r e v b r a s o r t o p . 2014;49(2):101–102
w w w . r b o . o r g . b r
Editorial
O
que
nos
leva
a
aceitar
essa
forma
de
trabalhar?
Talvez
o
prazer
de
exercer
a
medicina!
What
makes
us
accept
the
way
we
work?
Maybe
the
pleasure
of
practicing
medicine!
Anossaatividadeprofissionaltem umlado desatisfac¸ãoe prazer,queéoexercíciodanossaespecialidade:operar,fazer diagnóstico,avaliarresultados.Aortopediaéuma especiali-dadedediagnósticosobjetivosetratamentosque,emgeral, trazemresultadosfavoráveisnaanálisedospacientes.
Aremunerac¸ãodonossotrabalhoéonossogrande pro-blema,somosmuitomalremuneradosquandocomparadosa outrosprofissionaiseassumimosumaresponsabilidadeque nãotemparemqualqueroutraatividade.Adesvalorizac¸ãodo atomédicoéabsurdaemtodosossentidos,éatéestranhoque asociedadeaceiteessasituac¸ão.
Peranteospacienteshácertaauradedignidadena ativi-dadedomédicoquetornaaremunerac¸ãoalgoquestionável. Sempresurgeapergunta:“Massenãotiverdinheiroapessoa ficacomadoenc¸a?”
A maioria das profissões liberais tem sua remunerac¸ão relacionadaaocustodotrabalho;assimtrabalhamarquitetos, engenheiroseadvogados,quecobramseushonorários base-adosempercentuaisdocustodotrabalhoaserexecutado.Se omédicorecebesseumpercentualdacontahospitalar,essa atitudeseriaconsideradaindigna.
Oquenoslevaaaceitaressaformadetrabalhar?Talvezo prazerdeexerceramedicina.
Paralelaaessaatividadecomplexadeatenderpacientes, tratá-loseserremuneradodeformainadequada,temosade educac¸ãocontinuadanoscongressos,nasjornadas,leiturase hojetransmissõesviainternet,quesemdúvidaalgumaéuma atividadeintensa,queconsomemuitotempo,masagradável. Nessaatividadeanossavocac¸ãodetrabalharporpouco dinheirooupagarparaaprenderatingeoseuápice.
Fazer cursos, estágios, assistir a congressos, fazer uma apresentac¸ão,participardeumexame,escreverourevisarum trabalho,gravarumvídeosãoatividadesmuitodesgastantes e,emalgunscasos,dispendiosas,feitassemremunerac¸ãoe muitodisputadasemcertasocasiões.
OExamedeObtenc¸ãodoTítulodeEspecialistaem Orto-pediaeTraumatologia(TEOT)temmaisde300examinadores,
quesedeslocamparaCampinaseportrêsdiasavaliam os possíveisnovoscolegas.Nemconsidereiosorganizadorese osmembroseex-membrosdaComissãodeEnsinoe Treina-mento(CET),quepassamoanonamontagemdoexame.
No Congresso Brasileiro de Ortopedia e Traumatologia (CBOT)temos300a400participantesquedãoaulas, organi-zamsalas,orientamtrabalhos.Maisumaveznãoconsiderei osorganizadores,colegasdacidadequerecebeocongressoe daCEC,quepassamanosnaorganizac¸ãodoencontro.
Se considerarmos os congressos regionais e das espe-cialidades, esse número de colegas que trabalham sem remunerac¸ãoecomalgumprejuízoduplicaoumesmotriplica. ARBO,apartirdosúltimoscincoanos,tevemaisde900 trabalhosanalisados,semcontarosrejeitados.Se considerar-mostrêsautoresportrabalhoedoisavaliadores,tivemosmais de4.500colegasenvolvidosemnossaspublicac¸ões,sónaRBO, semconsiderarasoutrasrevistas.
Sem dúvida há um número expressivo de colegas que fazem várias dessas atividades de forma simultânea, mas mesmoassim,seconsiderarmosporatividadenão remune-rada,onúmerochamaaatenc¸ão.
Amaioria dossóciosda SBOT temgrandesatisfac¸ãoao fazer essastarefas,asquais,alémdenãoserpagas,geram despesas.
Oquenoslevaaaceitaressaformadetrabalhar?Talvezo prazerdeexerceramedicina.
Emcertoscasosaatividadedeeducac¸ãomédicaé financi-adaporalgumdosfornecedoresdematerialoumesmopela indústriafarmacêutica,oqueminimizaoprejuízodocusto do aprimoramento profissional. Inscric¸ões em congressos, viagensde aperfeic¸oamento, auxílioa publicac¸ões, patrocí-nio de fóruns de discussão científica e de congressos são contribuic¸õessemasquaisessasatividadesnãoseriam viá-veisparaumgrandenúmerodecolegas.
ONewEnglandJournalofMedicinepublicanasuaedic¸ãode
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r e v b r a s o r t o p . 2 0 1 4;49(2):101–102obrigaomédico aexpor emumsite públicoqualquertipo deauxílioquesupere10dólares.Aleisugerefortementeque essesauxílios,sejaparaoquefor,sãodesonestos.Omédico seráconsideradoindignoedeveráexporpublicamenteovalor desuaindignidade.
Essaéaanáliseeaavaliac¸ãodeumasociedadequecolocao consumoacimadequalquerregra,mascondenaasubvenc¸ão daeducac¸ão médica,semfalarnaremunerac¸ãodomédico pelosservic¸osdeconsultoriaàsempresasquemilitamnaárea dasaúde.Atéopovo,quevivedosdescontos,dasliquidac¸ões fantásticas,queveneraodinheiroacimadequalquervalor, vêomédicocomoumprofissionalquedeveviversemauxílio paraassuasatividadesacadêmicasdeatualizac¸ão.
Segundoessavisão,devemosnosaprimorarsempre,pois somos julgados severamente quando erramos, mas nunca aceitarqualquerformadeauxíliofinanceiroaessenosso pro-gramadeaperfeic¸oamento.
A esse conjunto de regras, formado pela baixíssima remunerac¸ãodoatomédico, pelobaixíssimo salárioepela abdicac¸ãodequalquerauxílioexterno,chamamdedignidade domédico.
Oquenoslevaaaceitaressaformadetrabalhar?Talvezo prazerdeexerceramedicina.
GilbertoLuisCamanho RevistaBrasileiradeOrtopedia E-mail:gilbertocamanho@uol.com.br
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