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Círculo da sustentabilidade : um método didático-pedagógico para avaliar a sustentabilidade de assentamentos rurais na Amazônia norte mato-grossense

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE ENGENHARIA AGRÍCOLA

WAGNER GERVAZIO

CÍRCULO DA SUSTENTABILIDADE:

UM MÉTODO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO PARA AVALIAR A

SUSTENTABILIDADE DE ASSENTAMENTOS RURAIS NA

AMAZÔNIA NORTE MATO-GROSSENSE

CAMPINAS 2019

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WAGNER GERVAZIO

CÍRCULO DA SUSTENTABILIDADE:

UM MÉTODO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO PARA AVALIAR A

SUSTENTABILIDADE DE ASSENTAMENTOS RURAIS NA

AMAZÔNIA NORTE MATO-GROSSENSE

Tese apresentada à Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em Engenharia Agrícola, na área de Gestão de Sistemas na Agricultura e Desenvolvimento Rural.

Orientadora: Profa. Dra. Sonia Maria Pessoa Pereira Bergamasco

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELO ALUNO WAGNER GERVAZIO E ORIENTADO PELA PROFA. DRA. SONIA MARIA PESSOA PEREIRA BERGAMASCO.

CAMPINAS 2019

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CNPq, 160488/2015-0

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Área de Engenharia e Arquitetura Elizangela Aparecida dos Santos Souza - CRB 8/8098

Gervazio, Wagner, 1982-

G329c Círculo da sustentabilidade: um método didático-pedagógico para avaliar a sustentabilidade de assentamentos rurais na Amazônia norte mato-grossense / Wagner Gervazio. – Campinas, SP: [s.n.], 2019.

Orientador: Sonia Maria Pessoa Pereira Bergamasco.

Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Agrícola.

1. Agricultura familiar. 2. Amazônia. 3. Assentamentos rurais. 4. Ecologia agrícola. 5. Reforma agrária. 6. Sustentabilidade. I. Bergamasco, Sonia Maria Pessoa Pereira, 1944-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia Agrícola. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Circle of sustainability: a didactic-pedagogical method to evaluate the sustainability of rural settlements in the northern amazon region of Mato Grosso

Palavras-chave em inglês: Family farming Amazon Rural settlements Agricultural ecology Land reform Sustainability

Área de concentração: Gestão de Sistemas na Agricultura e Desenvolvimento Rural Titulação: Doutor em Engenharia Agrícola

Banca examinadora:

Sonia Maria Pessoa Pereira Bergamasco [Orientadora] Delmonte Roboredo

Débora Monteiro do Amaral Abelardo Gonçalves Pinto Wilon Mazalla Neto

Data de defesa: 13-02-2019

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Este exemplar corresponde à redação final da Tese de Doutorado defendida por Wagner Gervazio, aprovada pela Comissão Julgadora em 13 de fevereiro de 2019, na Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas.

_______________________________________________________________ Profa. Dra. Sonia Maria Pessoa Pereira Bergamasco – Presidenta e Orientadora

_________________________________________________________________ Dr. Delmonte Roboredo – Membro Titular

_________________________________________________________________ Dra. Débora Monteiro do Amaral – Membro Titular

_________________________________________________________________ Dr. Abelardo Gonçalves Pinto – Membro Titular

_________________________________________________________________ Dr. Wilon Mazalla Neto – Membro Titular

A ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do discente.

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Aos agricultores familiares assentados dos assentamentos rurais São Pedro, em Paranaíta-MT e do PDS São Paulo em Carlinda-MT, dedico!

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Agradecimentos

Não conseguiria desenvolver este trabalho se não fosse por várias instituições e pessoas.

Por isso, meus mais sinceros agradecimentos…

À Universidade Estadual de Campinas - Unicamp, em especial à Faculdade de Engenharia Agrícola - Feagri.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq pela concessão de bolsa no Brasil e pelo Doutorado Sanduíche.

À Professora Doutora Sonia Maria Pessoa Pereira Bergamasco pela orientação, pelos ensinamentos e amizade.

Aos professores e funcionários do Programa de Pós-graduação em Engenharia Agrícola.

Ao Professor Doutor Delmonte Roboredo pela amizade e pela força que me deu em prestar o doutorado na Unicamp.

À Universidade Nacional Autônoma do México - Unam, em especial aos professores Narciso Barrera-Bassols e Ana Isabel Moreno-Calles - na qual realizei o doutorado sanduíche.

Aos companheiros do Laboratório de Comunicação e Extensão da Feagri e do doutorado, em especial a amiga Francine Procópio pelo companheirismo.

Aos meus familiares, minha mãe Lourdes Félix da Rocha Gervazio, ao meu pai Orival Gervazio, aos meus irmãos Marcos Paulo Gervazio, Adriana Gervazio, Ana Paula Gervazio e João Ricardo Gervazio (in memoriam) e aos sobrinhos e sobrinhas. Em especial, agradeço à minha irmã Ana Paula por ter feito alguns pratos como torta, para os encontros no Assentamento São Pedro.

Aos agricultores familiares assentados dos Assentamentos São Pedro em Paranaíta-MT e PDS São Paulo em Carlinda-MT pela construção do conhecimento e pela participação neste projeto.

À Simone Cordeiro, pela compreensão, companheirismo e amor.

À família do Roberto Lopes, Iracy de Oliveira Andrade Lopes, João Paulo Andrade Lopes e Paulo Roberto Andrade Lopes pela hospedagem em sua casa, pela amizade e pela companhia que tornaram a vida longe dos meus familiares menos solitária e pelas

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namoradas dos amigos João Paulo e Paulo Roberto, Stefani Monteiro e Juliana Sccoco, respectivamente pela amizade.

Aos amigos do Bairro Videiras de Indaiatuba e aos amigos do Curso de Arquitetura do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio, Salto - SP, que conheci através do Paulo Roberto.

E acima de tudo, a Deus por contribuir com a minha transcendência e me tornar um homem melhor.

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“Sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo e nem ensino.” Paulo Freire

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RESUMO

Nosso trabalho propõe uma abordagem sobre tema bastante relevante no atual cenário rural no Brasil e no mundo, que é a sustentabilidade. Leonardo Boff analisa vários modelos que buscam sustentabilidade e dentre estes, apresenta o buen vivir1 dos povos originários da

América como sustentabilidade desejável. Neste modelo, há uma civilização focada no equilíbrio e na centralidade da vida com uma ética da suficiência para toda a comunidade e não apenas para o indivíduo. Nesta perspectiva, discutimos a sustentabilidade a partir do buen

vivir e da sua concretização através da agroecologia. Desenvolvemos este trabalho em dois

assentamentos rurais que se diferem pela forma de ocupação, formação e modalidade, na região da Amazônia norte mato-grossense. Propusemos a realização do trabalho nesta região devido à carência de estudos dentro de uma perspectiva participativa para avaliação da sustentabilidade. A pergunta que nos motivou a realizar esta pesquisa foi “como avaliar a sustentabilidade de assentamentos rurais diferentes na história, na forma de ocupação, organização e modalidade na Amazônia norte mato-grossense”? Acreditamos que a melhor forma para avaliar a sustentabilidade se dá por meio da coletividade e da participação dos agricultores familiares. Diante disso, o nosso objetivo foi o de construir um método para avaliar a sustentabilidade de dois assentamentos rurais que se diferem quanto à história, a forma de ocupação e organização/modalidade, para contribuir com a mudança da realidade local. Esta pesquisa quer se alinhar ao buen vivir para contribuir com referencial na mudança “da realidade social e política, colonial e colonizadora, para promover uma perspectiva que configura a vida com bem maior e inafiançável a favor da dignidade e da plenitude coletiva”. Chamamos este método didático-pedagógico de “Círculos da Sustentabilidade”. Este método foi construído a partir de cinco pontos: 1º – círculo de investigação de temas geradores; 2º – círculo da história do mundo dos sujeitos; 3º – círculo de diagnóstico dos assentamentos rurais; 4º – círculo de troca de saberes; e 5º – círculo das percepções e narrativas sustentáveis. Foram sete temas codificados: “Mudanças”; “Acampamento, Barraco, Luta”; “Assentamento, Associação, Comunidade, Gleba, Parcela, Terra, PDS; “Titulação da terra”; “Política”; “Boteco, Comunidade, Escola, Faculdade, Igreja, Leite, Trabalho”; e “Meio ambiente, SAF”. A caracterização dos assentamentos nos permitiu compreender como a sustentabilidade e o

buen vivir vai se construindo no processo histórico e dialético de cada sujeito e

consequentemente nos assentamentos. O diagnóstico foi um trabalho difícil, muito complexo, pois dependeu de nossa capacidade de percepção, de observação, de interpretação e de sistematização dos vários processos socioculturais e socioambientais e naturais presentes na realidade e que muitas vezes têm suas causas, seus efeitos e sua abrangência maiores que a área de estudo. Através da análise e da discussão dos resultados concluímos que a melhor forma de avaliação da sustentabilidade dos assentamentos rurais se dá por meio da coletividade e da participação dos sujeitos, à luz do contexto histórico e dialético; que a sustentabilidade é um processo histórico e dialético, portanto os assentamentos rurais estão em processo para serem sustentáveis e os processos de sustentabilidade dos assentamentos rurais diferem devido à história, à forma de ocupação, organização/modalidade e ao buen

vivir; os agricultores familiares utilizam diversos saberes e conhecimentos para avaliarem a

sustentabilidade dos assentamentos rurais.

Palavras-chave: Agroecologia; Buen vivir; Pesquisa participante; Temas geradores; Troca de saberes.

1

Bem viver - Buen Vivir ou Vivir Buen são palavras, em espanhol, usadas na América Latina para descrever alternativas para o desenvolvimento focado na bem viver em um sentido amplo. Para não perder o sentido original do conceito, nesta tese, optamos por não traduzir o termo buen vivir para o português.

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ABSTRACT

Our work proposes the approach on a very relevant topic in the current rural scenario in Brazil and in the world, which is sustainability. Leonardo Boff analyzes several models that seek sustainability and among them, presents the buen vivir of the peoples originating in America as desirable sustainability. In this model, there is a new civilization focused on the balance and centrality of life with an ethic of sufficiency for the whole community and not just for the individual. From this perspective, we discuss sustainability from the buen vivir and its implementation through Agroecology. We developed this work in two rural settlements that differ in them by the form of occupation, formation and modality, in the region of the north Amazon of Mato Grosso. We proposed carrying out the work in this region due to the lack of studies within a participatory perspective for sustainability assessment. The question that motivated us to carry out this research was "how to evaluate the sustainability of different rural settlements in history, in the form of occupation, organization and modality in the North Amazon of Mato Grosso"? We believe that the best way to assess sustainability is through the collectivity and participation of family farmers. In addition, our objective was to construct a method to evaluate the sustainability of two rural settlements that differ in history, occupation and organization / modality. We call this didactic-pedagogical method of "Circles of Sustainability". This method was constructed from five points: 1st - circle of investigation of generating themes; 2nd - circle of the history of the subject world; 3th - circle of diagnosis of rural settlements; 4th - circle of knowledge exchange; and 5th - circle of sustainable perceptions and narratives. There were seven codified themes: "Changes"; "Camp, Shack, Conflicts, Fight"; "Settlement, Association, Community, Plot, Land, PDS; "Land titling"; "Politics"; "Barroom, Community, School, College, Church, Milk, Work"; and "Environment, Agroforestry system". The characterization of the settlements allowed us to understand how sustainability and buen vivir is being built in the historical and dialectical process of each subject and consequently in the settlements. The diagnosis was a difficult and very complex work, because it depended on our capacity for perception, observation, interpretation and systematization of the various socio-cultural and socio-environmental and natural processes present and that often have their causes, their effects and their scope larger than the study area. Through the analysis and discussion of the results, we conclude that the best way to assess the sustainability of rural settlements is through collectivity and participation, in the light of the historical and dialectical context; that sustainability is a historical and dialectical process, so rural settlements are in the process of being sustainable and the process of sustainability of rural settlements differs from one another due to history, occupation, organization / modality and buen vivir; family farmers use a variety of knowledge and knowledge to assess the sustainability of rural settlements.

Key-word: Agroecology; Buen vivir; Participant research; Generating themes; Exchange of knowledge.

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SUMÁRIO

1 CÍRCULO INTRODUTÓRIO DA SUSTENTABILIDADE E DO BUEN VIVIR 13

1.1 Círculos antecedentes 13

1.2 Justificativa e problema da pesquisa 22

1.3 Objetivos 26

1.3.1 Geral 26

1.3.2 Específicos 26

1.4 Círculo estrutural da tese 27

2 CÍRCULO METODOLÓGICO 29

2.1 Pressupostos teórico-metodológicos 29

2.2 Pesquisa bibliográfica 32

2.3 Os sujeitos da pesquisa 32

2.4 Como se deu a avaliação da sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte

mato-grossense 39

2.4.1 Método didático-pedagógico Círculo da Sustentabilidade 41

2.5 Análise dos dados 49

3 CÍRCULO DE VIVÊNCIA/CODIFICAÇÃO E DA DESCODIFICAÇÃO DO MUNDO

DOS SUJEITOS NOS ASSENTAMENTOS RURAIS 51

3.1 Introdução 51

3.2 Círculo de investigação de temas geradoresn- codificar o “mundo” 52 3.3 Círculo da história do mundo dos sujeitos - História, formação e organização dos Assentamentos São Pedro e São Paulo na Amazônia norte mato-grossense 56 3.3.1Assentamento São Pedro em prosas e versos: Jardim do Éden e a conquista do paraíso. 66 3.3.2 Assentamento “Projeto de Desenvolvimento Sustentável” São Paulo - A luta pela terra

em tempos de acampamento 80

3.4 Considerações finais 97

4 CÍRCULO DO DIAGNÓSTICO: A DESCODIFICAÇÃO DOS ASSENTAMENTOS

RURAIS 100

4.1 Introdução 100

4.2 Círculo do diagnóstico do Assentamento São Pedro 101

4.3 Círculo do diagnóstico do Assentamento Projeto de Desenvolvimento Sustentável São

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4.4 Considerações finais 129 5 CÍRCULO DA DESCODIFICAÇÃO DA SUSTENTABILIDADE E DO BUEN VIVER DOS ASSENTAMENTOS RURAIS DA AMAZÔNIA NORTE MATO-GROSSENSE 137

5.1 Introdução 137

5.2 Círculo da troca de saberes - descodificar e ressignificar o mundo dos sujeitos 141 5.2.1 A sustentabilidade e o buen vivir do Assentamento São Pedro 141 5.2.2 A sustentabilidade e o buen vivir do Assentamento PDS São Paulo 145 5.3 Círculo das percepções e narrativas sustentáveis - descodificar e atuar no mundo dos

sujeitos 152

5.3.1 Percepções e narrativas sustentáveis do Assentamento São Pedro 153 5.3.2 Percepções e narrativas sustentáveis do PDS São Paulo 169 5.4 Contribuições da agroecologia para a sustentabilidade e o buen vivir dos assentamentos

rurais da Amazônia norte mato-grossense 165

5.5 Considerações finais 167

6 CÍRCULO CONCLUSIVO 169

7. CÍRCULO SOBRE A APLICAÇÃO, AS LIMITAÇÕES E OS DESAFIOS FUTUROS 179 7.1 Aplicação e limitações do “Círculo da Sustentabilidade” 179

7.2 Desafios: sugestões para futuros trabalhos 180

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 182

APÊNDICE 197

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1 CÍRCULO INTRODUTÓRIO DA SUSTENTABILIDADE E DO BUEN VIVIR

1.1 Círculos antecedentes

A presente tese representa um produto de nosso processo de formação durante o doutorado nos anos de 2015 a 2018. O doutorado foi desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Agrícola, na Área de Concentração “Gestão de Sistemas na Agricultura e Desenvolvimento Rural” da Faculdade de Engenharia Agrícola - Feagri, Universidade Estadual de Campinas - Unicamp. A orientação foi da Professora Doutora Sonia M. P. P. Bergamasco e com a contribuição da Professora Doutora Ana Isabel Moreno-Calles durante o doutorado sanduíche na Escuela Nacional de Estudios Superiores - Enes, Unidad

Morelia, Universidad Nacional Autónoma de México - Unam, de fevereiro a agosto de 2018.

Portanto, representa o esforço de quatro anos de diferentes momentos de leitura, de estudo, de formação e de debate construídos em contato com a cultura científica e com os saberes e conhecimentos de agricultoras e agricultores familiares de dois assentamentos rurais na Amazônia norte mato-grossense em torno da sustentabilidade e do buen vivir.

O termo sustentabilidade vem sendo usado na retórica de diversos autores em vários trabalhos científicos; por muitas organizações e/ou instituições, por ambientalistas, pela mídia, no embate político,enfim, um termo que está presente no nosso dia a dia. É utilizado nas mais diversas aspirações e projetos políticos, de acordo com o objetivo e o interesse de cada um. Ser sustentável é ser “politicamente correto”, dá credibilidade e vende uma “boa imagem”, ou seja, o termo vem sendo usado de forma banalizada.

Assim, compreendemos que a sustentabilidade provém de um processo histórico da crítica ao modo capitalista de como a sociedade vem usufruindo seus recursos naturais, das causas e principalmente das consequências que esse uso vem causando à Mãe Terra. “Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a humanidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo se torna cada vez mais interdependente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas” (CARTA DA TERRA, 2000). Não é segredo que estamos enfrentando uma emergência ambiental planetária, que coloca em perigo muitas espécies do planeta, incluindo nossa própria, e que a catástrofe em curso tem suas raízes no sistema econômico capitalista (FOSTER, 2011).

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Vários biólogos, astrônomos, geneticistas, bioquímicos, físicos, cientistas em geral, nos advertem sobre a ameaça que o planeta Terra corre devido ao modo como o tratamos. Estamos vivendo um período de crise mundial e esta não é só financeira e econômica, aliás, estas são cíclicas do sistema capitalista. Esta crise é sistêmica, de muitos aspectos, de esgotamento dos recursos naturais; é uma crise energética, alimentar, climática, uma crise da civilização e de seus valores. E essas contradições, produtos das modificações e respectivas adaptações dos seres vivos em sua evolução e coevolução, foram se formando ao longo de milhares de anos (MACHADO e MACHADO FILHO, 2014).

Mas, quando começamos a relação hostil com a natureza? Podemos datar o começo de nosso “erro”? A relação homem-natureza é tão antiga quanto à própria existência humana na Terra. O teólogo e escritor Leonardo Boff (2010) distingue três etapas na relação do ser humano com a natureza, a saber: interação/equilíbrio, intervenção e a agressão.

Segundo Boff (2010) na primeira etapa havia uma interação/equilíbrio entre humanos-natureza. Para Marx, havia uma “complexa interdependência entre os seres humanos e a natureza” (FOSTER, 2010, p. 223). Para o autor as relações do homem e da mulher com a natureza eram permeadas de mitos, rituais e magia, pois se tratava de relações divinas e para cada fenômeno natural havia um deus, uma entidade responsável e organizadora da vida no planeta. Boff (2010) ressalta que rituais eram utilizados para se “desculpar” pelo ato tão cruel que estava sendo cometido. Nesse sentido, afirma que natureza e homem eram a mesma coisa, havia uma dependência direta da natureza, e a natureza era vista como a deusa mãe. Ou seja, havia um metabolismo entre natureza e homem. Nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844, Foster (2010) revela que Marx tinha explicado que a natureza é o corpo do homem e ele deve manter um diálogo contínuo com a natureza se não quiser morrer, ou seja, o homem vive da natureza.

Na segunda fase da relação do ser humano com a natureza, Boff (2010) relata que foi o momento da intervenção, ou seja, o homo habilis surgiu e deu início ao rompimento do equilíbrio, sobrepondo-o à natureza. Para o autor, o homem dominou a natureza através do uso de tecnologias, fogo, pedras e passou de sobrevivente a dominador com a noção da capacidade que tinha para dominar a natureza.

O autor historiciza que essa relação de intervenção com a natureza começou há cerca de mais de 10 mil anos quando o ser humano passa de nômade para sedentário com a descoberta da agricultura. Nesse processo, ocorreu a desarticulação da relação de equilíbrio

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entre a natureza e o ser humano através da tecnificação e da artificialização de praticamente todas as nossas relações com o ambiente natural, a natureza e o homem passaram a ser duas coisas distintas (BOFF, 2010).

Boff (2010) conclui que, ao longo da história, os filósofos sempre fizeram estudos sobre a natureza e com o Renascimento o homem se colocou no centro do Universo (Antropocentrismo), consagrando a si mesmo um poder absoluto sobre a natureza e passou a considerar a natureza sem alma, sem vida, mecânica, geométrica. Assim, o autor afirma que o homem perdeu o conceito divino de integração com a natureza, transformou-se num ser fora e acima da natureza.

Na terceira fase da relação homem-natureza, Boff (2010) a chamou de agressão com a revolução do neolítico, com a revolução industrial, nuclear, biotecnológica, informática, automação e da nanotecnologia. Com a Revolução industrial a natureza passou a ser vista como fonte ilimitada de recursos naturais. “De ser inserido na natureza como parte dela, o ser humano transformou-se num ser fora e acima da natureza” (BOFF, 2010, p. 20). Para a economia, a natureza sempre foi o reino da abundância (LEFF, 2010).

A partir da Revolução Industrial, vivemos uma nova era geológica, o antropozoico, marcada pela época do antropoceno. Nesta época, a “dominação da natureza e a exploração de todos os seus bens e serviços, se caracteriza pela capacidade de destruição do ser humano, que acelerou o desaparecimento natural das espécies” (BOFF, 2015, p. 21).

A ciência contribuiu para a terceira fase: Francis Bacon proclamou que a sociedade humana e a natureza eram separadas; René Descartes, através do pensamento mecanicista-reducionista, preconizava que o homem assumisse uma posição de superioridade em relação ao meio natural (BOFF, 2010). A partir do pensamento ocidental se constrói uma maneira de ver e pensar o mundo, a partir de Descartes é fundada a ciência moderna, dissociando o objeto e o sujeito do conhecimento (LEFF, 2010). A ciência moderna cristalizava uma visão da natureza alheia ao homem, que deveria ser dominada por meio do conhecimento. A natureza passa a ser vista de modo cartesiano (subdividida em disciplinas). Esse processo colocou à margem o ser, ou seja, o ser do humano, o ser significador da vida e das coisas, do real e da natureza (LEFF, 2010). Logo, a relação ao longo dos últimos séculos, foi do domínio, da exploração, do uso irracional dos recursos naturais, do desrespeito ao Planeta Terra. Uma relação desarmônica, de competição, de predatismo e de parasitismo.

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Este processo de distanciamento, de desligamento do homem com a natureza, Marx descreveu no século XIX, chamado de “ruptura ou falha metabólica”. Marx empregou o conceito de metabolismo para descrever a relação humana com a natureza através do trabalho (FOSTER, 2010). E essa ruptura metabólica foi gerada pelo produtivismo capitalista (LÖWY, 2005). Para Foster (2010), esta ruptura expressa a alienação entre o homem e a natureza. A produção capitalista perturba a interação metabólica entre o homem e a terra e isso impede o retorno dos seus elementos constitutivos. O autor analisa que a divisão do trabalho, separou o camponês da terra, de uma relação íntima e tradicional com o solo e provocou uma “falha metabólica” incontornável no modo de produção capitalista (FOSTER, 2010). Diante disso:

[...] o conceito de falha metabólica de Marx na relação entre a cidade e o campo, entre os seres humanos e a terra, permitiu-lhe penetrar nas raízes do que foi às vezes chamado pelos historiadores de ‘segunda revolução agrícola’, que então ocorria no capitalismo, e da crise na agricultura associada a isto, permitindo assim que Marx desenvolvesse uma crítica da degradação ambiental que antecipava boa parte do pensamento ecológico hoje. [...] a crise da fertilidade do solo na agricultura europeia e norte-americana e os grandes avanços na ciência do solo na época do próprio Marx é que, todavia, iriam permitir que Marx transformasse esta abordagem histórica à questão da melhoria agrícola numa crítica ecológica da agricultura capitalista (FOSTER, 2010, p. 202 e 208).

Em “O capital, Marx já se havia convencido da natureza insustentável da agricultura capitalista” (FOSTER, 2010, p. 213). O autor analisa que “Marx desenvolveu uma crítica sistemática da ‘exploração’ capitalista do solo - incapacidade do solo de manter os meios de produção” (FOSTER, 2010, p. 218).

Na 1ª metade do século 20 o que predominou foi à degradação de valores e a produção em massa. Isso aumentou a produção de máquinas. Trouxe um grande impacto negativo sobre a natureza, o que os economistas denominam de externalidades do sistema econômico (LEFF, 2010). Essas externalidades são a alteração e possível desaparecimento dos ecossistemas, perda da biodiversidade, erosão do solo, contaminação do ar, do solo, da água por agrotóxico; a perda da camada de ozônio, a crise da água potável, o aumento das temperaturas terrestres – aquecimento global, etc.

Na 2ª metade do século 20, iniciou-se uma discussão sobre a possibilidade do retorno do homem à natureza, com o debate sobre o desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade em nível mundial. Porém, a discussão sobre o cuidado com a natureza e a sustentabilidade é bastante antiga. Para Leonardo Boff (2010), o conceito de sustentabilidade possui uma história de mais de 400 anos e surgiu a partir da silvicultura, o manejo das

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florestas. Para o autor, por volta dos anos de 1560, na Alemanha, surgiu a preocupação pelo uso racional das florestas, uma vez que a madeira era a matéria-prima principal da época. Neste contexto, surgiu a palavra Nachhaltigkeit, em alemão, que significa “sustentabilidade” e foi em 1713 que a palavra sustentabilidade se transformou num conceito estratégico devido à necessidade do uso sustentável das florestas (BOFF, 2016). Acredita-se que se não tratasse a madeira com cuidado, esta iria cessar o lucro.

Este conceito se manteve vivo e em 1947, na Suíça, foi criada a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). No documento intitulado World’s

Conservation Strategy o foco do conceito era a dimensão ambiental, apesar de aparecer no

conceito de desenvolvimento sustentável, as dimensões social e econômica.

Em 1962 nos EUA, Rachel Carson lançou o livro “Primavera silenciosa”, denunciando que o DDT (diclorodifeniltricloroetano) contaminava alimentos e até o leite humano. Causava mutações genéticas em pássaros, peixes e répteis. No ano de 1965 a expressão educação ambiental foi utilizada na Conferência de Educação da Universidade de Keele, na Grã-Bretanha. Outros livros lançados foram “The Population Bumb”, de Paul Earlich, em 1968 que tratava da questão da relação entre população e o meio ambiente; “The

Limits to Growth”, de Meadows e Randers, modelo matemático desenvolvido no MIT

(Massachussets Institute of Technology), “modelo MIT” ou Clube de Roma, em 1970. De forma sintética, o MIT constava a análise de cinco variáveis: população, produção industrial, produção alimentar e esgotamento dos recursos naturais, tomava o mundo como uma só unidade e fazia previsão do que poderia acontecer ao mundo se as tendências atuais se mantivessem (FAGNANI, 1997). Outro livro importante foi “Os limites do crescimento”, publicado na Conferência da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável em Estocolmo, Suécia em 1972.

Nessa Conferência da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável, foi estabelecido um conjunto de 26 princípios para oferecer aos povos do mundo inspiração e guia para preservar e melhorar o meio ambiente humano. Nesta época, a consciência ambiental começou a expandir e se definiram os limites da racionalidade econômica e os desafios que a degradação ambiental gera para o projeto civilizatório (LEFF, 2009). Ainda em 1972, surgiu o Modelo Bariloche. Foi desenvolvido pela Fundação Bariloche, e contradizia as conclusões do MIT. Mostrou que com políticas adequadas dentro de uma visão de sociedade

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equitativa, participativa e igualitária, o ambiente e seus recursos naturais não iriam impor barreiras para o atendimento das demandas sociais (FAGNANI, 1997).

No ano seguinte, em 1973 a noção de ecodesenvolvimento foi apresentado por Maurice Strong, diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em Genebra (SACHS, 2009). Posteriormente Ignacy Sachs aprimorou o conceito de ecodesenvolvimento, que deu origem, mais tarde, ao conceito de desenvolvimento sustentável. Em resumo, Sachs (1986) descreveu o ecodesenvolvimento como sendo um estilo de desenvolvimento que, em cada ecorregião, busca soluções específicas de seus problemas particulares, as necessidades imediatas como também aqueles em longo prazo. Ainda deixa claro que o ecodesenvolvimento foi pensado como estilo de desenvolvimento particularmente adaptado às regiões rurais dos países do terceiro mundo.

Em 1977 e 1978 foram lançados o Goals for Mankind por Ervin Laszlo e “Para uma Nova Ordem Internacional” de Tinbergem, respectivamente. No ano de 1984 a Assembleia Geral da ONU criou a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CMED). Em 1986 foi lançado o livro “Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir” de Ignacy Sachs além da Declaração de Estocolmo com 26 princípios que balizava a postura socioambiental de governos. Em 1987 foi publicado o Relatório “Nosso Futuro Comum” (relatório da comissão Brundthand) da ONU com a ideia de um tipo de desenvolvimento que estivesse em harmonia com a sociedade, a economia e o meio ambiente. Propunha que as gerações futuras deveriam ter os mesmos direitos que as presentes gerações, o que ficou conhecido como desenvolvimento sustentável.

Na década de 1990, aconteceu a 2ª Conferência mundial sobre o meio ambiente e desenvolvimento da ONU (Eco-92 ou Rio-92), também conhecida como Cúpula da Terra, onde se discutiu sobre a biodiversidade, o clima, os princípios da floresta e um programa de ações (as agendas 21). Nesta Conferência, o discurso do desenvolvimento sustentável foi legitimado, oficializado e difundido amplamente (LEFF, 2009). Ainda nesta década foi lançado a 1ª edição do Livro Azul, com um conjunto de 134 indicadores de sustentabilidade (1996).

Em 1997 aconteceu a Rio + 5 e no mesmo ano seguinte foi proposto o protocolo de Kyoto para a redução dos gases de efeito estufa (GEE). Em 2000, a publicação da Carta da Terra (2000), afirmou princípios interdependentes, que visava um modo de vida sustentável com critérios comuns, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações,

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empresas, governos e instituições transnacionais seriam guiados e avaliados (CARTA DA TERRA, 2000). No ano de 2001, os 134 indicadores constantes na 1ª edição do Livro Azul, foram reduzidos para 57 indicadores. Na África do Sul (Joanesburgo), em 2002, aconteceu a Conferência Rio + 10, com o objetivo de discutir o que havia sido realizado até o momento, renovar os compromissos firmados entre os países, avaliar os avanços e traçar meios de alcançar os objetivos definidos na Rio-92.

No ano de 2012, no RJ, aconteceu a Conferência Rio + 20, que teve por objetivo a renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação do progresso e das lacunas na implementação das decisões adotadas pelas principais cúpulas sobre o assunto e do tratamento de temas novos e emergentes.

Em 2015, aconteceu a publicação dos “Indicadores de desenvolvimento sustentável: Brasil 2015”, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, dando continuidade à sua trajetória iniciada em 2002. A presente edição teve como orientação as recomendações da Comissão para o Desenvolvimento Sustentável - CDS (Commission on Sustainable Development - CSD) da ONU, com adaptações à realidade brasileira.

Na Carta da Terra, foi evidenciada a preocupação em somarmos forças para gerarmos uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura de paz. Além disso, foi declarada nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações.

Diante da crise ambiental gerada pelo crescimento econômico, Leff (2010) afirma que um dos pontos importantes da economia foi a internalização das externalidades. Essa internalização deu lugar ao surgimento da economia ambiental e da economia ecológica que, ao invés de resolver a crise ambiental, contornou o problema criando conceitos e instrumentos para economizar ainda mais o mundo e capitalizar a natureza e a vida (LEFF, 2010).

Já Boff (2016) submete a uma crítica os vários modelos atuais que buscam sustentabilidade. O primeiro modelo apresentado é o “modelo-padrão de desenvolvimento sustentável” que segundo o autor é antropocêntrico, contraditório e equivocado. Para ele desenvolvimento sustentável obedece a lógicas diferentes e que se contrapõem.

O desenvolvimento é linear, deve ser crescente, supondo a exploração da natureza e privilegia a acumulação individual. Já a sustentabilidade é circular e includente; representa uma tendência dos ecossistemas ao equilíbrio

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dinâmico, à cooperação, à coevolução e a interdependência de todos com todos (BOFF, 2016, p. 45).

O segundo modelo analisado por Boff (2016) é o modelo do neocapitalismo. Segundo o autor, neste modelo há ausência de sustentabilidade, pois é um capitalismo modificado que aceita a regulação do estado. Já o terceiro é o modelo do capitalismo natural que Boff (2016) supõe ser uma sustentabilidade enganosa, por usar diversas estratégias para conferir-lhe sustentabilidade, ecoeficiência, imitar modelos biológicos etc. Nestes modelos “o desenvolvimento sustentável corresponde ao falso discurso ecologista esboçado pelos organismos internacionais, por meio de uma construção teórica ecotecnocrática” [...] (GUZMÁN, 2001, p. 42).

O quarto é o modelo da economia verde que, para o autor, é uma sustentabilidade fraca, pois usa da agricultura de baixo carbono, agricultura orgânica, energia solar, reciclagem, etc. Porém esses modelos acima citados contribuíram para uma transição de um modo de produção a uma sociedade igualitária e democrática. Levaria também a um “modo de vida alternativo, a uma civilização nova, ecossocialista, para além do reino do dinheiro, dos hábitos de consumo induzido e da produção ao infinito das mercadorias nocivas ao meio ambiente” (LÖWY, 2005, p. 49).

O ecossocialismo é o quinto modelo, sendo a sustentabilidade insuficiente, “trata-se de uma corrente de pensamento e de ação ecológica que faz suas as aquisições fundamentais do marxismo” (LÖWY, 2005, p. 44). É uma alternativa radical e prática ao sistema capitalista, generosa e atenta à sustentabilidade ambiental e social, mas não percebe o ser humano-Terra-universo, nem a vê, a Terra, como um organismo vivo, como Gaia (BOFF, 2016). Para os ecossocialistas a “lógica do mercado e do lucro são incompatíveis com a preservação do meio ambiente” (LÖWY, 2005, p. 44).

O outro modelo analisado pelo autor é o do ecodesenvolvimento ou da bioeconomia, sendo uma sustentabilidade possível, pois suas análises combinam economia ecologia, democracia, justiça e inclusão social (BOFF, 2016). O sexto modelo é o da economia solidária: a microssustentabilidade viável, porque para o autor a economia solidária é o que melhor materializa o conceito de sustentabilidade em direta oposição ao sistema mundial e é movida pelos ideais éticos de vida e da criação das condições para o buen vivir.

Por fim Boff (2016) apresenta o modelo do buen vivir (sumak kawsay ou suma

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focada no equilíbrio e na centralidade da vida com uma ética da suficiência para toda a comunidade e não apenas para o indivíduo. “Possui uma visão holística e integradora do ser humano inserido na grande comunidade terrenal, busca um caminho de equilíbrio e está em profunda comunhão com a Mãe Terra” (BOFF, 2016, p. 62). A ideia do buen vivir está se espalhando por toda a América Latina. É um conceito em construção que visa ir além do desenvolvimento convencional, e é baseado em uma sociedade onde os seres humanos coexistem entre si e com a natureza (GUDYNAS e ACOSTA, 2008). “O buen vivir é uma expressão gestada nas comunidades indígenas da Bolívia, Equador e Peru, a favor da saúde da Mãe Terra” (KEIM e SANTOS, 2012, p. 25).

Assim, Sumak Kawsay tornou-se um novo discurso adaptado à razão moderna e entrou nos debates da sustentabilidade (VANHULST e BELING, 2013). Neste intuito, o buen

vivir será a base para discutirmos a sustentabilidade a partir das narrativas e percepções dos

agricultores familiares dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense.

Neste sentido, a sustentabilidade enquanto uma nova racionalidade ambiental, tal como proposto por Leff, se dá pela agroecologia como sendo uma alternativa à lógica do neoliberalismo (GERVAZIO et al., 2016). Pensamos que em um contexto rural, camponês, a Agroecologia e a agricultura de base ecológica são as possibilidades de contribuir, na prática, para o buen vivir. Assim como a Agroecologia, “o buen vivir é um grito anticolonial que faz frente ao contexto neoliberal que denigre a vida e desumaniza as relações” (KEIM e SANTOS, 2012, p. 9).

Aqui entendemos agroecologia como sendo a “ciência que envolve, pratica e estuda as bases científicas para uma agricultura ecológica” (ALTIERI, 1989); funcionamento ecológico necessário para se praticar uma agricultura sustentável (GLIESSMAN, 2009). Isso, sem esquecer-se da equidade, ou seja, da busca da agroecologia a um acesso igualitário aos meios de vida (GUZMÁN, 2001). E ainda, que a Agroecologia “fornece as ferramentas necessárias para a participação da comunidade e que esta venha a se tornar a força geradora dos objetivos e atividades dos projetos de desenvolvimento” (ALTIERI, 2009, p. 27).

Para Guzmán (2001), Caporal e Costabeber (2015), a partir da agroecologia é possível repensarmos os estilos de desenvolvimento rural, dentro de uma perspectiva de sustentabilidade. Guzmán (2001) apresenta o enfoque agroecológico como contraponto à lógica do neoliberalismo e da globalização econômica. Acredita na importância do desenvolvimento local, endógeno e destaca a necessidade da construção e da reconstrução do

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conhecimento local, como estratégia para processos de transição agroecológica. A transição para a sustentabilidade implica a paulatina desconstrução da economia antiecológica e entropizante predominante (LEFF, 2010). Sob o paradigma da sustentabilidade, a agroecologia valida as diversas formas de apropriação do ecossistema entre cada cultura humana estudada, mediante análise comparativa (CASTILLO, 2002).

Nesta ótica, a agroecologia constitui uma alternativa ao atual modelo, pois busca a conservação ecológica e o aperfeiçoamento dos ciclos produtivos, atendendo às expectativas sociais e ambientais. É uma proposta de valorização das diversidades tanto no que tange às espécies silvestres e cultivadas nos agroecossistemas quanto aos meios de vida desenvolvidos por agricultores locais (ALTIERI, 1989). Afirma Altieri (1989) que a agroecologia tem contribuído para este objetivo, uma vez que investiga as relações entre os seres vivos na busca pela compreensão das consequências dessas relações para a agricultura, aplicando conceitos da ecologia para o redesenho e manejo sustentável dos agroecossistemas.

Guzmán insere a agroecologia como forma de resistir aos conflitos do capitalismo concretamente na sociedade e de ressignificar positivamente as contradições do mundo em novas formas de relação com a natureza e o trabalho (GERVAZIO et al., 2016). A agroecologia, então, atua tencionando a pretensa imutabilidade das relações sociais e a impossibilidade de transformar as expressões da opressão presentes na modernidade (MAZALLA NETO, 2015).

1.2 Justificativa e problema da pesquisa

Nossa investigação propõe uma abordagem sobre um tema bastante relevante no atual cenário rural no Brasil e no mundo, que é a sustentabilidade, por meio de um estudo em assentamentos rurais na região da Amazônia norte mato-grossense. Nos municípios da Amazônia norte mato-grossense, podemos registrar inúmeras experiências práticas que se baseiam nas possibilidades de garantir a sustentabilidade dos agroecossistemas.

Nos últimos 50 anos, a Amazônia brasileira sofreu intensas transformações ocorridas em função de um modelo de desenvolvimento exógeno imposto pelo Estado brasileiro e pelo capital internacional, resultando em drásticos impactos socioambientais ligados à questão fundiária, ao desmatamento e queimadas, à implantação de projetos hidrelétricos e à expansão da fronteira agrícola (IDESP, 2011). A soja é o “carro chefe” da expansão da fronteira agrícola. Para Oliveira (2006) a pressão sobre a floresta amazônica no

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Mato Grosso para o aumento da área cultivada com soja, tem a ver com a elevação dos índices de desmatamento no estado neste início do Século XXI, além da expansão da pecuária e da grilagem de terras. O desmatamento atingiu pico recorde na Amazônia em 2004 e o governo federal foi obrigado a agir para contê-lo (IMAZON, 2009).

A atuação do governo foi consolidada em 2009 para coibir os desmatadores, com as operações “Arco de Fogo” e “Arcoverde”, e o “Pacto Nacional Pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Amazônia Brasileira” (GREENPEACE, 2007). Diante disso, vários municípios foram incluídos na “lista do desmatamento”, inclusive os pertencentes à macrorregião norte do MT, os quais sofreram sanções econômicas e financeiras, como embargo agropecuário, além de serem proibidos de comercializar seus produtos e de receber crédito de instituições oficiais (PMS, 2014).

O Mato Grosso apresentou picos de aumento do desmatamento em 2011 e, em 2013, aumentou em 50% em relação a 2012 (INPE, 2014). Além do desmatamento, o monocultivo retrata a alta concentração de terra e renda, a desertificação do solo, em alguns casos o trabalho escravo (CPT, 2017) e o uso irracional de agrotóxicos.

Os municípios pertencentes à Amazônia norte mato-grossense, em sua constituição, possuem grande heterogeneidade, na origem da população, nas atividades produtivas e na cultura local, bem como no contexto histórico (GRANDO, 2014). A região é privilegiada em termos de ecossistemas. Está inserida no Bioma Amazônia e Transição Floresta/Cerrado, biomas de alto valor biológico e genético (ANDRADE, 2007; ANDRADE et al., 2007).

Porém, de acordo com os autores acima citados, apresenta as mais altas taxas de desmatamento da Amazônia brasileira, devido à pressão antrópica, provocada, principalmente, pelas atividades de pecuária e exploração insustentável da madeira, além do uso intensivo dos recursos naturais para o plantio da soja. Nesse sentido, a região se torna prioritária para ações sustentáveis de conservação da agrobiodiversidade, além da regularização fundiária. Para tanto, diversas políticas públicas foram criadas como diretrizes para a ação e aplicação de instrumentos de monitoramento e controle, a fim de deter o desmatamento e tirar o Estado da lista dos desmatadores. Dentre as ações do Estado do Mato Grosso, criou o Programa Mato-grossense de Municípios Sustentáveis – PMS.

Assim, a preocupação com a sustentabilidade e com o meio ambiente está presente no discurso da política de desenvolvimento territorial, e algumas ações e práticas

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nesse sentido podem ser verificadas. Entretanto, ainda é evidente que os instrumentos de política econômica e de desenvolvimento regional, de maneira geral, não levam em conta em suas ações a dimensão ambiental, o que muitas vezes deixa a impressão de que o desenvolvimento sustentável não passa de uma promessa (PASQUIS e VARGAS, 2009).

O modelo agrícola predominante no Brasil, não obstante também o dos municípios da Amazônia norte mato-grossense, é fundamentado na maximização do uso dos recursos naturais. Não há uma preocupação em avaliar as reais capacidades dos agroecossistemas em suportar tais ações. Isso está impactando, de forma muito rápida, esses ecossistemas. Este modelo de desenvolvimento preconiza o uso intensivo do solo através de monocultivos, uso de máquinas e implementos agrícolas e a aplicação irracional de insumos químicos e de agrotóxicos. Consequentemente, tem provocado a desertificação, a contaminação do solo e da água, a erosão, o assoreamento dos córregos d'águas e o êxodo rural.

Desse modelo agrícola, agricultura capitalista, Marx já indicara a insustentabilidade, uma vez “que já não encontrava mais condições naturais da sua própria produção dentro de si, de forma natural, espontânea” (FOSTER, 2010, p. 221). Mais ainda, o autor afirma que Marx sustentava que “a falha metabólica foi criada pela sociedade capitalista e que nesta sociedade as condições de sustentabilidade impostas pela natureza haviam sido violadas” (FOSTER, 2010, p. 229).

Neste contexto de degradação socioambiental encontram-se os assentamentos rurais que cada vez mais encontram-se ilhados por grandes fazendas de produção em larga escala, comprometendo a sustentabilidade desses assentamentos rurais e o buen vivir dos agricultores familiares. O contexto amazônico atual impulsiona a realização de estudos como o nosso para encontrar estratégias, experiências e práticas que sensibilizem o povo amazônico, em especial os agricultores familiares assentados para resistir a qualquer iniciativa de depredação desse patrimônio que garanta o buen vivir e a sobrevivência de milhares de pessoas (ALBARADO, 2016).

Estudos sobre assentamentos rurais, que levem em consideração os aspectos ambientais da sua implantação e as condições de sustentabilidade na região da Amazônia norte mato-grossenses, são quase inexistentes. Mas espera-se que seja parte, cada vez maior, da preocupação também recente com a sustentabilidade dos sistemas produtivos (CARMO, 2003). Pesquisas foram realizadas em assentamentos, mas acreditamos que a maioria das

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pesquisas planejadas e realizadas está em consonância com o desenvolvimento do agronegócio na região.

A realização da nossa pesquisa se justifica tendo em vista que se desconhece as ações que tenham sido realizadas nesses assentamentos rurais nos municípios da Amazônia norte mato-grossense, dentro de uma perspectiva participativa para avaliar a sustentabilidade dos assentamentos rurais a partir do buen vivir. Nosso estudo foi desenvolvido nos assentamentos São Pedro, em Paranaíta e no Projeto de Desenvolvimento Sustentável São Paulo, em Carlinda.

Para tanto, desenvolveu-se o interesse na construção de um método para avaliar a sustentabilidade dos assentamentos rurais. Esta pesquisa quer se alinhar ao buen vivir para contribuir com referencial na mudança “da realidade social e política, colonial e colonizadora, para promover uma perspectiva que configura a vida com bem maior e inafiançável a favor da dignidade e da plenitude coletiva” (KEIM e SANTOS, 2012, p. 25). Gamboa (2013) sugere que a construção do conhecimento se dá numa relação dialética de mútua implicância entre a pergunta e a resposta.

[...] de afirmação e de negação e de projeção do tempo; o passado representado na resposta, o presente na dúvida e a postura crítica perante o passado e o futuro na abertura que a força das perguntas projeta (GAMBOA, 2013, p. 85). [...] pergunta e resposta são dois elementos opostos que se negam mutuamente (GAMBOA, 2013, p. 95).

Este método é de relevante importância não só para avaliar a sustentabilidade de um assentamento, mas para o processo de compreensão do possível papel desses, para o desenvolvimento regional, bem como para a formulação de políticas públicas agrícolas e agrárias.

Diante do exposto, as questões pertinentes que motivaram nossa pesquisa foram: 1. O que os agricultores familiares dos assentamentos rurais da Amazônia norte

mato-grossense, compreendem por sustentabilidade e buen vivir? O entendimento difere quanto à forma de organização/modalidade dos assentamentos?

2. Como avaliar a sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense?

3. Os assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense, são sustentáveis? Em que a sustentabilidade difere entre as diferentes modalidades de assentamentos?

4. O que é mais relevante para os agricultores familiares para a sustentabilidade e o buen

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Para a construção desta pesquisa, procuramos dar ênfase na relação dialética entre pergunta e resposta proposta por Gamboa (2013). Para o autor, o ponto de partida de uma pesquisa ou investigação é uma questão, que se coloca como um problema a resolver.

Dessa maneira, o problema geral desta pesquisa foi detectar “Como avaliar a sustentabilidade de assentamentos rurais diferentes na história, na forma de ocupação, organização e modalidade na Amazônia norte mato-grossense”?

Nessa relação dialética entre a pergunta e a resposta, “momentos-chave da produção do conhecimento” (GAMBOA, 2013, p. 159), segundo o autor na pesquisa (a ênfase está na pergunta), o problema, a justificativa e os objetivos caracterizam a pergunta, enquanto que a metodologia e o referencial teórico, a resposta. Ainda para Gamboa (2013), no relatório da pesquisa, a ênfase está na resposta. A introdução, os resultados, as discussões e a conclusão são exemplos de resposta.

Como hipóteses da pesquisa, acreditamos que:

1. A melhor forma de avaliação da sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense se dá por meio da coletividade e da participação; 2. Os agricultores familiares utilizam saberes e conhecimentos para avaliar a

sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense;

3. A sustentabilidade dos assentamentos rurais é diversificada devido à história, à forma de ocupação, de organização/modalidade e ao buen vivir.

1.3 Objetivos 1.3.1 Geral

Construir um método, que proporcione a coletividade e a participação à luz dos saberes dos sujeitos da pesquisa e do buen vivir para avaliar a sustentabilidade de dois assentamentos rurais que se diferem quanto à história, a forma de ocupação e organização/modalidade na Amazônia norte mato-grossense, sendo assim, contribuir para a mudança da realidade local.

1.3.2 Específicos

➢ Caracterizar, a partir do contexto histórico dos sujeitos da pesquisa, dois assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense, seus aspectos de ocupação, organização, socioeconômico, cultural, ambiental e político;

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➢ Realizar diagnóstico, à luz do contexto histórico e dialético de dois assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense, levando em consideração as dimensões da sustentabilidade e os princípios do buen vivir para a superação dos problemas locais; ➢ Discutir o conceito de sustentabilidade, a partir do conhecimento dos sujeitos da

pesquisa, à luz do contexto histórico e dialético, dos conceitos, dos enfoques e discussões sobre o termo sustentabilidade e o buen vivir;

➢ Utilizar o método construído “círculo da sustentabilidade” para avaliar a sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense;

➢ Avaliar, de forma coletiva e participativa com os agricultores familiares a sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense a partir dos seus saberes e do buen vivir;

➢ Analisar se a forma de ocupação e organização dos dois assentamentos rurais refletem na percepção e nas narrativas sobre o que é sustentabilidade e no buen vivir para os sujeitos.

1.4 Círculo estrutural da tese

O círculo estrutural da tese possui seis pontos: Círculo metodológico; Círculo de vivência/codificação e da descodificação do mundo dos sujeitos em assentamentos rurais; Círculo do diagnóstico: a descodificação dos assentamentos rurais; Círculo da descodificação da sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense; o Círculo conclusivo da sustentabilidade e o Círculo sobre a aplicação, as limitações e os desafios futuros do método.

No círculo metodológico apresentamos os pressupostos teórico-metodológicos; a pesquisa bibliográfica; os sujeitos da pesquisa e como se deu a avaliação da sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense. Para a avaliação propomos o método científico-pedagógico Círculo da Sustentabilidade com cinco pontos: 1º – Círculo de investigação de temas geradores – codificar o “mundo”; 2º – Círculo da história do mundo dos sujeitos - descodificar o mundo; 3º – Círculo de diagnóstico dos assentamentos rurais - descodificar e reler o mundo dos sujeitos; 4º – Círculo de troca de saberes - descodificar e ressignificar o mundo dos sujeitos e 5º – Círculo das percepções e narrativas sustentáveis – descodificar e atuar no mundo dos sujeitos.

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No círculo de vivência/codificação e da descodificação do mundo dos sujeitos em assentamentos rurais, dividimos em duas partes. Na primeira parte, “círculo de investigação de temas geradores” apresentamos os resultados da codificação da realidade dos agricultores familiares nos assentamentos rurais, bem como os temas geradores que são comuns aos dois assentamentos. A segunda parte, “círculo da história do mundo dos sujeitos”, apresentamos a descodificação do mundo dos sujeitos, a história, a formação e a organização dos assentamentos rurais. O objetivo do capítulo é caracterizar, a partir do contexto histórico dos sujeitos da pesquisa, os Assentamentos São Pedro e São Paulo na Amazônia norte mato-grossense, a história, os aspectos de ocupação, organização de cada assentamento. Nesse círculo, foi possível analisar o passado da sustentabilidade dos assentamentos.

No círculo do diagnóstico dos assentamentos rurais, problematizamos os outros temas geradores elencados no capítulo anterior, além de motivarmos os sujeitos a ler, a descodificar seu mundo, mesmo que de forma superficial, mais narrando que analisando a realidade. Assim, analisamos a sustentabilidade no presente dos assentamentos rurais.

No círculo da descodificação da sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense discutimos as narrativas e percepções dos sujeitos a respeito da sustentabilidade a partir do buen vivir, numa perspectiva de presente e futuro sobre a sustentabilidade dos assentamentos.

Com relação ao círculo conclusivo da sustentabilidade, apresentamos algumas considerações acerca da sustentabilidade e do buen vivir dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense.

Por fim, no círculo sobre a aplicação, as limitações e os desafios futuros do método, discutimos a aplicação do método; apontamos as limitações do Círculo da Sustentabilidade e propomos desafios e sugestões para futuros trabalhos.

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2 CÍRCULO METODOLÓGICO

2.1 Pressupostos teórico-metodológicos

Toda pesquisa científica exige fundamentação epistemológica, uma explicitação clara do posicionamento teórico (GOMIDE, s.d.) e político do pesquisador. Dessa forma, para chegarmos aos objetivos propostos neste trabalho, para vermos, codificarmos, lermos, descodificarmos e interpretarmos a realidade dos Assentamentos Rurais da Amazônia norte mato-grossense, optamos por conceber esta pesquisa à luz do posicionamento teórico-metodológico materialista, fundado na dialética da realidade, a partir da história e do chão da experiência empírica concreta dos agricultores familiares assentados. Assim, os “óculos” que utilizamos para vermos a realidade dos agricultores familiares foi o materialismo.

De forma conceitual, o termo materialismo diz respeito à condição material da existência humana; já o histórico parte do entendimento de que a compreensão da existência humana implica na compreensão de seus resultantes; por fim a dialética tem como pressuposto o movimento da contradição produzida na própria história (GOMIDE, s.d.). A dialética aborda os conhecimentos e elementos externos objetivos aos sujeitos, bem como sua complementaridade e oposição às representações sociais que traduzem o mundo dos significados (MAZALLA NETO, 2014). O presente só é inteligível à luz do passado, alertava Marx e isto nos permite afirmar que sem história não há identidade (BRASIL, 2010). “Nada pode ser compreendido sem uma referência à sua história relacional e ao seu percurso temporal” (BOFF, 2015, p. 76).

Optamos por este posicionamento por entendermos que a realidade só pode ser compreendida de forma contraditória, dinâmica e sistêmica, onde os fatos só podem ser entendidos, não de forma isolada, mas considerando o conjunto das dimensões. Tudo o que existe se relaciona, tudo está conectado, interligado como numa teia. Tudo está em constante mudança, em movimento e em transformação. Esse enfoque dialético “trata de apreender o fenômeno em seu trajeto histórico e suas inter-relações com outros fenômenos” (GAMBOA, 2013, p. 75).

Consideramos a dialética como a forma mais adequada para a crítica, para as pesquisas comprometidas com a sociedade e a transformação da realidade dos sujeitos envolvidos. Não é possível entendermos a realidade desconectada da história, da vida e da prática dos sujeitos. A dialética é um movimento de trazer para a realidade a materialidade

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dos acontecimentos e ressaltar as contradições existentes. “Busca compreender os processos de transformação, suas contradições e suas potencialidades” (GAMBOA, 2013, p. 75). Uma ação reflexiva, emancipatória e orientadora de práticas que contribuem para libertação dos povos colonizados historicamente por uma ideologia dominante. Para este enfoque:

[...] o homem conhece para transformar e o conhecimento tem sentido quando revela as alienações, as opressões e as misérias da atual fase do desenvolvimento da humanidade… O conhecimento crítico ao mundo e da sociedade e a compreensão de sua dinâmica propiciam ações (práxis) emancipadoras (GAMBOA, 2013, p. 75).

Nesta lógica, “procura-se o diálogo em todas as direções e em todos os movimentos. Por isso supõe a atitude a mais inclusiva possível e a menos produtora de vítimas” (BOFF, 2015, p. 61).

Neste contexto em que o ponto de partida do pensamento deve ser a realidade concreta dos sujeitos, utilizamos a abordagem participativa. A abordagem participativa tem como conceitos e princípios os paradigmas como o materialismo histórico e dialético (GABARRÓN e LANDA, 2006). E é também desta realidade que parte o método da pesquisa participante. O ponto de partida da pesquisa participante deve ser a realidade social concreta da vida dos sujeitos individuais e coletivos (BRANDÃO e STRECK, 2006). E para conhecer esta realidade, Gamboa (2013) afirma que as “perguntas são as locomotivas do conhecimento”. Para o autor, na dialética, “o conhecimento é construído por uma relação dialética entre sujeito e objeto, os quais estão dentro de um contexto da realidade histórica e social” (GAMBOA, 2013, p. 70).

Adotamos a concepção de que a pesquisa participante se dá através de um processo de construção coletiva de conhecimento que seja socialmente útil para que os sujeitos possam ler de forma crítica a realidade para, assim, poder transformá-la e transformando-a possam melhorar suas condições de vida. Acreditamos que a pesquisa científica deve assumir um caráter político, e que contribua para a emancipação dos sujeitos envolvidos para a sua libertação. Gamboa (2013, p. 73) afirma que quando o interesse na pesquisa é “crítico emancipador, orienta a pesquisa para desenvolver e alimentar a práxis que transforma o real e libera o sujeito dos diferentes condicionamentos”.

Entendemos que uma pesquisa científica deve ultrapassar o caráter puramente técnico-científico e assumir uma perspectiva científico-pedagógica. O trabalho científico deveria ser um trabalho educativo/pedagógico e político; político porque deveria dar voz às

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mulheres e homens para estes saírem do anonimato e do silêncio das tabelas e dos números; pedagógico, pois a pesquisa participativa é uma alternativa solidária de criação social de conhecimento, de construção de uma ciência popular (BRANDÃO e STRECK, 2006). Contribuindo com esta concepção, Gabarrón e Landa (2006) sinalizam que a pesquisa participante “é uma proposta metodológica inserida em uma estratégia de ação definida, que envolve seres beneficiários na produção de conhecimentos”. Desse modo, como afirma Paulo Freire, o pesquisar e o educar se identificam em um permanente e dinâmico movimento (FREIRE, 1987).

Neste intuito, procuramos desenvolver este trabalho, inspirados na educação libertadora de Paulo Freire e do colombiano Orlando Fals Borda. Parafraseando Paulo Freire, a “investigação bancária, pesquisa bancária”. Nesta, os pesquisados são meros objetos da pesquisa, assim como na educação bancária, onde os educandos são reduzidos a meros receptores de ideias em um ato de depositar ideias de um sujeito a outro (FREIRE, 1987). Nossa postura foi de uma relação horizontal, que perpassou e buscou superar a visão autoritária do pesquisador sobre os pesquisados e as pesquisadas.

Tornamos o local da investigação, um ambiente de encontro. E neste lugar de encontro, “não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos; há homens e mulheres que em comunhão, buscam saber mais” (FREIRE, 1987, p. 46). No entanto, “a unificação do pensamento entre a base e os profissionais com objetivos de criar confiança mútua e alcançar a práxis, metas comuns de transformação social e poder popular, não é uma tarefa fácil” (FALS BORDA e BRANDÃO, 1986, p. 71).

Destacamos a pesquisa com base na educação popular, pois partimos do princípio de que “assim como não existe um vazio de poder, também não existe um vazio de saberes e de cultura” (AMARAL e MONTRONE, 2015). Para Fals Borda (2007) uma pesquisa deve ter como objetivos fortalecer a resistência, a insurgência, através de uma metodologia participativa embasada numa ótica crítica do modelo social vigente.

Nossa postura foi de vermos os pesquisados e as pesquisadas como sujeitos, participantes do processo de construção da pesquisa. Assim como o pesquisador também é um sujeito, uma vez que não está fora da realidade pan-relacional. “O pesquisador é parte do processo da realidade e de seu conhecimento reflexivo” (BOFF, 2015, p. 63). Entendemos que a pesquisa participante “deve ser como num caminho de duas vias: de um lado, a participação

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dos sujeitos na investigação; do outro, a participação do pesquisador nas ações populares” (BRANDÃO e STRECK, 2006).

Enfim, uma pesquisa que seja dialógica, problematizadora, libertadora e transformadora. Assim, para que esta pesquisa atendesse a esta concepção, o diálogo foi fundamental. Aliás, o diálogo é condição sine qua non de uma pesquisa participativa. “O diálogo é um caminho pelo qual os homens ganham significação enquanto homens” (FREIRE, 1987, p. 79). Neste sentido, durante todo o decorrer do trabalho procuramos problematizar a realidade dos sujeitos dessa investigação.

Fazer pesquisa com a classe popular também é uma tomada de decisões e atitudes que comprovam nosso entendimento de suas demandas, que passam a ser as mesmas que as nossas, entender é estar junto em todo processo de luta e conquista dos direitos, que também são nossos enquanto pertencentes a esta mesma sociedade (AMARAL, 2014, p. 63).

A problematização da realidade concreta permitiu aos sujeitos “re-existenciar as palavras do seu mundo, para, na oportunidade devida, saber e poder pronunciar a sua palavra; o mundo pronunciado por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar” (FREIRE, 1987, p. 13 e p. 78).

2.2 Pesquisa bibliográfica

Para a fundamentação teórico-metodológica, realizamos pesquisa bibliográfica. A pesquisa bibliográfica foi condicionada em quatro (4) grandes temas. Estes temas são pontos importantes na construção do círculo da sustentabilidade dos assentamentos rurais da Amazônia norte mato-grossense foram:

✓ Metodologia participativa e educação popular;

✓ Processo de ocupação, história e formação de assentamentos na Amazônia norte mato-grossense;

✓ Sustentabilidade; ✓ Buen vivir; e ✓ Agroecologia.

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