OS GRANDES
DESASTRES
MILITARES
Julian Spilsbury
Tradução Marta PinhoReservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor. Reprodução proibida por todos e quaisquer meios.
A presente edição segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. © 2010, Julian Spilsbury
Publicado originalmente por Quercus Editions Ltd. Direitos para esta edição:
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Título original: Great Military Disasters Autor: Julian Spilsbury
Tradução: Marta Pinho (Lufada de Letras) Revisão: Silvina de Sousa
Paginação: Gráfica 99 em caracteres Palatino
Impressão e acabamento: Eigal (Portugal) ISBN: 978-989-724-437-7
Depósito legal: 442 254/18 1.ª edição: Julho, 2018
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ÍNDICE
Introdução – Principais causas das derrotas militares ... 13 I
EXCESSIVA DEPENDÊNCIA DE UMA VANTAGEM TÁTICA
1. A batalha de Monte Tabor – O colapso de uma civilização,
1125 a. C. ... 19 2. Posição defensiva em Flodden – A catástrofe do reino escocês,
1513 ... 31 3. A longa agonia de Verdun – Presos na própria armadilha, 1916 ... 47 4. Desmoralização em Dien Bien Phu – A última batalha na Guerra
da Indochina, 1954 ... 61 II
IMPREPARAÇÃO DAS FORÇAS EM CONFLITO E UTILIZAÇÃO DEFICITÁRIA DE ARMAMENTO 5. A lenda de Bannockburn – A humilhação do exército invasor,
1314 ... 79 6. A batalha de Crécy – O orgulho vencido dos franceses, 1346 ... 93 7. Incursão contra Fredericksburg – A tática desastrosa do exército
da União, 1862 ... 105 8. Rivalidade franco-prussiana em Sedan – O colapso do Segundo
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9. Derrota em Tannenberg – As fraquezas da máquina de guerra
russa, 1914 ... 133 III
EXCESSO DE CONFIANÇA
10. Fracasso em Siracusa – O grande desastre de Atenas, 415-13 a. C. .... 149 11. Emboscada na floresta de Teutoburgo – O fim do mito
da invencibilidade de Roma, 9 d. C. ... 163 12. Humilhação em Little Bighorn – A maior derrota do exército
americano contra os índios, 1876 ... 175 13. Choque em Isandlwana – A derrota da primeira invasão britânica
da Zululândia, 1879 ... 189 14. Brutalidade em Estalinegrado – A batalha mais sangrenta
da História, 1942 ... 203 IV
IGNORAR PROBLEMAS COLOCADOS PELA LOCALIZAÇÃO ESTRATÉGICA 15. Reviravolta em Saratoga – O início do fim dos britânicos
na América, 1777 ... 219 16. Marcha sobre Moscovo – A destruição do exército de Napoleão,
1812 ... 233 17. A ofensiva do Somme – Impasse estratégico inútil e mortífero,
1916 ... 247 V
SUBESTIMAR O INIMIGO
18. Duplo cerco em Canas – A derrota do exército romano, 216 a. C. .... 263 19. A ambição de um rei em Pavia – A ruína de França em Itália,
1524 ... 277 20. A grande batalha de Leipzig – A queda do império germânico
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INTRODUÇÃO
Principais causas das derrotas militares
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undamentalmente, este livro pode ser encarado como um guia do que não fazer na arte da guerra, um tema que merece uma análise pormenorizada. Ler sobre a ruína de grandes projetos, a des-truição de exércitos e o desmoronamento da fama militar é um prazer que persiste, ainda que culpado, mas justificado pelas lições que se podem aprender com o passado. Quando perguntaram ao duque de Wellington, já de idade avançada, o que aprendera com o serviço prestado na campanha do duque de York nos Países Baixos, ele res-pondeu: «Aprendi o que não fazer, e isso já é alguma coisa.»Ao longo dos tempos, vários especialistas em teoria militar bateram--se por formular as regras da guerra. O resulado das suas conclusões está muito bem condensado nos Princípios da Guerra atualmente ensi-nados no exército britânico: seleção e manutenção do alvo; concen-tração de força; economia de esforço; manutenção do moral; ação ofensiva; flexibilidade; cooperação; segurança; surpresa; e sustenta-bilidade. Claro que, sendo a guerra uma arte e não uma ciência, a aplicação destes princípios não é garantia de vitória, mas deverá aju-dar a evitar um desastre. Isto se tudo decorrer conforme o previsto, o que nunca acontece. Em todas as épocas é possível identificar coman-dantes que fizeram tudo certo pelas razões certas, mas que foram derrotados pela mais inexorável das leis da guerra – a de Murphy.
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«O sucesso tem muitos pais», diz -se. «O fracasso é órfão.» Na verdade, contudo, o fracasso – sob a forma de desastre militar – também tem muitos pais. As causas de uma derrota são inúmeras e diversificadas. Atribuir um desastre, seja ele qual for, a uma causa seria simplificar de forma redutora, mas em termos de grandes causas, podemos identificar as seguintes: excessiva dependência da tecnologia (Monte Tabor, Flodden, Verdun, Dien Bien Phu); utilização deficitária ou mau conhecimento da tecnologia (Crécy, Fredericksburg); excesso de confiança (Sicília, a floresta de Teuto-burgo, Little Bighorn, Isandlwana, Estalinegrado). Em alguns casos, um dos exércitos em confronto não estava simplesmente preparado para os problemas colocados pela localização geográfica (Saratoga, Moscovo). A esta lista poder -se -ia acrescentar: incapacidade de previsão; incapacidade de adaptação; incapacidade de aprender; e, talvez o mais importante, subestimação do inimigo.
A derrota de uns é a vitória de outros – em diversos casos, o exército derrotado era simplesmente inferior. Outro prazer secreto, claro, é sentar -se à lareira, confortável, e criticar os derrotados, esquecendo que talvez estivessem cansados, com frio, com fome, mal -informados, sob pressão e debaixo de fogo. Em particular a partir da década de 1930, desenvolveu -se um hábito de pensamento que equipara «desastre militar» a «deslize militar», perpetrado por incapazes (quase todos aristocratas) que levavam, ou na maior parte das vezes mandavam, os homens para a morte por pura incom-petência. O professor Norman Dixon, no seu livro A Psicologia da
Incompetência dos Militares, sugere que as organizações militares, por natureza, atraem e privilegiam indivíduos rígidos, de mente taca-nha e inteligência limitada que provavelmente conduzirão tropas ao desastre.
De facto, em muitas das batalhas descritas neste livro, os líderes do lado derrotado eram homens de guerra bastante experientes, que deram o seu melhor em circunstâncias e sob pressões que nem con-seguimos imaginar. Muitos pagaram com a vida derrotas pelas quais
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eram culpados apenas parcialmente. Muitas vezes as condições que conduziram à derrota foram criadas bem antes de a guerra começar por trapalhadas políticas e diplomáticas, negligência para com os exércitos em tempo de paz, ou pela imposição de missões impossí-veis a exércitos e comandantes. Os verdadeiros responsáimpossí-veis – polí-ticos sem nome e há muito esquecidos – escapam à culpa atribuindo -a aos generais.
Alguns comandantes – vêm -nos à memória Aníbal, Robert E. Lee e Napoleão – atingiram, durante algum tempo, uma reputação tal que os inimigos já estavam meio derrotados antes sequer de a bata-lha se iniciar. Mas estes mestres na arte da guerra estavam muitas vezes destinados a tornar -se instrutores dos inimigos. «Estes ani-mais aprenderam alguma coisa!», comentou Napoleão ao ver as tropas inimigas em manobras no verão de 1813. De facto, assim foi, como ele próprio viria a constatar em Leipzig. Ao derrotar os suecos em Poltava em 1709 ao fim de tantos anos de perdas, Pedro, o Grande, da Rússia brindou aos oficiais suecos capturados que recebeu ao jantar desse dia como «os nossos professores na arte da guerra».
A derrota, então, pode ser uma escola de vitória. Quem a ela sobrevive pode emergir, como Cipião no massacre de Canas, e tornar -se posteriormente vitorioso. O marechal de campo Sir William Slim, que liderou um exército derrotado em retirada da Birmânia em 1942 e o reconduziu à vitória em 1944 -5, descreveu o sentimento de um comandante derrotado no livro Defeat into Victory (Derrota em Vitória). «A derrota é amarga. Amarga para o soldado raso, mas três vezes mais amarga para o general. O soldado ainda pode ter o con-solo de, seja qual for o resultado, ter cumprido o seu dever fielmente e com firmeza, mas o comandante fracassou no seu dever se não alcançou a vitória, pois é esse o seu dever. Não tem outro equiva-lente.» Slim explica ainda como o general derrotado se culpa por ter falhado perante os seus homens e o seu país, e como questiona a sua liderança e até a sua masculinidade. «Então, tem de parar! Porque se quiser voltar a comandar numa batalha, tem de se livrar dessas
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mágoas e esmagá -las, porque elas desgastam a sua determinação e a autoconfiança. Tem de rechaçar esses ataques que desencadeia con-tra si mesmo e afastar as dúvidas decorrentes do fracasso. Esquecê--las e lembrar -se apenas das lições a tirar da derrota, que são mais numerosas do que as da vitória.»