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Academic year: 2020

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Produções culturais surdas no contexto da educação bilingue

Deaf cultural productions in the bilingual education context

Beras, Júlia Jost – julia_beras@hotmail.com Lunardi-Lazzarin, Márcia Lise (O.)

Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS

Submetido em 28/08/2017 Revisado em 04/09/2017 Aprovado em 30/10/2017

Resumo: O artigo se propõe a discutir questões do projeto “Produções Culturais Surdas no contexto da Educação Bilíngue” (GIPES/CNPq), cujo objetivo é problematizar os modos de circulação e consumo de artefatos culturais da educação bilíngue para surdos nos espaços da Educação Básica. Interessa-nos olhar para a educação de surdos a partir das questões culturais e idenitárias que estão no centro do debate da escola contemporânea. Para a análise filiamo-nos ao campo dos Estudos Culturais em Educação.

Palavras-chave: educação bilíngue, artefatos culturais, escola de surdos.

Abstract: The paper intends to discuss aspects related to the project "Deaf Cultural Productions in the Bilingual Education Context" (GIPES / CNPq), whose objective is to problematize the circulation modes and cultural artifacts consumption of bilingual education for the deaf in the spaces of Basic Education. It’s our interest to look at the education of the deaf from the cultural and identity issues that are at the center of the contemporary school debate. For the analysis, we joined the field of education cultural studies.

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Introdução

As discussões realizadas no presente artigo referem-se ao recorte realizado pela Universidade Federal de Santa Maria a respeito do projeto

“Produções Culturais Surdas no contexto da Educação Bilíngue1” o qual é

proposto por pesquisadoras de três universidades federais localizadas no Estado do Rio Grande do Sul. A Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS; Universidade Federal de Pelotas – UFPel; e a Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, vêm nos últimos anos desenvolvendo investigações no campo da cultura e educação de surdos, junto ao Grupo Interinstitucional de Pesquisa em Educação de Surdos (GIPES), registrado no Diretório CNPq. Particularmente, na última década, as proponentes participaram de várias pesquisas, financiadas pelas agências nacionais (CNPq, CAPES/MinC, FAPERGS, FUNARTE), compondo um conjunto de análises significativas quanto às condições sociais, linguísticas, culturais e educacionais dos surdos.

A partir dos trabalhos realizados pelo referido grupo de pesquisa, mostrou-se necessário que para pensar os processos de ensino-aprendizagem dos alunos surdos, se faz urgente uma discussão que coloque no centro do debate as questões linguísticas, culturais e identitárias desse grupo especifico. Implicados nessas condições estão à formação dos professores, a qualidade de comunicação entre professor e aluno, a presença de intérpretes de Libras, a disponibilidade e conhecimento do professor acerca da diferença surda, principalmente no que se refere aos aspectos linguísticos e culturais que envolvem a educação, o ensino e a avaliação da aprendizagem do aluno surdo.

O que buscamos perceber, durante esta pesquisa, são as possíveis recorrências discursivas quanto à cultura surda, produção de subjetividades surdas, experiência visual, artefatos da cultura surda, currículo escolar, espaços de ensino-aprendizagem e língua de sinais. O que tentamos reforçar na articulação de nosso trabalho é a necessidade de mantermos nossos discursos sempre em suspeita. Ao entendermos que a educação de surdos é interpelada por contornos linguísticos, culturais e identitários, fazemos um exercício constante para não tomá-la como algo natural, mas que se relaciona a forças

1 O projeto Produções Culturais Surdas no Contexto da Educação Bilíngue está registrado no CNPq sob a

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discursivas tensionadoras de movimentos impregnados de poder e de significação. Além disso, numa época marcada pela liquidez das coisas no mundo, não há medidas ou técnicas que solucionem de uma vez por todas as demandas sociais. Nessa lógica, questões que foram durante décadas as causas que mobilizavam a militância surda – como a luta pelo espaço escolar específico para surdos, sob a égide da importância do ensino em língua de sinais e do contato entre os pares – e as pesquisas referentes a esses assuntos não encerraram em si a necessidade de discussões sobre a questão da educação de surdos.

Interessa-nos olhar, dessa forma, para a Educação Básica no que se refere ao trabalho docente (professores surdos e ouvintes) e ao currículo (o que vem sendo ensinado; priorizado) no sentido de um dispositivo pedagógico que organiza os espaços/tempos escolares e hierarquiza os saberes. Vale lembrar que a escola, para o aluno surdo, não é apenas um espaço de aprendizagem formal, mas um dos espaços onde ocorrem os processos de produção de identidades/diferenças e de construção de subjetividades.

Quanto às escolas especificas de surdos entendemos que a maneira de conceber as coisas do mundo e os elementos que se fazem realidade a partir de regimes de verdade têm relevância nesta discussão pela impossibilidade de tomar a escola, a comunidade e o sujeito surdo fora do jogo de instituição de verdades, sempre cambiante pelos limites traçados em tramas de poder. Procuramos situar tais discursos em um campo permeado por forças que produzem, valoram e determinam as condições dos sujeitos surdos de estar no mundo. A significação da diferença se dá nesse campo conflituoso de forças que envolvem culturas e relações indissociáveis de poder-saber que passam inevitavelmente por relações de atribuição de sentido. Portanto, pensar nessas questões implica inevitavelmente lançar um olhar crítico não apenas para o sujeito surdo em questão, mas também para a comunidade e para os espaços escolares no que concerne às possibilidades de existência e seus efeitos, entre outros elementos.

Nesse contexto, entendemos que a cultura opera como fator decisivo para o agrupamento dos surdos nesse território, chamado escola. Cultura e, mais especificamente, cultura surda são conceitos necessários para a composição

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desta pesquisa, uma vez que os denominados artefatos culturais do povo surdo têm servido à comunidade surda como fator determinante para reforçar a segurança do território comunitário e das lutas políticas pelo direito à diferença. Não haveria como evitar essa abordagem, uma vez que a comunidade surda se articula, sobretudo em torno de toda uma retórica sobre sua cultura.

Metodologia

Estabeleceu-se como problema de pesquisa para as discussões que compõem esse projeto o seguinte enunciado: de que modo a circulação e o consumo de artefatos culturais, no contexto da educação escolar bilíngue para surdos, vêm se configurando nos espaços da educação básica? O Objetivo geral é analisar a circulação e o consumo de artefatos culturais em contextos da educação bilíngue para surdos, nos espaços da educação básica. A partir disso, os objetivos específicos da pesquisa são: (a) Problematizar as propostas de políticas educacionais do Ministério da Educação com ênfase na educação escolar bilíngue para surdos;(b) Analisar e entender as formas de apropriação da cultura surda no currículo escolar em escolas de educação básica; (c) Investigar a circulação e consumo de artefatos culturais da cultura surda, em práticas educacionais; (d) identificar e analisar a produção, circulação e consumo de materiais literários utilizados em propostas pedagógicas, na educação escolar bilíngue.

O foco da pesquisa está em analisar a circulação e o consumo das produções culturais de comunidades surdas nos espaços escolares da educação básica. Para a demarcação do lócus investigativo, priorizamos escolas específicas de surdos do Estado do Rio Grande do Sul – por ser o Estado que concentra o maior número de escolas específicas para surdos – num total de catorze escolas, assim distribuídas: quatro escolas na capital; seis escolas da região metropolitana de Porto Alegre; e, quatro escolas do interior do estado, sendo elas das diferentes esferas: particular (cinco), pública estadual (quatro), e pública municipal (cinco). Um critério que consideramos significativo para a delimitação das escolas a serem pesquisadas é de estarem localizadas em cidades em que a comunidade surda esteja organizada e desenvolvendo movimentos no sentido da garantia da educação bilíngue para surdos.

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Para cumprimento dos objetivos da pesquisa, mencionados

anteriormente, estabelecemos diferentes procedimentos metodológicos

divididos em três etapas: 1ª Etapa – Sistematização e análise dos dados produzidos nas pesquisas “Educação de surdos no Estado do RS” (GIPES/CNPq) e “Produção, circulação e consumo da cultura surda brasileira” (GIPES/CAPES e MinC). 2º etapa – A circulação e consumo dos artefatos culturais surdos no cotidiano escolar. 3ª Etapa: Efeitos das recorrências do cotidiano escolar no contexto da educação bilíngue e possibilidades da construção de políticas curriculares bilíngues para surdos, em uma perspectiva intercultural.

Para a produção deste trabalho nos atemos no recorte da pesquisa concentrada na Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, - responsável por três escolas localizadas nos seguintes municípios: Santa Maria, Caxias do Sul e Santa Rosa – onde aplicamos nossa proposta metodológica e apresentamos

resultados2. Neste trabalho, trazemos algumas analíticas provenientes das

problematizações dos documentos elaborados pelo Ministério da Educação e pela comunidade surda acerca da educação bilíngue para escolares surdos e as narrativas dos diários de campo por ocasião das observações realizadas nas escolas investigadas.

Ao tomarmos o campo Estudos Culturais em Educação como suporte teórico-metodológico para as discussões da pesquisa, entendemos que os artefatos culturais estão presentes no circuito da cultura (HALL; DU GAY, 1997 e JOHNSON, 1999) como espaço/tempo de produção de sentidos e significados culturais na interligação de processos de representação, identidade, produção, consumo e regulação. Consideramos que nos espaços das escolas de surdos alunos e professores são produtores e co-autores dos artefatos e práticas com os quais se relacionam, produzindo jeitos de ser surdo, professor surdo, professor de surdo, bem como constituindo possibilidades de pensar o currículo e as práticas docentes.

2 Inicialmente foram feitos encontros do grupo de pesquisadores, sendo esses alunos de iniciação cientifica,

de Mestrado e Doutorado em Educação, constituindo assim, a primeira etapa da pesquisa. Nestes momentos de reunião do grupo, foram formulados os cronogramas de discussões, leituras de documentos oficiais que tratam da Educação de Surdos na legislação atual brasileira e a produção escrita analítica destes documentos. É importante ressaltar que destes encontros e discussões do grupo de pesquisa, resultaram outras produções acadêmicas a partir de dados que emergiram de tais discussões.

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Nesse sentido, pelas lentes dos Estudos Culturais, entende-se que a escola de surdos através das suas propostas curriculares de ensino torna-se um local de laços culturais, compreendendo a noção de cultura e das questões culturais dos sujeitos surdos, reconhecendo a existência da cultura surda. Segundo Klein, Formozzo, “essa cultura produz identidades surdas e os membros dessas comunidades constroem seus significados a respeito de mundo” (KLEIN, FORMOZZO, 2009, p. 214). Para isso, metodologicamente a noção de discurso é central para a análise do corpus empírico a ser investigado. Entendemos os discursos não como um conjunto de signos, como elementos significantes que remetem a conteúdos e representações, mas no entendimento que lhes dá Foucault (2002, p. 56), como “práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam”, discursos que engendram relações que, ao se operacionalizarem, produzem o limite mesmo desses discursos.

A partir de uma análise das relações entre poder, saber e verdade, entender a produtividade estratégica organizada e estabelecida de um discurso atual, no caso a educação bilíngue, que nos leva a ver e dizer formas particulares, tornadas como naturais e verdadeiras, sobre um objeto que não transcende a história, e sim, nela se estabelece e é fabricado.

Portanto, a partir da ideia de que as realidades são construídas discursivamente foram realizadas observações do cotidiano escolar das instituições elegidas para a pesquisa no âmbito da UFSM. As observações se deram a partir de um protocolo pré-estabelecido pelo grupo de pesquisadores. Entre os locais escolhidos estavam salas de aula, biblioteca, laboratórios, ginásios entre outros locais que constituem cada escola pesquisada. Também foram registrados alguns aspectos que circulam nos cotidianos escolares, entre esses: Distribuição dos tempos e rotinas escolares, Organização e utilização dos espaços escolares; Uso das línguas (LS e Língua Portuguesa — escrita, oral) nas dinâmicas escolares; Materiais e recursos utilizados pelo professor; Materiais e recursos compartilhados entre os alunos. Os aspectos observados e mencionados anteriormente foram registrados de diferentes formas como, por exemplo, por diários de campo, fotografia, filmagens entre outros. Esse trabalho teve o intuito de conhecer os e espaços e práticas formais e informais dos ambientes escolares atingindo os objetivos da pesquisa.

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A partir dessa prática, de conhecer os cotidianos escolares, podemos compreender que esses espaços priorizam a Língua de Sinais Brasileira – LIBRAS nos momentos de comunicação, ensino e aprendizagem. Ainda, a presença de professores surdos no ensino da língua de sinais é um dos artefatos que caracterizam as instituições de ensino bilíngue para surdos, considerando o envolvimento desses professores para o ensino da língua primordial para o desenvolvimento cognitivo dos alunos. Há ainda uma grande divergência sobre a educação bilíngue para surdos, mas o mais importante é que deixemos nossas certezas sempre em suspeita e continuemos discutindo sobre esse e outros assuntos que perpassam a Educação de Surdos.

Resultados e Discussões

Nesta seção, apresentaremos a analítica empreendida a partir do seguinte objetivo da pesquisa já citada: problematizar as propostas de políticas educacionais do Ministério da Educação com ênfase na educação escolar bilíngue para surdos, através da análise dos documentos elaborados pelo Ministério da Educação e dos documentos elaborados pela comunidade surda. Nossa hipótese é que há um descompasso entre esses dois discursos produzidos pelos documentos.

O Ministério da Educação (MEC), através de seus documentos, mais especificamente, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), orienta os procedimentos da inclusão escolar, organizando, assim, as práticas escolares e conduzindo a conduta dos profissionais ligados à educação, sejam eles professores ou gestores. Por orientar a inclusão escolar e abordar o contexto da Educação de Surdos, esse documento faz parte do nosso arsenal de pesquisa. Já os documentos elaborados pela comunidade surda tencionam as práticas de normalização trazidas pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) prevê a obrigatoriedade da inclusão de todos os alunos em escolas inclusivas, sendo ofertado o Atendimento Educacional Especializado

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(AEE) para alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, no contraturno escolar.

De acordo com esse documento, alunos com deficiência são aqueles que “(...) têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental ou sensorial que, em interação com diversas barreiras, podem ter restringida sua participação plena e efetiva na escola e na sociedade”. (BRASIL, 2008, s/p). Dessa forma, os sujeitos surdos são produzidos pelos discursos oficiais como sujeitos com deficiência. Essa produção do sujeito surdo como deficiente ocorre devido ao funcionamento da norma. É a norma que estabelece quem é o sujeito normal e quem é o sujeito deficiente. No processo de normalização, a norma circula no jogo do normal e do anormal e produz, nessa circularidade, diferentes gradientes, diferentes níveis de normalidade. Conforme Lopes,

Toda e qualquer norma traz consigo a necessidade de classificação, ordenamento e hierarquização. (...) a norma opera a fim de incluir todos segundo determinados critérios que são construídos no interior e a partir dos grupos sociais. (LOPES, 2009, p. 116).

No momento em que os discursos da Política determinam quem é o sujeito deficiente, há uma relação entre o normal e o anormal. Essa classificação, essa nomeação produz um lugar no qual esses sujeitos passam a existir, ou seja, há uma divisão entre o normal e o anormal e, nessa divisão, é que se organizam as estratégias de condução desses alunos, no caso desse estudo, as estratégias de escolarização dos sujeitos surdos. Por isso, o discurso da Política torna-se um discurso baseado na norma. Os sujeitos surdos são narrados como sujeitos deficientes, que têm algo a corrigir, a recuperar. São incluídos no mesmo grupo das demais deficiências.

Para movimentar o segundo objetivo específico deste trabalho que foi analisar e entender as formas de apropriação da cultura surda no currículo escolar em escolas de educação de surdos trouxemos algumas problematizações acerca das observações realizadas nas escolas.

A escola continua sendo um dos locais mais poderosos de subjetivação dos sujeitos. Ela subjetiva os alunos que passam por ela e, nesse sentido, o currículo está intimamente ligado a essa subjetivação, pois imprimi em cada

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aluno “modos de perceber e de se conduzir no mundo” (KLEIN; LUNARDI, 1997, p. 45). Ainda de acordo com as autoras, o currículo é:

(...) sim, uma prática discursiva em que saber/poder estão imbricados em narrativas individuais ou coletivas constituindo sujeitos auto-regulados através do disciplinamento dos indivíduos para a vida em sociedade. (KLEIN, LUNARDI, 1997, p. 47)

Alinhando-nos à defesa das autoras, assumimos a expressão discurso curricular como esse mecanismo que organiza as práticas nas escolas. Não se trata de tomar o discurso como língua ou como fala, e sim como esse mecanismo que, por organizar as práticas escolares, subjetiva permanentemente os sujeitos nelas produzidos. Dito de outra maneira, o discurso curricular opera na constituição de conhecimentos válidos ou não à escolaridade, na instituição de espaços e tempos de aprendizagem, na organização de ciclos de estudos, na hierarquia de que pode ensinar essa ou aquela disciplina, na produção de sujeitos escolares.

Em relação à questão da Língua de Sinais, nas escolas pesquisadas podemos perceber que há o entendimento de que a Libras é uma língua natural do sujeito surdo. Acreditamos que o mais importante é estarmos atentos para lugar que a língua de Sinais ocupa no contexto escolar, sejam escolas específicas de surdos ou escolas regulares. Apenas ter a Língua de Sinais como um meio comunicativo na escola não garante aprendizagem; tê-la apenas como recurso metodológico também não.

Conclusões

Como principais resultados e conclusões desse estudo podemos inferir que os discursos da cultura surda e a produção da alteridade surda perpassa e interpela os sujeitos surdos. Portanto, aquilo que se vem consumindo e produzindo como cultura surda nos espaços de educação escolarizada incide nos processos de subjetivação do sujeito surdo. Isso se deve ao fato de que a trajetória de cada indivíduo é decididamente marcada (entre tantas outras coisas) pela forma como a escola relaciona-se com o capital cultural de origem da comunidade que a compõe e, mais especificamente, dos alunos que por ela passam. Portanto as narrativas produzidas pelas entrevistas realizadas com as

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escolas investigadas, bem como, a análise curricular dos seus Projetos Políticos Pedagógicos nos mostram como os discursos da educação bilíngue se constituem nas prerrogativas da Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva.

Nesse sentindo, após análise desses documentos concluímos que há um breve distanciamento entre esses discursos e uma permanente negociação entre a comunidade surda e o disposto pelo MEC. Negociação essa que, por vezes, é produtiva, pois acaba trazendo conquistas para os sujeitos surdos, como é o caso, por exemplo, da oficialização da Lei de Libras, através do Decreto 5626/2005.

Salientamos que ao longo deste trabalho não pretendemos fazer um juízo de valor em referência aos discursos do MEC, nem aos discursos da comunidade surda tampouco ao cotidiano das escolas de surdos observadas. Ou seja, não defendemos que um seja verdadeiro e o outro falso, ou que um seja melhor que o outro. A intenção foi realizar uma problematização acerca desses discursos, para poder pensar a Educação de Surdos perante a Política de Educação Bilíngue no contexto das escolas de surdos. Pensamos que esse movimento seja salutar a fim de mantermos sempre viva as possibilidades de tensionamento, suspensão de juízo de valores, portanto, de problematizações necessárias ao cenário atual da Educação de Surdos.

Do resultado das análises dos documentos, das observações do cotidiano escolar e das entrevistas realizadas, até momento, podemos inferir que a educação de alunos surdos é eficaz quando parte de um ensino bilíngue. A defesa desse ensino bilíngue está no desejo da comunidade educativa dessas escolas, no entanto é possível perceber a fragilidade teórica/didática na construção de propostas pedagógicas bilíngues. É recorrente o discurso que a Língua de Sinais é a primeira língua do surdo e deve contemplar o ensino escolar em todas as esferas, enquanto que a Língua Portuguesa escrita opera como segunda língua. No entanto as praticas cotidianas observadas nesses contextos educacionais não conseguem responder a essa proposição, seja pela dificuldade de construção espaços de leitura e estudo por parte do corpo docente, pela falta de materiais didáticos bilíngues e pelo próprio esvaziamento na escola básica da

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comunidade surda, condição necessária para a circulação e produção de um ambiente rico linguisticamente.

Referências

BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC, 2008.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Decreto Nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei Nº 10.436, de 24 de abril de 2002. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Lei Nº. 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e dá outras providências.

FOUCAULT, Michel. Arqueologia do Saber. 6.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.

HALL, Stuart; DU GAY, Paul (orgs). Questions of Cultural Identity. London/Thousand Oaks/New Delhi: Sage, 1997.

JOHNSON, Richard. O que é, afinal, Estudos Culturais? In: SILVA, Tomaz Tadeu da. (trad. Org.) O que é, afinal, Estudos Culturais? Belo Horizonte: Autêntica, 1999. KARNOPP, Lodenir; KLEIN, Madalena e LUNARDI-LAZZARIN. Projeto Produções Culturais Surdas no Contexto da Educação Bilíngue. CNPq, a área de concentração 7.08.00.00-6 - Educação e Sub-área: 7.08.05.00-8 –Currículo.

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