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Fotojornalismo do coletivo fotográfico SP invisível e a humanização de pessoas em situação de rua

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Academic year: 2021

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FOTOJORNALISMO DO COLETIVO FOTOGRÁFICO SP INVISÍVEL E A HUMANIZAÇÃO DE PESSOAS EM SITUAÇÃO

DE RUA

Dissertação submetida ao Programa de Pós-graduação em Jornalismo, Departamento de Jornalismo, Centro de Comunicação e Expressão da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do grau de Mestre em Jornalismo.

Orientador: Prof.ª Dr.ª Raquel Ritter Longhi

Florianópolis 2018

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Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor

através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC.

Santos, Marcelo De Franceschi dos

Fotojornalismo do coletivo fotográfico SP invisível e a humanização de pessoas em situação de rua / Marcelo De Franceschi dos Santos ;

orientadora, Raquel Ritter Longhi , 2018. 220 p.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós-Graduação em Jornalismo,

Florianópolis, 2018. Inclui referências.

1. Jornalismo. 2. Fotojornalismo. 3. Humanização. 4. Coletivo Fotográfico SP invisível. 5. Site de Rede Social. I. , Raquel Ritter Longhi. II.

Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Jornalismo. III. Título.

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Em direção a meus pais, Fátima De Franceschi dos Santos e Hélio Gonçalves dos Santos, e meus irmãos, Gabriel De Franceschi dos Santos e Hélio Gonçalves dos Santos Filho.

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À sociedade brasileira, representada através da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo (PPGJOR), pelo privilégio da obtenção de aperfeiçoamento de qualidade às custas do Estado sustentado por impostos pagos principalmente pelos oprimidos. Que o resultado do investimento público feito em mim, durante o afastamento como servidor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), contribua de alguma forma para a humanização de todas e todos.

À Ingrid Pereira de Assis por estar comigo em todos os sentidos. Aos colegas de pós-graduação, especialmente Juliana Cristina Gobbi Betti, Luiza Mylena da Costa Silva, Caetano Machado, Anderson Dias Silveira, Jéssica Gustafson Costa, e Dairan Mathias Paul.

As amigas e amigos, especialmente Fabiani e Vanessa Gonzaga Noronha, Leonardo Pereira Côrtes, Eduardo Covalesky Dias, Ítalo de Holanda Padilha Vieira, Maria Carolina Zanini, e Suzana Susi Pfeifer.

Ao Grupo de Estudos em Paulo Freire do NUEG – UFSC, especialmente André Luís Franco Rocha. À Silvana Louzada da Silva pela gentileza de me enviar um livro.

A minhas tias e meus tios, especialmente minha madrinha Leda Bolzan De Francescki e Ieda Bolzan De Franceschi da Silva.

Aos servidores públicos docentes da UFSC pela oportunidade: Raquel Ritter Longhi, Eduardo Barreto Vianna Meditsch, Samuel Pantoja Lima e Jorge Kanehide Ijuim. Ao servidor público docente da UFSM Rondon Martin Souza de Castro pelo incentivo no fotojornalismo na graduação.

Ao André Soler Torres Iung de Souza, ao Vinícius Jorge Ribeiro Lima e as voluntárias e voluntários do SP invisível que ainda não conheço.

Aos servidores docentes da Escola Municipal de Ensino Fundamental Professora Maria José Valmarath, e do Colégio Estadual São Sepé. Não é possível nomear todas e todos mas torço para que saibam da importância de seus trabalhos na minha formação humana.

À Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) por cumprir a obrigação de acolher minha denúncia sobre os pombos que sobrevoavam internamente o Restaurante Universitário da UFSC e de interditar o local por dois dias até a remoção das aves.

Às Pessoas de Santa Maria. Obrigado à você se ler isso.

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MOORE, Alan; GIBBONS, Dave; HIGGINS, John. Watchmaker.

Watchmen, n.4. Nova Iorque: DC

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Esta pesquisa tem o objetivo de compreender como as fotografias de entrevista feitas por um coletivo fotográfico humanizam as pessoas em situação de rua. Elege como objeto de estudo o fotojornalismo produzido pelo coletivo fotográfico SP invisível e publicado em site de rede social. Adota a abordagem metodológica da Gramática do Design Visual. Tem como corpus as dez publicações com maior engajamento da página SP invisível no Facebook, a partir de sua maior popularidade em 7 de novembro de 2014, quando alcançou 100 mil seguidores, até 2 de abril de 2017, quando alcançou 341 mil seguidores. Para atingir o objetivo, busca verificar os recursos de interação nas fotografias, e constatar as características essenciais humanas nas legendas. No primeiro capítulo, conceitua o coletivo fotográfico e sua prática social fotojornalística em site de rede social. Depois, discute o fotojornalismo humanista e uma perspectiva do diálogo retextualizado na legenda da fotografia de entrevista. Por fim, analisa como as fotografias e legendas das publicações selecionadas na página humanizam pessoas em situação de rua. Conclui que a humanização dos retratados ocorre parcialmente, sendo mais uma sensibilização orientada para os usuários do site de rede social do que para as pessoas em situação de rua.

Palavras-chave: Fotojornalismo; Humanização; Coletivo Fotográfico SP invisível; Site de Rede Social; Tecnologias, Linguagens e Inovação em Jornalismo.

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Este trabajo tiene el objetivo de comprender como las fotografías de entrevista hechas por un colectivo fotográfico humanizan las personas en situación de calle. Elige como objeto de estudio el fotoperiodismo producido por el colectivo fotográfico SP invisível y publicado en sitio de red social. Adopta el enfoque metodológico de la Gramática del Diseño Visual. Tiene como corpus las diez publicaciones con mayor compromiso de la página SP invisível en Facebook, a partir de su mayor popularidad en 7 de noviembre de 2014, cuando alcanzó 100 mil seguidores, hasta en 2 de abril de 2017, cuando alcanzó 341 mil seguidores. Para alcanzar el objetivo, los recursos de interacción en las fotografías son verificadas y las características esenciales humanas en las leyendas son constatadas. En el primer capítulo, conceptua el colectivo fotográfico y su práctica social fotoperiodística en sitio de red social. Después, discute el fotoperiodismo humanista y una perspectiva del diálogo retextualizado en la leyenda de la fotografía de entrevista. Por último, analiza como las fotografías y leyendas de las publicaciones seleccionadas en la página humanizan las personas en situación de calle. Concluye que la humanización de los retratados ocurre parcialmente, siendo más una sensibilización orientada hacia los usuarios del sitio de red social que para las personas en situación de calle.

Palabras Clave: Fotoperiodismo; Humanización; Colectivo Fotográfico SP invisível; Sitio de Red Social; Tecnologías, Lenguajes e Innovación en Periodismo.

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Figura 1- Página inicial do SP invisível no Facebook. ... 32

Figura 2 - Publicação do dia 20 de novembro de 2014 ... 131

Figura 3 - Publicação do dia 16 de janeiro de 2015 ... 134

Figura 4 - Publicação do dia 10 de março de 2015 ... 137

Figura 5 - Publicação do dia 17 de março de 2015 ... 140

Figura 6 - Publicação do dia 10 de abril de 2015 ... 143

Figura 7 - Publicação do dia 20 de abril de 2015 ... 146

Figura 8 - Publicação do dia 23 de junho de 2015 ... 150

Figura 9 - Publicação do dia 25 de junho de 2015 ... 153

Figura 10 - Publicação do dia 29 de janeiro de 2016 ... 156

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Quadro 1 - Comparativo entre diferentes agrupamentos de fotógrafos . 48

Quadro 2 - Resumo dos recursos da metafunção interativa da GDV. . 127

Quadro 3 - Números de publicações do SP invisível entre 7 de novembro de 2014 e 2 de abril de 2017. ... 129

Quadro 4 - Publicação do dia 20 de novembro de 2014 ... 132

Quadro 5 - Publicação do dia 16 de janeiro de 2015 ... 135

Quadro 6 - Publicação do dia 10 de março de 2015 ... 138

Quadro 7 - Publicação do dia 17 de março de 2015 ... 141

Quadro 8 - Publicação do dia 10 de abril de 2015 ... 144

Quadro 9 - Publicação do dia 20 de abril de 2015 ... 147

Quadro 10 - Publicação do dia 23 de junho de 2015 ... 151

Quadro 11 - Publicação do dia 25 de junho de 2015 ... 154

Quadro 12 - Publicação do dia 29 de janeiro de 2016 ... 157

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INTRODUÇÃO ... 21

1 COLETIVOS FOTOGRÁFICOS E FOTOJORNALISMO ... 39

1.1 COLETIVO FOTOGRÁFICO: FORMAÇÃO HISTÓRICA E CONCEITUAL ... 39

1.2 COLETIVOS FOTOGRÁFICOS SE APROPRIAM DOS SITES DE REDES SOCIAIS ... 51

1.3 COLETIVOS FOTOGRÁFICOS TENSIONAM FOTOJORNALISMO NA INTERNET ... 59

1.4 COLETIVOS FOTOGRÁFICOS PRATICAM FOTOJORNALISMO COLETIVO ... 65

2 FOTOJORNALISMO E HUMANIZAÇÃO ... 73

2.1 FOTOJORNALISMO HUMANISTA: HISTÓRICO E FORMAÇÃO ... 73

2.2 JORNALISMO HUMANIZADO E HUMANISMO MARXISTA 87 2.3 A LEGENDA NA FOTOGRAFIA DE ENTREVISTA ... 99

2.4 DIÁLOGO COMO PERSPECTIVA DA ENTREVISTA PARA A LEGENDA ... 111

3 ANÁLISE DAS PUBLICAÇÕES DO SP INVISÍVEL ... 125

3.1 GRAMÁTICA DO DESIGN VISUAL ... 125

3.2 ANÁLISE DAS PUBLICAÇÕES ... 128

3.3 SÍNTESE ... 162

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 169

REFERÊNCIAS ... 177

APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ... 203

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INTRODUÇÃO

Uma das metas gerais do fotojornalismo é expressar significados ao representar, sempre que possível, seres humanos e suas reações diante dos fatos que acontecem no dia a dia. “Tudo tem que estar no mesmo quadro: os personagens e as suas relações com o espaço e com a circunstância” (LIMA, 1989, p. 35). Com essa prioridade, não só se daria uma característica única e irrepetível às imagens mas, também, seria mostrado algo em comum com o leitor: alguém semelhante. O fotojornalismo carrega esse interesse humano, herdado do fotodocumentarismo social que trata “quer temas estritamente humanos quer o significado que qualquer acontecimento possa ter para a vida humana” (SOUSA, 2000, p. 13).

Como toda a sociedade, o fazer do fotojornalismo foi afetado com o desenvolvimento da internet e de tecnologias digitais. No novo meio, empresas jornalísticas passaram a publicar fotorreportagens (LONGHI, 2010), e, através do acesso a telas e câmeras, os leitores também puderam se conectar com mais facilidade e começaram a usar esses dispositivos para difundir suas produções. A utilização dos computadores ou telefones liberou o polo emissor (LEMOS, 2005) de informações, possibilitando uma maior facilidade das pessoas fotografarem, editarem e distribuírem digitalmente imagens de fatos presenciados.

No fim da primeira década dos anos 2000, os sites de redes sociais (SRS) se tornaram ambientes propícios para a difusão de imagens jornalísticas. Instituições passaram a fazer uso desses sites efetivamente em 2009 (RAIMONDO ANSELMINO; BARTONE, 2013) e, no Brasil, o Facebook alcançou a liderança quanto ao número de usuários ativos em 20111. Na configuração visual desses portais, as imagens são publicações destacadas e circulam com mais facilidade ao receberem reações, serem comentadas ou compartilhadas pelos perfis dos usuários, alcançando mais audiência (RECUERO, 2014a). Dessa forma, não apenas pessoas comuns puderam fotografar acontecimentos inesperados e disseminar suas produções, mas fotógrafos iniciados também perceberam que teriam espaço para divulgar seus próprios trabalhos do cotidiano. Assim, registros de cenas contrastantes entre a

1 Disponível em:

https://web.archive.org/web/20170626034850/http://www.comscore.com/po r/Insights/Press-Releases/2012/1/Facebook-Blasts-into-Top-Position-in-Brazilian-Social-Networking-Market. Acesso em: 10 jul. 2018.

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desigualdade das classes sociais2 nas cidades brasileiras surgem diariamente nesses sites.

Nos grandes jornais do Brasil, entretanto, “as vivências das populações pobres estão, em geral, ausentes”, de acordo com Biroli, Miguel e Dualibe (2013, p. 22). E quando estão presentes, as vivências enfatizadas são as que causam estranheza e distanciamento em relação as classes mais elevadas: “o horizonte limitado de esperanças e possibilidades, a acomodação diante da privação, a ignorância e a passividade” (BIROLI; MIGUEL; DUALIBE, 2013, p. 23). Segundo os pesquisadores ao analisarem o jornal Folha de S. Paulo, a distribuição da riqueza na sociedade não é apresentada como um investimento simultâneo ao das atividades produtivas, em que essas seriam fomentadas pela ascensão social. “A miséria tem prejudicados, é evidente, os próprios miseráveis, mas nunca beneficiários. Aparentemente, ninguém lucra com a miséria” (BIROLI; MIGUEL; DUALIBE, 2013, p. 23). Tal isolamento engessa a discussão sobre as causas da pobreza e as respostas a serem dadas a ela. Consequentemente, a penúria deixa de ser percebida como injustiça estrutural e histórica a ser reparada com ação política.

Além disso, ao retratarem os pobres como ameaçadores ou incômodos, fazem com que estes sejam passíveis “de eliminação, não apenas simbólica, mas também física” (RESENDE, 2016, p. 962). Para dar vazão às imagens e discursos desse grupo negligenciado, os sites de redes sociais passaram a ser usados por fotógrafos. Coletivos fotográficos se organizaram e viram nesses sites um local para publicar os registros imagéticos seguidos de descrições, atraindo um público considerável com as histórias relatadas. Esse contexto abre uma possibilidade de estudo sobre tais fatos.

Sendo assim, como objeto de estudo desta pesquisa, elege-se o fotojornalismo produzido por coletivo fotográfico e publicado em site de rede social. O objeto empírico se trata das fotografias de entrevista da página do SP invisível no Facebook. O objetivo geral é compreender

2 Dados da pesquisa Síntese de Indicadores Sociais de 2017, feita pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), indicam que cerca de 50 milhões de brasileiros, o equivalente a 25,4% da população, vivem na linha de pobreza e têm renda familiar mensal equivalente a R$

387,07. Disponível em:

https://web.archive.org/web/20180219162033/http://agenciabrasil.ebc.com. br/economia/noticia/2017-12/ibge-brasil-tem-14-de-sua-populacao-vivendo-na-linha-de-pobreza. Acesso em: 10 jul. 2018.

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como as produções fotojornalísticas do coletivo humanizam pessoas em situação de rua. Os objetivos específicos incluem: caracterizar o coletivo fotográfico e sua prática do fotojornalismo com o site de rede social Facebook; discutir a humanização nas legendas produzidas com fotografias e entrevistas com os retratados; e examinar as fotografias de entrevista da página do SP invisível, elaborando uma síntese crítica dos recursos de interação nas fotografias e de características essenciais humanas nas legendas.

Para efetuar os objetivos, serão realizados três passos principais. O primeiro é a seleção de dez publicações da página no período de popularidade homogênea, estabelecido como entre 7 de novembro de 2014 e 2 de abril de 2017. Utilizando a abordagem metodológica da Gramática do Design Visual (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006; OLIVEIRA, 2011), o passo dois é o de verificação dos recursos de interação nas fotografias e das características essenciais humanas nas legendas. E, por fim, combina-se o resultado das análises das fotografias com as legendas, visando a elaboração de uma síntese crítica sobre como é a humanização das fotografias de entrevista do SP invisível no Facebook.

Percebe-se uma potencialidade de se analisar os discursos de humanização efetuados pelas fotografias e legendas produzidas pelo coletivo, mesmo que isso ocorra numa plataforma de uma empresa capitalista. À parte o caráter selecionador do algoritmo de exibição de postagens, que pode deixar de mostrar determinadas informações conforme os interesses de seus desenvolvedores, e comercializador dos dados de preferências dos usuários para anunciantes, o Facebook pode e tem sido apropriado como uma ferramenta jornalística por meio de seu serviço de páginas e perfis. O site de rede social alcançou 2 bilhões de usuários ativos em 27 de junho de 20173, sendo desses mais de 100 milhões no Brasil. Neste site, as publicações podem alcançar diversos públicos ao serem facilmente disseminadas pelos usuários através das atividades de “Reagir”4, “Comentar” e “Compartilhar”. Fotógrafos e

3 Dado disponível em:

https://web.archive.org/web/20171012184831/http://agenciabrasil.ebc.com. br/internacional/noticia/2017-06/facebook-alcanca-marca-de-2-bilhoes-de-usuarios Acesso em: 10 jul. 2018.

4 Este termo é utilizado aqui porque, a partir de 2016, foram adicionados mais cinco ícones na opção “curtir”: “amei”, “haha”, “uau”, “triste”, e “grr”. Esses desenhos foram chamados de “reações” pelo diretor

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coletivos perceberam essas funcionalidades e usam o Facebook como plataforma de divulgação. Ao serem publicadas, as fotos se apresentam em ordem cronológica reversa – a mais recente primeiro – na página inicial dos usuários. Assim, o fotojornalismo não pode ser descartado ou desconsiderado devido à popularização de aparelhos com câmeras fotográficas, mas sua especificidade pode ser alavancada pelas formas digitais de publicação, como mais um espaço para fotojornalistas destinarem suas produções (SALLET; HENN, 2015).

A escolha pelo SP invisível como objeto empírico se deve a produção ser disponibilizada em modo público, ou seja, acessível a todos os usuários registrados e não registrados no site de rede social, permitindo livremente a análise, e por ter um jornalista em sua fundação e produção, aproximando-se da área de concentração deste estudo. Tomando conceitualmente o movimento SP invisível como um coletivo fotográfico (QUEIROGA, 2012) e sua atividade como prática social jornalística (GROTH, 2011; RUELLAN; ADGHIRNI, 2009; DOMINGO; LE CAM, 2015), o problema que direciona essa pesquisa é: como ocorre a humanização de pessoas em situação de rua através das fotografias de entrevista do SP invisível publicadas na página do site de rede social Facebook?

Como guia para os procedimentos deste estudo, foram levantadas as seguintes hipóteses: a) através da utilização do site de rede social Facebook, o SP invisível tensiona conceitos de fotojornalismo e fotodocumentarismo, configurando-se como fotojornalismo feito por coletivo fotográfico; b) o fotojornalismo humanista pode humanizar com a perspectiva do diálogo retextualizado nas legendas das fotografias de entrevista; c) a humanização das pessoas em situação de rua se realiza principalmente por meio da legenda das fotografias de entrevista. O método adotado recorre à Gramática do Design Visual (GDV) de acordo com Kress e Van Leeuwen (2006) e Oliveira (2011). Os procedimentos permitem interpretar os recursos de interação das fotografias de entrevista em questão. Além disso, observa-se a estrutura textual das legendas e, nelas, quais características essenciais humanas (MÁRKUS, 2015) são destacadas pelas declarações dos entrevistados. Para isso, outro estudo a se basear foi o de Resende e Alexandre (2010) com uma análise linguística sobre um depoimento de uma pessoa em situação de rua publicado por um jornal sem fins lucrativos. Por fim,

de design do Facebook e visavam a ampliação das formas de expressão dos usuários (PINHEIRO, 2018).

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associam-se os resultados que permitem explicar como é trabalhada a humanização com as fotografias e as legendas.

Esta dissertação se justifica por buscar o aprofundamento de duas questões maiores evocadas pelo trabalho do coletivo fotográfico. Em primeiro lugar, para compreender as remodelações que o fotojornalismo vem passando, como por exemplo não ser uma atividade exclusivamente relacionada às redações de jornais tradicionais, mas também ter uma atuação independente de interesses corporativos. Percebe-se que esses coletivos, utilizando sites de redes sociais para publicação e circulação, tensionam conceitos de fotojornalismo e fotodocumentarismo (SOUSA, 2004; BAEZA, 2007). Em segundo lugar, para saber como ocorre a humanização nas fotografias de entrevista, cuja legenda tem parte fundamental na fotografia, e qual a efetividade dessa proposta do grupo. Nota-se que o coletivo aplica a fotografia e a descrição para provocar mudanças na forma como os indivíduos são enxergados e enxergam-se a si. Nesse cenário, este estudo pode colaborar para que a concepção do fotojornalismo seja mais aberta, que haja uma melhor sistematização de iniciativas semelhantes e, principalmente, que o fotojornalismo esteja mais atento às complexidades das pessoas menos favorecidas econômica e socialmente. Aos motivos para pesquisar o tema, inclui-se o trabalho do pesquisador como repórter fotográfico no extinto Jornal A Razão, de Santa Maria, Rio Grande do Sul, em 2012. Tal experiência alavancou o autor à produção de um projeto semelhante ao objeto na cidade gaúcha. Criado em julho de 2014, o projeto se chama “Pessoas de Santa Maria”5, no qual procurava dar um aspecto jornalístico às postagens. Os pedestres eram abordados, recebiam uma explicação do objetivo e, caso aceitassem, eram questionados sobre suas circunstâncias, situações e sonhos, e fotografados tendo como cenário principal as ruas. Um dos critérios de escolha de pessoas era que fossem aquelas “que representassem determinados grupos sociais ou que pudessem ter ideias progressistas que não fossem muito divulgadas pelos meios de comunicação” (SANTOS, 2017, p. 12). A partir do material colhido, a fotografia era publicada com a transcrição da entrevista no espaço da descrição da imagem, o que gerou comentários dos outros cidadãos e atraiu mais de 17 mil seguidores, de diversos locais, na página no site de rede social. A iniciativa resultou em mais de 280 publicações, que foram

5 Disponível em: facebook.com/pessoasdesantamaria. Acesso em: 10 jul. 2018.

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compiladas em um livro de mesmo nome publicado em 20176 com tiragem de 1500 exemplares distribuídos sem custos à população. A ideia se originou da página Humans of New York7, que retrata os transeuntes e seus relatos na metrópole estadunidense desde 2010.

Inclusive, a página no Facebook do Humans of New York é uma das mais acompanhadas de todo o site de rede social, possuindo 18 milhões de seguidores até setembro de 20178. Deste projeto, a relação entre imagem e legenda foi destacada por Vicente (2016, p. 8), junto com a influência na criação de outros 226 sites e páginas semelhantes nos cinco continentes até 20149. No mesmo ano de 2014, o fotógrafo responsável pelo projeto inicial, Brandon Stanton, fez uma tour mundial retratando pessoas de cidades de países como Iraque, Jordânia e República Democrática do Congo à convite e patrocínio da Organização das Nações Unidas (ONU)10.

No Brasil, a página do SP invisível conta com grande audiência no Facebook, o que chamou atenção de alguns pesquisadores que a fizeram objeto empírico de seus estudos. Foram encontrados 12 artigos

6 O projeto foi selecionado por três avaliadores na 12ª edição da política pública cultural “Lei do Livro” promovida pela Câmara de Vereadores de Santa Maria (Resolução Legislativa n° 22/2004, RL nº 16/2009 e RL nº 07/2013). Através de um edital, são escolhidos anualmente até dois livros para serem impressos e distribuídos gratuitamente à população da cidade. O lançamento ocorreu dia 30 de maio de 2017 no plenário da sede do poder legislativo:

https://web.archive.org/web/20170623192328/http://www.camara-sm.rs.gov.br/camara/conteudo/5152/Noticias/1/0/ Acesso em: 10 jul. 2018. 7 Ver em: humansofnewyork.com. O projeto gerou uma série de TV com 13 episódios e três livros até este momento: “Humans of New York”, “Humans of New York: stories”, e “Little Humans”. Todos alcançaram os primeiros lugares em listas de livros mais vendidos nos Estados Unidos.

8 Dado disponível em:

https://web.archive.org/web/20171218200930/https://www.nyunews.com/2 017/09/05/humans-of-new-york-in-motion/. Acesso em: 10 jul. 2018.

9 Dado disponível em:

https://web.archive.org/web/20171219002312/http://www1.folha.uol.com.b r/saopaulo/2014/04/1434759-humanomania-veja-226-sites-com-fotos-e-historias-anonimas-pelo-mundo.shtml. Acesso em: 10 jul. 2018.

10 Dado disponível em:

https://web.archive.org/web/20171219002929/http://www1.folha.uol.com.b r/ilustrada/2014/09/1513732-apoiado-pelo-onu-humans-of-new-york-viaja-para-areas-de-risco.shtml. Acesso em: 10 jul. 2018.

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que dão diversos tratamentos à página. Dez deles ressaltam, em linhas gerais, os aspectos políticos (TORRES; CHRISTOFOLETTI, 2015; MARTINO; MARQUES; COELHO, 2015; COELHO; MARQUES; MARTINO, 2016; LOBATO; COSTA, 2016), publicitários (PETRY; MALDANER, 2016), de cidadania (BORTOLI; MONTIPÓ, 2016; MORO; SÓLIO, 2016), de representações sociais (CARNEIRO; PROCÓPIO, 2018) e masculinas (CAIM, 2016), e de estética literária (PEREIRA; STORER, 2017).

Outros dois trabalhos se aproximam um pouco mais do proposto aqui, pois possuem enfoques sobre as capacidades das narrativas poderem ora humanizar os retratados (CARRARO; LEMOS, 2015), ora convocar os leitores para notarem as pessoas (LOBATO, 2017). Esta última, constata que a página busca não apenas humanizar as narrativas mas também fazer com que o restante da sociedade, pelo menos a parcela com acesso ao site de rede social, possa conceber as pessoas em situação de rua como seres humanos, e não como objetos. A autora ainda indica a possibilidade de os estudos de jornalismo pensarem como o SP invisível pode “subverter seus formatos clássicos, como a grande reportagem e o perfil” (LOBATO, 2017, p. 58). O trabalho de Lobato (2017), dentre todos os previamente citados, é o único que analisa, mesmo sem método declarado, a fotografia e o texto da iniciativa. O restante ou se atêm à fotografia ou à legenda, isto é, não examinam integralmente as fotografias de entrevista. O fenômeno precisa ser compreendido por meio de uma pesquisa apropriada, que englobe os textos verbais e visuais, pois faz uso de fotografias potencialmente jornalísticas para tratar de questões sociais.

Com o propósito de facilitar a delimitação do objeto empírico escolhido, apresenta-se um breve histórico do SP invisível e uma descrição de sua produção neste momento introdutório. Trata-se de um grupo de profissionais que produzem uma página, na internet e no Facebook, voltada principalmente para a publicação de fotos de pessoas em situação de rua na cidade de São Paulo. A iniciativa é de responsabilidade do jornalista Vinícius Jorge Ribeiro Lima, formado na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), e do cineasta André Soler Torres Iung de Souza, formado na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP-SP). Ambos possuem o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) de Microempresa (ME) do movimento com o nome “SP Invisivel Produção Cinematográfica LTDA – ME”, tendo como

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atividade principal as “de produção de fotografias, exceto aérea e submarina”11.

A ideia começou em outubro de 2013, quando os dois então estudantes, em um passeio fotográfico com 30 outros jovens, saíram “para fotografar moradores de rua e postar no Instagram com a #SPinvisivel, mas sem conversar com eles, só de longe, mais para incomodar visualmente uma timeline só de comida, viagens e selfies”12. Segundo Vinícius, o organizador do passeio foi o pastor Joabe Santos13 da Igreja Batista de Água Branca (Ibab)14. No começo de março de 2014, Vinícius sugeriu a André que retornassem com a atividade, não de maneira esporádica mas de forma mais contínua e assim decidiram recomeçar. Os dois autores frequentam a Ibab, cujo pastor presidente Ed René Kivitz prefaciou o livro do projeto (LIMA, 2016a).

Conforme Lima (2016b), a origem da idealização do SP invisível também teve como fator motivacional pensar que a pouca atenção dada à população de rua não seria relativa aos corpos ou as presenças delas, mas no desconhecimento sobre quem são aquelas pessoas e os motivos que as fizeram estar ali.

Invisível é a história delas. Pra saber porque ela está lá, quem que é ela, porque que ela faz o que ela faz, porque que ela está onde ela está. O que mais me choca assim e que a gente quer mostrar é essa singularidade de cada um, esse lado heterogêneo da rua, de que a rua são os moradores de rua, é o João, a Maria, o José, e cada um é de 11 Disponível em: web.archive.org/web/20180302193150/https://www.cnpjconsultas.com/cnpj /sp-invisivel-producao-cinematografica-ltda---me/27490071000176. Acesso em: 10 jul. 2018. 12 Disponível em: web.archive.org/web/20170808030827/http://jornalismosp.espm.br/geral/pr ojeto-da-voz-aos-moradores-de-rua-e-ganha-milhares-de-seguidores-na-internet. Acesso em: 10 jul. 2018.

13 Informação disponível em:

web.archive.org/web/20170930053505/http://blog.jovempan.uol.com.br/rad ioatividade/2017/01/09/a-cidade-quem-ninguem-ve-moradores-de-rua-viram-personagens-de-livro/. Acesso em: 10 jul. 2018.

14 A Ibab está localizada no distrito de Barra Funda, pertencente à região oeste do município de São Paulo.

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um jeito por um motivo, por uma história. (LIMA, 2016b, online).

Por conseguinte, a primeira fotografia acompanhada com relato do SP invisível foi disponibilizada no Facebook no dia 17 de março de 2014 às 23h, contendo um texto entre aspas com cerca de 11 linhas e sem qualquer menção a autoria da fotografia. Desde então, o horário noturno de postagem e a ausência de indicação de autores das imagens foram mantidos.

Alguns meses após começarem, a dupla de responsáveis pelo SP invisível concedeu uma entrevista ao programa televisivo “Encontro com Fátima Bernardes”15, do Grupo Globo, em 22 de outubro de 2014. Dias depois, em 7 de novembro de 2014, a página alcançou 100 mil apreciadores16, com cerca de 125 publicações até aquele momento. Ou seja, a página da internet teve sua audiência catapultada substancialmente por sua aparição na televisão aberta. A ideia chegou a mais pessoas que tentaram aplicá-la em outras cidades do Brasil. Conforme os autores, “mais de 30 pessoas”17 entraram em contato e pediram para realizar atividades semelhantes ao SP invisível em outros municípios.

A participação do SP invisível se estendeu a dois eventos relacionados ao jornalismo. Os dois fundadores foram palestrantes da 9ª Semana de Fotojornalismo da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP) no dia 10 de novembro de 2015, em uma mesa com o tema “Personagens da Rua - Direitos Humanos”18.

15 Disponível em:

web.archive.org/web/20170809025205/http://gshow.globo.com/programas/ encontro-com-fatima-bernardes/O-Programa/noticia/2014/10/amigos-criam-pagina-na-internet-para-registrar-historias-de-moradores-de-rua.html. Acesso em: 10 jul. 2018.

16 Disponível em:

https://www.facebook.com/spinvisivel/photos/a.598272883590717.1073741 828.598268693591136/718159488268722/. Acesso em: 10 jul. 2018.

17 Disponível em:

web.archive.org/web/20150626182042/http://spinvisivel.com:80/index.php/ um-movimento-nao-um-projeto/. Acesso em: 10 jul. 2018.

18 Disponível em:

web.archive.org/web/20170621194746/http://jornalismojunior.com.br/sala3 3/9a-semana-de-fotojornalismo-cobertura-do-2o-dia-personagens-de-rua/. Acesso em: 10 jul. 2018.

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Cinco dias depois, em 15 de novembro, estavam na terceira parte do “Rebelião Jornalística”19, organizado pelo site Ponte Jornalismo e pela Agência Pública20, no Espaço Cultural Bela Vista, centro de São Paulo. O objetivo do evento, que contou com outros dez projetos convidados, era discutir “as narrativas jornalísticas capazes de lidar com as questões de direitos humanos, com os problemas da periferia, com as injustiças, com a violência dos agentes do Estado, com o racismo, com a desigualdade de gênero”21.

O coletivo SP invisível também possui um site22, mas nele não há

possibilidade de comentar ou demonstrar reações como na página do Facebook, portanto não há como mensurar a participação do público. A primeira versão site foi lançada em 6 de julho de 201523 e possuía o domínio24 “.com”, que mais tarde foi alterado para “.org”. O projeto se desdobra em diferentes plataformas, como Twitter25, Instagram26,

19 Disponível em:

web.archive.org/web/20150321123659/http://ponte.org/rebeliao-jornalistica-mostrou-nova-fase-do-jornalismo-independente/. Acesso em: 10 jul. 2018.

20 A Ponte é uma iniciativa de jornalismo independente com foco em Segurança Pública, Justiça e Direitos Humanos, e pode ser acessada em www.ponte.org. A Agência Pública é uma agência de jornalismo investigativo e independente fundada em 2011 por três mulheres jornalistas. Disponível em: www.apublica.org. Acesso em: 10 jul. 2018.

21 Disponível em:

web.archive.org/web/20150331031026/http://ponte.org/rebeliao-jornalistica-celebra-hoje-o-jornalismo-independente/. Acesso em: 10 jul. 2018.

22 Disponível em: spinvisivel.org. Acesso em: 10 jul. 2018. 23 Disponível em:

https://www.facebook.com/spinvisivel/posts/844794455605224. Acesso em: 10 jul. 2018.

24 Segundo o Registro.br, departamento do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) domínio é um “nome que serve para localizar e identificar conjuntos de computadores e serviços na Internet”, conforme o site www.registro.br/ajuda.html. O nome de domínio foi concebido com dois objetivos: primeiro para facilitar a memorização desses endereços, pois sem ele, teríamos que memorizar uma sequência grande de números; e, segundo, dar flexibilidade para que o operador desses serviços altere sua infraestrutura com maior agilidade.

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Youtube27. Com o passar do tempo, a página do coletivo no Facebook foi galgando mais perfis que a curtiam e a seguiam ao ser espalhada através de reações, comentários e compartilhamentos. Observando-se as publicações superficialmente, pode-se perceber que, para a produção das fotografias do coletivo, realiza-se uma entrevista aberta com o retratado. Depreende-se que o conteúdo da conversa, por sua vez, passa posteriormente por escrita, edição e organização, pelo fotógrafo ou responsável pelo coletivo fotográfico, para gerar um discurso legível, culminando em uma legenda que será incluída na descrição da imagem publicada. Ao se acessar o projeto no Facebook, encontra-se a página como na figura 1.

26 Disponível em: instagram.com/spinvisivel. Acesso em: 10 jul. 2018.

27 Disponível em: youtube.com/user/saopauloinvisivel. Acesso em: 10 jul. 2018.

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Figura 1- Página inicial do SP invisível no Facebook.

Fonte: facebook.com/spinvisivel. Acesso em: 28 ago 2017

Até 28 de agosto de 2017, 378.476 perfis no site curtiam a página e 376.598 a “seguiam”, possivelmente visualizando em suas próprias páginas iniciais. Na guia “Sobre”, o projeto se descreve como “um movimento de conscientização e humanização através das histórias dos invisíveis da cidade de São Paulo”. O tipo de página, escolhida pelos autores entre as opções do Facebook, é “Empresa de mídia/notícias em São Paulo”. O sistema também permite aos usuários do site fazerem

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uma avaliação numa escala de zero a cinco, na qual o SP invisível está mensurado pela audiência “4,9”. Em uma das guias, “Páginas curtidas por esta Página” são recomendados outros endereços de iniciativas que aplicaram a ideia de forma semelhante em outras cidades, como Campo Grande28, Porto Alegre29, Rio de Janeiro30, Salvador31, entre outras. Na coluna principal, as publicações são empilhadas em ordem temporal reversa, ou seja, a mais recente aparece primeiramente.

O coletivo recorre à criação de páginas de eventos no site de rede social, e ao financiamento coletivo por meio de outros sites. O primeiro evento, “Páscoa Invisível”32, foi promovido em 13 de abril de 2014 pouco mais de um mês depois da criação do projeto e consistiu numa distribuição de cobertores e ovos de Páscoa no vão do Museu de Arte de São Paulo (Masp). De 2015 até fins de 2017, o SP invisível organizou seis campanhas de financiamento coletivo, todas com êxito na arrecadação da meta: o “Aniversário Invisível”33, dois “#SPSemFrio”34, o próprio livro35 e dois “Natal Invisível”36. Assim, as ações não se

28 Disponível em: facebook.com/cginvisivel. Acesso em: 10 jul. 2018.

29 Disponível em: facebook.com/poainvisivel. Acesso em: 10 jul. 2018.

30 Disponível em: facebook.com/rio.invisivel. Acesso em: 10 jul. 2018.

31 Disponível em: facebook.com/ssainvisivel. Acesso em: 10 jul. 2018.

32 Disponível em: facebook.com/events/1460585207509313/. Acesso em: 10 jul. 2018.

33 Disponível em:

web.archive.org/web/20171006024555/http://spressosp.com.br/2015/01/14/ sp-invisivel-e-pimp-carroca-vao-presentear-catadores-em-sao-paulo/. Acesso em: 10 jul. 2018.

34 A primeira edição aconteceu no inverno de 2016 e distribuiu 200 kits com água mineral, cobertores, meias e moletons para as pessoas em situação de rua. Em 2017, 500 kits foram distribuídos. Disponível em: web.archive.org/web/20170928201257/http://cidadeludica.com.br/2016/06/ 16/sp-invisivel-promove-campanha-do-agasalho-em-sp/. Acesso em: 10 jul. 2018.

35 Reunindo 100 publicações da página, o exemplar de capa dura e papel fotográfico é vendido por um preço vigente de R$ 74,99 no site do

projeto. Informação disponível em:

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limitam ao ambiente digital, mas são realizadas nas ruas. A atuação rendeu uma homenagem por parte da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo37, na 20ª edição do prêmio Santo Dias de Direitos Humanos38 promovida no dia 20 de fevereiro de 2017. O evento foi coordenado pela Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais (CDH) e, nele, André e Vinicius receberam uma placa em reconhecimento aos serviços prestados.

O SP invisível se define como “um movimento de conscientização sobre a população em situação de rua e humanização do olhar da sociedade através das histórias de pessoas invisíveis da capital paulista” (LIMA, 2016a, p. 7). As pessoas invisíveis referidas são as pessoas em situação de rua. Não existem dados oficiais sobre o total dessa população no país, como alerta Natalino (2016)39. Tal ausência reproduz a quase inexistência da população de rua para o âmbito das

ada/2016/10/1822575-movimento-sp-invisivel-quer-criar-livro-de-perfis-de-moradores-de-rua.shtml. Acesso em: 10 jul. 2018.

36 A primeira edição evento ocorreu no dia 21 de dezembro de 2016 e nele buscaram distribuir mais de 600 refeições para pessoas em situação

de rua. Informações disponíveis em:

web.archive.org/web/20180624080204/https://papodehomem.com.br/ceia-nas-ruas-natal-invisivel/. Acesso em: 10 jul. 2018.

37 Disponível em:

web.archive.org/web/20170928205153/https://www.al.sp.gov.br/noticia/?id =376914. Acesso em: 10 jul. 2018.

38 A congratulação homenageia o metalúrgico e ex-membro da Pastoral Operária de São Paulo, Santo Dias da Silva, assassinado pela Polícia Militar durante a greve de 30 de outubro de 1979. O cortejo do corpo de Santo Dias, em 31 de outubro de 1979, reuniu 30 mil pessoas e acabou se tornando uma das maiores manifestações contra a ditadura

militar. Informações disponíveis em:

https://f5.folha.uol.com.br/saiunonp/2015/05/1630975-santo-dias-e-assassinado-durante-piquete-em-sao-paulo.shtml. Acesso em: 10 jul. 2018.

39 Para o pesquisador, a atividade de vigilância socioassistencial deve ser acompanhada de maiores esforços para a inserção desta classe social no Cadastro Único para Programas Sociais, “de forma que se ampliasse o acesso da população em situação de rua às políticas públicas, tais como transferência de renda, inclusão produtiva e habitação” (NATALINO, 2016, p. 25-26). Ele recomenda que a contagem da população de rua seja incorporada ao Censo de 2020.

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políticas sociais40. A partir de dados do Censo do Sistema Único de Assistência Social (Suas)41, Natalino (2016) estima que existam 101.854 pessoas em situação de rua. Em São Paulo, destaca-se a existência da “Pesquisa Censitária da População em Situação de Rua” (FIPE, 2015), um relatório que caracterizou socioeconomicamente a população adulta em situação de rua e identificou suas necessidades. O estudo foi realizado quando a cidade de São Paulo possuía 11 milhões de habitantes segundo dados do Censo do IBGE de 2010. O levantamento censitário contou 15.905 pessoas em situação de rua na capital paulista42, com o distrito da Sé concentrando o maior número de pessoas encontradas na rua: 3.863.

40 Em 23 de dezembro de 2009, foi publicado o decreto Nº 7.053 da Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPR) que estabelece diretrizes para garantir direitos das pessoas que tem em comum a extrema pobreza, a fragilidade nos vínculos familiares e a inexistência de moradia convencional regular. Informações disponíveis em: https://web.archive.org/web/20171119182943/http://www.planalto.gov.br:8 0/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d7053.htm. Acesso em: 10 jul. 2018.

41 O Censo Suas foi regulamentado pelo Decreto 7.334/2010. É uma ferramenta de captação anual de informações institucionais de secretarias e conselhos estaduais e municipais de assistência social, bem como das unidades gestoras e prestadoras de serviços públicos, tais como os Centros de Referência da Assistência Social (Cras), Centros de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e Centros de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centros POP). Mais

informações disponíveis em:

https://web.archive.org/web/20180525020237/http://blog.mds.gov.br/redesu as/sistemas/censo-suas/. Acesso em: 10 jul. 2018.

42 Segundo a pesquisa censitária, 88% dessa população em situação de rua de São Paulo é do sexo masculino, e a média geral de idade é de mais de 40 anos. “Quanto à cor declarada, a maioria é de ‘não brancos’ (pretos, pardos, amarelos e indígenas): 69,7% entre os acolhidos e 72,1% nas ruas” (FIPE, 2015, p. 8). A escolaridade é baixa, com porcentagem de analfabetos (7,1% nos acolhidos e 9,6% nos de rua) superior à do município de São Paulo. A presença de migrantes é majoritária na composição, com 73,4% e 71%, mas possui presença expressiva de pessoas nascidas no município de São Paulo: 26,6% e 29%. Outra grande porcentagem constatada foi o elevado índice de pessoas solitárias: 80% e 69%. Quanto ao emprego, poucos afirmaram ter registro na carteira do trabalho: 7,2% entre acolhidos e 2,2% entre os de rua. A maioria obtém renda por conta própria ou

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Tal população, para Freire (1989), conta com pouco acesso a serviços básicos relativos à saúde e à educação, tendo poucas perspectivas pessoais de desenvolverem seus potenciais humanos. Por tudo isso, é “o oprimido e não o opressor” (FREIRE, 1989, p. 13). Para o autor, a problemática das pessoas em situação de rua, especialmente das crianças, não pode ser exclusiva dos educadores. “Ela demanda não só criação de novas alternativas mas também cobranças de respostas às instituições públicas e particulares” (FREIRE, 1989, p. 15). Portanto, esse conjunto de questões também pode ser objeto dos jornalistas e outros profissionais das ciências sociais aplicadas.

Com o intuito de viabilizar o trabalho de análise das publicações, considera-se a abrangência do alcance da página crucial para a seleção de dez delas com maior engajamento, de acordo com Recuero (2013), sendo as que receberam mais atividade dos usuários. Não seria compatível recolher as primeiras publicações, que tiveram pouca audiência porque a página ainda não tinha se popularizado, e compará-las com aquecompará-las do período em que o site obteve mais público. Tendo em mente essa discrepância, o período de coleta foi de 7 de novembro de 2014, data em que a página alcançou 100 mil curtidas43, até 2 de abril de 2017, em que a página marcava 341 mil seguidores44.

Visando a análise desse objeto empírico, a estrutura da dissertação possui três capítulos em sua composição. Na primeira parte, define-se o coletivo fotográfico a partir de Queiroga (2012) e seu movimento de apropriação de site de rede social (RECUERO, 2009) e de tensionamento de alguns conceitos de fotojornalismo (SOUSA, 2000;

eventualmente (57,7% e 73,8%), enquanto que uma parcela declarou não estar trabalhando (25,8% e 20,7%). Entre os que trabalham eventual ou autonomamente nas ruas, prevalecem atividades como carga e descarga, entregador de panfleto, flanelinha, reciclador, vendedor ambulante, entre outras. “Além disso, a prática da mendicância é uma forma comum de obtenção de renda na rua” (FIPE, 2015). A maioria de acolhidos (84%) e de rua (89%) não participa de nenhum Movimento Social.

43 Endereço para a publicação que marcou esse índice:

https://www.facebook.com/spinvisivel/photos/a.598272883590717.1073741 828.598268693591136/718159488268722/?type=3&theater. Acesso em: 10 jul. 2018.

44 Estatística marcada pela seguinte reportagem:

https://web.archive.org/web/20170903203330/http://www.istoedinheiro.co m.br/uma-janela-para-ver-sao-paulo-em-versao-on-line/. Acesso em: 10 jul. 2018.

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BAEZA, 2007), para enfim caracterizar sua atividade como prática social jornalística (GROTH, 2011; RUELLAN; ADGHIRNI, 2009; DOMINGO; LE CAM, 2015). Na etapa seguinte, partindo da reflexão de Ijuim e Sardinha (2009) sobre a necessidade de se pensar na humanização no jornalismo, envereda-se por uma perspectiva marxista sobre o conceito de humanização (FREIRE, 2016) e quais as características essenciais humanas, segundo as três definidas por Márkus (2015): consciência, trabalho e sociabilidade. Ainda propõe-se o diálogo de Freire (2016) como uma perspectiva para a legenda de fotografia de entrevista (ABREU SOJO, 1998). O último capítulo examina, por meio da Gramática do Design Visual (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006; OLIVEIRA, 2011), como os recursos de interação nas fotografias e as características essências humanas nas legendas são utilizadas para humanizar os retratados.

Nas considerações finais, os principais pontos são retomados e indicam-se as potencialidades do objeto para o fotojornalismo, para os retratados, e para o público leitor. Por fim, visa-se, com este estudo, contribuir para a produção de conhecimento científico na área de “Jornalismo e Editoração”, segundo o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Ressalta-se que esta pesquisa está vinculada ao Programa de Pós-graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (PPGJOR/UFSC), dentro da Linha de Pesquisa “Tecnologias, Linguagens e Inovação em Jornalismo”.

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1 COLETIVOS FOTOGRÁFICOS E FOTOJORNALISMO

Este capítulo trata das condições históricas e tecnológicas mais abrangentes que moldaram os coletivos fotográficos entre outros modelos de grupos de fotógrafos. Partindo disso, aborda a apropriação feita pelos coletivos fotográficos sobre os sites de redes sociais, principalmente o Facebook, como sistema de publicação para circulação de suas produções. Em seguida, apresenta como esse movimento problematiza os conceitos de fotojornalismo e fotodocumentarismo, e, então, aproxima a atividade dos coletivos fotográficos como uma prática social de fotojornalismo.

1.1 COLETIVO FOTOGRÁFICO: FORMAÇÃO HISTÓRICA E CONCEITUAL

O processo de criação da fotografia possui origens coletivas. A fixação de imagens através de lentes e câmaras decorre de um acúmulo de conhecimento realizado por vários pensadores que culmina na primeira metade do século XIX, entre a França e a Inglaterra45. O resultado foi um cruzamento de três descobertas produzidas historicamente, segundo Machado (1984). Em diferentes espaços e tempos, foram elaboradas a câmara escura, a perspectiva artificial e, por último, a superfície fixadora. A câmara escura teve a óptica sistematizada pelo árabe Ibn Al-Haytham (OLSCHOWSKY, 2006), foi utilizada por arquitetos e pintores renascentistas por meio da Perspectiva Artificial (HOCKNEY, 2001), e o desenvolvimento do processo positivo/negativo iniciado pelo inglês William Henry Fox Talbot (MACHADO, 1984). Esta última etapa corresponde ao processo químico, ou digital, e as duas primeiras correspondem ao processo óptico.

Cada uma delas equivale a uma das três pontas do chamado “triângulo de exposição”: o obturador do corpo da câmera, o diafragma da objetiva, e a sensibilidade da película ou do sensor. O obturador, vindo da câmara escura, controla a quantidade de tempo captado; o diafragma, desenvolvido pela sistematização da perspectiva artificial, regula a intensidade de luz disponível; e a sensibilidade da superfície, derivada dos processos químicos, absorve a iluminação sobre os objetos

45 A possibilidade de escrita com luz foi percebida isoladamente no Brasil com Antoine Hercule Romuald Florence (1804-1879), conforme as pesquisas de Kossoy (2006) e Monteiro (2004).

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materiais. Esse procedimento mecânico confere à representação da fotografia uma objetividade, mas também possui uma subjetividade, conforme Machado (1984).

A fotografia parece possibilitar a reprodução automática do mundo visível: automática num sentido positivista, livre de codificações subjetivas e estilizações pessoais de cada operador, como se pudesse ser isenta e neutra. Todavia, o autor lembra que toda fotografia “é sempre um retângulo que recorta o visível. O primeiro papel da fotografia é selecionar e destacar um campo significante, limitá-lo pelas bordas do quadro, isolá-lo da zona circunvizinha que é a sua continuidade censurada” (MACHADO, 1984, p. 76). Essa seleção é essencialmente interpretativa por parte dos interesses do fotógrafo, conforme Hamilton (1997, p. 85, tradução nossa)46: “As representações que o fotógrafo produz estão relacionadas às suas interpretações pessoais dos eventos e assuntos que ele ou ela escolhe colocar na frente da lente da câmera”.

Com esse histórico e especificidade, o que se convencionou nomear de fotografia tem uma origem muito anterior ao processo de fixação de imagens em superfícies com substâncias sensíveis. O mesmo aspecto coletivo se manteve na prática fotográfica, conforme indicam Silva Junior e Queiroga (2010). Para um desses pesquisadores, os coletivos fotográficos como agrupamentos de fotógrafos surgem “com maior ênfase” na primeira década dos anos 2000 com o desenvolvimento do meio digital (QUEIROGA, 2012, p. 113). Porém, existiram experiências anteriores ainda no período em que a fotografia era analógica.

Nos anos 1930, existiu o coletivo fotográfico Hermanos Mayo na Espanha (MRAZ, 1993). Funcionando como agência fotográfica, era composto por cinco fotojornalistas - Francisco (Paco), Faustino, Julio, Cândido e Pablo – que atuaram durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939) e migraram para o México. Segundo Mraz (1993), na América Latina, eles introduziram as vantagens técnicas das câmeras Leica, mais leves e intercambiáveis. Os Hermanos Mayo tinham a necessidade de vender suas produções, “possuindo o próprio arquivo, e participando ativamente na fundação e operação de publicações” (MRAZ, 1993, p.

46 Tradução nossa para: “The representations that the photographer produces are related to his or her personal interpretations of the events and subjects which he or she chooses to place in front of the camera lens” (HAMILTON, 1997, p. 85).

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83, tradução nossa)47. Os trabalhos ficaram conhecidos pelo comprometimento com a classe trabalhadora, principalmente na Revolução Mexicana (1910-1917), registrando as lutas sociais e as “pessoas esquecidas que lutavam para ganhar a vida nas ruas” (MRAZ, 1993, p. 87, tradução nossa)48. Outro caso é o grupo fotográfico AFAL (sigla para Agrupación Fotográfica Almeriense), fundado em 1956 na Espanha, cujo veículo de divulgação era uma revista homônima49. Inicialmente utilizada como um boletim social do coletivo, a linha editorial do periódico recebeu uma reformulação nos primeiros números em que os fotógrafos, amadores e profissionais, foram dirigidos a documentar o cotidiano “com um claro humanismo social e com uma preocupação com a imagem como um instrumento de cultura e comunicação” (SIQUIER, 2003, online, tradução nossa)50.

No Brasil, o coletivo fotográfico “Ladrões de Alma” de Brasília reivindica o título de primeiro do país (MORELLI et al., 2015). O marco de lançamento do grupo, formado inicialmente por 11 integrantes, foi uma coleção de 24 cartões postais do distrito federal em 1988. Naquele ano, alguns alunos da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB) se reuniram em espaços próprios e dividiram a produção de seus trabalhos imagéticos para divulgar mais intensamente suas ideias. Não queriam produzir nos modelos disponíveis, mas, “tampouco queriam formar um fotoclube, embora quisessem criar com a liberdade dos amadores” (DOBAL, 2015, p. 22). Uma exposição artística, em 1990, consolidou o trabalho do coletivo, que buscava fugir do discurso fotográfico da capital do Brasil “marcado pelo fotojornalismo, pela ideia da ‘foto forte’, da imagem única que desse conta da função de dizer tudo sozinha” (FEIJÓ, 2015, p. 88). As marcas do grupo, segundo Feijó (2015), eram o ensaio fotográfico concretizado através de cartões postais

47 Tradução nossa para: “possessing their own archive, and participating actively in the founding and operating of publications” (MRAZ, 1993, p. 83).

48 Tradução nossa para: “forgotten people who struggle to make their living in the streets” (MRAZ, 1993, p. 87).

49 Mais informações estão disponíveis em:

https://web.archive.org/web/20170331212914/http://www.museoreinasofia. es/sites/default/files/salas/informacion/grupo_afal_.pdf. Acesso em: 10 jul. 2018.

50 Tradução nossa para: “con un claro humanismo social y con una preocupación por la imagen como instrumento de cultura y comunicación” (SIQUIER, 2003, online).

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ou exposições, a ausência de hierarquia ou diretoria, e, internamente, o processo de edição com seleção, discussão e avaliação coletiva das imagens. Isso demonstra que a organização de coletivos fotográficos não passou a ocorrer a partir do surgimento da tecnologia digital, mas foi impulsionado por ela. Resta buscar uma delimitação mínima para esta modalidade de grupo de fotógrafos.

Ao longo da história da fotografia, há diversos registros de fotógrafos que se associavam numa união em prol do aprimoramento pessoal e compartilhamento de experiências. Por isso, a emergência do coletivo fotográfico decorre de outras organizações, como associações, agências, fotoclubes, entre outros. Enfocando a fotografia com uma finalidade comunicativa e relacionada com a documentação, Queiroga (2012) diferencia o coletivo fotográfico de outras experiências colaborativas na fotografia como os fotoclubes, o projeto estadunidense de documentação Farm Security Administration (FSA), e as agências. Todavia, adverte sobre os diferentes usos das produções: um mesmo trabalho fotográfico pode ser feito em um fotoclube, virar foto-livro e ser exposto num museu, dentre outras combinações possíveis.

Os grupos de fotógrafos que compartilhavam objetivos em comum se formaram alguns anos depois da oficialização dos primeiros processos de fixação fotográfica. Fundado em 1843, o Calotype Club de Edinburgh, capital da Escócia, é considerado o primeiro clube de fotógrafos do mundo (A REMINISCENCE, 1874). O texto mais antigo sobre a aglomeração rememora que “os membros eram todos experimentalistas -interessados, e o objetivo de seu encontro era trocar ideias e comunicar resultados e experiências, com uma visão de cada um fazendo tudo o que poderia beneficiar o todo” (A REMINISCENCE, 1874, p. 385, tradução nossa)51. Esse grupo não tinha regras ou formalidades de qualquer tipo, como sede, tanto que as reuniões eram realizadas alternadamente nas casas dos membros. A formalização passaria a ocorrer a partir da segunda metade do século XIX para o século XX, com as associações de fotógrafos e os fotoclubes por vários países. No Brasil, o marco inicial do movimento fotoclubista foi a fundação do Photo-Club Helios, de Porto Alegre, em 2 de março de 1907, conforme Rodeghiero (2014, p. 510) constatou por meio de estatuto. Depois, houve a criação do Photo Club do Rio de Janeiro, em

51 Tradução nossa para: “The members were all keen experimentalists, and the object of their meeting was to exchange ideas and communicate results and experiences, with a view of each doing all that he could benefit of the whole” (A REMINISCENCE, 1874, p. 385).

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1910, e o Foto Clube Bandeirante de São Paulo, em 1939 (COSTA; SILVA, 2004).

O maior catalisador para a expansão da fotografia foi criação do filme de rolo da Kodak de George Eastman em 1888. Com essa inovação, a produção de uma fotografia foi facilitada, não sendo mais necessário muitos conhecimentos químicos nem grandes equipamentos técnicos para se fazer uma fotografia, afinal o bordão da empresa era “Você pressiona o botão, nós fazemos o resto” (“You press the button, we do the rest”, na frase original) (COSTA; SILVA, 2004, p. 21). Ou seja, não só foi tornada um produto acessível mas sua prática se expandiu, influenciando costumes e criando novos hábitos sociais. Formou-se o fotoamadorismo e a fotografia deixou de ser uma atividade de entendidos para se alçar como uma prática democrática a quem pudesse pagar. Nesse contexto, os fotoclubes eram grupos cujos integrantes visavam fazer da fotografia uma atividade artística e desenvolver mais os próprios conhecimentos.

Ao movimento de industrialização e popularização da produção fotográfica, correspondeu um outro movimento artístico que o fotoclubismo incentivou: o pictorialismo, uma tentativa de conferir à fotografia o status de “obra de arte” (COSTA, 1991, p. 263). “Na Europa, os fotógrafos amadores adotaram como modelo a pintura do século XIX, academizaram seus arquétipos formais e reintroduziram a cópia única pela intervenção em todas as etapas do processo fotográfico” (COSTA; SILVA, 2004, p, 21). Nessas intervenções, os fotógrafos alteravam a pigmentação no fotograma dissolvendo as formas dos componentes e dando uma aparência de gravura, aquarela ou pintura. “Tentando se colocar como arte, a fotografia perdia sua própria identidade” (COSTA, 1991, p. 264).

Além disso, no interior dos fotoclubes, a participação dos fotógrafos era marcada pela competição. “Havia uma hierarquia que classificava os sócios dos clubes em categorias, segundo seu nível de aperfeiçoamento” (COSTA; SILVA, 2004, p. 23). Eram realizados concursos internos, em que os associados ganhavam pontos computados. Os fotoclubes possuíam como membros amadores, profissionais, artistas e técnicos, mas conforme o desempenho avaliado pelos organizadores, as pessoas eram promovidas entre categorias como “aspirantes”, “novíssimos”, “juniores” e “seniores”. Ainda havia “duelos fotográficos”, em que os integrantes saíam juntos com o mesmo tipo de equipamento para fotografar um assunto em comum, posteriormente, sendo os resultados julgados por uma banca. Mesmo que a linguagem fotográfica fosse subjetiva, possuíam um sentido meritocrático e

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divisório entre “vencedores” e “perdedores”. Sendo assim, os fotoclubes eram compostos por fotógrafos amadores e profissionais, que produziam individualmente, orientados de maneira centralizada. Não buscavam o lucro direto, mas um melhor desenvolvimento no fazer fotográfico, por meio de um sistema hierárquico que incentivava a concorrência e mantinha suas identidades como individuais.

Não sendo fotoclube tampouco agência, houve o projeto coletivo de documentação financiado pela Secretaria de Segurança no Trabalho Rural dos Estados Unidos, o Farm Security Administration (FSA). Governamental, o organismo foi sustentado a partir de 1937, durante o período da Grande Depressão (1929-1939). Origina-se em 1933, quando o presidente Franklin Delano Roosevelt aprovou uma série de políticas econômicas chamadas de New Deal. Dentre elas, estava a criação do Departamento Histórico do FSA. O objetivo era documentar a situação da pobreza rural e mostrar o “valor das pessoas” fotografadas, segundo Sontag (2004). “Portanto definia implicitamente seu ponto de vista: o de pessoas de classe média que precisavam ser convencidas de que os pobres eram mesmo pobres, e de que eram dignos” (SONTAG, 2004, p. 77).

No começo, o foco era o êxodo rural dos Estados do Centro-Oeste para os do Centro-Oeste dos EUA, mas o escopo do projeto se expandiu conforme o passar do tempo para as condições urbanas e os preparativos para a 2ª Guerra Mundial. Durante a existência do trabalho até 1946, muitos fotógrafos se tornaram conhecidos, dentre eles Dorothea Lange (1895 – 1965), Gordon Parks (1912 – 2006), e Walker Evans (1903 – 1975), todos dirigidos pelo editor de fotografia Roy Emerson Stryker (1893-1975). Stryker instruía sua equipe de subordinados quanto ao que deveriam fotografar e de que forma deveriam mostrar (SONTAG, 2004). Ele categorizava, arquivava e selecionava o trabalho enviado pelos fotógrafos, podendo até descartar fotogramas. As milhares de fotografias resultantes estão disponíveis52 na Divisão de Impressos e Fotografias da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. Pode-se depreender que era um projeto composto por fotógrafos profissionais, que produziam individualmente ainda que orientados pelo editor de maneira centralizada. Trabalhando para o governo que os financiava, mas mantendo as identidades individuais, os fotógrafos não objetivavam o lucro.

52 Disponível em: loc.gov/pictures/collection/fsa/. Acesso em: 10 jul. 2018.

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A emergência das primeiras agências de fotografia, no fim do século XIX, é um dos fatores que contribuíram para a institucionalização do fotojornalismo (KELLER, 2007). “Na raiz desse desenvolvimento tardio, estava o fato que nem os maiores jornais com a mais versátil equipe de fotógrafos poderia cobrir todos os importantes eventos noticiáveis, especialmente se acontecesse em um momento e lugar imprevisível” (KELLER, 2007, p. 149, tradução nossa)53. Nesse contexto, em 1898, o fotógrafo George Grantham Bain (1865-1944) inaugura a Bain News Service em New York. Conhecido como “o pai das fotografias de notícias estrangeiras”, Bain criou um serviço em que acumulava fotografias e as revendia. Ele comprava de correspondentes e jornais de várias partes dos Estados Unidos, fazia cópias e enviava para seus assinantes. Assim como os negativos da FSA, os 40 mil da Bain News estão disponíveis54 no site da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos.

Há três tipos de experiências com fotografia que se podem denominar de agências, conforme Humberto (1983): agência internacional, agência de empresa jornalística, e agência de fotógrafos. A primeira alude às agências estrangeiras, internacionais, grandes corporações globalizadas que fazem circular mundialmente maciços volumes de imagens. Para Humberto (1983), esse tipo de agência pode atuar como instrumento de dominação quando operava em um sentido centralizado de apenas venda. Queiroga (2012) atribui não somente a função de venda, mas também de produção. Exemplos são a Agence France-Presse (AFP), Associated Press, Agência EFE e Thomson Reuters.

A segunda experiência se refere ao de agências de veículos de comunicação, que “comercializa o subproduto das grandes empresas jornalísticas” (HUMBERTO, 1983, p 44). Essa agência se distinguiria da anterior pelo fluxo informacional. Enquanto que na anterior, o fluxo de informação seria recíproco – no qual a agência capta material ao redor do mundo para então distribuir aos assinantes – nesta o fluxo informacional seguiria uma lógica centrífuga de mão única, tendo, como centro, o veículo produtor das imagens (QUEIROGA, 2012). Exemplos

53 Tradução nossa para: “At the root of this latter development was the fact that not even the greatest newspapers with the most versatile staff photographers could cover every important news event, especially if it happened in an unpredictable moment and place” (KELLER, 2007, p. 149).

54 Disponível em: loc.gov/pictures/collection/ggbain/ Acesso em: 10 jul. 2018.

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