• Nenhum resultado encontrado

Entre preto e branco para uma estética monocromática do cinema depois do Technicolor

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Entre preto e branco para uma estética monocromática do cinema depois do Technicolor"

Copied!
374
0
0

Texto

(1)

1

UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

ENTRE PRETO E BRANCO

PARA UMA ESTÉTICA MONOCROMÁTICA DO CINEMA DEPOIS DO TECHNICOLOR

Tese apresentada à Universidade Católica Portuguesa

para obtenção do grau de Doutor em Ciência e Tecnologia das Artes

Por

Jaime Sérgio de Oliveira Neves

Sob orientação de

Professora Doutora Jenny Feray

ESCOLA DAS ARTES Dezembro 2015

(2)
(3)

i AGRADECIMENTOS

Este trabalho de vários anos é dedicado integralmente à Cândida e ao Álvaro, meus pais, pela humildade e perserverança que conseguiram transmitir-me ao longo da vida. Agradeço à Jenny Feray, pela imprescindível orientação desta tese, pela enorme paciência, amizade e pela sua capacidade de me fazer pensar a fundo nas questões que à partida me pareciam muito simples.

Obrigado ao Álvaro Barbosa pelo desafio e por acreditar que este trabalho poderia efectivamente concretizar-se.

Um agradecimento para o Amílcar Sousa que foi também responsável pelo início de todo um processo que me conduziu até aqui.

Os meus agradecimentos à Marta Reis, grande amiga e colega de trabalho. Este trabalho é também dela e para ela.

Obrigado à Inês Rebanda Coelho pelas semanas em que se debruçou afincadamente a analisar uma parte importante da história do cinema em prol deste trabalho de investigação.

Pelas centenas de horas passadas ao longo dos últimos anos na Biblioteca Municipal Rocha Peixoto, na Póvoa de Varzim, agradeço a disponibilidade e a simpatia de todos quantos lá trabalham.

Obrigado à Universidade Católica Portuguesa, Escola das Artes, nomeadamente e em especial ao Professor Carvalho Guerra que um dia, algures no ano 2003, acreditou e viabilizou um projecto lindo chamado Black & White – Festival Internacional Audiovisual. Obrigado também à Maria Lopes Cardoso e ao Paulo da Rosária que estiveram comigo deste o primeiro minuto nesta belíssima aventura a preto e branco. Julgo que temos motivos para estar orgulhosos!

Um agradecimento muito especial aos amigos que durante meses, numa cave improvisada, trabalharam comigo na Invenção do Amor, poema que está na base do trabalho prático desta tese. Obrigado à Benita Azevedo, ao Casimiro Teixeira, à Cláudia Moreira, à Isabel Cruz, ao João Pedro Azul e à Paula Miranda. Foram

(4)

ii

momentos que não mais esquecerei.

E porque a Invenção do Amor se materializou, abandonou as páginas de um livro e fez-se vida, um agradecimento à Cláudia que tanto tardou a chegar mas um dia efectivamente chegou. Obrigado à companheira, à amiga e à mãe do Pedro, meu filho, que espero possa, caso seja essa a sua vontade, seguir o pai na sua grande paixão pelo cinema. Este trabalho é pois, indiscutivelmente, também para a Cláudia e para o Pedro, com amor.

(5)

iii RESUMO

A 28 de Dezembro de 1896 no "Grand Café" em Paris os Irmãos Lumière apresentam L'Arrivée d'un Train à La Ciotat - a primeira projecção cinematográfica da história. Com a invenção do Cinematógrafo os Irmãos Lumiére apresentaram ao mundo uma nova arte que rapidamente se tornaria uma indústria milionária.

Em 1927 a Warner Brothers revoluciona com o filme The Jazz Singer, um musical que pela primeira vez na história do cinema possuía alguns diálogos e cantigas aliados a partes totalmente sem som. Um ano mais tarde, em 1928, a Warner Brothers conclui a revolução sonora com o filme The Lights of New York - o primeiro filme com som totalmente sincronizado.

Utilizando a revolucionária e inovadora tecnologia Technicolor, em 1935, o cinema apresenta-se pela primeira vez a cores com Becky Sharp, filme realizado por Rouben Mamoulian. O preto e branco liberta-se então da imposição técnica e passa a assumir um novo estatuto enquanto estética alternativa, distinta e distante da fealdade proporcionada pela cor. Uma opção monocromática que reclama um maior envolvimento do espectador enquanto, ao mesmo tempo, minimiza factores de distração e maximiza momentos de concentração. Uma estética a preto e branco que se funde numa atmosfera muito própria, muitas vezes potenciada através de motivações afectivas e culturais do espectador disponível e menos sensível aos apelos comerciais da indústria, quer cinematográfica quer televisiva, onde a cor impera.

Mais de um século de evolução tecnológica têm ditado profundas mutações na arte de fazer cinema. O aparecimento do sonoro e, mais tarde da cor, revolucionaram e provocaram impactos profundos. Se o sonoro permitiu que o espectador passasse a viver num ambiente novo e ambicionado e pôs término a um cinema mudo e porventura pouco sedutor, o aparecimento da cor não provocou ruptura. Com o Technicolor os filmes puderam passar a apresentar cor mas a produção de cinema a preto e branco nunca deixou de existir. Pelo contrário, ao longo da história do cinema vários foram os movimentos que no preto e branco encontraram motivação e sentido. Uma estética com tradição e com futuro, ao mesmo tempo inovadora e portadora de uma modernidade que muitas vezes, para alguns espectadores, assume mesmo características de novidade.

(6)
(7)

v ABSTRACT

In December 28th, 1896 the Lumière Brothers presented L'Arrivée d'un Train à La Ciotat at the "Grand Café" in Paris – it was the first cinema projection in history. With the invention of the cinematographer the Lumière brothers showed the world a new art that would quickly become a billion dollar industry.

In 1927 Warner Brothers revolutionized the world with the film The Jazz Singer, a musical that for the first time in the history of cinema had some dialogues and songs combined with completely muted fragments. A year later, in 1928, Warner Brothers completes the sound revolution with the film The Lights of New York - the first film with fully synchronized sound.

Using the revolutionary and innovative Technicolor technology, a film is presented in 1935 in colour for the first time: Becky Sharp - directed by Rouben Mamoulian. Black and white is freed from its technique imposition and assumes a new status as an alternative aesthetic, distinct and detached from the unpleasantness provided by colours. A monochrome option that calls for greater involvement of the viewer while at the same time lessens distraction factors and expands moments of concentration. A black and white aesthetics that blends a very unique atmosphere, often enhanced by emotional and cultural spectator's motivations; and less concerned with commercial appeal of the film or television industry, where colour reigns.

Over a century of technological evolution dictated profound changes in the art of filmmaking. The advent of sound and later of colour was transformative and had profound effects. If sound allowed the spectator to start living in a new and coveted environment and put end to the perhaps unappealing silent film; the introduction of colour did not cause rupture. With Technicolor film could display colour but the production of film in black and white never ceased to exist. On the contrary, throughout the history of cinema several movements found motivation and meaning in black and white - aesthetics with tradition and prospect, both pioneer and modern that can often take on novelty characteristics.

(8)
(9)

vii INDICE: AGRADECIMENTOS i RESUMO iii ABSTRACT v SUMÁRIO xi

ÍNDICE DE QUADROS xvii

ÍNDICE DE FIGURAS xix

Nota de Leitura xxiii

INTRODUÇÃO 1

1. O CINEMA NASCEU A PRETO E BRANCO 15

1.1 Dos Irmãos Lumière a Rouben Mamoulian – 40 anos de cinema a

preto e branco: a imposição da técnica 17

1.2 Becky Sharp (1935): com o Technicolor a cor apodera-se do cinema 53

1.3 Neutralização do preto e branco 78

1.3.1 Movimentos e estilos cinematográficos 78

1.3.2 A pressão comercial e os factores económicos 100

(10)

viii

2. PARA UMA ESTÉTICA MONOCROMÁTICA DO CINEMA 136

2.1 O preto e o branco no inconsciente colectivo 136

2.2 Contextos favoráveis para o incremento da produção a preto e branco 160 2.2.1 O Black & White – Festival Internacional Audiovisual 162

2.2.2 A Filmoteca Vasca e o programa Kimuak 166

2.3 “As cores do preto e branco” 169

2.3.1 O visto e o sugerido. A cor em fora de campo: o fora de

campo “concreto” e o fora de campo “imaginário” 169 2.3.2 Uma apropriação individual da imagem - o espectador

construtor (a sensação de cor) 179

2.4 O preto e branco factor de distanciação e / ou aproximação à realidade

187

2.5 O hibridismo da cor e do preto e branco 201

3. ENTRE PRETO E BRANCO: O CAMINHO PARA A INVENÇÃO DO AMOR – UM EXERCÍCIO MONOCROMÁTICO

211

3.1 O processo de construção do documentário O Caminho para a

Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 211

3.2 Uma estética de aproximação e envolvimento do espectador à obra 233

3.3 Uma estética de resistência e liberdade 240

3.4 A importância dos rostos em O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático. Uma abordagem ao “cinema-afecção” de Gilles Deleuze

(11)

ix

3.5 Uma diferenciadora estética do preto e branco 251

3.5.1 O preto e branco potenciador da atmosfera e da emoção 254

3.5.2 A luz na estética do preto e branco 263

CONCLUSÃO 282

BIBLIOGRAFIA 295

WEBSITES CONSULTADOS 305

ÍNDICE REMISSIVO DE FILMES CITADOS 307

ÍNDICE ONOMÁSTICO 311

ÍNDICE DE NOÇÕES 321

ANEXOS 327

Anexo 1: Vencedores do Óscar para “Melhor Filme” 329

Anexo 2: Resultados de inquérito realizado sobre consumo de cinema e

grau de conhecimento e contacto com cinema a preto e branco 331

Anexo 3: Texto A Invenção do Amor de Daniel Filipe 337

Anexo 4: DVD-Vídeo – Trabalho Prático: O Caminho para a Invenção

(12)
(13)

xi SUMÁRIO:

1. O CINEMA NASCEU A PRETO E BRANCO

1.1. Dos Irmãos Lumière a Rouben Mamoulian – 40 anos de cinema a preto e branco: a imposição da técnica

Nascido no final do século XIX, o cinema apresentou-se a preto e branco para, logo de seguida, muitos interessados no fenómeno das imagens em movimento encetarem um interessante percurso de experiências com vista a dotar o cinema de cores.

1.2. Becky Sharp (1935): com o Technicolor a cor apodera-se do cinema

Em 1935 Rouben Mamoulian realiza Becky Sharp, a primeira longa-metragem a implementar o System 4 da Technicolor. As cores reais chegam ao cinema e liberta-se o preto e branco da tirana imposição técnica. Nasce uma estética.

1.3. Neutralização do preto e branco

Vários foram os movimentos cinematográficos que, ao longo da história do cinema, procuraram tirar o máximo partido das potencialidades monocromáticas. Indiferente, no entanto, ao potencial estético do preto e branco a indústria do cinema e da televisão viu na cor uma mais-valia comercial. Para além de desincentivar a produção monocromática, ao longo de várias décadas, a indústria procurou uma acrescida rentabilidade financeira recorrendo à colorização de inúmeros filmes rodados a preto e branco.

(14)

xii

2. PARA UMA ESTÉTICA MONOCROMÁTICA DO CINEMA

2.1. O preto e o branco no inconsciente colectivo

No cinema o simbolismo do preto e branco é marcante e está associado a relações dinâmicas que o realizador pretende estabelecer no filme. O preto negativo e associado ao mal e o branco positivo e associado ao bem é uma associação possível e mais evidente para a cultura ocidental. Esta dualidade interpretativa não é exclusiva do cinema e manifesta-se de igual forma em outras áreas de cariz artístico.

2.2. Contextos favoráveis para o incremento da produção a preto e branco

A ausência de conhecimentos de índole estético e conceptual, o desconhecimento da história do cinema e seus filmes-chave e um cariz demasiado autodidacta do realizador, leva inúmeras vezes a que a opção pelo monocromático seja totalmente desprovida de intenção estética, vazia de verdadeira motivação e de ponderada e reflectida intensão crítica. Festivais de cinema, cineclubes, cinematecas, escolas artísticas e demais associações culturais, pelo seu pendor formativo apresentam-se como factores catalisadores para um incremento da produção a preto e branco e sua respectiva aceitação.

2.3. “As cores do preto e branco”

A descodificação de uma imagem está fortemente dependente dos conhecimentos adquiridos de quem a interpreta ou descodifica. A interpretação é o resultado explícito da relação entre a intenção de interpretar do sujeito e as proposições de uma imagem. Na ausência de uma cor imposta numa imagem a preto e branco, aquele que observa, por via de uma sensação cromática, reage emocionalmente na mental e sofisticada procura pela cor nos domínios da sua imaginação.

(15)

xiii

2.4. O preto e branco factor de distanciação e / ou aproximação à realidade

O cinema regista a realidade e daí uma nova realidade surge criada pelo próprio receptor, movido por diversos impulsos provenientes da sua estrutura cognitiva e, sobretudo, mental. Mantemos uma relação colorida com o mundo que nos rodeia. Uma imagem a preto e branco, ao não impor a cor, descomprometida de fortes motivações miméticas e por isso mais propensa a abstracções, convoca o espectador para uma leitura mais pessoal e única da realidade.

2.5. O hibridismo da cor e do preto e branco

A conjugação de planos coloridos e a preto e branco numa mesma obra cinematográfica procura induzir o espectador para uma percepção de diferentes ambiências, sejam elas de cariz narrativo, temporal ou cénico. Por outro lado, num mesmo fotograma, a convivência da cor com o preto e branco pauta-se por um pontuação cromática que procura evidenciar algo ou alguém.

3. ENTRE PRETO E BRANCO: O CAMINHO PARA A INVENÇÃO DO AMOR – UM EXERCÍCIO MONOCROMÁTICO

3.1. O processo de construção do documentário O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático

A Invenção do Amor é um poema escrito em 1961 por Daniel Filipe. Sete actores, ao longo de vários meses procuraram adaptar o texto ao teatro por via de um processo criativo de construção assente no Método Stanislavski. Ao longo de várias sessões registaram-se em vídeo e a preto e branco todos os momentos, procurando objectivar um documentário de observação.

(16)

xiv

3.2. Uma estética de aproximação e envolvimento do espectador à obra

O estimulante e cativante jogo do claro e do escuro, do preto e do branco, potencia a criação de uma atmosfera de tensão e mistério onde muito daquilo que propositadamente não é mostrado, oculto na escuridão, pode ganhar uma vida muito para além do enquadramento. O preto e branco diminui a verosimilhança que a cor proporciona contribuindo de forma preponderante para a avaliação da forma e da essência do conteúdo. Num desafiante jogo perceptivo desenham-se no ecrã misteriosas silhuetas que se movem e, ora se vislumbram, ora se ocultam.

3.3. Uma estética de resistência e liberdade

Optar conscientemente e de forma ponderada por um registo cinematográfico a preto e branco é, à luz dos tempos actuais, ter a ousadia de não privilegiar alcançar o chamado grande público assumindo o risco da diferença. É ter a consciência de manipular de forma quase alquimista a vida, conferindo-lhe fotogénicas características particulares e uma clareza directa, impactante, concentrada, distinta e sóbria. É patrocinar a emanação de uma certa atmosfera, uma aura particular que erradia do ecrã em direcção ao espectador, ferindo-o prazerosamente. É um acto de resistência e liberdade.

3.4. A importância dos rostos em O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático. Uma abordagem ao “cinema-afecção” de Gilles Deleuze

A importância da análise do rosto no cinema em geral e em O Caminho para a Invenção

do Amor – Um Exercício Monocromático em particular, fica bem patente,

casuisticamente, por via dos escritos de Gilles Deleuze onde o filósofo francês explora o conceito de imagem-afecção. A luz permite, com o subtil rigor que o preto e branco proporciona e reforça, revelar o rosto dos actores, denunciando os seus comportamentos que manifestam sentimentos, as suas características, por exemplo, marcadas texturas faciais, nomeadamente rugas e atestando a viabilidade das três grandes funções que o rosto acarreta: a capacidade de produzir comunicação, de produzir socialização e de produzir individualização.

(17)

xv

3.5. Uma diferenciadora estética do preto e branco

A ausência de cor e a precisão da luz conferem um potenciador mistério ao ambiente fílmico. Mas mesmo em situações de luz natural, é possível identificar uma certa aura de fascínio num filme a preto e branco. Ao contrário do que acontece num filme a cores onde a verosimilhança com o visível no dia-a-dia retira impacto estilístico, num filme a preto e branco é praticamente impossível ficar indiferente à beleza latente emanada pela imagem.

(18)
(19)

xvii ÍNDICE DE QUADROS

Pag. Quadro 1 Filmes produzidos em França, entre 1956 e 1957, no seio da Nouvelle Vague 91/2 Quadro 2 Filmes produzidos em França, entre 1959 e 1961, no seio da Nouvelle Vague 92/3 Quadro 3 Percentagem de filmes produzidos em França, a preto e branco, a cores, ou com

mistura dos dois, no início e apogeu da Nouvelle Vague 94

Quadro 4 Filmes produzidos por François Truffaut entre 1959 e 1969 96/7 Quadro 5 Filmes produzidos por Jean-Luc Godard entre 1959 e 1969 97/8 Quadro 6 Número e percentagem de filmes produzidos por François Truffaut e Jean-Luc

Godard, a preto e branco, a cores, ou com mistura dos dois, no auge e nos fins da Nouvelle Vague

(20)
(21)

xix ÍNDICE DE FIGURAS

Pag. Fig. 1 O cinematógrafo e o cartaz promocional da sessão de apresentação do invento no

Grand Café 19

Fig. 2 L’arrivée d’un Train à La Ciotat (1895) 19

Fig. 3 L’Arroseur Arrosé (1895) 20

Fig. 4 O cinetoscópio de Edison (1895) 31

Fig. 5 Le Voyage dans la Lune de Georges Méliès (1902) 36

Fig. 6 Anna Belle Serpentine Dance colorizado por Thomas Alva Edison (1895) 37 Fig. 7 Anna Belle Serpentine Dance colorizado pelos Irmãos Lumière (1899) 37

Fig. 8 L’Assassinat du Duc de Guise de André Calmettes (1908) 40

Fig. 9 Vitaphone (1926) 46

Fig. 10 Don Juan de Alan Crosland (1926) 47

Fig. 11 The Jazz Singer de Alan Crosland (1927) 47

Fig. 12 The Lights of New York de Brian Foy (1928) 48

Fig. 13 Becky Sharp de Rouben Mamoulian (1935) 54

Fig. 14 La Cucaracha de Lloyd Corrigan (1934) 55

Fig. 15 O Fabuloso Destino de Amélie Poulain de Jean-Pierre Jeunet (2001) 71 Fig. 16 O Cozinheiro, o Ladrão, a Sua Mulher e o Amante Dela de Peter Greenaway (1989) 72

Fig. 17 Enter The Void de Gaspar Noé (2009) 72

Fig. 18 Blue Velvet de David Lynch (1986) 73

Fig. 19 Azul, Branco e Vermelho de Krysztof Kieslowski 74

Fig. 20 Entre o Amor e a Paixão de Sarah Polley (2011) 74

Fig. 21 Moonrise Kingdom de Wes Anderson (2012) 75

Fig. 22 A Vida de Ádele de Abdellatif Kechiche (2013) 76

Fig. 23 O Gabinete do Dr. Caligari de Robert Wiene (1920) 81

Fig. 24 A Terra Treme de Luchino Visconti (1948) 85

Fig. 25 Stranger on the Third Floor (1940) de Boris Ingster 87

Fig. 26 Touch of Evil (1958) de Orson Wells 87

Fig. 27 O Estado das Coisas de Wim Wenders 103

Fig. 28 It’s a Wonderfull Life de Frank Capra (1946) – original e colorizado 123 Fig. 29 Night of Living Dead (1946) de George A. Romero (original) 128 Fig. 30 Night of Living Dead (1946) de George A. Romero (colorizado – versão 1) 129 Fig. 31 Night of Living Dead (1946) de George A. Romero (colorizado – versão 2) 129 Fig. 32 Night of Living Dead (1946) de George A. Romero (original) 129 Fig. 33 Night of Living Dead (1946) de George A. Romero (versão 1) 130 Fig. 34 Night of Living Dead (1946) de George A. Romero (versão 2) 130

(22)

xx

Fig. 35 Edições em DVD de vários clássicos colorizados 131

Fig. 36 O Sétimo Selo de Ingmar Bergman (1957) 139

Fig. 37 Nosferatu (1922) de F. W. Murnau 139

Fig. 38 Drácula (1931) de Tod Browning 139

Fig. 39 O Homem que Matou Liberty Valance de John Ford 140

Fig. 40 Alexandre Nevsky (1938) de Sergei Eisenstein 141

Fig. 41 Linha Geral (1929) de Sergei Eisenstein 141

Fig. 42 Campanha Guinness – Surfer (2008) 147

Fig. 43 Campanha Dolce & Gabbana - Madonna (2010) 147

Fig. 44 Campanha VW Polo - Dreamer (2011) 148

Fig. 45 Campanha Gucci Sport – James Franco (2011) 148

Fig. 46 Campanha Fiat 500 by Gucci (2014) 149

Fig. 47 Seu lado Bravo nunca foi tão bom (Campanha Novo Fiat Bravo 2016 – Brasil) 150 Fig. 48 Seu lado Bravo nunca foi tão Bravo (Campanha Novo Fiat Bravo 2016 – Brasil) 150

Fig. 49 Campanha Qual é o teu fetiche? 151

Fig. 50 Campanha Lembra-se dos últimos anos com o seu filho? 153

Fig. 51 Campanha Lembra-se dos últimos anos com o seu filho? 154

Fig. 52 Campanha Lembra-se dos últimos anos com o seu filho? 154

Fig. 53 Campanha Lembra-se dos últimos anos com o seu filho? 154

Fig. 54 Campanha Lembra-se dos últimos anos com o seu filho? 155

Fig. 55 Fire Ready to Start (2010) de Arcade Fire 156

Fig. 56 Run Boy Run (2012) de Woodkid 156

Fig. 57 Girl Gone Wild (2012) de Madonna 156

Fig. 58 Lotus Flower (2011) de Radiohead 156

Fig. 59 Sims 3 – Dama de Inverno (trailer) de Maria Sims 158

Fig. 60 The Wedding de Glenn Owen 158

Fig. 61 Sims 2 – Evanescence de My Immortal 159

Fig. 62 The Exorcist Novel de Sofia M. 159

Fig. 63 Nana de Jean Renoir (1926) 173

Fig. 64 Nana de Jean Renoir (1926) 174

Fig. 65 Frances Ha de Noah Baumbach (2012) 175

Fig. 66 Filme de Amor de Julio Bressane (2003) 177

Fig. 67 Filme de Amor de Julio Bressane (2003) 178

Fig. 68 Frances Ha de Noah Baumbach (2012) 179

Fig. 69 Entre os dedos (2008) de Tiago Guedes e Frederico Serra 196

Fig. 70 Pão (2013) de Mário Lopes 197

Fig. 71 Anticristo (2009) de Lars Von Trier 203

Fig. 72 América Proibida (1998) de Tony Kaye 203

Fig. 73 Tetro (2009) de Francis Ford Coppola 204

(23)

xxi

Fig. 75 O Feiticeiro de Oz (1939) de Victor Fleming 206

Fig. 76 Pleasantville – A Vida em Preto e Branco (1998) de Gary Ross 206

Fig. 77 Stalker (1979) de Andrei Tarkovsky 207

Fig. 78 As Asas do Desejo (1987) de Wim Wenders 208

Fig. 79 A Lista de Schindler (1993) de Steven Spielberg 209

Fig. 80 Rumble Fish (1983) de Francis Ford Coppola 209

Fig. 81 O Couraçado de Potemkin (1925) de Sergei Eisenstein 210

Fig. 82 Aspecto da cave onde decorreram os trabalhos de adaptação de A Invenção do Amor 214

Fig. 83 Pormenores de objectos da cave 214

Fig. 84 Nanook do Norte (1922) de Robert J. Flaherty 221

Fig. 85 O Homem da Câmara de Filmar (1929) de Dziga Vertov 225

Fig. 86 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 228 Fig. 87 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 228 Fig. 88 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 229 Fig. 89 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 231 Fig. 90 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 232

Fig. 91 Ne Change Rien (2009) de Pedro Costa 234

Fig. 92 Chet’s Romance (1988) de Bertrand Fèvre 235

Fig. 93 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 236 Fig. 94 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 237/8 Fig. 95 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 238 Fig. 96 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 239 Fig. 97 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 240 Fig. 98 O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático 245

Fig. 99 A Paixão de Joana D’Arc (1928) de Carl Dreyer 246

Fig. 100 Persona (1966) de Ingmar Bergman 247

Fig. 101 Regen (1929) de Joris Ivens 249

Fig. 102 My Winnipeg (2007) de Guy Maddin 255

Fig. 103 O Prezo da Dote (2003) de Chus Dominguez 255

Fig. 104 O Prezo da Dote (2003) de Chus Dominguez 255

Fig. 105 Nebraska (2003) de Alexander Payne 255

Fig. 106 O Barão (2011) de Edgar Pêra 255

Fig. 107 Retrato (2004) de Carlos Ruiz 255

Fig. 108 Sombras e Nevoeiro (1991) de Woody Allen 255

Fig. 109 O Tempo dos Bullós (2005) de Chus Dominguez 255

Fig. 110 O Cavalo de Turim (2011) de Béla Tarr 259

Fig. 111 Sombras e Nevoeiro (1991) de Woody Allen 259

Fig. 112 O Homem Elefante (1980) de David Lynch 261

Fig. 113 A Paixão de Joana D’Arc (1928) de Carl Dreyer 262

(24)

xxii

Fig. 115 O Tempo dos Bullós (2005) de Chus Dominguez 267

Fig. 116 89 mm para a Europa (1993) de Marcel Lozinski 268

Fig. 117 Rumble Fish (1983) de Francis Ford Coppola 268

Fig. 118 A Estrada (1954) de Federico Fellini 269

Fig. 119 La Haine (1995) de Mathieu Kassovitz 269

Fig. 120 O Sangue (1989) de Pedro Costa 269

Fig. 121 O Barão (2011) de Edgar Pêra 269

Fig. 122 Europa (1991) de Lars Von Trier 271

Fig. 123 O Cavalo de Turim (2011) de Béla Tarr 272 Fig. 124 O Cavalo de Turim (2011) de Béla Tarr 273 Fig. 125 Entre os Dedos (2008) de Tiago Guedes e Frederico Serra 275 Fig. 126 Le Baiser (2005) de Stephan Le Lay 276 Fig. 127 Le Baiser (2005) de Stephan Le Lay 276

(25)

xxiii Nota de Leitura

Esta tese foi escrita ao abrigo das regras da língua portuguesa anteriores à elaboração do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

O AO90 foi assinado em Lisboa a 16 de Dezembro de 1990, aprovado para ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 26/91, de 23 de Agosto, Diário da república nº 193, série I – A, pags. 4370 a 4388.

Em Portugal o processo de transição obrigatório para o Novo Acordo Ortográfico, com uma duração de seis anos, iniciou-se a 22 de Setembro de 2010, 5 dias após a publicação da Resolução nº 35/2008 no Diário da República e do Decreto Presidencial nº 52/2008, que procedeu à ratificação, em 29 de Julho de 2008. O processo de transição termina no dia 22 de Setembro de 2016.

(26)
(27)

1 INTRODUÇÃO

Depois de vários anos de experiências, os irmãos Auguste e Louis Lumière criaram em 1895 o cinematógrafo e marcaram assim o início de uma nova era no campo da arte. As imagens até aqui estáticas ganhavam agora uma nova vida com a ilusão do movimento e passariam a exercer uma força atractiva nos espectadores que as observavam. Nascia o cinema a preto e branco.

O cinematógrafo patenteado em França a 13 de Fevereiro de 1895, na Inglaterra a 8 de Abril de 1895 e na Alemanha em 11 de Abril de 1895, era um aparelho híbrido que associava as funções de máquina de filmar, de revelação de película e de projecção. A primeira exibição cinematográfica promovida por Louis Lumière acontece a 22 de Março de 1895, durante uma conferência sobre a indústria fotográfica. É apresentado aquele que é considerado o primeiro filme mandado executar para o Cinematógrafo Lumière, um registo onde se contemplava a saída dos operários da Fábrica Lumière em Lyon-Monplaisir. Cerca de três meses mais tarde, a 10 de Junho do mesmo ano, acontece em Lyon uma segunda exibição, desta feita durante um congresso da União Nacional das Sociedades Fotográficas de França. Neste congresso são apresentados oito filmes, entre os quais L’Arroseur Arrosé – o primeiro filme burlesco da história.

Perante uma tão satisfatória reacção por parte de um público exigente, curioso e à data relativamente entendido no fenómeno da imagem, os irmãos Lumière haveriam de, em 28 de Setembro de 1895, apresentar publicamente a sua invenção numa sala chamada Eden em La Ciotat (França). Mais tarde, em Paris, a 28 de Dezembro de 1895 acontecerá aquela que é considerada a primeira apresentação comercial do cinematógrafo. Na Salle Indienne do Grand Café, em Paris, os Irmãos Lumière apresentam ao público, com entradas pagas, L’arrivée d’un Train à la Ciotat. Um plano sequência de cinquenta segundos, sem som, a preto e branco e em perspectiva diagonal a partir da estação de La Ciotat com alguns passageiros à espera na estação. Surge depois ao fundo um comboio proveniente de Marselha que pára no lado direito do ecrã. Alguns passageiros descem da carruagem e outros, entretanto, sobem. Um plano de apenas cinquenta segundos que haveria de provocar nos curiosos espectadores, estupefacção e natural apreensão pela novidade com que se confrontavam.

(28)

2

O ano 1896 marca desta forma o início da história do cinema. A partir daqui vários nomes haveriam de perseguir o grande objectivo de maximizar o potencial da criação dos Irmãos Lumiére, quer através de aperfeiçoamentos técnicos quer através de inovações ao nível do conteúdo. Por exemplo, George Méliès, um ilusionista francês que havia assistido no Grand Café à projecção dos Irmãos Lumière, haveria de surpreender ao criar mundos fantásticos a partir de inventivos efeitos fotográficos e ao conduzir o cinema para uma vertente de espectáculo. Em 1902, George Méliès surpreende com o filme Le voyage dans la Lune pela utilização de técnicas de dupla-exposição, fusão e sobreposição e desta forma conseguir obter efeitos visuais inovadores. A partir dos romances de H. G. Wells e Jules Verne, respectivamente Os Primeiros Homens na Lua e Da Terra à Lua, George Méliès cria o primeiro filme de ficção científica da história do cinema ao narrar a história de uma viagem de cinco astrónomos à lua, numa cápsula lançada por um canhão gigante. Ao aterrarem no satélite da Terra os homens são capturados pelos habitantes da lua e, mais tarde, conseguem escapar e regressar a salvo. George Méliès, que faleceu no ano de 1938 com setenta e seis anos, realizou ao longo da sua vida quinhentos e cinquenta e cinco filmes e é, poderemos considerar, o percursor do cinema espectáculo.

Os primeiros anos do cinema foram anos de fortes limitações de ordem técnica apesar do esforço criativo de muitos pioneiros. Mais de vinte anos depois da projecção no Grand Café, em Paris, o cinema continuava mudo e a preto e branco apesar dos vários, mas muito ténues avanços, no caminho quer de um cinema sonoro quer de um cinema a cores.

Em 1927, a Warner Brothers inicia uma revolução com o filme The Jazz Singer, realizado por Alan Crosland e protagonizado por Al Jolson. Um musical que pela primeira vez na história do cinema possuía alguns diálogos e cantigas aliados a partes totalmente sem som. Aquando da estreia, The Jazz Singer provocou êxtase e perplexão junto do público que, descrente na veracidade da inovação, procurou a habitual orquestra e o artista que cantava nos espaços mais recônditos do edifício, crendo tratar-se de uma mentira e procurando pôr termo a uma farsa que depois tratar-se provou tratar-ser efectivamente verdade.

Em 1928, também a Warner Brothers conclui a revolução sonora com o filme The Lights of New York - o primeiro filme com som totalmente sincronizado. A partir daqui

(29)

3

a transição do cinema mudo para o cinema sonoro faz-se com extrema rapidez que mesmo os filmes lançados entre 1928 e 1929 e que tinham iniciado o seu processo de produção enquanto filmes mudos, foram sonorizados posteriormente para se adaptarem à nova realidade que emergia. A chegada do sonoro ao cinema marca uma verdadeira ruptura com os métodos de produção que até aqui vigoravam. Uma ruptura, para muitos, demasiado radical. A indústria do cinema, aparentemente, não se encontraria preparada para tal revolução e muitas produtoras faliram e muitas outras passaram por grandes dificuldades de adaptação ao desafio que então se impunha. De igual forma, muitos actores terminaram neste período as suas carreiras por dificuldades de adaptação ao sonoro enquanto outros davam os primeiros passos e marcavam a sua estreia no cinema. Salvaguardando as excepções de muito poucos, entre eles Charles Chaplin e Buster Keaton que teimosamente resistiram à introdução do som, o cinema haveria de, a partir deste momento, não mais voltar a ser mudo. A imagem passou a ter o som como aliado e o cinema sonoro haveria de se tornar uma realidade evidente até ao tempo presente. O final dos anos 20 do século XX fica, como vimos, marcado pela primeira e mais radical revolução tecnológica da história do cinema. O fascínio pelo som torna o cinema cada vez mais um espectáculo de massas que cativa um público cada vez mais ávido de novidade. Mas a evolução tecnológica não haveria de ficar por aqui.

Os anos 30 trouxeram a cor ao cinema. A monocromia que então imperava constituía a grande frustração dos pioneiros do cinema. A introdução da cor haveria de estimular, mais ainda, a curiosidade de um público que só há pouco mais de três décadas havia sido confrontado com o grande espectáculo das imagens em movimento. Em 1935 surge o tão aguardado Becky Sharp, realizado pelo americano Rouben Mamoulian – o primeiro filme a cores. Baseado no romance satírico Vanity Fair (1847 – 1848) de William Makepeace Thackeray e na peça Becky Sharp de Langdon Mitchell, a longa-metragem Becky Sharp apresenta ao público uma Inglaterra vitoriana, onde a actriz Miriam Hopkins dá vida à personagem Becky Sharp, uma oportunista que manipulando as pessoas, tudo faz para casar com um homem rico e ascender socialmente. Miriam Hopkins haveria de receber uma nomeação para o Óscar de melhor actriz nesse ano, pelo seu trabalho neste filme de Rouben Mamouliam.

Apesar da inovação na introdução pioneira em Becky Sharp da nova tecnologia de três cores, a marca norte-americana Technicolor já em 1915 havia desenvolvido a sua

(30)

4

primeira tecnologia de captação de cores. Tratava-se de um processo de sobreposição de duas películas, uma verde e uma vermelha. Esta tecnologia haveria de resultar em fracasso dada a grande distorção cromática e a impossibilidade de captação quer da cor azul, quer da cor branca. Ainda assim, esta tentativa fracassada de introdução da cor no cinema, foi implementada em filmes como Os Dez Mandamentos de Cecil B. DeMille em 1923, O Fantasma da Ópera de Rupert Julian e Ben-Hur de Fred Niblo em 1925. A ambição de introduzir a cor nas imagens em movimento já nos primórdios do cinema se manifestava. A urgência era de tal ordem que, tanto os pioneiros irmãos Lumière como Thomas Edison, haveriam de experimentar o artesanal processo de pintura manual, quadro a quadro, da película. Logo em 1895, quando se davam os primeiros passos no cinema, Thomas Edison ousou registar Anna Belle Serpentine Dance, um pequeno filme de poucos segundos, pintado-o à mão. Quatro anos depois, em 1899, também os irmãos Lumière enveredavam por semelhante processo ao registar Serpentine Dance.

Analisando a História, não deixa de ser relevante e, porventura intrigante, que logo após o surgimento do cinema, se tenha atribuído uma maior urgência em complementá-lo com a cor do que com o som.

Voltemos a 1935. Estreia comercialmente Becky Sharp. As experiências de cinema colorido davam lugar ao cinema a cores graças à nova tecnologia desenvolvida pela Technicolor. A indústria cinematográfica predestinava que o cinema a cores aniquilaria o cinema a preto e branco tal como o sonoro aniquilou o cinema mudo, de tal forma que uns anos mais tarde, na década de 60, a academia de Hollywood abandonaria a atribuição de Óscares a filmes a preto e branco por os considerar pouco expressivos do ponto de vista quantitativo e com tendência ao desaparecimento. Ainda no ano de 1935, haviam indícios de que a introdução da cor no cinema era mais uma urgência dos realizadores e da indústria cinematográfica do que propriamente uma urgência, ou mesmo uma necessidade do público. A recepção do público, que haveria de pagar bilhete para assistir à projecção de Becky Sharp, manifestou-se indiferente. A cor não levaria mais gente às salas de cinema e o público não ficaria tão fascinado com a cor como com o sonoro introduzido no cinema poucos anos antes. A novidade cromática não seria tão arrebatadora quanto a novidade sonora. O público continuaria a privilegiar o conteúdo independentemente da forma. Apesar de uma posterior generalização do uso

(31)

5

da cor, que se tornou mais evidente na década de 50, a verdade é que o cinema continuaria até ao presente, a preto e branco e/ou a cores ainda que sempre (naturalmente excluindo raríssimas e residuais excepções) com som. Vários movimentos ao longo da história, como o expressionismo alemão, o Cinema Noir ou a Nouvelle Vague francesa haveriam mesmo de, episodicamente, e por diferentes motivos, inverter a tendência e fazer prosperar e impulsionar o cinema a preto e branco. Um preto e branco enquanto opção e já libertado de uma imposição / limitação técnica.

Desde meados dos anos 30 do século XX até aos dias de hoje, que cabe ao realizador a opção por filmar a preto e branco ou a cores. Uma decisão, muitas vezes desnutrida de uma verdadeira consciência estética, leva o realizador a optar pelo monocromático, procurando, tudo indica, obter um registo fílmico alternativo que possa de alguma forma surpreender o espectador mais incauto.

Analisando do ponto de vista estético alguns filmes contemporâneos a preto e branco, podemos deparar-nos com uma inquietante dúvida no que concerne a obter resposta às questões: porquê a preto e branco? Porque não o uso da cor? Que pretende o realizador transmitir ao espectador não lhe revelando a palete cromática? A resposta a estas questões pode muitas vezes ser dúbia, uma vez que nem sempre a escolha pelo preto e branco é feita de forma ponderada e com uma perfeita consciência estética.

Muitas vezes parece ser uma certa impreparação do ponto de vista conceptual do realizador a conduzir à decisão de filmar a preto e branco, numa tentativa de surpreender pela novidade monocromática. Na actualidade o receptor é constantemente invadido por imagens provenientes de diversas fontes, nomeadamente da televisão que vincula um universo de cores vibrantes e sedutoras. Para os mais novos realizadores, que sempre assistiram ao espectáculo televisivo a cores e não têm um verdadeiro conhecimento dos clássicos filmes a preto e branco, a opção de produção monocromática parece revestir-se duma tentativa de surpreender o espectador ou, nalguns casos, de quebrar a homogenia da cor gravando a preto e branco como forma de contrariar tendências e investir em modelos menos convencionais. Na verdade, se nos centrarmos novamente na História, constatamos que o preto e branco no cinema trasvestiu-se também, por exemplo durante a Nouvelle Vague francesa, de veículo protestatório e rebelde mais do que de verdadeira e consciente opção estética. Também o realizador mais impreparado tecnicamente, muitas vezes é forçado a optar pelo uso do

(32)

6

preto e branco como situação de recurso. Uma deficiente captação de imagem no que à homogeneidade das temperaturas de cor diz respeito, obriga já na fase de pós-produção, a que se retire a informação cromática do material em bruto conseguindo assim iludir o espectador das deficiências técnicas.

Com as constantes inovações tecnológicas no cinema (sonoro, cor, os écrans largos, as três dimensões, a alta definição, etc.) a exigir uma cada vez maior capacidade inventiva por parte do realizador, de quem a indústria cinematográfica espera que consiga surpreender o espectador, torna-se muito difícil ousar optar pelo preto e branco se o objectivo da concepção da obra vai muito para além de um registo de autor e passa em larga escala pela necessidade imperativa de obtenção de lucro, quer em sala de cinema (número de espectadores) quer em exploração da venda directa (DVD, Blu-Ray,…) ou aluguer (videoclubes ou pay-per-view). A História mostra-nos que a indústria do cinema é avessa ao preto e branco e, numa grande maioria das vezes, dificulta ou mesmo inviabiliza, a produção de filmes monocromáticos temendo a relação menos empática do público com a obra e consequente fracasso comercial. São inúmeros os exemplos de relações tensas entre a indústria e os realizadores quando estes manifestam a vontade de contornar a cor. Woody Allen, por exemplo, e a propósito dos seus filmes Uma Outra Mulher (1988) e O Inimigo Público (1969), chegou mesmo numa entrevista a afirmar: “Acabei por não poder filmar a preto e branco. O estúdio não deixou.” (Lax, 2011, p. 417). Woody Allen, apesar da sua considerável filmografia a preto e branco, nesta frase, enfatiza aquilo que a indústria julga ser a opinião reinante junto do grande público: “Pensam que um filme a preto e branco é de qualidade inferior…” (Lax, 2011, p. 249). Este pressuposto parece ter estado na base da decisão da Academia de Hollywood de, nos anos 60, abandonar a atribuição de Óscares a filmes a preto e branco. Depois de Billy Wilder em 1960 ter ganho o Óscar de melhor filme com O Apartamento só muito mais tarde, em 1993, outro filme a preto e branco haveria de ser premiado com a estatueta dourada. Trata-se de A Lista de Schindler de Steven Spielberg, que recolheu um grande entusiasmo junto do grande público. Aqui, neste caso, e apesar de tudo, a opção pelo preto e branco é óbvia uma vez que na obra se retrata o período do holocausto numa Alemanha nazista, um período nunca registado a cores mas sempre a preto e branco. Se Steven Spielberg tivesse hipoteticamente rodado A Lista de Schindler a cores o risco de afastamento à realidade imagética do espectador seria evidente e o filme teria tido muito menos impacto.

(33)

7

Mais recentemente, no ano de 2014, Nebraska, do realizador Alexander Payne, foi nomeado para o Óscar de melhor filme acabando por perder o troféu para 12 Anos Escravo, de Steve McQueen. Nebraska, rodado a preto e branco e ao estilo road movie desenvolve-se num tom melancólico, pleno de cinzentos e onde se percebe a procura de similaridade com os modelos de representação da América nos anos da Grande Depressão, em 1929. Em Nebraska, a opção pelo preto e branco, facilmente se percebe, não por se tratar de um puro exercício de capricho estético, antes reforça a identidade americana dos anos 20 e a confusão mental cinzenta de um velho ancião na última etapa da sua vida. Apesar da pertinência monocromática, Alexandre Payne teve de medir forças com a produtora, Paramount Pictures, que à luz do pensamento generalizado do ponto de vista comercial temeu a recepção dos críticos e do grande público. Em entrevista ao jornal The Canadian Press, Alexander Payne haveria de afirmar: “… a produtora tinha dúvidas sobre a escolha (do preto e branco) pelo medo que o filme caísse numa espécie de gueto artístico que não se comunicasse com o público em geral” (Szklarski, 2013). A persistência argumentativa de Alexander Payne haveria de dar frutos e Nebraska acabou mesmo por ser colocado a preto e branco no circuito comercial apesar das reservas iniciais da Paramount Pictures.

À luz do acima exposto parece coerente afirmar que a estética do preto e branco vem sofrendo de algum tipo de preconceito relativamente à recepção do grande público. Um preconceito que poderá não residir no espectador, mas sim logo no processo de produção onde a grande indústria procura inibir, e jamais estimular, a produção de filmes a preto e branco temendo a receptividade do público, senão na sala de cinema por certo no pequeno ecrã de televisão. O grande público vê-se assim subtilmente impedido de confrontação com uma estética que outros decidiram não ser conveniente, por desinteressantemente antiquada. Desde os anos 50 do século passado e até ao tempo presente, o número de filmes produzidos a cores é, obviamente, em muito maior número que a produção de filmes a preto e branco, no entanto, independentemente dos critérios de quantidade de produção parece ser também legítimo afirmar que o preto e branco não só resistiu à incursão da cor, como parece nos últimos tempos ter vindo a recolher um crescente acolhimento por parte do público, que aparentemente vem desenvolvendo um certo fascínio pelo monocromático. Um público que, ao abrigo do desenvolvimento tecnológico, da massificação e facilidade de manuseamento de equipamento de captação de imagem, parece ter vindo a desenvolver um certo apreço pelo registo de imagens sem

(34)

8

recurso à cor. Uma breve incursão em redes sociais especializadas em partilha de imagens, leva-nos a aferir um crescente entusiasmo pelo preto e branco ainda que despido de aparente, ponderada e criteriosa intensão estética. Atentos a uma nova realidade os fabricantes de equipamento audiovisual começam agora a introduzir no mercado câmaras especializadas na captação do preto e branco sem recorrer à captação de cor. Em 2012, a Leica introduziu no mercado mundial a câmara Monochrome e a Sony prepara-se para, durante o ano 2016, lançar mais um modelo da série Alfa desta feita, e à semelhança do modelo Monochrome da Leica, para captação exclusiva do preto e branco. Além do regresso à forma pioneira de captar imagem, assistimos e estamos confrontados no presente com uma revisitação e, ou, reinvenção do cinema a preto e branco.

Mas em que termos poderemos falar duma estética do cinema a preto e branco? Será possível circunscrever uma estética própria nesta revisitação do preto e branco?

De acordo com o crítico francês Gerard Betton, o cinema “é também uma linguagem estética, poética ou musical – com uma sintaxe e um estilo; é uma escrita figurativa, e ainda uma leitura, um meio de comunicar pensamentos, veicular ideias e exprimir sentimentos. Uma forma de expressão tão ampla quanto as outras linguagens (literatura, teatro, etc.), bastante elaborada e específica.” (Betton, 1987, p. 1)

O cinema, enquanto forma de expressão, manifesta-se como uma linguagem estética, sobretudo a partir do momento em que o realizador decide intervir fazendo passar para a obra a sua visão particular. A câmara regista as imagens mas com a sua devida e consciente influência. A escolha da luz, do ritmo, da cenografia, dos movimentos de câmara, dos planos e enquadramentos, a decisão de optar pela cor ou pelo preto e branco, pelo som ou pelo silêncio são aspectos da linguagem cinematográfica decididos por aquele que cria e que são depois elementos influenciadores da percepção do espectador que, posteriormente, nutrirá ou não um sentimento afectivo pela obra. Quando o realizador opta por, conscientemente, filmar a preto e branco a sua decisão vai também influenciar, como vimos, a percepção do espectador. Como poderemos classificar ou descrever o processo de criação e posterior percepção quando nos debruçamos sobre o preto e branco? Será que o processo de criação monocromática difere do processo de criação, por exemplo, a cores? Em que difere? Quanto difere? E

(35)

9

no caso do receptor, o processo de percepção e consequente relação afectiva é influenciada positiva ou negativamente pela escolha monocromática?

Anteriormente referimo-nos à televisão como meio que vincula um universo de cores vibrantes e sedutoras. Tudo indica, como também já vimos, que a indústria televisiva tem uma participação activa no bloqueio de uma maior produção a preto e branco por não acreditar, convictamente, no gosto dos telespectadores no que à estética monocromática diz respeito. Poderá ser essa necessidade de transmitir uma mensagem de uma forma diferente daquela que é transmitida pela televisão, que leva alguns realizadores a rejeitar a cor ainda que correndo potenciais riscos do ponto de vista comercial, ou seja, a exploração do mercado televisivo poderá ficar comprometida. Ao optar por uma produção a preto e branco, os realizadores procuram transmitir a mensagem desprovida de informação cromática, porventura factor de distracção do espectador, e ao invés optam por transmiti-la de uma forma que permite que aquele que observa, caso sinta necessidade, a complemente consoante o seu conhecimento imagético do que é mostrado. O preto e branco poderá estar associado à liberdade que é conferida ao espectador e à apropriação individual que o mesmo faz da imagem. O preto e branco enquanto e também, versão simplificada mas não simplista, daquilo que é mostrado. Acreditar na capacidade do espectador, mantê-lo activo ao longo do filme, ainda que, correndo o risco de construir uma barreira dificilmente ultrapassável para o espectador mais conformado e, porventura, menos receptivo a receber informação que poderá necessitar de ser complementada por si.

O preto e branco enquanto versão simplificada, mas não simplista da imagem, conduz também o espectador no processo de percepção e assimilação do que lhe é dado a ver. Parece, aliás, ser esta uma das características primordiais que podemos atribuir ao preto e branco no cinema: mostrar imagens de forma simplificada (mas permitir ao espectador a função, porventura dispensável, de as completar cromaticamente caso este sinta extrema necessidade) evitando a distracção. Conduzir a observação do espectador focando a sua atenção naquilo a que se pretende dar ênfase. Tal como afirmou o realizador russo Andrei Tarkovsky: “Um filme a preto e branco imediatamente cria a impressão de que a sua atenção se concentra no que é mais importante (…) Num filme a preto e branco não há nenhuma sensação de que há algo estranho acontecendo, o

(36)

10

público pode assistir ao filme sem se distrair pela acção da cor.”1 (Tarkovsky, Time

within time, 1991, pp. 356-358).

A associação quase imediata entre um filme a preto e branco e uma época passada parece ser também um factor relevante no momento da decisão pelo preto e branco. Se o que o realizador pretende é transmitir uma mensagem credível não fará sentido optar por um registo a cores se o retratado se passa, por exemplo, no início do século XX onde a cor não tinha ainda lugar. Retratar o início do século passado a cores é fazer com que o espectador se distancie da obra. Ao contrário, nesta situação, procurar o preto e branco é reforçar a credibilidade do que é mostrado ao espectador. O preto e branco que aproxima o espectador que, neste caso, não deverá sentir necessidade de complementar cromaticamente a imagem porque nunca viu cor em imagens contemporâneas à época. O encantamento que o preto e branco parece provocar em determinados espectadores é algo que se constata mas que dificilmente se explica de uma forma superficial. Um encantamento que parece encontrar ressonância no conceito de punctum defendido por Roland Barthes, ou seja, como o próprio define: “… uma espécie de fora de campo subtil, como se a imagem lançasse o desejo para além daquilo que dá a ver” (Barthes, 2012, p. 67). Um encantamento que se poderá revestir de diversas formas consoante a cultura, cinematográfica e não só, do espectador, se está ou não familiarizado com os grandes clássicos do cinema e se está ou não disposto a experienciar algo que lhe poderá não ser familiar. De igual forma também se poderá ponderar a influência das diversas culturas espalhadas pelo mundo na forma como o preto e branco é aceite com grande, pouco ou residual entusiasmo. No leste da Europa, por exemplo, o preto e branco encontrou excelente receptividade através dos filmes de realizadores como Dziga Vertov, Sergei Eisenstein, Andrei Tarkovsky, Artavazd Pelechian, Béla Tarr e Victor Asliuk. Também na Alemanha o cinema encontrou no Expressionismo (Alemão) uma estética muito própria, assente numa fotografia a preto e branco (ainda que nesta altura, início do século XX, fosse a única opção) onde se manifestava uma excessiva dramaticidade dos actores acentuada por um excesso de maquilhagem e distorção cenográfica obtida a partir de recursos fotográficos. O Expressionismo Alemão, no seu auge (anos 20 do século passado), expressava, também pelo preto e branco, a forma como os realizadores viam o mundo de uma forma subjectiva, emocional e psicológica.

(37)

11

Um movimento artístico que haveria de, anos mais tarde (anos 40), dar origem ao Film Noir fortemente conotado com o policial e onde o preto e branco se apresentava fortemente contrastado. Em Itália, o Neo-Realismo marcou o cinema ao procurar mostrar uma realidade crua a preto e branco e, no final dos anos 50 e início de 60, em França a Nouvelle Vague surgia muito com o propósito de transgredir e pôr em causa as normas aceites onde o preto e branco foi uma das formas encontradas para provocar e exteriorizar uma certa rebeldia na procura de novos caminhos.

A questão geográfica parece, à partida, ser bastante relevante quanto à forma como o preto e branco é interpretado, uma vez mais assente nos princípios culturais do espectador. O preto e o branco têm leituras distintas no ocidente e no oriente. O preto pesado e fúnebre do ocidente parece contrastar com a serenidade e sobriedade atribuída no oriente. De igual forma o branco associado à pureza e a sentimentos positivos no ocidente tem uma conotação distinta no oriente onde ofusca e provoca desconforto. De uma forma muito sucinta e prévia a um processo de investigação que conduza a uma verdadeira tese, parece pertinente considerar desde já a tese da existência de uma estética do preto e branco ainda que, pontualmente, como atrás vimos, a mesma possa resultar de uma imposição quer comercial quer de procura de similitude ao contexto imagético da época retratada, quer mesmo de factor de recurso para ocultar deficiências de cariz técnico. Nestes casos retratados poderemos estar a falar de uma estética de pura conveniência e não de uma estética na sua plena acepção. A estética do preto e branco parece estar alicerçada num coerente, assumido e reflectido jogo de contrastes, ainda que, com uma diversidade de cinzentos intermédios: o tudo e o nada, o sim e o não, a luz e a sombra. Será a partir desta dualidade de estados que o realizador conduzirá a atenção do espectador, procurará envolvê-lo, tornando-o cúmplice no processo de criação e procurará neutralizar o máximo de probabilidades de distracção. Mostrar simplificado, porém não simplista, mas objectivo, e, através dos extremos procurar construir um caminho que conduza o espectador na busca das suas emoções perante uma atmosfera sedutora, coerente e porventura fascinante.

Ao longo das próximas páginas caminharemos no sentido de obter respostas para a problemática enunciada. Na primeira parte procuraremos compreender a génese do cinema, seus principais intervenientes e respectivos contributos. Uma perspectiva histórica dos primórdios do cinema que abrangerá a chegada do sonoro, os rudimentares

(38)

12

mas inventivos efeitos especiais e as primeiras experiências de colorização manual de frames. Por fim, abordaremos a chegada efectiva da cor, em 1935, com a revolucionária tecnologia Technicolor. Nesta altura o cinema liberta-se da tirana limitação técnica que impunha uma cinematografia monocromática. Depois desta data os realizadores puderam optar por produzir a cores mas o facto é que muitos continuaram ligados ao preto e branco pelos mais diversos e variados motivos. Motivos de ordem cultural e de tradição mas também não poderão ser esquecidos os factores económicos e o influente peso da indústria quer cinematográfica quer televisiva. Após a chegada da cor, o preto e branco passou também a ser utilizado no cinema como elemento diferenciador, distintivo e, em alguns casos, sinónimo de modernidade ou mesmo de novidade. No entanto, a opção monocromática nem sempre é uma escolha verdadeiramente estética feita pelo realizador. Por vezes, deficiências cromáticas resultantes de uma menos capaz captação da imagem levam à ponderação, muitas vezes efectivada já na fase de pós-produção, de transpor para preto e branco todas as sequências captadas, retirando a informação cromática da imagem e contornando assim os problemas de divergência, sobretudo ao nível da temperatura de cor, entre planos. Trata-se daquilo a que poderemos chamar uma estética de conveniência. No sentido contrário a situação também se aplica, apesar da divergência de opiniões relativas a esta matéria. Na tentativa de chegar a um maior número de espectadores, sobretudo do universo televisivo, as grandes produtoras, por diversas vezes, colorizaram digitalmente grandes clássicos a preto e branco, subvertendo a intenção estética dos seus criadores.

Na segunda parte desta tese abordaremos questões mais relacionadas com a estética propriamente dita. Uma estética que pode à partida, e ainda que muito sucintamente, ser denominada de estética de precisão onde o contraste entre o preto e o branco, a luz e a sombra é o elemento primordial da linguagem. Uma estética que, independentemente de recolher ou não o afecto do espectador, quando bem alicerçada do ponto de vista intencional, lhe transmite vários sentimentos e emoções que, de outra forma, nomeadamente pela cor, dificilmente seriam possíveis de transmitir. Uma estética ambígua, que favorece a aproximação, mas também o afastamento do espectador, que propicia a concentração mas também pode distrair.

Por fim, na terceira parte, e para terminar esta dissertação, exploraremos o trabalho prático realizado em paralelo com a investigação e que acompanha este documento escrito. O Caminho para a Invenção do Amor – Um Exercício Monocromático é um

(39)

13

exercício realizado a preto e branco, a propósito deste estudo, e que de alguma forma pretende interrogar e demonstrar as teorias levantadas ao longo deste documento escrito.

(40)
(41)

15

1 – O CINEMA NASCEU A PRETO E BRANCO

A história do cinema fez-se, e continua ainda a fazer-se, ano após ano, década após década, século após século, pelo trilhar de um percurso evolutivo e aventureiro repleto de engenhosas invenções tecnológicas, de personalidades inspiradas, arrojadas, inventivas, curiosas e, sobretudo, muito criativas. Séculos de ambição, de maravilhosas visões, de atribuladas, e muitas vezes falhadas, tentativas de aprisionar o momento então presente, através de imagens que se complementam e ganham potencial, também narrativo, quando se conjugam com o som. Um percurso de séculos, pela pré-histórica arqueologia das imagens em movimentos ambicionando alcançar uma nova forma de arte, a sétima como haveria de ser classificada. Uma nova forma de arte que haveria de sintetizar em si todas as outras artes e que, em muito ultrapassaria, o mero objectivo narrativo pela interacção de vários contributos linguísticos, iconográficos, visuais, técnicos e científicos. Um percurso até ao cinema, tal como hoje o conhecemos, cujo ponto de partida, podemos arriscar, remonta primeiro ao maravilhoso espectáculo das sombras do teatro oriental praticado na China há mais de 2000 anos e depois à lanterna mágica e ao princípio da câmara escura2 que já era conhecido desde a antiguidade como

atesta um testemunho que o monge e astrónomo Guillaume de Saint-Cloud escreveu no ano 1290:

“Faça-se no tecto de uma casa fechada ou numa janela um furo virado em direcção à parte do céu onde deve aparecer o eclipse do sol que seja para o efeito da grandeza de um buraco como o que se faz numa pipa para extrair o vinho. Enquanto a luz do sol entra por este furo, disponha-se a uma distância de vinte ou trinta pés qualquer coisa de plano, por exemplo uma tábua, e ver-se-á então o feixe de luz desenhar-se sobre a tábua com uma forma redonda, mesmo se o furo for anguloso.” (Potonniée, 1989, p. 28)

2

Também chamada câmara obscura. “A câmara obscura não é mais do que uma caixa em forma de cubo tendo apenas um orifício no centro de uma das faces. Por um fenómeno óptico, o que é visto por esse orifício reflecte-se “de pernas para o ar” na parede oposta. Se se substituir essa parede por um vidro fosco, por exemplo, a paisagem ou a figura exterior que se encontre em frente daquele orifício vem pintar-se nessa superfície e pode ser vista à transparência por um observador colocado na obscuridade. Ao princípio, a camara escura era uma grande casota, podendo os observadores estar lá dentro para olharem a parede onde a imagem exterior se ia reflectir. (…) Mais tarde, nos meados do século XVII apareceram as primeiras descrições de câmaras obscuras portáteis, que depois se iriam munir de lentes.” (Costa, Da lanterna mágica ao cinematógrafo, 1986, p. 50)

(42)

16

Inventada no século XVII, a lanterna mágica, constituída por uma câmara escura e um jogo de lentes já em muito se assemelhava à cinematografia pela ilusão de movimento que proporcionava. Foi dada a conhecer em 1643 e descrita em 1671 pelo padre jesuíta Athanasius Kircher3, seu inventor, no tratado Ars Magna Lucis et Umbrae (2ª edição) como “uma pequena máquina que é usada para ver na parede branca diferentes espectros e monstros horríveis, para que aqueles que não conhecem o segredo acreditem que esta é a arte mágica.”4 (Toulet, 1988, p. 57) Assumidamente uma máquina visionária, a lanterna mágica de Kircher, serviu de base para uma enorme quantidade de novos modelos que foram surgindo já ao longo do século XVIII, predispostos quer para o entretenimento doméstico quer para o espectáculo.

“Um entretenimento agradável e ao mesmo tempo instrutivo para os longos serões de inverno. Que profunda lembrança deixou na nossa infância a aparição de quem mostrava a lanterna mágica!... E quando o espectáculo tão desejado nos era oferecido, quando uma grande tela branca era estendida sobre a parede da sala, com que ardor seguíamos, no grande círculo luminoso, no meio da escuridão da sala, as imagens que o homem nos explicava no seu estilo naif.” (Fourtier, 1889, p. 10)

Um “entretenimento agradável” e sedutor capaz de envolver o espectador na sua teia, seja ela narrativa ou puramente estética. Um “espectáculo tão desejado” que haveria muitos anos mais tarde de se transformar numa grande indústria movendo em todo o mundo fortunas financeiras, criando portentosos magnatas do capital e gigantescos estúdios de produção de estrelas da representação, envolvidas no glamour da passadeira vermelha. Um espectáculo e ao mesmo tempo uma nova forma de arte capaz de impor ao espectador ou prisioneiro, como refere o sociólogo Laymert Garcia dos Santos, uma aparente fracção de realidade que este aceita ao deixar-se transportar emotivamente pela magia das imagens em movimento, outrora sombras, conforme metaforiza, na alegoria da caverna, o filósofo grego Platão.

“A alegoria da caverna transforma-se num grande dispositivo teatral

3

Athanasius Kircher nasceu em Geisa, na Alemanha em 1601 e faleceu em Roma em 1680. Sábio jesuíta, possuidor de grandes conhecimentos, escreveu sobre Física, História Natural, Astronomia, Matemática, Medicina, Arqueologia, Filosofia e Teologia. Entre as suas obras destacam-se O Iman, em 1641, Mundo Subterrâneo, em 1664, Edipo Egípcio, em 1952/54 e China, em 1667. Para além da lanterna mágica, Athanasius Kircher inventou uma máquina de escrever.

(43)

17

ou cinematográfico, numa bela máquina de cenografia onde o metteur en scène Platão acerta todos os detalhes do cenário e intervém incessantemente para que o papel do prisioneiro se desenrole como deve ser, para que o discípulo Glauco seja convencido e seduzido pelo fundamento do discurso do mestre guardião da pertinência das analogias. Quando a sessão de cinema terminar, o prisioneiro, o discípulo e nós mesmos ficamos cegos por termos contemplado não mais as imagens da caverna, mas a imagem desse Deus-Pai-Sol-Real.” (Santos, 1981, pp. 192 - 193)

Após um longo percurso de inovações técnicas entre a óptica e a mecânica, trilhando um percurso pela construção de uma cinematografia, 28 de Dezembro de 18955 é a data que oficialmente marca o início do cinema. O cinema a preto e branco. Ganha assim um folego a esperança num próspero futuro cinematográfico.

1.1 - Dos Irmãos Lumière a Rouben Mamoulian – 40 anos de cinema a preto e branco: a imposição da técnica

A 28 de Dezembro de 1895, os franceses Louis (1864 – 1948) e Auguste Lumière (1862 – 1954), fotógrafos de profissão, na Salle Indienne do Grand Café6 em Paris, apresentaram um aparelho denominado cinematógrafo7 e, consequentemente, a primeira

5

Apesar de 28 de Dezembro de 1895 ser a data mais unanimemente relacionada com o início do cinema, será conveniente referir que em Outubro de 1888 o inventor francês Louis Le Prince (1842 – 1890) filmou sequências de imagens em movimento (numa ponte, charretes puxadas por cavalos) de onde resultou a curta-metragem de dois segundos Leeds Bridge. Louis Le Prince nunca conseguiu fazer uma apresentação pública do seu trabalho nos Estados Unidos uma vez que desapareceu misteriosamente durante uma viagem de comboio no dia 16 de Setembro de 1890. O seu corpo e a sua bagagem nunca foram encontrados e o misterioso caso do seu desaparecimento nunca foi resolvido. Existem várias teorias para o desaparecimento de Louis Le Prince sendo que uma delas se relaciona com uma possível guerra de patentes.

6

Situado na Boulevard des Capucines. Para evocar a data do nascimento oficial do cinema foi afixada no Grand Café uma placa onde se lê: “Aqui em 28 de Dezembro de 1895, tiveram lugar as primeiras projecções públicas de fotografia animada por meio de cinematógrafo, aparelho inventado pelos irmãos Lumière.”

7

O Cinematógrafo dos Irmãos Lumière surge após o Revólver Fotográfico de Jules Jansen, da Metralhadora Fotográfica do Dr. Étienne-Jules Marey, do Fonoscópio de Demeny, do Teatro Óptico de

Imagem

Fig. 2 – L’arrivée d’un Train à La Ciotat (1895)
Fig. 4 – O cinetoscópio de Edison (1895)
Fig. 5 – Le Voyage dans la Lune de Georges Méliès(1902)
Fig. 6 – Anna Belle Serpentine Dance colorizado por Thomas Alva Edison (1895)
+7

Referências

Documentos relacionados

No entanto, maiores lucros com publicidade e um crescimento no uso da plataforma em smartphones e tablets não serão suficientes para o mercado se a maior rede social do mundo

Notamos, portanto, que desde cedo Eça de Queirós já desenvolvia suas aptidões jornalísticas (apenas com 21 anos, no Distrito de Évora). Em maio de 1870 iniciou a

Focamos nosso estudo no primeiro termo do ensino médio porque suas turmas recebem tanto os alunos egressos do nono ano do ensino fundamental regular, quanto alunos

Os principais objectivos definidos foram a observação e realização dos procedimentos nas diferentes vertentes de atividade do cirurgião, aplicação correta da terminologia cirúrgica,

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

psicológicos, sociais e ambientais. Assim podemos observar que é de extrema importância a QV e a PS andarem juntas, pois não adianta ter uma meta de promoção de saúde se

O tema proposto neste estudo “O exercício da advocacia e o crime de lavagem de dinheiro: responsabilização dos advogados pelo recebimento de honorários advocatícios maculados