mentais na História da Ciência (Galileu e Einstein)

- Continuação das discussões epistemológicas;

- Apresentar e discutir dois experimentos mentais cruciais na história das ciências em forma de argumentos, a saber, o experimento mental de Galileu sobre a queda dos corpos (a ser esboçado em lâminas de Power Point com os passos do argumento a serem explicados e detalhados, com explicações complementares), e o de Einstein sobre a constância da velocidade da luz e seus desdobramentos.

(14)

14

Encontro 6

45-50 min

Incitação de debates, fundamentando as suas opiniões em argumentos (sobre os grandes temas abordados em aulas anteriores)

- fazer a mediação dos argumentos e das falas dos estudantes - orientar e participar das discussões,

- deixar falar e se manifestar sempre que possível.

Encontro 7

45-50 min

Incitação de debates, fundamentando as suas opiniões em argumentos (sobre os grandes temas abordados em aulas anteriores)

- fazer a mediação dos argumentos e das falas dos estudantes - orientar e participar das discussões

- realizar gravações em áudio e fazer anotações em diário de campo para posterior análise dos dados coletados

- incentivar a que o professor seja um professor-pesquisador.

Encontro 8

45-50 min

Incitação de debates fundamentando as suas opiniões em argumentos (sobre os grandes temas abordados em aulas anteriores)

- novamente mediar a construção dos argumentos e das falas dos estudantes

- orientar e participar das discussões

- realizar gravações em áudio e fazer anotações em diário de campo para posterior análise dos dados coletados

- incentivar a que o professor seja um professor- pesquisador.

Na sequência, apresentaremos com mais detalhes as dinâmicas de cada encontro, e serão sugeridos os materiais de apoio a serem utilizados, como textos e vídeos.

(15)

15

Planos de Aulas - Cronograma Provisório (a ordem das aulas, dependendo do andamento do módulo, pode ser alterada, antecipando ou colocando para mais tarde determinadas aulas)

Nesta seção descrevemos um a um os encontros através de uma arquitetura muito próxima de planos de aula e, ao final, indicamos materiais, autores, obras e sites que incitam leituras e discussões visando tornar as aulas proveitosas para o desenvolvimento de habilidades de argumentação e também incitar discussões críticas e reflexivas.

Primeira Aula

Plano de Aula do Encontro 1: Apresentação geral das temáticas a serem trabalhadas

Tempo previsto: 45-50 minutos

Conteúdo: O que você entende que seja a ciência e o conhecimento científico?

Na primeira aula, será feita uma apresentação geral das temáticas e dos tópicos a serem trabalhados, bem como da proposta do módulo e da dinâmica de trabalho a ser desenvolvida em sala de aula.

Após esta breve introdução, a pergunta “O que você entende que seja a ciência e o conhecimento científico?” será lançada para a turma, a fim de se avaliar previamente as concepções dos estudantes sobre estes conceitos. A partir das respostas, ou tentativas de respostas dos alunos, ditas oralmente, se estabelecerá um diálogo sobre estas diferentes concepções e pontos de vista, procurando se estabelecer uma dinâmica conversacional a partir daí que oriente e balize as próximas aulas, que terão, também, estes fios condutores como referenciais teórico-epistemológicos para os próximos encontros, onde a grande questão de fundo sobre qual é a natureza da ciência é, fundamentalmente, a perspectiva e o substrato teórico e conceitual por trás de todas as outras questões que serão trabalhadas neste módulo de ensino.

O objetivo desta primeira aula, além de colocar os alunos a par da dinâmica do módulo e da proposta didática a ser desenvolvida e implementada, é, através destas questões norteadoras, a de se

“apropriar’, digamos assim, das diferentes opiniões prévias que os estudantes têm do que seja a ciência e a atividade científica para eles, e do que é e como que o conhecimento científico é construído na visão desses estudantes, procurando explorar as visões de senso comum que eles externarem no início das atividades. Através desta baliza teórico-conceitual, do teste destas concepções prévias, provavelmente muitas delas alternativas à visão clássico/canônica, e de senso comum da ciência, se procurará moldar as aulas e atividades subsequentes a partir deste ponto de partida. Será uma espécie de “termômetro” inicial de como o módulo irá se suceder.

(16)

16

Concomitantemente a esta questão e alinhada e conectada à mesma, seguindo as mesmas diretrizes e com os mesmos objetivos anteriores, se colocarão algumas questões norteadoras e balizadoras acerca das temáticas sociocientíficas elencadas anteriormente, como, por exemplo, através de perguntas/questões como estas: “Seria possível que a Inteligência Artificial (IA), no futuro, pudesse substituir o ser humano? O que você pensa sobre a sociedade atual e do futuro poder e dever ser mais sustentável do ponto vista ambiental e ecológico, a fim de preservar a vida e a diversidade biológica na Terra? Qual deve ser a relação entre o ser humano e a natureza com vistas a uma sociedade que não agrida e destrua/degrade o meio ambiente, preservando a vida e o bem-estar social? Quais deveriam ser as estratégias para se combater o negacionismo científico e as fake news e a desinformação, utilizando-se do conhecimento estabelecido pela comunidade científica para tanto?” Tais questões, à medida que forem sendo feitas, e dependendo do interesse e das motivações da turma/estudantes, serão antecedidas de breves e resumidas exposições, explicações e conversas sobre os principais conceitos e ideias envolvidos nestas questões e as discussões que daí se desdobrarem.

O grande objetivo aqui, ao final de tudo, é, ao fim e ao cabo, testar as concepções prévias dos estudantes sobre todos estes temas, de forma bastante crua e baseada nas opiniões de senso comum dos mesmos, para, a partir deste ponto de partida, então, se delinear e desenvolver com capacidade crítica as temáticas que virão na sequência, que poderão, ou não, englobar todos ou partes destes assuntos tão amplos e complexos nas suas estruturas e conteúdos, se tendo este termômetro, parâmetro inicial como baliza e referência para as discussões que posteriormente ocorrerão.

Segunda Aula

Plano de Aula do Encontro 2: Apanhado histórico sobre a construção da ciência

Tempo previsto: 45-50 minutos

Conteúdo: A concepção de ciência em Aristóteles, Galileu, Newton e Copérnico;

Visões epistemológicas de Bacon, Popper e noções do Movimento CTS.

Após o exercício da aula anterior, e dando continuidade às temáticas do módulo, esta segunda aula será dedicada a um breve apanhado histórico sobre o desenvolvimento científico e tecnológico ao longo da história, a fim de oferecer um panorama geral para os estudantes do estado da arte da história da ciência até os dias atuais. Esta exposição/revisão histórica, muito rápida e breve, iniciará com alguns conceitos básicos acerca da concepção de ciência em Aristóteles, e a sua relação com a Filosofia (do conhecimento científico derivado da dedução e da demonstração lógica, dentre outras peculiaridades), passando pelo período moderno, com Newton, Galileu, Copérnico e Bacon, especialmente (importância do método experimental, empirismo-indutivismo e suas críticas, revolução copernicana), até a ciência contemporânea e também discussões sobre ciência, tecnologia e sociedade (CTS).

(17)

17

Aspectos a serem abordados - Cronograma Geral da Segunda Aula:

- A concepção de ciência em Aristóteles: conceitos gerais, o que é o conhecimento demonstrativo, a importância da lógica e do pensamento na construção dos princípios da ciência aristotélica; ciência e dialética em Aristóteles.

- A Física de Aristóteles: os quatro elementos (ar, água, terra e fogo); mundo sublunar e mundo supralunar; a concepção de movimento aristotélica; a noção de lugar natural, e explicações teleológicas.

- A Física de Galileu e o método experimental: invenção do telescópio e descoberta das luas de Júpiter;

experimento da Torre de Pisa (contextualização); argumento da descrição da queda dos corpos e a importância do método dedutivo/demonstrativo em Galileu.

- A Física de Newton: as leis da Mecânica, concepção de força, ação à distância. Fundamentos filosóficos do Principia.

- A visão de ciência de Bacon: o método empirista-indutivista na ciência, o papel da observação e experimentação; a indução de leis e teorias verificadas (verdadeiras e inquestionáveis): defesas e críticas do mesmo.

- A Revolução Copernicana: a tensão entre duas visões de mundo distintas - o Geocentrismo e o Heliocentrismo.

- Karl Popper: o papel das hipóteses; critério para que uma hipótese seja candidata a ser hipótese científica; o falseacionismo/falibilismo de teorias científicas, método hipotético-dedutivo e a lógica da pesquisa científica (baseada em conjecturas e refutações).

- Noções do Movimento CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) no ensino de ciências na contemporaneidade: discussões sobre a não neutralidade da ciência, mas como ela é atrelada aos interesses econômico-sociais; como a ciência & tecnologia não são salvacionistas (nem sempre ciência e tecnologia trazem benefícios e bem-estar social).

É importante destacar que nem todos os temas acima devem/conseguem ser discutidos em

uma aula de aproximadamente 50 minutos, mas o educador pode fazer escolhas sobre as temáticas

em que se sinta mais confortável para abordar, sempre de forma dialógica e junto com os estudantes,

criando um clima capaz de oferecer um panorama histórico de como a ciência Física se desenvolveu

em seu curso histórico - desde o pensamento grego, e mesmo antes dos gregos, até o advento da

Ciência Moderna, com Galileu e Newton.

(18)

18 Terceira Aula

Plano de Aula do Encontro 3: Continuação do apanhado histórico; visões de ciência

de Thomas Kuhn e Paul Feyerabend

Tempo previsto: 45-50 minutos

Conteúdo: Aprofundamento de temas relativos ao movimento CTS e a importância

que a ciência e o conhecimento científico têm para a sociedade

Devido à importância e amplitude dos temas e assuntos da aula anterior, esta terceira aula será uma continuação da anterior, tanto em relação à retomada de pontos e assuntos que ficaram pendentes nas discussões anteriores, como na ampliação dos temas relativos ao movimento CTS e a importância que a ciência e o conhecimento científico têm para a sociedade, como discussões sobre o valor da ciência, de por que é importante estudar ciência e fazer investimentos nela, tanto financeiros quanto de recursos humanos e de formação de cientistas. Especial destaque é para a importância da educação científica com formação de professores de ciências e divulgação científica de qualidade para a sociedade, dentre outros temas correlatos e de interesse.

Exposições e discussões sobre o negacionismo científico e determinadas práticas decorrentes desta postura anticientificista também serão discutidos em complemento com os temas já apresentados, com vistas a desenvolver a postura crítica dos estudantes, desde já, a fim destes posicionarem-se criticamente sobre estes assuntos.

Aspectos a serem abordados - Cronograma Geral da Terceira Aula:

- Continuação, se for o caso, e retomada dos temas da aula anterior sobre a breve retrospectiva histórica do desenvolvimento científico (sejam em relação à aula expositiva e/ou discussões acerca destas questões).

- Perguntas/Questões Norteadoras e balizadoras da aula: Qual o valor da ciência? Por que a ciência e o desenvolvimento científico são importantes para a sociedade? A educação científica pode e deve formar cidadãos críticos, que questionem as descobertas da ciência? Estas também são indagações/questões pertinentes e relevantes a serem lançadas e colocadas para os estudantes, de forma semelhante ao que foi feito na primeira aula, com o objetivo de fomentar e promover as discussões e os debates futuros em torno destes temas.

- Revoluções Científicas (visão de ciência de Thomas Kuhn): o que são e para que servem. Paralelo destas com as revoluções sociais e políticas.

(19)

19

- “Anarquismo” epistemológico e o “vale-tudo” nas ciências (visão de ciência de Paul Feyerabend):

por que Feyerabend foi chamado de “inimigo da ciência”? Qual o significado de pluralismo teórico e metodológico? Por que estas ideias são tão discutidas?

- Evolucionismo na ciência (visão de ciência de Stephen Toulmin) - compreensão humana como enculturamento - processo de captação, uso e transformação de conceitos e teorias - não neutralidade da ciência em relação às ambições dos cientistas, às questões de poder e às necessidades sociais (de ciência e tecnologia).

- Movimentos negacionistas, anticientificistas e pseudociências (astrologia, homeopatia, medicinas alternativas (“curas” quânticas) etc.): por que estes discursos e narrativas desqualificam as ciências de forma a fazer muitas pessoas acreditarem que estas práticas são justificáveis? Qual

“epistemologia” ou viés epistemológico estaria por trás destas concepções? Por que elas acabam atraindo tantos adeptos? Existe alguma forma de “racionalidade” envolvida nestas práticas?

Quarta e Quinta Aulas

Plano de Aula do Encontro 4 e 5: Discussões epistemológicas (experimentos mentais

de Galileu e Einstein); apresentação da importância do argumento no ensino de ciências

Tempo previsto: 45-50 minutos (cada)

Conteúdo: Em que a ciência difere de outras formas de conhecimento? Qual a relação entre Ciências Naturais e Ciências Humanas? Inteligência Artificial e implicações para a vida na Terra.

Novamente trata-se de uma continuidade da aula anterior, devido à gama de temas e da complexidade dos mesmos, e, em paralelo a isto, a apresentação de uma discussão epistemológica sobre o que é a ciência e o conhecimento científico e a sua natureza, e no que consiste propriamente a atividade científica como um todo; e se este conhecimento difere substancialmente de outros tipos de conhecimento e de atividades, bem como a relação entre ciências naturais, exatas e ciências humanas, e qual a contribuição que uma pode e deve oferecer à outra.

Também uma apresentação e discussão sobre a importância do argumento no ensino de ciências será trabalhada, particularmente, por exemplo, no caso dos exemplos da queda dos corpos de Galileu (já referido anteriormente, no plano da primeira aula, ainda dentro dos aspectos históricos e epistemológicos da ciência) e do experimento mental de Einstein sobre a constância da velocidade da luz, enfatizando e mostrando com isso a importância crucial que o método dedutivo e os experimentos mentais possuem para a construção do conhecimento científico.

(20)

20

Tais temas serão apresentados de forma expositiva e dialogada, focando na participação ativa dos estudantes, recorrendo-se, também, a outros recursos didáticos em sala de aula, como, por exemplo, a apresentação eventual de vídeos, palestras e de textos de apoio para os estudantes (a lista de alguns destes em anexo, no final, é apenas uma amostragem, muito mais material pode ser disponibilizado/utilizado).

É importante salientar e destacar que a ordem destas temáticas e assuntos a serem trabalhados e discutidos em sala de aula, da forma como estão apresentados aqui, não necessariamente precisam seguir esta ordem pré-estabelecida, sendo mais uma espécie de guia prévio para uma organização mínima do professor, que pode distribuir estes conteúdos de outra forma ou mesmo os “diluir” de acordo com o andamento/sequência das aulas.

Dada a integração mútua e simbiótica entre todos estes temas, muitos deles correlacionados e intercambiáveis, tal ordem não precisa ser necessariamente esta, este plano e cronograma é mais um mapa geral para uma orientação didática e um encadeamento mínimo destas questões que poderão, dependendo da relevância e do contexto em que serão tratadas, ser trabalhadas em um momento ou outro, dependendo, também, do andamento e da dinâmica do módulo.

Aspectos a serem abordados - Cronograma Geral da Quarta Aula:

Será feito um breve resumo/retomada dos temas da aula anterior sobre a retrospectiva histórica do desenvolvimento científico (seja em relação à aula expositiva e/ou discussões acerca destas questões).

- Epistemologia do Conhecimento Científico: qual a natureza do conhecimento científico e qual a diferença deste conhecimento para os outros tipos de conhecimento?

- Existem diferenças significativas entre as assim chamadas ciências da natureza (ciências naturais) e as ciências humanas? Se existem, quais são? É possível ter pensamento crítico em questões de ciências naturais, assim como nas ciências humanas, ou as questões relativas às ciências desta natureza são mais “fechadas” do que “abertas”?

- Apresentação e discussão de dois experimentos mentais cruciais na história das ciências em forma de argumentos, a saber, o experimento mental de Galileu sobre a queda dos corpos (a ser esboçado em lâminas de Power Point com os passos do argumento a serem explicados e detalhados, com explicações complementares), e o de Einstein sobre a constância da velocidade da luz. Ressaltar a importância destes experimentos para os estudantes, e fazê-los enxergar a relevância dos mesmos para a atividade do cientista e do professor de ciências na educação

(21)

21

científica. Discussão adicional e complementar sobre a educação científica e sua importância para a formação autônoma e cidadã.

- Exposição e discussão sobre o que é a Inteligência Artificial (IA) e as implicações advindas daí para o conceito de vida na Terra e fora dela: até que ponto a tecnologia pode determinar o que seja “vida”, e se a vida estaria apenas fundamentada sob um viés biológico e físico-químico? Quais as projeções e impactos disto para o mundo pós-pandemia de COVID 19, e a possibilidade de se ter de lidar e conviver futuramente com ameaças biológicas e também tecnológicas, oriundas de um mau uso da IA, por exemplo? A humanidade poderá e saberá conviver harmoniosamente com isso, ou poderemos viver em uma sociedade de controle e opressão, em vista tanto da segurança, tanto sanitária (Biossegurança) quanto de outras naturezas? Os conceitos de sustentabilidade e consciência ambiental devem ser pensados e repensados em uma sociedade de valores não consumistas, que prezem outra forma de relação do homem com a natureza e o meio ambiente? Como lidar com as questões de matriz energética em vista desta sustentabilidade ambiental, como radioatividade, e a utilização de energias limpas e renováveis, como, por exemplo, energias solar, eólica e nuclear? Como tratar da questão da radioatividade em questões do uso de energia nuclear e os seus riscos, também em relação ao lixo nuclear?

Sexta, Sétima e Oitava Aulas

Plano de Aula do Encontro 6, 7 e 8: Incitação de debates fundamentando as suas

opiniões em argumentos (sobre os grandes temas abordados em aulas anteriores) Tempo previsto: 45-50 minutos (cada)

Conteúdo: Argumentação; oferecer razões para que os estudantes apoiem e justifiquem os argumentos e as possíveis conclusões

Após a exposição de todos os temas e tópicos a serem trabalhados e discutidos em sala de aula (e talvez seja necessário, dentro da dinâmica apresentada, a presença de mais aulas além das inicialmente programadas), estas duas ou três últimas aulas serão aulas de discussão e debates sobre todos os assuntos tratados, com os estudantes falando livremente, mas procurando fundamentar as suas opiniões em argumentos e oferecendo, sempre que possível, razões que justifiquem e/ou apoiem estes argumentos e as possíveis conclusões dos mesmos a que os mesmos possam e devam chegar.

A função do professor neste momento do módulo de ensino, ou sequência didática, é a da mediação dos argumentos e das falas dos estudantes, os procurando orientar nesse sentido e também participando das discussões, os deixando falar e se manifestar sempre que possível. Gravações de

(22)

22

áudio e anotações em diários de campo por parte do professor-pesquisador, dentre outras formas de registros, serão feitas a fim de este ter elementos suficientes para poder, por exemplo, realizar a sua pesquisa diante dos dados coletados, seja nas aulas de discussões e debates, e também nas aulas expositivo-dialogadas; tal expediente tem como função a obtenção de um estudo de caso específico, que será delineado na sequência a fim de ilustrar, ainda que parcialmente, os elementos/tópicos apresentados e expostos nesta estrutura didática toda.

De maneira bastante geral e resumida, esta é, em linhas gerais, a dinâmica de como este módulo de ensino e esta sequência didática deveria se desenvolver, através desta metodologia apresentada, seja nas aulas expositivo-dialogadas e nas aulas dos debates e das discussões orientadas. O que aqui está apresentado é uma espécie de “pseudo-manual” a ser utilizado pelo professor de ciências, no sentido de auxiliar e ter alguma utilidade nas suas aulas e nos seus planejamentos pedagógicos.

Após a breve exposição final desta seção sobre o plano/cronograma destas aulas e das atividades do debate orientado, será detalhado, na sequência, um estudo de caso que se pretendeu se utilizar de determinados elementos deste módulo a fim de se configurar como um exemplar ilustrativo das ideias apresentadas aqui, ainda que não coincidindo necessariamente com todos os tópicos e temáticas apresentados por questões de limitação da logística e do planejamento das aulas e atividades.

Aspectos e Cronograma Geral das Sexta, Sétima e Oitava Aulas:

Serão retomados brevemente os temas da aula anterior sobre a breve retrospectiva histórica do desenvolvimento científico (seja em relação à aula expositiva e/ou discussões acerca destas questões).

Atividade do debate e da discussão orientada:

Esta atividade, que finaliza o módulo, é atividade mais importante e crucial deste módulo de ensino, pois é nela que os estudantes irão discutir os assuntos trabalhados em sala de aula de forma orientada e utilizando argumentos e oferecendo razões que fundamentem/balizem as suas opiniões. A discussão é livre, sem maior rigidez de regras (poderá ter, por exemplo, forma de um júri simulado, onde os alunos formam grupos e se dividem os assuntos de forma a defenderem os seus argumentos dentro das concepções de cada grupo), contudo a organização de ideias e a elaboração desta através do discurso argumentativo é o principal objetivo a ser perseguido aqui.

(23)

23

O professor-pesquisador que conduz os debates procurará formular questões-chave que norteiem toda a gama e o escopo de assuntos trabalhados e também discutidos nas aulas anteriores para que os alunos tomem a iniciativa de discuti-los em sala de aula, seja em pequenos grupos e/ou individualmente, e que esta discussão seja socializada a fim de que se permita o contraponto de ideias e de opiniões, sempre se utilizando argumentos e razões, sejam favoráveis ou contrárias, a fim de justificar ou refutar alguma opinião/ posição.

O objetivo é tratar todos os temas e assuntos trabalhados nas aulas anteriores, que de uma forma ou outra se complementam em um grande debate que pode ser estabelecido, seja nas questões menores e nas suas particularidades específicas, ou no grande tema geral que pode ser discutido amplamente de forma mais global. Não há aparentemente uma ordem pré-estabelecida nas temáticas a serem discutidas, elas podem aparecer em vários momentos dos debates dependendo do curso e da dinâmica que os mesmos tomarem e desenvolverem-se.

Ao final, espera-se que os estudantes consigam desenvolver algum entendimento sobre estas questões, seja no seu conjunto e/ou nas suas particularidades, sendo capazes de minimamente exercerem o seu senso crítico de forma organizada e racionalmente coerente e consistente. Na sequência, exploraremos o detalhamento de um estudo de caso que servirá como referência/baliza para ilustrar a essência do que foi apresentado e discutido até aqui, ainda que não contemple plenamente todas as atividades e temáticas aqui propostas.

(24)

24

(25)

25

Estudo de caso: Temáticas sóciocientificas trabalhadas através da análise conceitual seguindo os referenciais teóricos e epistemológicos da argumentação - transcrições das aulas e identificação/construção de argumentos

Uma vez tendo minimamente delineado os referenciais teóricos do ensino por argumentação em temáticas sociocientíficas dentro do escopo do presente módulo de ensino/sequência didática, passemos agora ao estudo de caso que foi realizado em uma turma do terceiro ano da disciplina de Física do Ensino Médio de uma escola pública de Porto Alegre, Estado do RS.

Utilizando-nos da transcrição de falas das aulas e dos debates realizados e procedendo pela identificação e construção de argumentos destas falas, o trabalho do professor-pesquisador é o de construir uma estrutura argumentativa oriunda destas audições, que basicamente são diálogos orientados pela figura deste professor pesquisador, cuja função é a de ser o mediador destas falas, assim como tais resultados do presente estudo de caso possam servir como ilustração de como minimamente aplicar o ensino por argumentação em sala de aula.

No caso do presente estudo de caso, os alunos assistiram a alguns vídeos sobre as temáticas sociocientíficas referidas e leram um material de apoio para auxiliar nas questões e nos debates, onde o professor-pesquisador faz a mediação e conduz a discussão. Os vídeos estão disponibilizados no Youtube e os endereços constam na seção final sobre o material didático e de apoio. Basicamente os mesmos versam sobre os assuntos/temas que foram tratados em sala de aula, como IA e tecnologias, fake news e desinformação, negacionismo científico, e radioatividade e energia e lixo nucleares.

Embora tal estudo de caso não tenha seguido rigorosamente o plano do módulo de ensino e da sequência didática apresentada como substrato teórico para a atividade de ensino por argumentação, as temáticas trabalhadas assemelharam-se bastante ao que foi proposto e exposto aqui, e o objetivo é, basicamente, que esta atividade ajude e auxilie o professor na condução da possível implementação da sua proposta didática em sala de aula. Após este breve e resumido relato da dinâmica do módulo exemplificada pelo estudo de caso presente, passemos agora, pois, à exposição e transcrição das falas das aulas trabalhadas para posterior construção dos argumentos que serão realizadas aqui, onde, nos primeiros encontros, foram tratados temas relativos à inteligência artificial (IA) e os usos da tecnologia na ciência e na sociedade.

(26)

26 Transcrições das falas dos alunos das Aulas 1 e 2

Aluna 1: “Uma visão sociológica da coisa, que muita gente tem medo que a tecnologia tome conta do mundo. E que domine o mundo.... (o vídeo sobre IA postado no Google Classroom). Eu concordo com o ponto de vista do senhor que gravou o vídeo, eu não acho que as máquinas vão dominar o mundo porque na realidade uma máquina, como diz no vídeo, é formada por algoritmos, né, é o próprio homem que coloca as informações, então eu acho que algum dia, se as máquinas acabarem criando alguma consciência, vai ser porque o homem incentivou isso, entendeu, eu não acho que a autonomia delas vá ser criada por elas mesmas, eu acho que o homem vai influenciar nisso. Enfim essa é basicamente a minha opinião.”

Aluna 2: “Eu achei interessante o vídeo, achei interessante aquela máquina que nem os próprios programadores entenderam, essa informação meio que me assustou, entre aspas (“”), mas não de uma maneira necessariamente ruim, e assim como a [citou nome da colega], eu não acho que, pelo menos em um futuro próximo, fazer as máquinas terem uma consciência, porém o que me “preocupa” é que a máquina vai seguir o que ela foi programada para fazer, e o que me preocupa é quem vai estar por trás dela, aí é que tá o perigo, não pela máquina em si, mas pela pessoa que ta programando ela.”

Aluno 1: “Eu ia falar que máquina é só um script de programação do conhecimento prévio do ser humano, então a máquina não tem uma autonomia para ter uma ação diferente da programada, minha opinião é mais ou menos parecida com as gurias que falaram, meu medo é mais essa questão do ser humano achar que as coisas possam sair do controle, pois não faz sentido uma máquina fazer algo que ela não foi programada, não faz sentido comparar o cérebro humano com um pensamento de filme, é basicamente essa a minha ideia.”

Aluna 1: “Eu acho que um dos principais medos do ser humano é, na realidade, ser substituído, as pessoas têm medo que a mão de obra delas não seja mais usada e que máquinas comecem a substituí- las, e acho que isso vem de muitas gerações. Na realidade, se tu for ver, as tecnologias criadas nos últimos anos, as pessoas sempre têm medo de que elas parem de trabalhar, e principalmente ali na Revolução Industrial, que as pessoas acharam que iriam ter de parar de trabalhar, que aí iria ter máquinas que iriam substituir a mão de obra delas, mas na realidade vão ter de ter pessoas para fazer a manutenção dessas máquinas, então eu acredito que a mão de obra humana nunca vá ser completamente substituída, e que se em algum momento isso for acontecer, isso vá acabar prejudicando a nossa volta, a nossa população é muito grande e tem de ter trabalho pra todo mundo, acho que essa é a questão principal.” (grifo nosso)

Aluna 2: “Só complementando o que o [citou nome do colega] falou, da questão de medo, eu acho que esse medo do ser humano das máquinas se voltarem contra ele é por que o ser humano é o criador delas, das máquinas, e o ser humano personifica a sua instabilidade nas máquinas, o ser humano é

(27)

27

muito instável, a gente tem medo de que elas, com a evolução, possam ser tão instáveis quanto nós, de alguma forma, e daí fazer todo esse levante, de dominar o mundo etc.”

Aluno 2: “Eu vou discordar um pouco dos colegas, dessa teoria de que não existirão empregos, mas será que o que existiu na humanidade até agora vai se repetir com a IA? E não só isso, nunca antes na história da humanidade houve tanta evolução e tanta tecnologia quanto num período tão curto de tempo. É difícil para as pessoas comuns se adaptarem, é difícil até para quem é do meio da programação, muitas mudanças acontecem tão rápido..., como uma pessoa comum que nem tá ligada no que acontece no mundo, ela nem sabe esse tipo de coisa, como é que ela vai se adaptar num mundo com computação quântica, num nível de informação absurdo, numa sociedade tão diferente do que era há um tempo atrás? Talvez seja muita arrogância achar que vão se criar novos empregos daqui por diante para compensar os que vão acabar com as IAs.”

Aluno 2 (continuando): ... “é muito difícil definir e dizer o que é consciência... tem um vídeo que fala de uma IA poder criar uma IA melhor que ela, a superando, sobre isso, saiu uma notícia da Microsoft, dizendo que ela teria criado essa IA que teria superado a IA dela, e seria numa velocidade mais rápida, e que seria tão evoluída e conectada com a IA original, que a superaria, que seria uma espécie/forma de Deus. Quanto a isso também eu vi uma notícia de que na Índia, antes da Covid ainda, que essa perda de emprego, e tal, como seria a questão do emprego com essa IA tão especial e superior, seria quase como que um Deus “criando” o seu filho.”

Aluna 1 (retomando): “Eu acho que a própria constituição do nosso país nos limita, a gente sempre vai ter alguém nos limitando o tempo todo, isso entra mais no lance dos contratualistas, que eu não quero entrar, mas acaba que a gente sempre acaba entrando/invadindo o espaço do outro, e até o governo, como a gente vê em certas ditaduras como na China e em outros países, eles acabam invadindo a nossa privacidade de certa forma, mas em relação a informações do Google etc., a gente aceita os termos de uso e permite que a nossa privacidade seja violada, mas se a gente não permitir, vai acabar tendo de se afastar desse tipo de tecnologia, mas essa liberdade tem mais a ver com a condição desse ser humano que escolhe ter esse tipo de privacidade ou não.” (grifo nosso).

Aluno 2: retomando... “Até tendo a concordar com a [citou nome da colega] nesse ponto, do controle da tecnologia, nós já perdemos esse controle e nem vai conseguir recuperar, nos EUA ainda dá para ter o controle, pois é uma “democracia”, mas no caso da China não, nós não sabemos o que vem lá de dentro, que quer dominar o mundo e ser uma potência tecnológica, é um país que tem o domínio das informações, é um país que está muito na frente, já vai passar os EUA, como ir contra um país deste em um futuro próximo? Muito complicado isso.”

(28)

28

Análise e construção, identificação de estruturas argumentativas e de argumentação através das falas e discussões das Aulas 1 e 2

Através das falas e das transcrições dos estudantes nestas aulas antecedentes, podemos utilizar este material e outros elementos a fim de identificar estruturas argumentativas nas opiniões e proposições dos alunos, bem como, se é possível, interpretar estas passagens no sentido de defender uma perspectiva de que houve a presença de elementos argumentativos oriundos destas falas.

Como recurso didático para estas aulas, conforme referido anteriormente, foram disponibilizados alguns vídeos para os alunos assistirem e comentarem depois, dentro da metodologia proposta e utilizada em sala de aula. Por exemplo, um argumento que se pode identificar é o da questão da máquina (no caso, a máquina operando de acordo com uma IA) ser dependente da construção e operacionalização de algoritmos para poder desempenhar as suas funções: é o ser humano que programa a máquina e constrói os algoritmos, se as máquinas futuramente, na sociedade, criarem alguma espécie de autonomia de realizarem as coisas “sozinhas”, digamos assim, isso não será por causa da própria máquina, e sim de quem a programou, o ser humano. A máquina não teria autonomia para ter uma determinada “autonomia” diferente da programada, essa seria uma das consequências deste raciocínio e isto foi, inclusive, dito por um dos estudantes.

Também na questão e discussão sobre a nova Revolução Tecnológica, em comparação com a Revolução Industrial, os estudantes defenderam posições de que as máquinas não deverão substituir os humanos nos empregos, e utilizaram as seguintes razões, ou argumentos para tanto, a saber, de que a manutenção das máquinas não serão outras máquinas que realizarão, pois isto requer a presença do ser humano (mesmo que haja uma IA que faça tal “manutenção”, essa IA foi programada pelo ser humano e teria alguma dependência dele, em algum nível), e um ponto levantado por um dos estudantes, que foi bastante interessante, foi a questão do alto nível de complexidade que as funções em uma sociedade com altas tecnologias de IA iria exigir, tecnologias estas que são desconhecidas pela maior parte das pessoas e inclusive por parte dos próprios especialistas, que tem uma grande quantidade de dados e de informações para lidarem (o que é conhecido na literatura da ciência de dados como o problema do Big Data).

Então, em termos de argumento/argumentação, podemos colocar essa questão levantada pelos estudantes em uma forma de pergunta, por exemplo, que exigirá uma resposta à mesma: “As máquinas, a IA irão “dominar” o mundo/sociedade, a ponto de restringirem nossas capacidades de autonomia, liberdade etc., e também em relação às relações de trabalho, tornando certas funções/empregos obsoletos ou inexistentes, e também em relação aos termos de uso dos serviços de IA?” (este último ponto/tópico também foi levantado e aventado pelos estudantes, e pode/deve ser agregado aqui, pois está diretamente relacionado às questões pertinentes colocadas e elencadas pela classe).

(29)

29

Como resposta a esta grande e complexa questão, construída aqui em forma de pergunta, ou questionamento, cujo objetivo é o de dar uma forma a uma estrutura argumentativa presente nas falas dos estudantes, se pode responder negativamente, de acordo com as razões e os argumentos apresentados por eles, e oferecer as seguintes razões pertinentes e relevantes para tanto: “Não, as máquinas e a IA não terão este poder de dominação, pois quem faz a sua programação e manutenção são os humanos, que não terão a sua perda de autonomia e liberdade nesse sentido, pois as máquinas e as IAs são dependentes do ser humano. Em relação aos termos de uso dos serviços de uso das empresas e companhias de IA, também é o humano que escolhe não utilizar ou não, seu acesso ficará restrito se assim não o escolher, utilizando e tendo acesso a menos tecnologias e produtos, mas no final a escolha será sempre sua.” (Mesmo com a guerra tecnológica travada entre EUA x China e que pauta/pautará as relações tecnológicas e comerciais de nossas vidas privadas, também, restringindo nossas “liberdades”, mas ainda assim seremos nós, ao fim e ao cabo, que faremos as escolhas).

De forma breve e resumida, basicamente estes seriam os argumentos contidos nas falas dos alunos nestas aulas. É importante salientar que a forma como estamos expondo estas estruturas argumentativas aqui não precisam ser necessariamente estas, buscamos oferecer uma alternativa de análise e construção aqui, que sirva como baliza e referência para o professor-pesquisador na elaboração da suas aulas, mas se trata apenas de um modelo de como fazer, não uma “receita de bolo”, outras diversas formas podem e mesmo devem ser utilizadas, o objetivo aqui é ser ilustrativo e didático no propósito desta atividade.

Referências

Documentos relacionados

A dose de propofol de 20 mg/kg que foi testada é recomendada para procedimentos clínicos e coletas de amostras biológicas em Lithobates catesbeianus, visto que

No código abaixo, foi atribuída a string “power” à variável do tipo string my_probe, que será usada como sonda para busca na string atribuída à variável my_string.. O

Este estágio de 8 semanas foi dividido numa primeira semana de aulas teóricas e teórico-práticas sobre temas cirúrgicos relevantes, do qual fez parte o curso

Realizar a manipulação, o armazenamento e o processamento dessa massa enorme de dados utilizando os bancos de dados relacionais se mostrou ineficiente, pois o

4.2.10 No caso de aprovarem na redação um número superior a 24 candidatos, serão convocados para a próxima etapa apenas um primeiro grupo com os 24

Quando mudei para o Brasil, uma das grandes diferenças que percebi é que a taxa equivalente ao overdraft, o cheque especial, era dez vezes mais no Brasil do que na

Para superar essa contradição são necessárias novas políticas públicas e sobretu- do um alerta sobre os limites desta intervenção estatal assim como uma tomada de consciência

Esses códigos constituem-se em números atribuídos a campos específicos do documento onde devem ser inseridas informações que abrangem indicação de números (número do