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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 0980/12

Data do Acordão: 06-03-2013

Tribunal: 2 SECÇÃO

Relator: LINO RIBEIRO

Descritores: SISA

RESERVA DE PROPRIEDADE

Sumário: I - Para efeitos do nº 16 do artigo 8º do CIMSISSD, a resolução,

invalidade ou extinção do contrato por acordo das partes (distrato) só é considerado facto tributário sujeito a sisa quando tiver por efeito uma transmissão onerosa do direito de propriedade;

II - O distrate do contrato de compra e de venda com reserva de propriedade não se subsume no disposto no artigo 8°, nº 16 do

CIMSISSD, pois, como a reserva da propriedade difere a transmissão do direito de propriedade, o distrate não pode ter como consequência o efeito translativo da propriedade.

Nº Convencional: JSTA000P15423

Nº do Documento: SA2201303060980

Data de Entrada: 24-09-2012

Recorrente: A..., LDA

Recorrido 1: FAZENDA PÚBLICA

Votação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal

Administrativo

1.1. A………, Lda, com os demais sinais dos autos, interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 26 de Maio de 2011, que julgou improcedente a impugnação

judicial da liquidação de sisa, no valor de €12.697,50.

Nas respectivas alegações de recurso formulou as seguintes conclusões:

1. Em 03/02/2003 a Recorrente celebrou, por escritura pública, um contrato de compra e venda de dois imóveis, com reserva de

propriedade, até integral pagamento da totalidade do preço por parte dos adquirentes.

2. Não tendo os adquirentes pago o preço acordado as Partes, em 23/12/2003, distratam o referido contrato de compra e venda.

3. A Sentença recorrida, à semelhança da Administração Fiscal, entende que o supra mencionado Distrate consiste numa extinção do contrato de compra e venda e como tal sujeito a imposto municipal de SISA, nos termos do disposto no artigo 8º, nº 16, do CIMSISSD.

4. Sucede, que a interpretação e aplicação do disposto no supra referido preceito legal ao caso em apreço é manifestamente incorrecta. Senão vejamos.

5. O disposto no artigo 8º, nº 16 do CIMSISSD procura tributar as situações em que ocorre a extinção de um contrato de compra e venda por força do qual a propriedade foi transmitida, jurídica ou economicamente, para o adquirente.

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adquirente em resultado do contrato de compra e venda, a sua extinção irá naturalmente operar uma segunda transmissão, desta vez do adquirente para o alienante.

7. O que não sucedeu no caso em apreço.

8. Com efeito, tendo o contrato de compra e venda sido celebrado com reserva de propriedade, esta não foi de imediato transmitida para os adquirentes. A propriedade só seria transmitida, se, e quando os adquirentes pagassem o preço.

9. À reserva de propriedade, prevista nos artigos 409° e 934° do C. Civil, consiste numa cláusula pela qual as partes, num contrato de compra e venda estipulam que a propriedade do bem não se

transmite com a celebração do contrato, mas sim após a verificação de um evento futuro e incerto (que no caso concreto se traduz no pagamento integral do preço).

10. A propriedade dos imóveis aqui em causa não se transmitiu para os adquirentes no momento da celebração do contrato, nem

posteriormente, porque a condição de que dependia a realização dessa transmissão – pagamento integral do preço – não se verificou. 11. Ou seja, no caso em apreço, os adquirentes nunca chegaram adquirir a propriedade dos imóveis, que sempre permaneceu na titularidade da Recorrente.

12. Saliente-se que isto é verdade quer do ponto de vista jurídico, quer ainda do ponto de vista económico.

13. Pois, ainda que tenha havido posse dos imóveis por parte dos adquirentes, essa posse não é relevante para efeitos de tributação em sede de imposto da SISA, porquanto não se trata de uma posse em nome próprio, mas sim uma posse em nome alheio.

14. Ora, porque de facto, nestas situações, não existe transmissão da propriedade dos imóveis, o artigo 47°, § único do CIMSISSD, prevê a possibilidade dos adquirentes solicitarem o reembolso do imposto municipal da SISA, pago aquando da celebração do contrato.

15. De facto, embora em regra a liquidação do imposto municipal da SISA seja um acto definitivo e executório, nas situações previstas no artigo 47° do CIMSISSD, ou seja, nas situações de contratos de compra e venda com reserva de propriedade, a liquidação tem carácter condicional e provisório, ficando sem efeito se o acto ou facto translativo não se realizar.

16. Assim, não tendo a propriedade sido transmitida para os adquirentes, extinção do respectivo contrato de compra e venda, naturalmente não opera um “retransmissão” da propriedade para a Recorrente.

17. Pois, os adquirentes nunca poderiam transmitir um direito que nunca o tiveram, quer jurídica, quer economicamente.

18. Ou seja, a extinção do contrato de compra e venda, com reserva de propriedade, não operou qualquer transmissão, económica ou jurídica, da propriedade dos imóveis para a Recorrente, porquanto esta nunca deixou de a ter.

19. “Da mesma maneira, o alienante que autorizou o adquirente a tomar posse do imóvel e que, por força do não cumprimento da condição vier a ser restituído da posse do bem, não está sujeito a IMT, dado que nunca deixou de ser o titular do direito de propriedade

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por força da reserva estipulada” (cfr. CIMT anot. e coment. J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Feitas, EngiFisco, 1° ed, 2005, a propósito do disposto no artigo 22º, que corresponde com algumas alterações ao art. 47º do CIMSISSD).

20. “Deve, pois, considerar-se que a configuração jurídica do contrato sob condição suspensiva se sobrepõe ao conceito de transmissão fiscal, na parte que tem a ver com a resolução do contrato e os seus efeitos” (cfr. obra supra citada).

21. Assim e face ao supra exposto podemos devemos concluir que o Distrate do contrato de compra e de venda com reserva de

propriedade, aqui em causa, não se subsume no disposto no artigo 8°, nº 16 do CIMSISSD.

22. Pois, apesar de estarmos perante uma forma de extinção de um contrato de compra e venda de imóveis, o Distrate não tem o efeito de “retransmissão” da propriedade à aqui Recorrente.

23. E isto porque, em resultado da reserva da propriedade, a Recorrente nunca transmitiu aos adquirentes o Direito de

propriedade, quer do ponto de vista jurídico, quer do ponto de vista económico.

24. A situação em apreço deve antes ser integrada no disposto no artigo 47° do CIMSISSD, que expressamente estabelece que não se verificando a condição suspensiva – no caso concreto o pagamento integral do preço – a transmissão jurídica e económica da

propriedade não se

efectiva para o adquirente.

25. Ora, não sendo os adquirentes titulares do direito de propriedade (jurídica e economicamente), os mesmos jamais a poderia transmitir para a Recorrente.

26. Assim, ao contrário do decidido na Sentença Recorrida, os actos de liquidação de SISA são de facto ilegais, devendo os mesmos ser anulados, com as legais consequências designadamente ao nível do reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido dos

respectivos juros indemnizatórios.

27. Com efeito, do exposto resulta claro que as liquidações foram emitidas por erro da Administração Fiscal, na interpretação e aplicação das normas legais relevantes in casu, pelo que tendo a Recorrente procedido ao pagamento das liquidações do imposto municipal de SISA, a mesma tem direito ao seu reembolso, bem como aos correspondentes juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 61° do CPPT.

28. Deste modo, podemos e devemos concluir que a Sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação e aplicação das normas legais relevantes in casu, designadamente do disposto nos artigos 8°, nº 16 e 47° do CIMSISSD, e ainda do disposto no artigo 61° do

CPPT, devendo a mesma ser anulada e/ou revogada.

1.2. Não houve contra-alegações.

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no

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de compra e venda com estas características não está sujeito à incidência de sisa, pela decisiva razão de que a nova transmissão para o proprietário dos poderes parcelares anteriormente alienados não foi onerosa, na medida em que dela não resultou qualquer

acréscimo de rendimento ou património, apenas restituição do preço pago pelos compradores, em cumprimento do acordado no contrato de compra e venda».

2. A sentença deu como provados os seguintes factos:

1 - Em 22 de Dezembro de 2003, a impugnante procedeu ao pagamento da sisa, na importância de €4.875,00 e de €8.092,50, respeitante aos prédios inscritos sob os art°s 854 e 853, nos termos constantes de fls. 48 e 50 destes autos e que aqui se dão por

reproduzidas.

2 - Contra os actos de liquidação identificados em 1), a impugnante deduziu reclamação graciosa, cfr. fls. 27 a 35 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.

3 - A reclamação graciosa referida em 2) foi objecto de despacho de indeferimento, cfr. fls. 23 a 25 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.

4 - Por escritura celebrada em 03.02.2003 a impugnante alienou dois prédios, a B……… e mulher, cfr. fls. 38 a 41 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.

5 - A alienação dos referidos prédios foi efectuada com reserva de propriedade a favor da impugnante até integral pagamento do preço acordado, cfr. fls. 40 destes autos.

6 - Por escritura celebrada em 23.12.2003 a impugnante e os adquirentes outorgaram o distrate do contrato de compra e venda identificado em 4), cfr. 43 a 46 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.

3.1. A recorrente impugnou o imposto de sisa que foi liquidado em consequência da celebração de uma escritura pública do distrate de um contrato de compra e venda de dois imóveis que havia outorgado com reserva de propriedade.

A sentença recorrida, invocando o nº 16 do artigo 8º do CIMSISSD, vigente na data da escritura, julgou improcedente a impugnação com o argumento de que, naquela norma «o legislador quis tributar não só as transmissões de bens ocorridas aquando da celebração do

contrato de compra e venda, mas igualmente aquelas outras, que se operam quando esse contrato é extinto por vontade das partes. E isso porque, muito embora se considere que o segundo contrato

restabelece a situação existente à data da compra e venda, entende-se que cada uma dessas transmissões é autónoma e resulta da celebração de contratos indiferenciados e que, sendo assim, cada uma dela faz nascer de per si, o facto tributário gerador da obrigação de imposto».

A recorrente discorda desse julgamento por entender que o distrate do contrato de compra e de venda com reserva de propriedade não se subsume no disposto no artigo 8°, nº 16 do CIMSISSD, uma vez que,

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em resultado da reserva da propriedade, nunca transmitiu aos

adquirentes o direito de propriedade, quer do ponto de vista jurídico, quer do ponto de vista económico.

A disposição convocada à resolução da controvérsia diz o seguinte: «Em virtude do disposto no artigo 2.º são sujeitas a sisa,

nomeadamente; (…) 16. A resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, do contrato de compra e venda ou troca de bens imóveis, e as do respectivo contrato-promessa, quando, neste último caso, ocorrerem depois de passados 10 anos sobre a tradição ou posse». E referido artigo 2º estabelece que «a sisa incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis».

Da conjugação das duas normas resulta que a resolução, invalidade ou extinção do contrato por acordo das partes (distrato) só é

considerado facto tributário sujeito a sisa porque representa uma transmissão onerada do direito de propriedade. Na verdade, quando no corpo da norma se refere «em virtude do disposto do artigo 2º», o sentido só pode ser o de se considerar o distrate como facto tributário nas situações em que ele produz o efeito translativo da propriedade. Ora, esse efeito de transmissão da propriedade só pode verificar-se se no momento do distrate o comprador ou o promitente-comprador já é um adquirente «a domino». Como se sabe, para haver transmissão de direitos é preciso que o direito exista na esfera jurídica do

transmitente, pois nemo plus juris in alium transferre potest quam ipse habet. Significa isto que o contrato de compra e venda e o contrato-promessa em que se funda ou filia o direito do comprador já

produziram efeitos reais quando ocorre o “mútuo acordo” que os faz cessar. Sem a produção do efeito translativo da propriedade na esfera jurídica do comprador não se poderia falar de (re) transmissão do direito anteriormente adquirido.

No contrato de compra e venda, a transmissão da propriedade dá-se por mero efeito do contrato, não dependendo nem da traditio nem da posse simbólica nem de quaisquer outras formalidades externas (cfr. arts. 408º, 874º e 979º, al. a) do CCv). Já no contrato-promessa, mesmo que tenha eficácia real, o direito de propriedade só se

transmite com a celebração definitiva do contrato prometido ou com a sentença que determine a execução específica e que, por esse efeito, o prédio passe para o domínio do comprador (cfr. arts. 413º e 830º do CCv).

Na hipótese de contrato-promessa não cumprido, e por conseguinte, sem que o efeito translativo ainda se tenha produzido, a norma acima transcrita arvora em facto tributário a rescisão, invalidade ou extinção por acordo dos contratantes, o que a primeira vista poderia parecer que, para efeitos fiscais, poderia haver «transmissão de propriedade» sem que o transmitente fosse dono do prédio. Todavia, a lei só

considera existir facto tributário se tais factos extintivos ocorrem após 10 anos de posse.

Para efeito de sisa, as promessas de compra e venda ou troca de imóveis, acompanhada da tradição do imóvel, constituem transmissão do direito de propriedade (art. 2º § 1, nº 2 do CIMSISSD), pois, se assim não fosse, poderia conseguir-se a transferência de propriedade

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através das regras da usucapião, fugindo-se ao pagamento do

imposto. Mas, uma vez que está sujeito a sisa, o distrate do contrato promessa só pode produzir o efeito translativo se o promissário tiver adquirido o direito de propriedade apesar do contrato-promessa não ter sido cumprido. Ora, isso só ocorre através da usucapião, que é uma aquisição originária derivada da posse traduzida na prática de actos correspondentes ao direito de propriedade durante um

determinado número de anos. É por isso que o nº 16 do artigo 8º do CIMSISSD apenas sujeita a sisa o distrate do contrato promessa após 10 anos de posse, que é o prazo para usucapir, com título de aquisição e de boa fé (cfr. arts. 1294º. 1295º do CCv).

Se dúvidas houvessem, de que o distrate também deve produzir o efeito translativo da propriedade para que possa servir de

pressuposto objectivo da sisa, elas ficam dissipadas com a exigência da posse por 10 anos por parte do promitente comprador, pois

através desse modo de aquisição extingue-se o direito do proprietário anterior, adquirindo o usucapiente um direito novo da mesma

natureza e conteúdo, tornado assim possível a transmissão para o anterior proprietário.

Ora, a exigência de que o distrate deve produzir o efeito translativo da propriedade para que seja passível de tributação afasta do alcance da norma o contrato de compra e venda com reserva de propriedade, na medida em que esta cláusula suspende a transferência do

domínio. E nem a equiparação desta figura jurídica ao regime do distrate do contrato promessa se poderia fazer, porque na venda com reserva de propriedade o comprador não pode, em caso algum,

adquirir por usucapião, tendo em conta o disposto no artigo 317º nº 3 do Ccv.

A reserva de propriedade é um conceito que no direito fiscal mantém rigorosamente o mesmo significado que tem no direito privado. O CIMSISSD faz-lhe referência, como acontece no artigo 47º, mas não lhe dá um sentido específico, que o afaste expressamente da

regulamentação jurídico-privada. E por isso mesmo, em aplicação do nº 2 do artigo 11º da LGT, é preciso determinar a natureza jurídica da reserva de propriedade no contrato de compra e venda, para se saber se tal cláusula implica ou não a transferência do domínio para o

comprador.

Várias são as teses que a doutrina portuguesa tem avançado para explicar a figura da reserva da propriedade, cuja opção se reflecte nas posições jurídicas subjectivas do vendedor e do comprador no negócio celebrado com essa cláusula:

(i) uns, advogam a tese da condição resolutiva, segundo a qual a propriedade transmite-se para o comprador com a conclusão do contrato, mas o seu direito está resolutivamente condicionado ao pagamento do preço (cfr. Cunha Gonçalves, Da Compra e Venda no direito comercial português, Coimbra Editora, 1925 e Tratado de Direito Civil, Vol, III, pág. 349);

(ii) outros, defendem que a venda com reserva de propriedade é uma alienação sujeita a condição suspensiva, segunda a qual os efeitos do negócio produzem-se integralmente, ficando apenas suspenso o efeito translativo (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil

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Anotado, Vol. I, pág. 334, Galvão Teles, Das Obrigações, 7ª ed. pág. 83 e 471, Almeida Costa, Direito das Obrigações, 7ª ed. pág. 250; (iii) outros, consideram a reserva de propriedade como um direito real de garantia, tese segundo a qual o vendedor não tem quaisquer

faculdades de gozo, apenas podendo obter a restituição da coisa depois de resolvido o contrato, funcionando a propriedade como uma garantia do pagamento do crédito do preço em caso de

incumprimento e o comprador é o titular do direito de propriedade desde o momento da conclusão do contrato (cfr. Lima Pinheiro, A cláusula de reserva de propriedade, Estudos de direito civil, direito comercial e direito comercial internacional, Coimbra, Almedina, 2006., pág. 65 e Pinto Duarte, Curso de Direito Reais, Lisboa, Principia, 2002, pág. 250 e 25);

(iv) e outros ainda, defendem que se trata de uma venda com efeito translativo diferido, em que o comprador, na pendência do contrato, é titular de uma expectativa jurídica de natureza real, qualificada como direito real de aquisição (cfr. Ana Maria Peralta, A posição do

comprador na compra e venda com reserva de propriedade, Almedina, 1990, pág. 152; e Menezes Leitão, Garantia das Obrigações, Almedina, 2006, pág. 267).

Independentemente da posição que se tome sobre a natureza jurídica da reserva de propriedade uma coisa é certa: no nosso direito, o vendedor permanece proprietário da coisa até ao final do contrato, mais correctamente, até ao pagamento integral do preço ou à

verificação do evento de que depende a transferência da propriedade. O artigo 409º do Código Civil prescreve que «nos contratos de

alienação é lícito ao alienante reservar para si a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações de outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento».

Portanto, ainda que se admita que a posição jurídica do vendedor não seja de propriedade plena, estando o seus poderes limitados ou

“reduzidos” a uma função de garantia, e que a posição jurídica do comprador se traduz numa expectativa real de aquisição, o

comprador nunca pode ser considerado dominus, uma vez que a coisa alienada faz parte do património do vendedor até ao pagamento do preço.

Ora, se é certo que do artigo 409º do CCv resulta que o comprador não adquire a plena propriedade da coisa no momento da conclusão do contrato, então não se pode concluir que o distrate do contrato tenha como consequência o efeito translativo da propriedade. Por efeito do distrate, o que eventualmente poderá cessar, seguindo uma das posições doutrinárias acima referidas, é a expectativa jurídica com eficácia real do comprador e a garantia que representa para o vendedor a propriedade reservada. O que o distrate produz é a cessação do efeito translativo que foi diferido para um momento diverso do da celebração do contrato, como forma de garantir o vendedor no que respeita ao pagamento do preço, e não a

constituição de um novo efeito translativo, pois a expectativa jurídica do comprador não corresponde a titularidade de um ius in re que permitisse criar esse efeito.

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reserva de propriedade não constitui um facto translativo de bens que possa ser incluído no âmbito do nº 16 do artigo 8º do CIMSISSD, o que conduz ao provimento do recurso.

3.2. A recorrente peticionou juros indemnizatórios derivados de erro na liquidação da sisa, que deve ser imputado aos serviços.

A sentença recorrida, tendo julgado improcedente a impugnação, naturalmente que também julgou improcedente o pedido de juros indemnizatórios.

Mas, sendo o recurso favorável ao sujeito passivo, em consequência da anulação do acto impugnado, não só se impõe a imediata e plena reconstituição da situação objecto do litígio, que passa pela

restituição do imposto ilegalmente liquidado, como o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso (cfr. art. 100º da LGT). Ora, a exigência ilegal da sisa apenas ocorreu por «erro imputável aos serviços», até porque a proposta de decisão do pedido efectuado pela recorrente estava suficientemente fundamentada no sentido de se anular a liquidação da sisa, por inexistência de facto tributário. Há um vício substancial do acto impugnado, que é imputável à “culpa funcional” do pessoal dos serviços tributários, e que originou prejuízos à impugnante que devem ser reparados através do

pagamento de juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43º da LGT e 61º do CPPT.

Justifica-se, pois, a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal desde 22 de Dezembro de 2003, data em que a recorrente pagou as liquidações anuladas, até à data em que vier a ser emitida a nota de crédito a seu favor.

4. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder

provimento ao recurso jurisdicional, revogar a sentença recorrida, julgar procedente a impugnação, anular o acto impugnado e ordenar a restituição das quantias liquidadas, acrescidas de juros

indemnizatórios, à taxa legal, desde 22 de Dezembro de 2003 até à data em que vier a ser emitida nota de crédito a favor da recorrente. Custas pela Fazenda Pública, na 1ª instância.

Lisboa, 6 de Março de 2013. – Lino Ribeiro (relator) – Dulce Neto - Isabel Marques da Silva.

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