Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu
em Psicologia
CONGRUÊNCIA E COMPARTILHAMENTO DE VALORES
PESSOAIS E ORGANIZACIONAIS: COMPARAÇÕES
MÚLTIPLAS ENTRE GRUPOS DE UMA AUTARQUIA FEDERAL
Brasília - DF
2013
Autor: Frederico Maciel Moreira
FREDERICO MACIEL MOREIRA
CONGRUÊNCIA E COMPARTILHAMENTO DE VALORES PESSOAIS E ORGANIZACIONAIS: COMPARAÇÕES MÚLTIPLAS ENTRE GRUPOS DE UMA
AUTARQUIA FEDERAL
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, como requisite parcial para obtenção do título de mestre em Psicologia.
Orientador: Profa. Dra. Elaine Rabelo Neiva
Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB
M838c Moreira, Frederico Maciel.
Congruência e compartilhamento de valores pessoais e organizacionais: comparações múltiplas entre grupos de uma autarquia federal. / Frederico Maciel Moreira – 2012.
159f; il.: 30 cm
Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2012.
Orientação: Profa. Dra. Elaine Rabelo Neiva.
Aos meus amores Ingrid e João,
pois sem eles esse trabalho não teria nenhum sentido e sem seu apoio nada disso seria possível.
AGRADECIMENTOS
Escolher pessoas para quem eu possa direcionar meus humildes agradecimentos me leva a cometer injustiças, pois sei que, com minha imperfeita memória, estarei esquecendo de alguém, por isso começo me desculpando com aqueles minha memória não alcançar, e agradecendo a todos que estarão aqui citados ou não, mas, que de alguma maneira, contribuíram neste pedregoso caminhar.
Não poderia iniciar meus agradecimentos sem falar nos meus amores: minha esposa Ingrid e meu (ainda) pequeno filho João, que veio ao mundo em meio a esta empreitada. A eles agradeço pelo apoio, pela compreensão e por todo o tempo que gostaria de estar com eles e eles comigo, aprendendo a valorizar e dar qualidade ao tempo dividido entre a família e a academia. Sei que não foi fácil.
Agradeço de forma muito especial e carinhosa à minha orientadora Elaine por ter acreditado em mim, alguém que surgiu de Recife para fazer mestrado presencial em Brasília, trabalhando, indo e vindo toda as semanas à capital do país. Sei que não são muitos os professores que aceitariam este desafio. Seu apoio e crença me fizeram perseverar neste caminho e, finalmente concluir este trabalho.
À Ana Lúcia Francisco que, por longas horas de terapia e seu exemplo pessoal, me deu coragem para iniciar este caminhar.
Ao meu pai, pelo sempre presente apoio, por ter sempre me ensinado a valorizar o caminho da educação como meio de realização pessoal e profissional e por ter vibrado a cada passo, a cada conquista que me fez chegar até aqui.
À minha mãe (in memorian) pelo carinho, pelo eterno sorriso e pelo exemplo de luta.
À Rô, pelo exemplo de perseverança, de conquista pelo esforço, de que nada que vem fácil na vida tem valor.
Ao meu irmão, minhas irmãs e familiares que são o esteio de minha formação e existência.
À minha grande amiga Inês, pelas diversas pausas para fumar e tomar um café, onde pude aprender muito e ouvir algumas verdades (por vezes) inconvenientes, mas que sempre me ajudaram a crescer.
Apesar de uma dissertação ser definida como uma monografia, ou escrita por um só, este produto aqui finalizado é fruto do apoio direto de diversas pessoas que não poderiam deixar de ser lembradas:
Agradeço a todos os professores que, por sua dedicação, me ajudaram a compreender um pouquinho melhor o universo da psicologia e meu tema de pesquisa.
À Profa. Cláudia pelas excelentes contribuições ao trabalho e por me introduzir na estatística das ciências humanas, além de sua eterna gentileza e disponibilidade com os alunos.
Ao prof. Cláudio Torres pelas suas contribuições que certamente renderão frutos como continuidade deste trabalho e por suas aulas apaixonantes e apaixonadas que, como um contador de estórias, é capaz de envolver o aluno em uma trama e despertar seu interesse para a psicologia social.
Aos colegas do grupo Inovare de pesquisa pelas críticas, elogios e sugestões ao trabalho, além de momentos de descontração fundamentais para recarregar as baterias.
Aos demais colegas de sala de aula e trabalhos em grupo, com alguns dos quais ainda mantenho contato e tenho profundo carinho.
Aos colegas de trabalho de Recife: Carlos Neves, Armando Farnese, Inês Demétrio, Gilvan Montel, Rubia, Fatima, Itamar, Glícia e Bianca que tiveram mais trabalho pela minha ausência semanal.
Aos colegas de trabalho de Brasília: Igor Dominici Mendonça, Rafaella Leite Pereira da Silva, Vania Moraes Rosildete de Oliveira, Claudia Ponte de Albuquerque, Liziane Castilhos de Oliveira Freitas, Cintya Pereira Paz Soares e Helcio Almeida Sa Freire de Abreu que também tiveram mais trabalho por minhas ausências semanais.
Aos gerentes Cleber Pinto dos Santos, David Falcão, Delor Moreira dos Santos, Mardônio Sarmento Pereira, Luis Gustavo Goi Simões e Adalberto Felinto da Cruz Junior pela compreensão da importância deste trabalho para a Organização e pela liberação do trabalho que me permitiu concluir o mestrado.
“Não existem palavras jogadas ao vento, todas elas trazem consequências ainda que não sejam imediatas, ainda que não possamos perceber.”
RESUMO
Referência: MOREIRA, Frederico. Congruência e compartilhamento de valores pessoais e organizacionais: comparações múltiplas entre grupos de uma autarquia federal. 159 f. Mestrado em Psicologia – UCB, Brasília, 2012.
O desenvolvimento dos estudos em valores associados a uma preocupação cada vez maior das organizações com os temas relacionados com a cultura organizacional criou um campo fértil para estudos mais direcionados para a aplicação das teorias no mundo real. O conceito de encaixe P-O vem no esteio deste cenário, buscando trazer informações mais objetivas sobre a congruência entre funcionário e organização, tanto em termos diagnósticos quanto propositivos. O presente estudo teve o objetivo de identificar o compartilhamento e a congruência de valores e analisar o papel que tempo de organização, função ou localidade têm na percepção destes valores. A análise fatorial e o Escalonamento Multidimensional, bem como o perfil de valores, apresentaram bom alinhamento da amostra com os modelos teóricos. O alinhamento dos valores organizacionais (VO) com os declarados da organização foi precário. Partindo de uma amostra de tamanho satisfatório (n=457), o nível de compartilhamento foi medido pelo grau de dispersão dos valores apresentados, seguido de MANOVA com post-hoc de Bonferroni. Prestígio foi o VO mais praticado e Domínio o menos. Autodeterminação foi o valor pessoal (VP), mais presente e Poder o menos. O tempo de serviço apresentou impacto na percepção dos valores, enquanto que os gerentes e servidores de regionais apresentaram maior coesão na sua percepção. Os cálculos de congruência foram feitos entre VP, VO e declarados. Os teste de diversos métodos de cálculo de congruência demonstraram o quanto os resultados podem ser complexos e de difícil significação. Foram feitos cálculos utilizando o índice de Gini, correlações e distâncias. As diferenças de grupos foram analisadas utilizando testes de Mann-Whitney ou Kruskal-Wallis com post-hoc de Bonferroni. Os servidores mais novos e os que trabalham na sede apresentaram maior congruência e os gerentes se mostraram mais conservadores. Com o objetivo de endereçar as dificuldades encontradas, foi proposta a criação de um Índice de Congruência (IC) cuja ideia é apresentar um resultado mais simples e significativo do conceito de congruência para modelos teóricos espaciais. O IC está baseado em cálculos vetoriais que consideram tanto a diferença dos perfis de valores quanto a intensidade deles. O modelo apresentou-se mais adequado para uma medida global de congruência. A organização estudada apresentou IC = 16%, valor considerado baixo para a congruência.
ABSTRACT
The development of studies based on values associated with a growing concern with organizational culture issues has created a fertile field for further studies toward the application of the theories in the real world. The concept of P-O fit evolves in this scenario, bringing more objective information about the congruence between employee and organization, both in terms of diagnosis and improvement proposals. This study aimed to identify the sharing values and congruence degree and analyse the role that seniority, function or location have on values perception. Factorial analysis and Multidimensional Scaling, as well as the profile of values, have indicated good alignment of the sample with the theoretical models. The alignment of organizational values with the organization's espoused values was precarious. Dealing with a suitable size sample (n = 457), the sharing values degree was measured through the dispersion of the values presented, followed by MANOVA test with post-hoc Bonferroni test. Reputation was the most practiced organizational value and Domain was the less practiced. Self-determination was the personal value more present and the less present was Power. The seniority had an impact on the perception of values, while managers and people that work in branch offices showed greater cohesion along their perception. Congruence was measured among personal, organizational and espoused values. The test of several fit measurement methods has demonstrated how the results can be complex and difficult to explain. Three measurement methods were used: Gini index, correlations and distances. The group differences were analysed using Mann-Whitney or Kruskal-Wallis test with post-hoc Bonferroni test. The newer employees and those who work at headquarters showed greater congruence and managers were more conservative. Aiming to address the difficulties, a new Fit Index (FI) was proposed. The idea is to present a simple and easy to explain result of congruence concept for spatial theoretical models. The FI is based on vector calculations considering both the vector difference of the value profiles and the intensity of values. The presented model is more suitable to a global measure of fit. The organization studied had FI = 16%, which is considered a low value of congruence.
LISTA DE GRÁFICOS E FIGURAS
GRÁFICO 1 – ÍNDICE DE GINI PARA OS VALORES AUTONOMIA (IPVO) E ESTIMULAÇÃO (PVQ) ... 110
GRÁFICO 2 – VETORES RESULTANTS DE VALORES PESSOAIS E VALORES ORGANIZACIONAIS ... 137
FIGURA 1 - MODELO ESTRUTURAL DE SCHWARTZ DEMONSTRANDO AS RELAÇÕES ENTRE VALORES ... 29
FIGURA 2 – ADAPTAÇÃO DO IPVO AO MODELO ESTRUTURAL DE SCHWARTZ. 33
FIGURA 3 – ESQUEMA DOS DIFERENTES TIPOS DE ESTUDOS DE ENCAIXE P-O 38
FIGURA 4 – MDS BIDIMENSIONAL DOS ITENS DO PVQ ... 70
FIGURA 5 – MODELO ESQUEMÁTICO COMPARADO AO MODELO CONCEITUAL 70
FIGURA 6 – PERFIL DE VALORES ORGANIZACIONAIS DA AMOSTRA BASEADO NO MODELO CIRCULAR DE SCHWARTZ (1994) ... 94
FIGURA 7 – PERFIL DE VALORES PESSOAIS DA AMOSTRA ... 97
FIGURA 8 – PERFIL DE VALORES DA AMOSTRA BASEADOS NO MODELO CIRCULAR DE SCHWARTZ (1994) ... 133
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - RELAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS E ORGANIZACIONAIS. .. 32
QUADRO 2 – ÍNDICES DE DIVERSIDADE MAIS COMUNS, ÚTEIS PARA A OPERACIONALIZAÇÃO DA INCONGRUÊNCIA INTERPESSOAL ... 44
QUADRO 3 – VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO E SUA DESCRIÇÃO. 74
QUADRO 4 – ANÁLISE DE JUÍZES. ... 75
QUADRO 5 – RELAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS, VALORES ORGANIZACIONAIS PERCEBIDOS E VALORES ORGANIZACIONAIS
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – ESTRUTURAÇÃO DA AMOSTRA. ... 60
TABELA 2 – ESTRATIFICAÇÃO POR GRUPOS COM DIFERENTES ENTRADAS NA ORGANIZAÇÃO ... 61
TABELA 3 – ESTRATIFICAÇÃO POR OCUPAÇÃO DE FUNÇÃO GERENCIAL .... 61
TABELA 4 – ESTRATIFICAÇÃO POR TIPO DE REGIONAL ONDE O SERVIDOR ATUA ... 62
TABELA 5 – DADOS DEMOGRÁFICOS DA POPULAÇÃO E DA AMOSTRA. ... 63
TABELA 6 – ANÁLISE FATORIAL COMPARATIVA ENTRE IPVO E A AMOSTRA. 68
TABELA 7 – ESPECIFICAÇÃO INICIAL BASEADA NO MODELO DE SCHWARTZ (1994). ... 69
TABELA 8 – CORRELAÇÃO ENTRE OS FATORES DO PVQ ... 71
TABELA 9 – TESTE K-S PARA FATORES CENTRALIZADOS. ... 83
TABELA 10 – TESTE DE LEVENE PARA A ESTRATIFICAÇÃO POR DIFERENTES ENTRADAS NA ORGANIZAÇÃO. ... 85
TABELA 11 – TESTE DE LEVENE APÓS TRANSFORMAÇÃO PARA A ESTRATIFICAÇÃO POR DIFERENTES ENTRADAS NA ORGANIZAÇÃO
(SOMENTE PARA FATORES OBTIDOS PELA MÉDIA DO IPVO) ... 86
TABELA 12 – TESTE DE LEVENE PARA A ESTRATIFICAÇÃO POR FUNÇÃO GERENCIAL ... 87
TABELA 13 – TESTE DE LEVENE PARA A ESTRATIFICAÇÃO POR TIPO DE REGIONAL OU LOCALIDADE ... 88
TABELA 14 – MÉDIA E DISTRIBUIÇÃO DOS VALORES ORGANIZACIONAIS (FM) 92
TABELA 15 – MÉDIA E DISTRIBUIÇÃO DOS VALORES ORGANIZACIONAIS (FC) 95
TABELA 16 – MÉDIA E DISTRIBUIÇÃO DOS VALORES PESSOAIS ... 96
TABELA 17 – MÉDIA E DISTRIBUIÇÃO DOS VALORES PESSOAIS (FC) ... 97
TABELA 18 – DIFERENÇAS ENTRE OS DADOS ANTES E DEPOIS DA
TRANSFORMAÇÃO DE HOMOSCEDASTICIDADE ... 99
TABELA 20 – DADOS DESCRITIVOS POR GRUPOS CONSIDERANDO A
OCUPAÇÃO DE FUNÇÃO GERENCIAL ... 103
TABELA 21 – DADOS DESCRITIVOS POR GRUPOS CONSIDERANDO A
LOCALIZAÇÃO DO SERVIDOR ... 104
TABELA 22 – CORRELAÇÕES ENTRE VALORES PESSOAIS E ORGANIZACIONAIS PARA OS FATORES CALCULADOS PELA MÉDIA
UTILIZANDO Ρ DE SPEARMAN ... 111
TABELA 23 – CORRELAÇÕES ENTRE VALORES PESSOAIS E
ORGANIZACIONAIS PARA OS FATORES CENTRALIZADOS UTILIZANDO R DE PEARSON ... 113
TABELA 24 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS (PVQ) E VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) ... 118
TABELA 25 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) E VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO .. 119
TABELA 26 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS (PVQ) E VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO ... 119
TABELA 27 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS (PVQ) E VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO), CONSIDERANDO O TEMPO DE ORGANIZAÇÃO. ... 121
TABELA 28 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) E VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO, CONSIDERANDO O TEMPO DE ORGANIZAÇÃO. ... 122
TABELA 29 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS (PVQ) E VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO,
CONSIDERANDO O TEMPO DE ORGANIZAÇÃO. ... 123
TABELA 30 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) E VALORES PESSOAIS (PVQ), CONSIDERANDO A OCUPAÇÃO DE FUNÇÃO GERENCIAL. ... 125
TABELA 31 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) E VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO, CONSIDERANDO A OCUPAÇÃO DE FUNÇÃO GERENCIAL. ... 126
TABELA 32 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS (PVQ) E VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO,
CONSIDERANDO A OCUPAÇÃO DE FUNÇÃO GERENCIAL. ... 127
TABELA 33 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) E VALORES PESSOAIS (PVQ), CONSIDERANDO O TAMANHO DA REGIONAL DE ATUAÇÃO. ... 129
TABELA 35 – MÉDIAS DAS DISTÂNCIAS: COMPARAÇÃO ENTRE VALORES PESSOAIS (PVQ) E VALORES DECLARADOS, CONSIDERANDO O TAMANHO DA REGIONAL DE ATUAÇÃO. ... 131
TABELA 36 – ÂNGULOS E POSIÇÕES DOS VETORES NO CÍRCULO
TRIGONOMÉTRICO – VALORES PESSOAIS ... 134
TABELA 37 – ÂNGULOS E POSIÇÕES DOS VETORES NO CÍRCULO
TRIGONOMÉTRICO – VALORES ORGANIZACIONAIS ... 135
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
∑D Somatório das diferenças algébricas
∑IDI Somatório das diferenças absolutas
∑D2 Somatório do quadrado das diferenças
A Ambiente
ACP Agregação de Características Pessoais
APO Agregação de Percepções acerca da Organização
ASA Atração – Seleção – Atrito – Attraction-Selection-Attrition
C Comportamento
CES Escala de Ênfase Comparativa – Comparative Emphasis Scale
CV Coeficiente de Variação
CVlim Limite do Coeficiente de Variação
D Distâncias
DE Distância Euclidiana
DP Desvio Padrão
EVO Escala de Valores Organizacionais
F Estatística de Fischer
FC Fatores Centralizados
FI Índice de Congruência – Fit Index
FM Fatores obtidos pela Média
G índice de Gini
H Hipotenusa
IC Índice de Congruência
IVO Inventário de Valores Organizacionais
K-S Kolmogorov-Smirnov
M Multidimensional
MCAR Missing Completely at Randon Test
MD Média das Diferenças
MDS Escala Multidimensional – Multidimensional Scale
MG Média Geral
MT Mesmo Tempo
MVW Significado e Valores da escala do Trabalho – Meaning and Value of
Work Scale
IPVO Inventário de Perfil de Valores Organizacionais
O Organizacional
OCP Perfil Cultural Organizacional – Organizational Culture Profile
OVCS Escala de Congruência de Valores Organizacionais – Organizational
Values Congruence Scale
P Pessoa
P-A Pessoa – Ambiente – Encaixe Pessoa-Ambiente
P-E Pessoa – Ambiente – P-E fit – Person-Environment fit
P-G Pessoa – Grupo
P-O Pessoa – Organização
P-P Pessoa – Pessoa
P-S Pessoa – Situação
P-T Pessoa – Trabalho
P-V Pessoa – Vocação
PAF Fatoração pelos Eixos Principais – Principal Axes Factoring
PVQ Questionário de Perfil de Valores – Portrait Value Questionnaire
RVS Pesquisa de Valores de Rokeach – Rokeach Value Survey
SSA Análise do Menor Espaço – Smallest Space Analysis
SPSS Statistical Package for Social Sciences
SVS Pesquisa de Valores de Schwartz – Schwartz Value Survey
SWV Pesquisa de Valores do Trabalho – Survey of Work Values
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TD Tempos Diferentes
TP Traço de Pillai
UO Uma Organização
� Vetor
V Valores
VD Variável Dependente
VI Variável Independente
VO Valores Organizacionais
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ... 21
1.1 JUSTIFICATIVA ... 23
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 25
2.1 VALORES PESSOAIS ... 25
2.1.1 Histórico e definições de valores ... 25
2.1.2 Teoria de valores de Schwartz ... 28
2.2 VALORES ORGANIZACIONAIS ... 30
2.3 CONGRUÊNCIA E ENCAIXE ... 33
2.3.1 Perspectiva histórica da literatura de encaixe P-O ... 34
2.3.2 Definição de encaixe P-O ... 35
2.3.3 Medidas de encaixe P-O ... 41
2.3.4 Abordagem multinível ... 45
2.3.5 Pesquisas em congruência ... 47
3 OBJETIVOS ... 54
3.1 OBJETIVO GERAL ... 54
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 54
4 MÉTODO ... 55
4.1 CARACTERIZAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO ... 55
4.2 AMOSTRA ... 57
4.2.1 Aspectos demográficos da amostra ... 62
4.3 INSTRUMENTOS ... 65
4.3.1 Análise fatorial ... 67
4.3.2 Análise espacial (MDS) ... 68
4.4 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ... 72
4.5 TRADUÇÃO DOS VALORES DECLARADOS DA ORGANIZAÇÃO ... 73
4.6 ANÁLISE DOS DADOS ... 76
5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ... 77
5.1 PREPARAÇÃO DA BASE DE DADOS ... 77
5.1.1 Cálculo dos fatores ... 79
5.1.2 Análise descritiva ... 80
5.1.3 Tratamento de casos ausentes ... 80
5.1.4 Tratamento das respostas redundantes ... 81
5.1.5 Tratamento de casos extremos ... 81
5.1.6 Análise de normalidade ... 83
5.1.7 Homoscedasticidade da amostra ... 84
5.2.1 Cálculo de compartilhamento ... 89
5.2.2 Prioridades axiológicas da organização ... 90
5.2.3 Prioridades axiológicas dos indivíduos ... 95
5.2.4 Análise dos valores por grupos ... 98
5.2.4.1 Análise dos valores de acordo com o tempo de organização. ... 98
5.2.4.2 Análise dos valores de acordo com a ocupação de função gerencial ... 101
5.2.4.3 Análise dos valores de acordo com a localização do servidor ... 103
5.2.5 Resumo das análises e observações sobre compartilhamento de valores ... 106
5.3 CONGRUÊNCIA DE VALORES E ENCAIXE P-O ... 108
5.3.1 Índice de Gini ... 108
5.3.2 Coeficiente de correlação ... 111
5.3.3 Medidas de distância ... 114
5.3.3.1 Análise dos resultados globais da amostra ... 117
5.3.3.2 Distâncias para os diferentes tempos de organização ... 120
5.3.3.1 Distâncias de acordo com a ocupação de função gerencial ... 124
5.3.3.1 Distâncias de acordo com o tipo de regional ... 128
5.3.4 Índice de congruência por análise vetorial ... 132
6 CONCLUSÕES ... 140
6.1 LIMITAÇÕES E PERSPECTIVAS. ... 145
REFERÊNCIAS ... 147
ANEXO A: PORTRAIT VALUE QUESTIONNAIRE (PVQ) ... 152
ANEXO B: INVENTÁRIO DE PERFIL DE VALORES ORGANIZACIONAIS (IPVO) 155
1 INTRODUÇÃO
A compreensão do vínculo do indivíduo com o trabalho e com a organização
é objeto de estudos da psicologia, sociologia e filosofia, além das inter-relações
entre eles (SIQUEIRA e GOMIDE JR., 2004). Uma das linhas de estudo que busca
interpretar o vínculo entre o indivíduo e a organização é o estudo de congruência. A
congruência, de maneira mais abrangente, ocorre quando existe ‘encaixe’ entre o
indivíduo e o ambiente (Person-Environment fit ou P-E fit). O encaixe
Pessoa-Ambiente (P-A) abarca uma grande diversidade de tipos de encaixe
(Pessoa-Trabalho, Pessoa-Pessoa, Pessoa-Organização, Pessoa-Grupo, etc.), determinando
o tipo de análise a ser efetuada e a forma de operacionalização do construto
(KRISTOF, 1996; HARRISON, 2007; OSTROFF e SCHULTE, 2007). Apesar da
diversidade de tipos de congruência o conceito de encaixe Pessoa-Organização
(P-O) começou a se destacar dos demais na medida em que as organizações
começaram a priorizar a contratação de funcionários que tivessem maior mobilidade
interna, se adaptando a diferentes tipos de trabalho. Assim, as organizações
passaram a necessitar de um funcionário mais alinhado com a organização do que
com o tipo de trabalho exercido, seu grupo ou supervisor, ou seja passou a ser mais
importante um funcionário que tivesse maior encaixe com a cultura organizacional
do que qualquer outro tipo de encaixe, colocando a organização no foco dos estudos
(KRISTOF, 1996).
O estudo de encaixe P-O pode ser feito utilizando uma infinidade de
construtos, como traços de personalidade, desempenho, percepção de encaixe,
valores, etc. Os estudos de encaixe P-O utilizando a congruência de valores são os
mais comuns na literatura, apresentando efeitos relevantes em satisfação no
trabalho, para citar um exemplo (KRISTOF-BROWN e JANSEN, 2007).
Os estudos de valores, por sua vez, ganharam impulso muito grande na
década de 1990, sobretudo com os resultados apresentados por Schwartz (1994)
com seu modelo de valores pessoais. A demonstração de que os valores se
apresentam de forma sistêmica e de que são universais atraiu a atenção de
pesquisadores do mundo inteiro. Este princípio já estava presente no trabalho de
valores pessoais. No entanto Rokeach (1973) não obteve grande sucesso com o seu
instrumento de pesquisa – Rokeach Value Survey (RVS) – deixando a
demonstração daquilo que havia postulado para 20 anos mais tarde.
A definição de valores que nos legou Rokeach (1973) traz dois princípios
muito importantes: o princípio de que valores são crenças transituacionais – o que o
diferencia do conceito de atitude – e o princípio de que valores são crenças
duradouras – o que o diferencia dos traços de personalidade por sua característica
mutável – sem perder sua característica de estabilidade. Portanto manipular ou
alterar os valores de alguém acarreta consequências profundas na vida dos
indivíduos, preocupação demonstrada por Rokeach (1973). O que se demonstrou
mais tarde não ser tão simples quanto se supunha.
Os valores organizacionais estão fortemente relacionados com a cultura
organizacional. Um dos estudos mais importantes foi desenvolvido por Hofstede
([1980 ou 1984]1 apud HOFSTEDE e HOFSTEDE, 2005). Ele desenvolveu, em
1980, um estudo abrangente sobre culturas nacionais a partir de um trabalho
demandado pela IBM em suas filiais. Em 2004 este estudo já tinha abrangência de
76 países (SILVA e ZANELLI, 2004). Segundo seu modelo, os valores são o
elemento central da cultura. Com este enfoque cultural dos valores e tendo a
organização como objeto de estudo, os valores organizacionais ganharam
importância. No Brasil, diversos estudos desenvolvidos por Álvaro Tamayo tiveram
enfoque na tradução do modelo de Schwartz (1994) no nível do indivíduo para o
nível organizacional (TAMAYO, MENDES e PAZ, 2000; OLIVEIRA e TAMAYO,
2004; TAMAYO, 2005), tendo sido um dos grandes impulsionadores da pesquisa de
valores no país.
Apesar de partir de uma mesma base teórica, valores pessoais e valores
organizacionais são construtos distintos e a medição da congruência de valores
demanda algumas operações que só foram possíveis com a evolução dos estudos
de encaixe P-O.
Este documento está estruturado em 6 capítulos, sendo que o primeiro
apresenta a introdução e a justificativa do trabalho. O segundo capítulo apresenta o
referencial teórico de Valores Pessoais, Valores Organizacionais e Encaixe P-O,
abordando um pouco da história, apresentação dos construtos e pesquisas
1
desenvolvidas. O terceiro capítulo apresenta os objetivos deste trabalho. O quarto
capítulo apresenta o método de pesquisa, destacando as características da
organização pesquisada, características da amostra e os instrumentos utilizados. No
quinto capítulo são apresentados os resultados e eles está divido em três grandes
tópicos: preparação da base de dados, análise de compartilhamento de valores e
análise de congruência. Por fim, o sexto capítulo apresenta as conclusões do
trabalho. Os dois instrumentos utilizados constam dos anexos A e B.
1.1 JUSTIFICATIVA
Pesquisas envolvendo valores e congruência têm grande relevância
acadêmica na medida em que são raras as pesquisas desenvolvidas com este
enfoque no Brasil, somado ao fato de que estes estudos vêm ganhando cada vez
mais vulto na produção internacional, tem-se um terreno fértil para desenvolvimento
de pesquisas na área. Do ponto de vista organizacional, este tipo de análise fornece
um panorama mais objetivo de variáveis que compõem o cotidiano das organizações
e permite que os gestores possam efetivamente gerir suas equipes com base nestes
resultados, fazendo com que a declaração de valores da organização não seja uma
mera declaração de intenção.
Os estudos de valores se consolidaram a partir da década de 1970, sobretudo
com Rokeach (1973) e avançaram em paralelo com os estudos sobre culturas
nacionais (HOFSTEDE [1980 ou 1984] apud HOFSTEDE e HOFSTEDE, 2005) que
vieram a culminar nos estudos de cultura organizacional já na década de 1980
(SILVA e ZANELLI, 2004). Na década de 1990, Schwartz (1994) desenvolve o
modelo dos tipos motivacionais que dará grande impulso aos estudos de valores.
Em paralelo se desenvolvem estudos de encaixe. Os primeiros estudos que
efetivamente foram denominados de estudos de encaixe remontam da década de
1980 e 1990 (MUCHINSKY e MONAHAN, 1987; SCHNEIDER, 1987b; CHATMAN,
1989; 1991; O'REILLY, CHATMAN e CALDWELL, 1991; EDWARDS, 1994;
KRISTOF, 1996), a maioria deles utiliza o conceito de valores. A evolução, ao
mesmo tempo que a integração, de todas estas linhas teóricas permitiu que o
estudos de encaixe ganharam em refinamento e foi possível se obter uma massa
crítica de pesquisas para que se pudesse compreender como a congruência de
valores podem afetar outras variáveis organizacionais. É neste momento que
estamos.
No que tange a congruência de valores, os autores brasileiros se encontram
em uma situação privilegiada por contar com mais de um instrumento que traz em
sua construção o alinhamento teórico com o modelo de Schwartz e ao menos um
instrumento – Inventário de Perfil de Valores Organizacionais (IPVO) – que garante
a comensurabilidade com o Portrait Value Questionnaire (PVQ), requisitos
necessários aos estudos de encaixe. Os autores estrangeiros encontram maiores
dificuldades por não dispor de instrumentos com características semelhantes. Ainda
que existam poucos estudos sobre encaixe no Brasil, esta característica singular
permite que grandes avanços sejam feitos nesse campo (FRANCO, 2008).
Segundo Kristof-Brown e Jansen (2007) a tendência para os futuros estudos
de encaixe é de que sejam estudos longitudinais, permitindo um acompanhamento
do comportamento das variáveis estudadas por mais tempo e, possibilitando a
análise de relações com os resultados de forma mais precisa.
Apesar de não se tratar de um estudo longitudinal, este trabalho buscou
refletir um pouco deste princípio ao mostrar como o tempo de organização afeta a
percepção dos valores pessoais e organizacionais.
A organização pesquisada é uma autarquia do governo federal e se encontra
em um momento de alta rotatividade em função do grande número de
aposentadorias e concursos que vêm sendo realizados no sentido de minimizar os
efeitos da falta de servidores. Esse cenário implica necessariamente em mudanças
no corpo diretivo da organização, possibilitando mudanças mais aceleradas em
aspectos relativos à cultura organizacional. Com este processo em andamento, é
possível observar como estas mudanças podem influenciar os valores pessoais e
organizacionais.
Desta forma este estudo irá analisar a congruência de valores (pessoais e
organizacionais) através do encaixe P-O, além disso o estudo irá analisar o grau de
compartilhamento e intensidade dos valores em cada uma das entidades ‘P’ e ‘O’
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 VALORES PESSOAIS
2.1.1 Histórico e definições de valores
As primeiras referências a pesquisas de valores datam do início do século XX
com os estudos de Thomas e Znaniecki (1927). Os autores abordam a adaptação de
imigrantes poloneses nos Estados Unidos, entre 1918 e 1920, através da análise de
documentos. Pela primeira vez é utilizado o conceito de atitude no plano pessoal,
afastando as perspectivas biológicas do comportamento humano, o que representou
um grande salto nos estudos em psicologia. Para os autores a conexão entre a
atitude e a estrutura social é feita através dos valores: “por valor social entendemos
qualquer dado que tenha conteúdo empírico acessível aos membros de um grupo
social e significado a respeito do qual se seja ou se possa ser objeto de atitude”
(p.21).
Os autores evidenciam portanto, que os valores são antecedentes da atitude
e estão ligados a metas, estabelecendo uma importante conexão com a psicologia
social.
Talvez a primeira escala de valores que se tenha notícia seja a escala de
similaridade de valores de Spranger (SPRANGER, 19282 apud ROKEACH, 1982).
Ela é composta de seis valores: estético, econômico, intelectual, político, religioso e
social. Esta escala foi bastante criticada por Rokeach (1982) em função de
apresentar características muito superficiais e que não caracterizavam a afinidade a
qual se propunha.
Parsons e Shils (19513 apud ROS, 2006) teorizam que a ação é realizada
cada vez que uma pessoa tenta atingir metas e que esta ação é limitada pela
2
Referência original: SPRANGER, E. Types of men. Halle: Max Niemeyer, 1928. 3
situação. Para lidar com esta limitação o indivíduo pode lançar mão de sua
experiência e das normas proporcionadas pela cultura onde está inserido. Segundo
os autores é o sistema cultural que possibilita o sistema social e o pessoal. As ações
dos indivíduos são motivadas por três critérios: cognitivo, afetivo e avaliativo além
das orientações de valor que determinam as regras e limitações. Desta maneira os
valores apresentam três aspectos: cognitivo, avaliativo e de responsabilidade
pessoal. Esta estrutura é o que possibilita o equilíbrio entre as possibilidades do
indivíduo e os limites sociais.
Kluckhohn (19514 apud ROS, 2006) parte dos mesmos princípios de Parsons
e Shils (1951) e define: “Valor é uma concepção, explícita ou implícita, distintiva de
um indivíduo ou característica de um grupo sobre o desejável, que influencia a
escolha das formas, meios e fins existentes da ação” (p. 27).
Em Kluckhohn (1951) já é possível encontrar alguns elementos que irão fazer
parte de teorias mais recentes como o princípio de que os valores são
hierarquicamente organizados e de que valores são instigadores do comportamento.
Autores como Maslow (1987) e Inglehart (1971) também apresentaram
contribuições, porém de maneira mais superficial. Vale notar que na década de 1960
não houve grandes avanços na teria de valores. As pesquisas ressurgiram com mais
força na década de 1970, sobretudo com os trabalhos de Rokeach (1973), que
publica sua definição de valores que praticamente permanece até hoje: “Valor é uma
crença duradoura de um modo específico de conduta ou estado final de existência
que é pessoal ou socialmente preferível a um modo oposto ou diverso de conduta ou
estado final de existência” (p. 5).
As implicações desta teoria são diversas. A concepção de valores como
crenças pressupõe que eles são compostos de conteúdos cognitivos e afetivos. Por
servir como critério para o comportamento, os valores são crenças prescritivas. O
caráter transituacional difere os valores das atitudes. O fato de ser hierarquicamente
organizado, indica que existe uma ordem de importância e que, sobretudo, são
estáveis porém não estáticos, por isso valores não são traços de personalidade, mas
são elementos centrais na rede cognitiva de atitudes e crenças.
4
Um dos resultados desta definição é o fato de que o componente afetivo dos
valores faz com que as pessoas tendam a se engajar em situações similares
àquelas onde elas experimentaram um afeto positivo (ROHAN, 2000).
Rokeach (1973) efetuou diversos experimentos desde meados da década de
1960 utilizando o método da auto-confrontação. Com isso ele esperava poder
manipular valores, atitudes e comportamentos. Ele acreditava que seu método era
tão poderoso que chegou a chamar a comunidade científica a zelar pelos aspectos
éticos das mudanças de valores em outros indivíduos (ROKEACH, 1971). O que
posteriormente demonstrou ser bastante limitado no longo prazo.
Outra contribuição de Rokeach (1973) foi sua escala de valores: a Rokeach
Value Survey (RVS) composta de 18 itens de valores terminais e 18 itens de valores
instrumentais. Os valores terminais são substantivos e representam objetivos que se
tem na vida. Os valores instrumentais são adjetivos e representam a maneira como
se pretende alcançar os valores terminais. No entanto o mais importante aqui é a
premissa de que existe um conjunto de valores universais que se articulam de forma
individualizada a partir de sua hierarquização. Hartmut Günther foi quem que
introduziu esta escala no Brasil, o que deu impulso ao desenvolvimento de novos
estudos no país (GÜNTHER, 1981).
A RVS é uma escala ordinal, o que a torna difícil de responder, além disso os
critérios para sua construção não foram adequados. A identificação dos valores
terminais partiu da literatura que evocava valores estadunidense e de algumas
outras sociedades, tendo sido complementada com um levantamento de valores por
30 estudantes de pós-graduação e subsequente entrevista com 100 indivíduos
adultos, todos habitantes de uma pequena cidade no interior dos Estados Unidos.
Os valores instrumentais, por sua vez, foram obtidos a partir de uma compilação de
555 palavras relativas a traços de personalidade (TAMAYO, 2007). Em virtude da
inadequação da escala proposta por Rokeach (1973), outros estudos surgiram de
2.1.2 Teoria de valores de Schwartz
Schwartz (1994) se baseia em Rokeach (1973) e suas premissas. O sistema
de valores de Schwartz (2005a) parte de dois princípios básicos: valores são
hierarquicamente construídos e são universais. Para Schwartz (2005a) o sistema de
valores responde a três necessidades humanas básicas: necessidades biológicas,
requisitos de interação social coordenada e necessidades de sobrevivência e
funcionamento em grupo. Visto de outra maneira, os valores devem ser importantes
de alguma forma para o funcionamento dos seres humanos, senão por que razão
eles existiriam (ROHAN, 2000)? A definição de valores de Schwartz (1999) procura
incluir estas características:
Valores são “concepções daquilo que é desejável e que guia a maneira como os atores sociais [...] selecionam ações, avaliam pessoas e eventos, além de explicar suas ações e avaliações [...]. De acordo com esta visão valores são critérios ou metas transituacionais [...], ordenados por importância como princípios-guia na vida.” (p. 25).
Apesar da definição de universalidade dos valores, Rokeach (1973) não havia
conseguido demonstrar o que ele próprio havia postulado, pelas razões já expostas.
Schwartz (1994) foi mais além e argumentou que estes valores poderiam apresentar
naturezas antagônicas entre eles, o que não era previsto no modelo de Rokeach
(1973). Desta forma ele desenvolveu um modelo circular que, além de abarcar as
características de universalidade, apresentou ainda, características sistêmicas, ou
seja, quando as pessoas se comportam em função de um determinado valor, estão,
na verdade, se comportando de acordo com o conjunto sistêmico de valores (ver
Figura 1).
Para a confirmação do modelo, Schwartz (2005a) desenvolveu o Schwartz
Value Survey (SVS). Este questionário é composto de 57 itens5 e as pessoas devem
respondê-lo em termos de importância para suas vidas. A escala utilizada varia de -1
(oposto aos meus valores) a 7 (suprema importância). O SVS foi aplicado em 67
países em todos os continentes e conseguiu confirmar a estrutura circular de valores
(SCHWARTZ, 2005a; 2005b). O processo de adaptação para diversas línguas e
5
culturas se fez pelo processo de tradução e retradução (PORTO, 2005). Como em
algumas línguas não existia adjetivo, Schwartz (2005b) percebeu que a divisão em
valores terminais e instrumentais não fazia sentido. Com a aplicação abrangente do
instrumento, o autor conseguiu finalmente demonstrar as características sistêmicas
e de universalismo do modelo postulado.
Figura 1 - Modelo estrutural de Schwartz demonstrando as relações entre valores
Fonte: Schwartz (2005b).
Apesar de sua ampla divulgação, a aplicação do SVS encontrava dificuldades
em populações muito jovens, com baixo nível de escolaridade (por necessitar de um
alto nível de abstração) e em culturas cuja educação não seguia o padrão ocidental
(SCHWARTZ, 2005a). Em virtude disso o autor desenvolveu um novo questionário,
o Portrait Value Questionnaire (PVQ).
A primeira versão do PVQ era composta por 21 questões. Como a teoria
prevê a existência de 10 tipos motivacionais, O número reduzido de questões
poderia dificultar a análise em amostras específicas. Desta forma foi desenvolvido o
PVQ com 40 questões. Este instrumento é composto por 40 descrições verbais
curtas e em cada uma delas as pessoas são convidadas a responder a seguinte
uma escala tipo likert de seis pontos que vai de se parece muito comigo a não se
parece em nada comigo (SCHWARTZ, 2005a). Maiores detalhes sobre a escala
podem ser encontrados no anexo A.
Com a comprovação da universalidade da estrutura de valores pessoais, era
natural imaginar que também poderia haver universalidade desta estrutura para
valores culturais. Schwartz e Bilsky (1990) iniciaram uma investigação buscando
alinhamento com as dimensões culturais de Hofstede (HOFSTEDE e HOFSTEDE,
2005), intento que foi bem sucedido pelos autores. A estrutura inicialmente proposta
pelos autores era composta de sete valores em uma gradação de individualismo e
coletivismo. Estes sete valores culturais foram redefinidos ao longo do tempo
buscando uma maior adequação da estrutura proposta, mantendo porém a ideia
central de que o valores culturais representam o que é bom e desejável para uma
sociedade (SCHWARTZ, 1999). Apesar dos avanços das pesquisas em valores
pessoais e culturais, estes trabalhos não conseguiam atender às necessidades
organizacionais, se desdobrando em pesquisas específicas em valores
organizacionais.
2.2 VALORES ORGANIZACIONAIS
Assim como os estudos de valores pessoais partem dos estudos de cultura,
os valores organizacionais se baseiam em estudos de cultura organizacional. A
cultura organizacional não esta desprovida de contexto e, portanto, sofre grande
influência da cultura em um nível mais elevado, podendo advir da cultura nacional
(onde a organização opera), da cultura da matriz (casos de transnacionais), de
outras fontes ou da interação de todas elas. Esta influência, no entanto não impede
que a organização tenha ainda uma cultura organizacional que lhe confere uma
identidade própria.
A ideia de se pesquisar os valores organizacionais a partir das percepções
dos indivíduos que fazem parte da organização tem base no fato de que os próprios
organização e, estejam certos ou errados, será essa percepção que guiará seus
comportamentos (SEGO et al., 19976 apud TAMAYO, MENDES e PAZ, 2000).
Segundo Katz e Kahn (1975), os principais componentes de uma organização
são os papéis, as normas e os valores. Desta forma valores e normas atuam como
elementos integradores pois são comuns a todos os membros da organização.
Tamayo (2005) parte da premissa de que valores pessoais expressam metas
das pessoas, enquanto valores organizacionais expressam metas das organizações
e que “[…] tanto valores organizacionais quanto os pessoais são princípios que
orientam e guiam a vida de pessoas e grupos” (TAMAYO, 2005, p. 167). Desta
forma Tamayo (2005) afirma que tanto os valores pessoais quanto os valores
organizacionais representam sistemas sólidos que permitem predizer o
funcionamento da organização e o comportamento dos indivíduos.
Tamayo e Gondim (1996, p. 63) definem valores organizacionais como
[...] princípios ou crenças, organizados hierarquicamente, relativos a tipos de estrutura ou a modelos de comportamento desejáveis que orientam a vida da empresa e estão a serviço de interesses individuais, coletivos ou mistos.
É importante notar que a definição apresentada está muito próxima das
definições de Rokeach (1973) e Schwartz (1999), tendo sido adaptada para as
organizações.
Com o objetivo de criar uma escala de valores organizacionais considerando
a realidade brasileira Tamayo, Mendes e Paz (2000) desenvolvem o Inventário de
Valores Organizacionais (IVO). O IVO é uma escala de bases teóricas,
diferentemente de sua antecessora de bases empíricas a Escala de Valores
Organizacionais (EVO). A IVO é baseada no modelo de Schwartz (1994) e está
estruturada em 6 itens divididos em 3 dimensões de valores opostos:
• Harmonia vs. Domínio;
• Autonomia vs. Conservadorismo;
• Hierarquia vs. Igualitarismo.
Mais recentemente Oliveira e Tamayo (2004) propuseram outra escala que
pudesse refletir de maneira mais direta o PVQ: o Inventário de Perfis de Valores
6
Organizacionais (IPVO). O IPVO segue a mesma lógica da PVQ e apresenta 48
descrições de situações nas quais os respondentes assinalam o seu grau de
identificação com cada uma delas (para detalhes ver anexo B).
Com esta estrutura o IPVO criou a possibilidade de comparação entre os
resultados obtidos pela aplicação da SVS ou da PVQ de Schwartz (2005a) no
âmbito dos valores pessoais e os resultados obtidos para os valores organizacionais
(ver quadro 1).
Quadro 1 - Relação entre valores pessoais e organizacionais.
Valores Orga-nizacionais
Correspondência com os valores pessoais
Metas dos valores organizacionais Alpha
Autonomia Autodeterminação
Estimulação
Oferecer desafios e variedade do trabalho, estimular a curiosidade, a criatividade e a inovação.
0,87
Bem-estar Hedonismo Promover a satisfação, o bem-estar e a qualidade
de vida no trabalho.
0,87
Realização Realização Valorizar as competências e o sucesso dos
trabalhadores.
0,80
Domínio Poder Obter lucro, ser competitiva e dominar o mercado. 0,80
Prestígio Poder Ter prestígio, ser conhecida e admirada por todos
e oferecer produtos e serviços satisfatórios para os clientes.
0,81
Tradição Tradição Manter a tradição e respeitar os costumes da
organização.
0,75
Conformidade Conformidade Promover a correção, a cortesia e as boas
maneiras no trabalho e o respeito às normas da organização. 0,75 Preocupação com a coletividade Benevolência Universalismo
Promover a justiça e a igualdade no trabalho bem como a tolerância, sinceridade e honestidade.
0,86
Fonte: Oliveira e Tamayo (2004)
Outra forma de observar o alinhamento proposto por Oliveira e Tamayo
(2004) pode ser encontrada na Figura 2, cujo objetivo é apresentar uma informação
gráfica, meramente ilustrativa, de como o IPVO se enquadra no modelo circular de
Schwartz (1994).
Os resultados de uma investigação acerca dos valores organizacionais por si
só já representam um importante instrumento de gestão para as organizações. Com
o desenvolvimento de um modelo de valores organizacionais baseado no mesmo
arcabouço teórico utilizado por Schwartz (1994), foi possível estabelecer a
comensurabilidade entre os dois instrumentos, possibilitando a comparação entre os
mais complexas e sofisticadas acerca do ambiente organizacional. O conceito de
comensurabilidade é central nos estudos de congruência e encaixe e será discutido
no tópico seguinte.
Figura 2 – Adaptação do IPVO ao Modelo estrutural de Schwartz (1994).
Fonte: Adaptado de Oliveira e Tamayo (2004).
2.3 CONGRUÊNCIA E ENCAIXE
O termo congruência pode assumir diversos sinônimos na literatura:
similaridade, alinhamento, acordo, composição, compilação, configuração,
correspondência, interacionismo, isso sem falar da expressão fit que pode assumir
traduções com ajuste, encaixe ou adequação (HARRISON, 2007). Como herança da
tradição interacionista o ponto central do conceito de congruência é o de que nem os
traços (ou valores), nem a situação determina o comportamento do indivíduo, mas
sim a interação entre eles (OSTROFF e SCHULTE, 2007). A literatura de
congruência Pessoa-Ambiente busca analisar os antecedentes e as consequências
Neste trabalho será utilizada a expressão encaixe como tradução de fit, ainda
que fit pareça mais simples e completo, optou-se por utilizar uma expressão em
português.
2.3.1 Perspectiva histórica da literatura de encaixe P-O
Até o final da década de 1960 e início da década de 1970 o enfoque dos
estudos organizacionais estava concentrado no nível micro e no comportamento do
indivíduo. Até então os estudos em psicologia apresentavam duas frentes
preponderantes: teorias baseadas no sujeito e os situacionistas. O diálogo entre os
diferentes teóricos de cada linha era precário (SCHNEIDER, 1987b). Entretanto é
importante pontuar que existiam estudos que conseguiam aproximar estes dois
universos, datados inclusive de períodos anteriores à década de 1960. Esta
descrição dicotômica serve para realçar a perspectiva história dos acontecimentos
que desencadearão outros estudos. Nesta época ocorre uma dissociação das
pesquisas em nível macro (teoria organizacional) e micro (comportamento
organizacional) (OSTROFF e SCHULTE, 2007).
Do ponto de vista macro, a efetividade organizacional ganha espaço com as
teorias contingenciais e foco no desenho organizacional, além da criação de um
ambiente que pudesse gerar maior alinhamento com os funcionários (OSTROFF e
SCHULTE, 2007).
Do ponto de vista micro é o interacionismo que surge como linha principal de
pesquisa, partindo da noção de que o comportamento dos indivíduos só poderia ser
compreendido a partir da interação com o ambiente (OSTROFF e SCHULTE, 2007),
a partir de múltiplas combinações que teriam como resultado algo diferente da
congruência esperada entre duas partes (SCHNEIDER, 1987a). O autor afirma
ainda que o desenvolvimento do interacionismo é fruto da crítica feita por Mischel
(19687 apud BOWERS, 1973; SCHNEIDER, 1987a) à teoria da personalidade,
argumentando que a também a situação e não apenas as pessoas eram
responsáveis pelo comportamento. Sem negar a importância de cada uma destas
linhas, mas criticando fortemente a excessiva centralidade dada à situação nos
7
estudos em psicologia da época, (sobretudo com o behaviorismo), Bowers (1973)
ressalta a importância de se considerar as estruturas intrapsíquicas nestes estudos,
sem as quais qualquer análise seria incompleta. É deste contexto que surge o
interacionismo.
Lewin (19358 apud SCHNEIDER, 2001) define que o comportamento é
determinado pela constelação de pessoas e situações, ou dito de outra maneira
C=ƒ(P,A), ou seja o comportamento (C) é uma função da pessoa (P) em um
determinado ambiente ou situação (A). Schneider (2001) ressalta que, apesar de
Lewin indicar que existe uma relação entre as variáveis ‘P’ e ‘A’, ele não indica como
esta relação ocorre. Desta forma Schneider (1987a), propõe uma mudança de foco
com a seguinte equação A=ƒ(P,C), ou seja, o ambiente é uma função das pessoas
se comportando nele. A diferença pode parece sutil, mas o que o autor faz é colocar
o indivíduo como componente essencial da formação do ambiente, indicando que
eles são elementos indissociáveis e que não é possível ‘medir’ o ambiente sem que
se considere a dimensão das pessoas que o compõem além de agregar um caráter
mutável a este ambiente.
Se o interacionismo postula que o comportamento não parte exclusivamente
do indivíduo e tampouco da situação ou ambiente, mas sim da interação entre eles,
ele não apresenta como esta interação se estabelece e quais são seus resultados
efetivos. Os estudos de encaixe buscam dar respostas a estas questões (OSTROFF
e SCHULTE, 2007).
2.3.2 Definição de encaixe P-O
A literatura de congruência é bastante ampla e abrange um grande número
de terminologias. Quando se fale de encaixe Pessoa-Ambiente (P-A) esta na
verdade de falando de um grande guarda-chuva conceitual que abarca diversos
tipos de encaixe: Pessoa Trabalho (P-T), Grupo (P-G),
Pessoa-Organização, Pessoa-Vocação (P-V), Pessoa-Pessoa (P-P), Pessoa-Situação (P-S),
etc. (HARRISON, 2007). Cada tipo de encaixe traz consigo suas especificidades
teóricas e diferentes níveis de análise.
8
Os estudos de encaixe têm uma de suas mais remotas raízes no começo do
século XX com os estudos de Parsons (19099 apud KRISTOF-BROWN,
ZIMMERMAN e JOHNSON, 2005). O foco destes estudos eram o encaixe P-V, que
tratavam de como as pessoas faziam a seleção de seus trabalhos de acordo com
suas características pessoais.
De acordo com Bowen, Ledford e Nathan (199110 apud KRISTOF-BROWN e
JANSEN, 2007) os trabalhos em congruência com enfoque no encaixe P-O se
tornaram mais frequentes à medida em que as organizações passaram a contratar
funcionários com maior flexibilidade para trabalhar em distintas áreas e com maior
facilidade de adaptação à mudança, em contraponto ao que ocorria anteriormente
quando as pessoas eram contratadas para atuar em uma atividade específica e
onde provavelmente trabalhariam a vida toda, fazendo com que o encaixe T ou
P-V fossem mais relevantes.
Schneider (1987b) definiu o que ele chamou de estrutura
Atração-Seleção-Atrito (ASA), partindo da teoria interacionista, com uma abordagem próxima ao
conceito de encaixe P-O. Segundo o autor e seu modelo, as pessoas não entram em
uma organização de forma aleatória, elas são atraídas por ela por alguma razão. O
atrito é o movimento inverso à atração. As experiência cotidianas de atração e atrito
é que vão indicar se o funcionário permanece ou deixa a organização. Entretanto
este processo não e uma contabilidade de soma zero, ou seja, podem existir
cenários onde, ainda que as situações de atrito sejam mais frequentes que as
situações de atração, o funcionário opte por permanecer na organização. Pode não
parecer uma decisão racional, mas o autor argumenta que o funcionário é parte do
ambiente e se sente como tal, podendo influir nos rumos daquilo que lhe causa
desconforto e cria situações de atrito, optando portanto por permanecer na
organização. Uma das possíveis variáveis em jogo é a nível de encaixe com a
organização.
Um dos conceitos de encaixe P-O mais citados foi cunhado por Chatman
(1989, p. 339): “Encaixe P-O é aqui definido como a congruência entre as normas e
valores de uma organização e os valores das pessoas”. Em um artigo subsequente
Chatman (1991, p. 459) redefine seu conceito: “Encaixe P-O é definido como a
9
Referência original: PARSONS F. Choosing a vocation. Boston: Houghton-Mifflin, 1909. 10
congruência entre o padrão de valores da organização e o padrão de valores
individuais”. Apesar de os conceitos de normas apresentarem alguma semelhança
com o conceito de valores, a autora optou por retirar esta referência de sua segunda
definição, dando uma ênfase maior aos valores.
De acordo com a autora, se a congruência aumenta com o tempo de
socialização na organização devido a mudanças nos valores individuais, então os
resultados apresentados por estes indivíduos são melhores do que os resultados
daqueles que não apresentam nenhuma alteração nos seus valores individuais.
Kristof (1996, p. 4) observando que termos como congruência ou
compatibilidade encerram diversos conceitos, buscou estreitar o significado dado por
Chatman (1991) ao conceito de encaixe P-O: “Encaixe P-O é definido como a
compatibilidade entre pessoas e organizações que ocorre quando: (a) ao menos
uma das entidades provê o que a outra necessita, ou (b) ambos compartilham
características fundamentais similares, ou (c) ambos”. Esta definição parte da
intenção da autora de alinhar duas abordagens distintas dos estudos de
congruência. A primeira abordagem define que a congruência pode ocorrer por
similaridade (encaixe suplementar) ou complementariedade (encaixe complementar)
(MUCHINSKY e MONAHAN, 1987). A segunda abordagem considera que o encaixe
ocorre para suprir uma lacuna e se concretiza pela relação necessidades-suprimento
ou pela relação demandas-habilidades (CAPLAN, 1987). Este último seria um
detalhamento do encaixe complementar (ver Figura 3) (KRISTOF, 1996).
O encaixe suplementar pressupõe que exista congruência entre
características dos indivíduos e características das organizações. No caso deste
estudo, interessa a congruência de valores, por isso haverá um maior destaque para
temas ou pesquisas que tratem o encaixe P-O utilizando valores.
No encaixe complementar a congruência ocorre pela necessidade da
organização de preencher alguma lacuna. Quando um indivíduo é capaz de
preencher esta lacuna pelas características que possui, ocorre a congruência. De
forma análoga pode ocorrer de a organização preencher alguma necessidade do
indivíduo e aí ocorrer a congruência. Um dos aspectos que diferencia as duas
abordagens é a visão de ambiente. No encaixe suplementar, as pessoas fazem o
ambiente, são parte ativa dele, já no encaixe complementar o ambiente é visto de
A segunda abordagem produz um maior refinamento do encaixe
complementar. Quando o encaixe ocorre na lógica necessidades-suprimento, o
funcionário avalia o que ele pode obter da organização e do trabalho que ele
desempenha, enquanto a organização busca suprir esta busca. Quando o encaixe
ocorre na lógica demandas-habilidades, o funcionário avalia o que ele pode prover à
organização com o objetivo de manter seu posto ou desenvolver-se nele, enquanto a
organização busca deixar evidente o que ela espera do seu funcionário (ver figura
3). Segundo Caplan (1987) a importância de se distinguir esses dois tipos de
congruência surge quando se pretende predizer o nível de retenção e de
desempenho dos funcionários, pois, de acordo com o autor, a ausência desta
distinção pode acarretar perda de significado na análise.
Figura 3 – Esquema dos diferentes tipos de estudos de encaixe P-O
Fonte: Kristof (1996) traduzido, adaptado e citado em Franco (2008)
Ostroff e Schulte (2007) argumentam que estas abordagens foram definidas a
partir de situações específicas, em níveis de análise específicos e que são
particularmente difíceis de serem diferenciadas quando o objeto de análise da
congruência são os valores, ou seja, os conceitos acabam se sobrepondo. Por
exemplo, Muchinsky e Monahan (1987) citam o processo de seleção e contratação
como uma situação onde se busca o encaixe complementar, no entanto, esta
contratação pode ocorrer não por ausência de uma competência interna à
organização, mas porque a organização passa por um processo de expansão e
necessita de um determinado perfil para compor seus quadros. Neste caso o
encaixe complementar poderia ser obtido a partir de um encaixe suplementar. Da
mesma forma os encaixes necessidades-suprimento e demanda-habilidade podem
ocorrer de forma concomitante. Segundo Ostroff e Schulte (2007) uma das razões
para haver a sobreposição é o fato de os conceitos terem sido desenvolvidos
considerando que as análises de encaixe P-A ocorrem em um nível específico e
que, na realidade, os estudos de encaixe são calcados em análises multinível e
reforça a importância de o pesquisador deixar claro qual é o nível de análise que se
está estudando. Harrison (2007) acrescenta que se uma equipe necessita de
determinados atributos para se completar uma atividade, pode-se buscar esta
lacuna em algum outro funcionário, o que seria uma situação típica de encaixe
complementar quando se analisa ‘P’ no nível individual, no entanto quando se avalia
‘P’ no nível grupal não se pode falar em encaixe suplementar ou complementar, mas
sim em níveis de encaixe ou desencaixe, o que evidencia uma outra questão
relacionada ao nível de análise adotado.
Baseado nestes argumentos os autores resgatam o modelo proposto por
Kozlowski e Klein (200011 apud OSTROFF e SCHULTE, 2007): o encaixe por
composição ou por compilação. A composição ocorre quando elementos ou
características de um nível inferior convergem ou aglutinam para compor um
resultado em um nível superior que é composto essencialmente dos mesmo
elementos (ex. comparação de valores pessoais e valores organizacionais). A
compilação parte da noção de que configurações específicas de características ou
11
elementos em um nível inferior se transformam em um construto de nível superior
(ex. o conceito de sinergia).
Por fim Harrison (2007, p. 391) propõe um outro conceito para encaixe. Sua
formulação é mais abrangente pois é uma definição de encaixe P-A, mas que se
adequa perfeitamente ao encaixe P-O: “Encaixe é um estado da compatibilidade da
articulação de valores de um ou mais atributos, a, b, c, ... j, de uma entidade focal
(P), e um conjunto de atributos de valores comensuráveis, a, b, c, ... j, de uma
entidade ambiente (A)”. Com esta definição o autor insere a necessidade de as
variáveis serem comensuráveis, ou seja, há de se obter em ambas as entidades
variáveis que façam sentido do ponto de vista teórico, mas que também permitam
operações algébricas entre elas. Os estudos de congruência entre valores
organizacionais e pessoais são um exemplo de variáveis que podem ser
comensuráveis, mas é importante observar que a construção do instrumento é uma
etapa fundamental no sentido de garantir que as variáveis sejam efetivamente
comensuráveis.
A definição proposta por Chatman (1989; 1991) para encaixe P-O se mostra
muito específica para estudos de valores. Ainda que este trabalho seja desenvolvido
sob esta ótica, acredita-se que seria necessária uma definição mais abrangente. No
caso da definição de Kristof (1986), ela traz no enunciado questões relativas aos
tipos de encaixe analisados por ela e outros autores, o que acaba por incluir
questões de cunho mais operacional na definição do conceito. A definição de
Harrison (2007), por outro lado, é bastante abrangente e procura abarcar diversos
tipos de estudos de encaixe. Pelos argumentos expostos propõe-se uma definição
de encaixe P-O que articula entre as definições apresentadas, de forma a torna-la
mais simples e que seja representativa do estudo que se pretende empreender:
‘Encaixe P-O é definido como a congruência entre pessoas e organizações,
considerando a compatibilidade entre atributos de uma entidade focal (P) e atributos