CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR EM AÇÃO DE HABEAS CORPUS1
INTRODUÇÃO
Habeas corpus é o remédio judicial que tem por finalidade evitar ou fazer cessar a
violência ou coação à liberdade de locomoção, decorrente de ilegalidade ou abuso de poder. O intuito deste trabalho é demonstrar, de forma objetiva, a possibilidade de concessão de medida liminar em ação de Habeas Corpus, para evitar danos irreparáveis decorrentes do constrangimento ilegal a liberdade de locomoção, sem deixar de lado informações importantes para uma melhor compreensão desse instituto tão importante em nosso ordenamento.
DESENVOLVIMENTO
Segundo LENZA (2007) o Habeas Corpus foi a primeira garantia de direitos fundamentais, concedida por “João Sem-Terra”, monarca inglês, na Magna Carta, em 1215 e formalizada, posteriormente, pelo Habeas Corpus Act, em 1679.
No Brasil a primeira manifestação do instituto deu-se em 1821, através de um alvará emitido por Dom Pedro I, pelo qual se assegurava a liberdade de locomoção. Na atual constituição de 1988 o habeas corpus está incluído no art. 5º, LXVIII que estabelece: conceder-se-á Habeas Corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
O habeas corpus é uma ação constitucional de caráter penal e de procedimento especial, isenta de custas e que visa evitar ou cessar violência ou ameaça na liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. Não se trata, portanto de uma espécie de recurso, apesar de regulamentado no capítulo a eles destinado no Código de Processo Penal.
1 Revista NPI - Núcleo de Pesquisa Interdisciplinar, São Manuel, 02/08/2010. 05p.
O autor da ação constitucional de habeas corpus recebe o nome de impetrante; o indivíduo em favor do qual se impetra, paciente (podendo ser o próprio impetrante), e a autoridade que pratica a ilegalidade ou abuso de poder, autoridade coatora ou impetrado.
Referida ação pode ser formulada sem advogado, não tendo que obedecer qualquer formalidade processual ou instrumental.
Segundo MORAES (2008), o Habeas Corpus pode ser interposto para trancar ação penal ou inquérito policial, bem como em face de particular, como no exemplo de hospital psiquiátrico, que priva o paciente de sua liberdade de ir e vir, ilegalmente, atendendo a pedidos desumanos de filhos ingratos que abandonam os seus pais.
Convém lembrar que, não obstante o esforço teórico desprendido por vários autores e o fato de o habeas corpus servir às vezes, como sucedâneo de recurso, para atacar pronunciamento judicial, está hoje fora de qualquer dúvida a sua natureza jurídica de ação, ou seja, atuação do interessado, ou alguém por ele, consistente no pedido de determinada providência, a órgão jurisdicional, contra ou em face de quem viola ou ameaça violar a sua liberdade de locomoção.
Segundo MIRABETE (2008), quando se destina a afastar constrangimento ilegal à liberdade de locomoção já existente, o habeas corpus é chamado de liberatório ou repressivo. Pode ser ele concedido a pedido ou de ofício pelo Juiz ou Tribunal. Mas pode ser impetrado quando existe apenas uma ameaça à liberdade de locomoção, recebendo a denominação de habeas corpus preventivo. Nesta hipótese, é expedido um salvo-conduto, assinado pela autoridade competente. O salvo-conduto, assim, deve ser expedido se há, por exemplo, fundado receio do paciente de ser preso ilegalmente. Mas o receio de violência deve resultar de ato concreto, de prova efetiva, da ameaça de prisão. Temor vago, incerto, presumido, sem prova, ou ameaça remota, que pode ser evitada pelos meios comuns, não dá lugar à concessão de habeas corpus preventivo.
Evidentemente, a impetração pode vir instruída com provas (documentos, certidões, justificações etc.), inclusive com rol de testemunhas, cujos depoimentos podem ser necessários em determinadas situações, desde que não prejudiquem a celeridade do processo, urgente por natureza. Impetração sem um mínimo de prova pré-constituída que
demonstre ao julgador a veracidade do fato que o impetrante aponta como ilegal e que configuraria, pelo menos em tese, constrangimento indevido, não pode ser deferida.
De acordo com o artigo 660, § 2°, "se os documentos que instruírem a petição evidenciarem a ilegalidade da coação, o juiz ou o tribunal ordenará que cesse imediatamente o constrangimento". Por isso se tem entendido que nada impede seja concedida liminar no processo de habeas corpus, preventivo ou liberatório, quando houver extrema urgência
Segundo PACELLI (2008), preceitua o artigo 654, parágrafo 2º do Código de Processo Penal, “os Juízes e os Tribunais tem competência para expedir de oficio ordem de
habeas corpus, quando no curso do processo verificarem que alguém sofre ou esta na
iminência de sofrer coação ilegal”.
Para a concessão da ordem, na hipótese, não há necessidade de processo especial, a autoridade judiciária serve-se dos próprios elementos do processo, que corre sob sua jurisdição, eis que a prova nele colhida, a convença da efetividade, ou da ameaça real e iminente, de constrangimento ilegal de que seja paciente, o réu, o ofendido, o querelante, testemunha, advogado.
Provada a ilegalidade do constrangimento e concedida a ordem de habeas corpus, expedir-se-á alvará de soltura, lavrado pelo escrivão da Vara e assinado pelo juiz, a fim de que o paciente seja posto em liberdade.
Não poderá a autoridade coatora deixar de acatar, imediatamente, a ordem concedida, a não ser que a mesma emane de Juiz Incompetente para a sua concessão. O não cumprimento implica em desobediência, podendo o Juiz determinar a prisão do detentor, ou requisitar a força necessária para que a mesma seja cumprida.
Segundo TOURINHO FILHO (2008), em ambas as espécies de Habeas Corpus haverá possibilidade de concessão de medida liminar para se evitar possível constrangimento à liberdade de locomoção irreparável.
Embora desconhecida figura da “liminar” na legislação referente ao habeas corpus, foi introduzida, nesse remédio jurídico, pela Jurisprudência, visando atender casos em que a cassação da coação ilegal exige pronta intervenção do judiciário, lembrando que até mesmo
os regimentos internos dos Tribunais, e em especial o do STF, admitem decisão liminar em processo de Habeas Corpus.
Como medida cautelar excepcional, a liminar em habeas corpus, além daquelas condições de toda e qualquer ação, exige requisitos que são a base para concessão de referida medida. Esses requisitos são o “periculum in mora” ou perigo na demora, quando há probabilidade de dano irreparável e o “fumus boni iuris” ou fumaça do bom direito, quando os elementos da impetração indiquem a existência de ilegalidade.
Importante ressaltar que tal medida surgiu com o Almirante José Espínola, ilustre figura que perolou no STM (cf. RTJ, 33/590). Posteriormente surgiu outro caso em novembro de 1964 em que a auditoria da 4ª Região Militar decretou a prisão de Mauro Borges, então governador do estado de Goiás. As tropas sediadas em Anápolis-GO já estavam marchando em direção a Goiânia para cumprimento da decisão. Impetrou-se o
habeas corpus, que recebeu o número 41.296, distribuído ao relator, Ministro Gonçalves de
Oliveira. Como naquele dia não havia sessão no STF, quer no Plenário, quer de suas Turmas, sua Excelência, o ex-Ministro Relator, concedeu a liminar, pois, do contrário, de nada adiantaria a apreciação do habeas corpus, pois a violência já estaria consumada.
Na referida decisão o relator observou: “Se no mandado de segurança pode o Relator conceder a liminar até em casos de interesses patrimoniais, não se compreenderia que, em casos em que está em jogo a liberdade individual ou as liberdades públicas, a liminar, no habeas corpus, não pudesse ser concedida”. Depois do ocorrido, na primeira reunião do Plenário ou Turma, foi o habeas corpus concedido por votação unânime. A partir daí os Tribunais passaram a conceder a referida “liminar”.
CONCLUSÃO
O Habeas Corpus é um importante remédio judicial para garantir a paz social e impedir abusos de poder e ilegalidades que possam restringir, ou por a perigo, a liberdade de locomoção das pessoas.
A possibilidade de concessão da medida liminar na ação de Habeas Corpus é uma importante medida para dar força ao referido instituto, garantindo que a restrição ilegal da liberdade não cause danos irreparáveis em decorrência da demora, já que seu objetivo é garantir a imediata solução para cessar a ilegalidade ou abuso de poder.
A liberdade é um dos dons mais preciosos que o céu deu aos homens. Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio, nem os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Editora Método, 2006. 816 pg.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Atlas, 2008. 900 pg.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. São Paulo: Editora Atlas, 2008. 784 pg.
PACELLI, Eugênio. Processo Penal. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2008. 777 pg.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. São Paulo: Editora Saraiva, 2008. 673 pg.