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Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

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Acórdãos STJ

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

Processo: 01A053

Nº Convencional: JSTJ00000366

Relator: PINTO MONTEIRO

Descritores: MARCAS REGISTO CONFUSÃO CONCORRÊNCIA DESLEAL Nº do Documento: SJ200104030000531 Data do Acordão: 03-04-2001 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Privacidade: 1

Meio Processual: REVISTA.

Decisão: NEGADA A REVISTA.

Área Temática: DIR COM - MAR PATENT.

Legislação Nacional: CPI95 ART25 N1 D ART165 ART168 ART183 ART189 N1 G.

Sumário : Não merece censura a recusa do registo da marca constituída pela expressão BOBBY JONES destinada a assinalar «serviços de bar, hotelaria e restaurante», fundada no entendimento de que a marca registanda, além de conter um nome individual para o qual a requerente não tem a devida autorização, poderia favorecer actos de concorrência desleal com a marca nacional BOBBY JONES, destinada a assinalar «artigos de desporto, aparelhos para o golfe não incluídos noutras classes, tacos, bolas e sacos de golfe».

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:

I - "A", interpôs recurso do despacho do Presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que recusou o registo da marca nº 307251 "..." para a classe 42ª, em que é parte contrária B.

A Direcção do Serviço de Marcas defendeu o despacho em causa. "B" deduziu oposição ao recurso interposto.

Foi proferida sentença que julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão do INPI.

Apelou a recorrente.

O Tribunal da Relação confirmou o decidido. Inconformada recorre a autora para este Tribunal. Formula as seguintes conclusões:

- O acórdão a quo aplicou erradamente a lei, designadamente o Código da Propriedade Industrial (artigo 16º nº 2, artigo 17º nº 1, artigo 32º nº 1, alínea b), artigo 189º nº 1, alínea g) e m), artigo 25º nº 1, alínea d)), o Código de

Procedimento Administrativo (artigo 133º nº 2), o Código de Processo Civil (artigo 2º e 3ºA e artigo 201º nº 1), a Constituição (artigos 2º, 20º e 268º nº 3);

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- A recorrente não foi notificada do último articulado da recorrida e quando pretendeu pronunciar-se o seu articulado já não foi considerado, pelo que lhe foi violado o nº 2 do artigo 16º e 17º do Código da Propriedade Industrial pelo que, dada a omissão dessa formalidade essencial o acto recorrido do INPI é nulo, resultando nulidade de todo o processado após a apresentação desse articulado pela parte contrária;

- O atrás referido constitui também uma violação do princípio do contraditório (artigo 2º e 3ºA do CPC);

- O próprio despacho recorrido refere expressamente que "a discussão findou numa exposição feita pela reclamante" pelo que confirma e prova que não se chegou sequer ao conhecimento da entidade recorrida a posição da recorrente sobre o último articulado da recorrida, cujo teor foi uma das bases do despacho recorrido, pelo que essa omissão é essencial e constitui preterição de

formalidade que pode influir na decisão da causa (artigo 201º nº 1 do CPC); - O princípio do contraditório é substancial e neste caso ficou frustrado pelo que, também com esse fundamento o despacho é nulo;

- Além disso o despacho também seria anulável por padecer de violação da lei por erro nos pressupostos por esse mesmo motivo;

- Não proceda a invocação do acórdão de que o nº 1 do artigo 32º só se aplica no caso de concessão e não em recusa;

- A lei nova da propriedade industrial é pouco precisa em alguns conceitos e aqui é um caso de lapso pois fala em títulos quando devia ser "registos" assim como em concessão quando devia falar de concessão ou recusa;

- Houve também inconstitucionalidade, pois a violação do princípio do

contraditório representa violação do direito de igualdade, previsto nos artigos 2º e 20º falta a notificação do artigo 268º nº 3 todos da Constituição;

- Há falta de ilegitimidade da parte contrária porque a recorrida apenas veio a adquirir um direito de propriedade industrial após a sua intervenção inicial no processo, pelo que há ilegitimidade inicial, e é nesse momento que deve ser apreciada e não posteriormente;

- O artigo 189º nº 1, alínea g) do CPI não pode ser invocado por quem não é o próprio ou herdeiro até ao 4º grau nem juntou procuração a favor do

procurador habilitado para intervir;

- A lei fala em herdeiro até ao 4º grau pelo que exclui herdeiros do 5º ou mais graus, aspecto as instâncias não curaram saber, apesar de alegado, o que origina omissão de julgamento;

- A expressão "..." não é nome nem inglês ou americano, nem é o nome da parte contrária que é "B" nem a parte contrária é herdeira de ninguém até ao 4º grau; - Os direitos publicitários de uma expressão, conferidos por pretensos herdeiros de um senhor falecido há mais de 50 anos, com base numa declaração da própria parte contrária não configuram o pressuposto do artigo 189º nº 1, alínea g) nem podem ter a virtualidade de impedir o registo de uma marca para

restaurante e bar em Portugal onde tal nome nem sequer é ou foi conhecido; - Como está demonstrado, a expressão "..." já foi registada em Portugal, sem qualquer problema para "artigos de ginástica e desporto" pelo INPI;

- A parte contrária veio adquirir essa marca para determinar a sua ilegitimidade sendo esse o único direito que pode invocar;

- A invocação desse direito marcário (a marca nº 295408, mista, também "..." para artigos de ginástica, desporto, etc) não pode impedir o regista da marca

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em apreço nem com fundamento no artigo 189º nº 1, alínea m), nem com fundamento na aplicação do artigo 25º nº 1, alínea d);

- A pretensa invocação da concorrência desleal para opor tal marca (artigo 25º nº 1, alínea d)) não é conforme ao entendimento que deve ser dado a este instituto;

- Conforme é pacífico entre os autores de que se citaram - Oliveira Ascensão, Patrício Paúl, Carlos Olavo, Américo da Silva Carvalho, entre outros autores portugueses. "O acto de concorrência desleal pressupõe concorrência e assenta num acto de apropriação de clientela alheia";

- Oliveira Ascensão refere: "Se não houver concorrência entre empresas não poderá haver concorrência desleal"; Américo da Silva Carvalho: "Obter uma maior quota parte no mercado"; Carlos Olavo: "Prejuízo de uma clientela alheia, efectiva ou potencial"; Patrício Paúl: "Produtos ou serviços em relação de substituição ou complementariedade";

- Ramella e Roubier dizem: "O desvio da clientela não basta por si só para caracterizar a concorrência desleal pois o acto da concorrência tem por móbil o aumento da clientela própria à custa da clientela alheia";

- A nossa jurisprudência é também clara ao estabelecer os limites do

entendimento da concorrência: O 5º Juízo considera "absolutamente diferentes a actividade de um restaurante e marca de vinhos; a Relação considera que "onde não houver possibilidade de concorrência, não tem razão de ser a sua aplicação no que concerne às normas protectoras dos direitos nele (CPI) consagrados (ac. de 12.09.98); noutro aresto refere que o titular da marca "não possa opor-se à sua utilização em quaisquer produtos diferentes ou disopor-semelhantes (Ac. 24.09.99); noutro aresto refere que se os produtos "não têm aptidão para satisfazer as mesmas necessidades, não havendo concorrência, não há concorrência desleal (Ac. de 13.05.99); o STJ considerou que não se confundiam "textêis em bruto" com "tecidos e artigos de vestuário" (Ac.

21.05.81) e considerou mesmo que não há usurpação da marca entre produtos e serviços (Ac. 10.12.1997); define ainda concorrência como o esforço no campo da actividade económica de outrem no sentido de atrair clientela (Ac. 07.01.58);

- Não faz sentido pretender que há concorrência entre artigos de ginástica e desporto e ou serviços de um restaurante ou bar, pois num caso é produção, no outro são serviços, sendo a clientela totalmente diferente, não podendo ser aferida pelo critério do acórdão: alguém está num local ou a fazer desporto e nesse local pode haver um restaurante... tem de haver limites! Ninguém que pretende comprar um artigo de ginástica ou desporto se engana e vai comer a um restaurante!;

- Não há concorrência entre "artigos de ginástica e desporto" e "restaurante e bar (serviços hoteleiros)", pelo que não pode haver concorrência desleal, que aliás nunca haveria em qualquer circunstância, mesmo potencial;

- Deve ser dado provimento à revista e revogado o acórdão recorrido

anulando-se o acto de recusa do INPI e dando-se oportunidade à recorrente de aí defender a sua posição, proferindo o INPI novo despacho de concessão da marca "..." para a classe 42ª "restaurante e bar";

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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II - Vem dado como provado:

A requereu o registo da marca nº 307251 meramente nominativa constituída pela expressão "...", em 13 de Fevereiro de 1995, para assinalar "serviços de bar, hotelaria e restaurantes", da classe 42ª;

Reclamou, no processo administrativo, B., em 10 de Novembro de 1995; A ora recorrente contestou tal reclamação em 13 de Fevereiro de 1996; Em 11 de Setembro de 1996, a ora recorrente apresentou no processo administrativo uma resposta a uma exposição suplementar que havia sido apresentada pela B.;

A teve conhecimento da referida exposição suplementar em Agosto de 1996; Em 12 de Setembro de 1996, foi proferido despacho de recusa do registo da marca nº 307251, "...", que foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial nº 9/96, de 31 de Dezembro;

É do seguinte teor o parecer que fundamentou tal despacho: "Ao proceder ao estudo do presente pedido de registo, verifico que houve oposição de B., invocando todos e quaisquer direitos ao nome do falecido jogador de golfe - ..., a que a requerente respondeu e a discussão findou numa exposição feita pela reclamante. A meu ver, a exposição é procedente, porque além da marca registada conter um nome individual e para o qual não tem a devida autorização, a sua eventual concessão poderia favorecer actos de concorrência desleal com a marca nacional nº 295408 - "...", da reclamante. Proponho, por isso a recusa do registo nos termos dos artigos conjugados 25º nº 1, alínea d) e 189º nº 1, alínea g), ambos do CI";

B. é titular da marca registada nº 295.408, "...", que foi registada em Portugal pela Callaway Golf Company, com o prévio consentimento e autorização da reclamante no processo administrativo, no âmbito dum acordo de licenciamento; Tal marca foi transferida para B., devidamente averbado, em 21 de Junho de 1996;

Tal marca assinala "artigos de ginástica e desporto, aparelhos para o golfe não incluídos noutras classes, tacos, bolas e sacos de golfe, resguardos para os tacos de golfe, partes e acessórios para estes produtos não incluídos noutras classes;

... foi um jogador de golfe;

Em 1985 os legítimos herdeiros de ... formaram B., uma sociedade do estado de Georgia, com a finalidade de controlar e explorar o uso do nome e figura de ..., tendo os herdeiros de ... transferido os seus direitos de publicidade do nome e figura de ... para B., sendo esta sociedade a proprietária de todos os direitos, títulos e interesse no nome e figura de ...;

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B., não deu autorização à ora recorrente para autorização do nome .... III - A recorrente requereu o registo da marca nº 307.251 constituída pela expressão "...". A ora recorrida reclamou, vindo a ser proferido despacho de recusa.

Interpostos competentes recursos, as instâncias mantiveram o despacho do Presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

Daí o recurso para este Tribunal. São várias as questões colocadas:

Nulidade do acto recorrido por omissão de formalidade essencial e violação do princípio do contraditório;

Inconstitucionalidade por violação do mesmo princípio do contraditório; Falta de legitimidade da parte contrária;

Ausência de fundamentos para recusa do registo; Inexistência de concorrência desleal.

Vejamos a primeira das questões suscitadas, revendo, a tal propósito, a marcha processual.

A ora recorrida reclamou contra o pedido do registo da marca em causa e, notificada a aqui recorrente, veio contestar tal reclamação.

Em 12.07.96 a reclamante juntou uma exposição complementar e em 11.09.96 a recorrente apresentou a competente resposta.

Com data de 12.09.96 foi lavrada proposta de recusa do registo e na mesma data proferido despacho de indeferimento.

A exposição complementar é consentida por lei quando se mostre necessária para melhor esclarecimento do processo (artigo 17º nº 2 do Código da Propriedade Industrial).

Aceite a exposição deveria ter sido notificada a recorrente. Não o tendo sido, existiu omissão de formalidade essencial e violação do princípio do

contraditório, com a consequente nulidade, conclui a recorrente. Pensamos que não tem razão.

A notificação serve no caso para dar conhecimento de um acto (artigo 228º nº 2 do C. Processo Civil). Ora, a recorrente, como expressamente admite, teve conhecimento da exposição em Agosto de 1996.

Não resulta que o seu direito tenha sido lesado ou o princípio do contraditório violado, uma vez que a recorrente tempestivamente apresentou a competente resposta. Nem o contrário se pode concluir do facto de a recorrente ter

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eventualmente direito a um prazo maior, já que ninguém é obrigado a esgotar os prazos legalmente concedidos.

Mas, sustenta a recorrente, e é esse o cerne da sua tese, a resposta apresentada não foi tida em conta. O despacho de recusa terá sido proferido sem ter em consideração os argumentos expendidos pela recorrente.

O despacho enfermaria assim de erro nos pressupostos.

Vem provado que o despacho é posterior à apresentação da resposta, contrariamente ao que a recorrente defendeu inicialmente.

Sendo assim, é obviamente impossível concluir qual o grau de atenção e reflexão que mereceu a resposta. Terá sempre que se presumir que qualquer articulado (ou parecer, por exemplo), mereceu de quem decide a atenção que, necessariamente, deve merecer.

Afigura-se-nos evidente que nunca se poderá concluir com um mínimo grau de certeza se o juiz analisou devidamente o documento, se a resposta à

contestação foi devidamente ponderada, se o articulado subsequente fundamentou ou não a sua convicção.

O que é susceptível de ser atacado via recurso é o resultado objectivo concretizado no processo e não a motivação psicológica que terá originado a decisão.

O que se impugna são as decisões e não as reflexões que as terão produzido. Nem procede o argumento central das alegações de que na informação consta que "a discussão findou numa exposição feita pela reclamente".

Desde um mero lapso de escrita ou uma redacção não cuidada até a uma concepção não correcta do que significa findar a discussão, muitas explicações são possíveis.

O que há de concreto e ao que o julgador tem que dar relevância é o facto de a resposta ter sido apresentada, constar dos autos e ter sido junta ao processo antes do despacho de recusa.

Resulta do que está dito que não existe violação do princípio do contraditório. Acrescentar-se-á, contudo, algo mais.

Um dos princípios fundamentais vigentes no nosso Processo Civil é o princípio do contraditório, desde logo realçado no artigo 3º nº 3 do CPC que estipula dever o Juiz observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, tal princípio, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.

O princípio do contraditório e o princípio da igualdade das partes (artigo 3º-A do CPC) não estando autonomamente consagrados na Constituição possuem,

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contudo, dignidade constitucional por derivarem, em última instância, do princípio do Estado de Direito e constituírem emanações directas do princípio da igualdade. Assim tem sido entendido pelo Tribunal Constitucional - por exemplo Ac. nº 516/93, de 26.10.93, BMJ nº 430, pág. 179.

Nenhuma decisão deve ser tomada pelo Juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra quem é dirigida, de a discutir, de a contestar, de a valorar - Prof. Miguel Teixeira de Sousa - "Estudos sobre o Novo Processo Civil" 2ª ed., pág. 47.

Às partes deve ser dado conhecimento de tudo quanto se passe no processo e possa ter interesse.

No caso, uma exposição complementar é algo de processual e substancialmente relevante e que, como tal, deve ser dada a conhecer à parte contrária,

exactamente para esta se poder opor e contra-argumentar em favor da sua tese. Violar o princípio do contraditório e da igualdade das parte seria em concreto não se ter dado conhecimento à ora recorrente da exposição ou não se lhe ter dado a conhecer por forma a poder pronunciar-se tempestivamente.

Então sim, estar-se-ia face a uma nulidade que influiria decisivamente no exame e decisão da causa.

Mas não foi isso que aconteceu.

A recorrente teve conhecimento da exposição e deduziu em tempo oposição. É certo que não se apurou por que forma a recorrente conheceu o articulado, mas o certo é o que o fim último da notificação foi alcançado.

Não há assim violação de qualquer princípio ou inconstitucionalidade que daí decorra.

Analise-se seguidamente a problemática da invocada ilegitimidade da recorrida. Sustenta a recorrente que há ilegitimidade da parte contrária porque esta apenas veio a adquirir um direito de propriedade industrial após a sua intervenção inicial no processo e por outro lado o artigo 189º nº 1, alínea g) do CPI não pode ser invocado por quem não é o próprio ou herdeiro até ao 4º grau.

É preciso não confundir o problema da legitimidade com a questão de fundo. A legitimidade afere-se pelo interesse directo em demandar ou contradizer, interesse esse que se exprime pela utilidade derivada da procedência da acção ou pelo prejuízo que dessa procedência advenha (artigo 28º nº 1 e 2).

Consagrando uma orientação desde há muito maioritária na jurisprudência o nº 3 determina que na falta, de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.

Ora, tal como a relação controvertida está configurada, a recorrida, atento o interesse directo que tem na causa, tinha legitimidade para intervir.

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Saliente-se, aliás, que estando-se no campo da propriedade industrial o conceito de interesse directo tem uma maior latitude, já que pode reclamar da apresentação do pedido "quem se julgar prejudicado pela eventual concessão de registo" (artigo 185º nº 1 do CPI).

Segundo a factualidade apurada pelas instâncias, os herdeiros de ... transferiram para a ora recorrida os seus direitos de publicidade do nome e figura de .... A exploração económica de tais direitos é susceptível de ser cedida e é com base nessa transferência que a recorrida tem interesse na recusa, por se julgar prejudicada.

Saber se a parte contrária é ou não prejudicada prende-se já com a questão substancial e não com o problema processual-formal da legitimidade.

Analise-se então a problemática de fundo.

Está em causa a marca nº 307251 constituída pela expressão "..." para assinalar "serviços de bar, hotelaria e restaurante" da classe 42ª.

A recusa do registo fundou-se no entendimento de que a marca registanda contém um nome individual para o qual a requerente não tem a devida

autorização, além de que a sua eventual concessão poderia favorecer actos de concorrência desleal com a marca nacional nº 295408 "..." pertencente à reclamante e ora recorrida.

Socorreu-se a informação e o consequente despacho do disposto nos artigos 189º nº 1, alínea g) e artigo 25º nº 1, alínea d) do C. Propriedade Industrial. As instâncias entenderam que era correcta a recusa.

O artigo 189º nº 1, alínea g) do CPI estipula que será recusado o registo das marcas que contrariem o disposto nos artigos 165º, 168º e 183º ou que, em todos ou alguns dos seus elementos contenham nomes individuais ou retratos sem obter permissão das pessoas a quem respeitem e, sendo já falecidos, dos seus herdeiros ou parentes até ao quarto grau, e, mesmo quando obtida, se produzirem o desrespeito ou desprestígio daquelas pessoas.

Vem, a propósito, dado como provado que ... foi um jogador de golfe. Em 1985 os legítimos herdeiros de ... formaram B., uma sociedade do estado de Georgia, com a finalidade de controlar e explorar o uso do nome e figura de ... transferindo os seus direitos de publicidade do nome e figura de ... para B. sendo esta sociedade a proprietária de todos os direitos, títulos e interesse no nome e figura de .... B. não deu autorização à ora recorrente para autorização do nome ....

Como é sabido, ao Supremo Tribunal de Justiça, como Tribunal de revista, só cumpre, em princípio, decidir questões de direito e não julgar matéria de facto (artigos 729º e 722º nº 2 do C. Processo Civil).

Face aos elementos trazidos até este Tribunal, tem que se concluir, que se está perante nome individual. Aliás, que a marca está ligada ao nome do falecido

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perante nome individual. Aliás, que a marca está ligada ao nome do falecido jogador de golfe pode até avaliar-se pelo facto de a própria recorrente ter requerido o registo de uma outra marca (nº 310133) com o nome de ... associado a um desenho representando um jogador de golfe (doc. fl. 81). Sendo assim, ao requerimento relativo ao pedido de registo de marca deveria a requerente, além do mais, juntar documento comprovativo da autorização da pessoa cujo nome, firma, denominação social, insígnia ou retrato figure na marca e não seja o requerente. A omissão de tal documento é fundamento de recusa (artigos 182º nº 1, alínea d) e 25º nº 1, alínea b) do CPI.

Suscita-se por fim a problemática da concorrência desleal.

Em bem estruturadas e fundamentadas alegações defende a recorrente que não existe concorrência desleal.

Estão em causa a marca nominativa "..." destinada a assinalar "serviço de bar, hotelaria e restaurante" que a recorrente pretende registar e a marca "...", requerida e autorizada em Portugal de que a recorrida é titular e que se relaciona com "artigos de ginástica e desporto, aparelhos para o golfe, tacos, bolas e sacos de golfe, resguardos para tacos de golfe, partes e acessórios para estes produtos".

No nosso ordenamento jurídico, princípios como o da autonomia privada, permitem e até estimulam a concorrência, ou seja, no caso, a competição entre os vários agentes económicos com vista a alcançar posições de supremacia no mercado.

Dada a grande variedade da oferta e a limitação das necessidades e capacidade de aquisição, o consumidor terá que escolher.

Se a concorrência é um dos pressupostos da iniciativa privada e da economia de mercado, a verdade é que a mesma tem que ter limites intrínsecos e extrínsecos, sendo aqueles constituídos pelas regras que disciplinam a própria liberdade de concorrência.

O abuso dessa liberdade de concorrência poderá levar à concorrência desleal. Daí que um dos fundamentos de recusa de registo seja o reconhecimento de que o requerente pretende fazer concorrência desleal ou que esta é possível

independentemente da sua intenção (artigo 25º nº 1, alínea d) do CPI).

O conceito de concorrência desleal encontra-se estabelecido no artigo 260º do CPI onde se diz que quem, com intenção de causar prejuízo a outrem ou de alcançar para si ou para terceiro um benefício ilegítimo, praticar qualquer acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade, incorre em punição.

Nos vários números do artigo são exemplificados os vários tipos de

concorrência desleal, exemplificação essa que, contudo, não é taxativa nem exaustiva.

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Saliente-se que, relativamente à definição do conceito constante do artigo 202º do Código de 1940, se passou a admitir a possibilidade de concorrência desleal quando houver intenção de alcançar para si ou para terceiro um benefício

ilegítimo.

A repressão da concorrência desleal não se esgota, aliás, nos dois referidos artigos. Desde logo no artigo 1º do citado Código se diz que a propriedade industrial desempenha a função social de garantir a lealdade de concorrência pela atribuição de direitos privativos, bem como pela repressão da concorrência desleal.

O Dr. Carlos Olavo em "Propriedade Industrial", 1997, pág. 147 escreve que acto de concorrência desleal é, antes de mais, um acto destinado à obtenção de desenvolvimento de uma clientela própria em prejuízo de uma clientela alheia, efectiva ou potencial.

Existindo naturalmente concorrência entre as várias actividades económicas, o problema que se coloca é o de saber quando a concorrência é desleal.

Entendem alguns autores que para que se esteja perante um acto de

concorrência desleal é necessária a existência de uma certa "proximidade" entre as actividades desenvolvidas pelos agentes económicos em causa, sendo o cerne da questão a definição de "proximidade".

Com base no que pensamos ser um entendimento restrito do conceito, defende a recorrente que não pode existir concorrência desleal entre "artigos de ginástica e desporto" e "restaurante e bar (serviços hoteleiros)".

Afigura-se-nos que não é assim.

É evidente que existe "proximidade" entre actividades económicas idênticas ou afins, entendendo-se por afins as actividades que estiverem numa relação de substituição ou complementaridade.

Deve, contudo, ir-se mais longe.

Para que se verifique a flutuação na escolha dos consumidores que caracteriza a concorrência, não é necessário que ambas as actividades económicas procurem satisfazer necessidades do mesmo tipo. Haverá concorrência "não apenas entre actividades económicas que estejam numa relação de identidade, substituição ou complementaridade, mas ainda entre todas aquelas que se dirigem ao mesmo tipo de clientela" - Dr. Carlos Olavo, obra citada, pág. 155/156.

Em concreto, uma marca que utiliza o nome de um jogador de golfe para assinalar artigos de ginástica e desporto, aparelhos para o golfe e acessórios pode ver a sua clientela afectada (sem intenção) por uma outra marca exactamente igual que se destina a serviços de restaurante e bar.

Basta que se pense que os restaurantes e bares existentes nas proximidades dos campos de golfe se dirigem ao mesmo tipo de clientela.

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A marca "garante ao comprador que todos os produtos que a ostentam provêm da mesma empresa. O consumidor pode não a conhecer, é certo, mas sabe que só pode ser uma, exactamente aquela que tem direito ao uso exclusivo do sinal" - Nogueira Serens - "A Vulgarização da Marca", Coimbra, 1993, pág. 9. Ora, dada a especificidade do nome e a sua ligação ao desporto,

designadamente ao golfe, com a amplitude de produtos e serviços que, directa ou indirectamente, abrange, é natural que o consumidor médio seja levado a pensar que serviços de hotelaria e o desporto em si estão ligados, provindo da mesma empresa.

Essa confusão frustraria as expectativas que a recorrida possa ter de alargar a sua actividade a novos sectores, beneficiando do prestígio que, porventura, lhe possa ter trazido a comercialização dos artigos de desporto com o recurso à marca em causa.

Tem assim que se concluir que o despacho está correcto. Pelo exposto, nega-se a revista.

Custas pela recorrente. Lisboa, 3 de Abril de 2001 Pinto Monteiro,

Lemos Triunfante,

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