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Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Programa de Pós-Graduação
Stricto Sensu em Direito
Mestrado em Direito Internacional Econômico
O Impacto da Globalização no Direito do Trabalho na Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988.
Brasília - DF
Autor: James Corrêa Caldas
JAMES CORRÊA CALDAS
O Impacto da Globalização no Direito do Trabalho na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado em Direito Internacional Econômico da Universidade Católica de Brasília – UCB, como requisito para a obtenção do Título de Mestre em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Jose Eduardo Sabo Paes
Brasília
–
DF
C145i Caldas, James Corrêa
O impacto da globalização no direito do trabalho na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. / James Corrêa Caldas – 2011.
110f. ; 30 cm
Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2011. Orientação: José Eduardo Sabo Paes
1. Globalização. 2. Direito do trabalho. 3. Direitos fundamentais. 4. Direito constitucional. I. Paes, José Eduardo Sabo, orient. II. Título.
TERMO DE APROVAÇÃO
Dissertação de autoria de James Corrêa Caldas, requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre do Programa de Pós-Graduação Srticto Sensu em
Direito, defendida e aprovada, em 9 de setembro de 2011, pela banca
examinadora constituída por:
Prof. Dr. JOSÉ EDUARDO SABO PAES Orientador
Prof. Dr. JOÃO REZENDE ALMEIDA OLIVEIRA Membro Interno
Prof. Dr. ARNALDO SAMPAIO DE MORAES GODOY Membro Externo
DEDICATÓRIA
A ,eus pais, in memorian, por onde tudo começou. Aos mestres que colaboraram com a leitura deste trabalho, em especial ao meu orientador, Dr. José Eduardo Sabo Paes, pela estremada atenção e carinho com que me homenageou.
RESUMO
O presente trabalho tem o propósito de examinar o impacto da globalização
nas regras de proteção ao trabalhador contidas na Constituição do Brasil de
1988. Para tanto, são estudados temas ligados à globalização, à Constituição
de 1988 e à evolução do Direito do Trabalho, desde a Revolução Industrial. O
estudo examina o momento político da elaboração da Carta Política de 1988,
no Brasil e no Mundo, o impacto das normas internacionais, a crise no direito
do trabalho ante a globalização, a OIT - Organização Internacional do Trabalho
e seus efeitos na ordem jurídica laboral. O ensaio comporta breves
considerações sobre o liberalismo, o neoliberalismo em confronto com a
globalização, assim como, uma análise das inovações introduzidas na Carta da
República do Brasil de 1988 e a flexibilização do direito do trabalho, ambos,
como decorrência da globalização. A conclusão da investigação é que graças a
globalização, o texto constitucional da Carta de 1988, no que pertine as regras
de Direito do Trabalho, foi bastante generoso, significando pródigo em regras
de proteção ao trabalhador, em conformidade com o panorama jurídico
internacional.
PALAVRAS-CHAVE: Globalização. Direito do Trabalho. Revolução Industrial. Liberalismo. Neoliberalismo. Carta Política. Legislação trabalhista.
ABSTRACT
This study aims to examine the impact of globalization on the worker protection rules contained in the Constitution of Brazil of 1988. For that end, studied issues related to globalization, the Federal Constitution and evolution Labor Law since the Industrial Revolution. The paper studies the political moment of drafting the Constitution, in Brazil and worldwide, the impact of international laws, the crisis in employment law face the globalization, the ILO (International Labour Organization) and its effects on labor law. The paper includes brief comments about liberalism, neoliberalism in confrontation with globalization, as well as an analysis of the innovations introduced in the Charter of the Republic of Brazil in 1988 and flexibility of labor law, both as a result of globalization. The conclusion of the investigation is that thanks to globalization, the text of the 1988 Constitution, in respect the rules of labor law, was very generous in meaning to the worker protection rules, in accordance with international legal landscape.
KEYWORDS: Globalization. Labor Law. Industrial Revolution. Liberalism. Neoliberalism. Charter Policy. Labor Laws. Flexibility. Desregulation.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...10
CAPÍTULO I – A CONSTITUIÇÃO DE 1988 – Momento político
1.1 No Mundo...16 1.2 No Brasil...19
1.2.1 O Direito Comparado e o Trabalhador 1.2.2 Constitucionalismo no Brasil
1.2.3 A Constituição de 1988
1.3 Diretos Sociais Incorporados ao texto constitucional...27 1.3.1 Considerações iniciais
1.3.2 Direitos relacionados às liberdades coletivas e individuais 1.3.3 Direitos relacionados diretamente ao trabalho
CAPÍTULO II – O IMPACTO DAS NORMAS INTERNACIONAIS
2.1 Organizações Internacionais...32 2.2 Diplomas Internacionais...33
2.2.1 Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 2.2.2 A Carta Social Européia de 1961
2.3 Organização Internacional do Trabalho (OIT)...37 2.3.1 Considerações iniciais
2.3.2 Classificação das Convenções por Categorias 2.3.3 Convenções Fundamentais
2.3.4 Convenções Prioritárias
2.4 Impacto das Normas Internacionais no Direito Individual...41 2.5 Impacto das Normas Internacionais no Direito Coletivo...43 2.6 Experiência comunitária...44
2.6.1 Experiência européia 2.6.2 Experiência sul-americana
CAPÍTULO III – A CRISE DO DIREITO DO TRABALHO ANTE A GLOBALIZAÇÃO...51 3.1 No Desemprego
3.2 Na Remuneração 3.3 Participação nos lucros 3.4 Na Jornada de Trabalho 3.5 No Trabalho Extraordinário 3.6 No Repouso Semanal 3.7 Nas Férias
3.8 Maternidade e Paternidade 3.9 Proteção contra automação
3.10 Prescrição dos Créditos Trabalhistas 3.11 Vedação a discriminação
3.12 Proteção ao trabalho do menor 3.13 Proteção aos trabalhadores avulsos 3.14 Proteção ao trabalhador doméstico 3.15 Direito Sindical
3.16 Sobre os Contratos de Trabalho
3.17 Sobre a Suspensão dos Contratos de Trabalho 3.18 Sobre a Descentralização das Atividades 3.19 Sobre a mobilidade internacional
CAPÍTULO IV – LIBERALISMO E NEOLIBERALISMO E
GLOBALIZAÇÃO...61 4.1 Liberalismo
4.2 Neoliberalismo 4.3 Globalização
CAPÍTULO V – GLOBALIZAÇÃO, DESREGULAMENTAÇÃO E
FLEXIBILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO...68
CAPÍTULO VI – O IMPACTO DA GLOBALIZAÇÃO NO
6.2 Estabilidade no emprego 6.3 Meio ambiente do trabalho 6.4 Vedação a discriminação
6.4.1 Lei nº 7.853/89 6.4.2 Lei nº 9.029/95 6.4.3 Lei nº 9.799/99
6.5 Direito do Trabalho como direito fundamental 6.5.1 Direitos fundamentais na Constituição
6.5.2 Direito Fundamental do Trabalho
VII – GLOBALIZAÇÃO, FLEXIBILIZAÇÃO E O JUDICIÁRIO...83 7.1 Palavras iniciais
7.2 Flexibilização 7.3 O judiciário
CONCLUSÃO...88 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
INTRODUÇÃO
O enfrentamento do tema exige sua delimitação, compreendendo um
exame da globalização, da Constituição Federal do Brasil de 1988 e da
evolução do Direito do Trabalho, da Revolução Industrial1 até a promulgação
da referida Lei Fundamental.
Pode-se afirmar que a globalização tem origem nos grandes
acontecimentos de repercussão mundial, em particular os que sucederam a
revolução industrial (segunda metade do Século XVIII)2.
Da Revolução Industrial, seguem-se a Revolução Francesa (1789),
apontada como responsável pela instauração do liberalismo,3 a primeira guerra
mundial (1914/1918) e o conseqüente Tratado de Versalhes (1918), a
depressão dos anos 30, a segunda guerra mundial (1939/1945), as
conferências de Bretton Woods (Bretton Woods Agreement, 1945), que deram
origem ao FMI e o Banco Mundial, assim como, definiu as regras para as
relações econômicas e financeiras entre os países mais industrializados do
mundo do pós guerra, o surgimento do neoliberalismo com Margaret Thatcher,
Primeira Ministra inglesa, (1980) e Ronald Reagan, Presidente dos EUA
(1981),4 a queda do muro de Berlin (1989)5, provocando o esfacelamento da
1 A revolução industrial provocou grande migração da população do meio rural para o meio
urbano, concentrando um enorme número de trabalhadores nas fábricas, que foram submetidos a regimes análogos à escravidão, com jornadas de trabalho exaustivas e baixas remunerações.
2 A Revolução Industrial aconteceu na Inglaterra na segunda metade do século XVIII e
encerrou a transição entre feudalismo e capitalismo, a fase de acumulação primitiva de capitais e de preponderância do capital mercantil sobre a produção. Completou ainda o movimento da revolução burguesa iniciada na Inglaterra no século XVII.
(www.culturabrasil.pro.br/revoluçãoindustrial.htm, acesso em 13.3.11 às 22.00).
3 BIAVASCHI, Magda Barros.
O direito do trabalho no Brasil – 1930-1942. São Paulo: LTr e JUTRA,
2007, p. 59.
4 MELLO, Celso de Albuquerque.
A soberania através da História, in Anuário de Direito e Globalização.
Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 21.
5HOBSBAWN, Eric.
URSS (União das Repúblicas Soviéticas). Tais acontecimentos, todos com
graves conseqüências, traduzem, com precisão, o processo da globalização,
na medida em que alteraram e continuam influenciando profundamente a
ordem jurídica e econômica mundial.
Na visão de Eric Hobsbawm, as operações cotidianas provocam conseqüências que, em questão de dias, expandem-se, causando efeitos mundiais, a velocidades impensáveis em momentos anteriores.6
A globalização está umbilicalmente associada a capitalismo, como noticiado
por David Held e Antony McGrew:7
To appreciate this, it is necessary to take a more complex view of the globalization process than is often adopted – certainly in the polemical discourses of the anti-globalization movement, where globalization is essentially understood as the globalization of capitalism, achieved in its cultural aspect via a complicitous westerndominated media system.8
Ainda conceituando, a globalização consiste em um processo que surgiu
com a evolução dos novos meios de comunicação cada vez mais rápidos e
mais eficazes. Em outra forma, afirma-se que a globalização é apenas a
continuação do processo de internacionalização em nova roupagem, sob a
influência do capitalismo. Uma definição mais completa é fornecida por Hesse:9
Globalização da economia significa que as fronteiras entre os países perdem importância, quando se trata de decisões sobre investimentos, produção, oferta, procura e financiamentos. As consequências são uma rede cada vez mais densa de entrelaçamentos das economias nacionais, uma crescente internacionalização da produção, no sentido de que os diferentes componentes de um produto final possam ser manufaturados em diferentes países, e a criação de mercados mundiais integrados para inúmeros bens, serviços e produtos financeiros. A globalização também abarca os mercados de trabalho. Aumentaram as migrações de mão-de-obra entre países....
6 HOBSBAWN, Eric.
Globalização, Democaracia e Terrorismo (Globalization, Democracy and
Terrorism). Tradução Jose Viegas. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p.152.
7 HELD, David e MCGREW, Antony.
The Global Transformations Reader: Na Introduction to the Globalization Debate. 2 ed. Cambridge, USA: Polity Press, 2006, p. 272.
8 Tradução livre do autor:
Para entender isso, é necessário ter uma visão mais complexa do processo de globalização que é frequentemente adotada nos discursos polêmicos do movimento antiglobalização, onde a globalização é essencialmente entendida como a globalização do capitalismo, obtida em seu aspecto cultural através de uma cúmplice ocidental, dominada pela imprensa.
9 HESSE, Helmut.
No pensamento de Daniel Sarmento:
O vertiginoso desenvolvimento da informática e das telecomunicações verificado no final do século encurtou drasticamente as distâncias e ampliou os mercados, aproximando da realidade a metáfora da aldeia global.10
Amauri Mascaro do Nascimento afirma que a globalização da economia não
é fenômeno novo, vez que antes da Primeira Grande Guerra (1914/1918) já
havia intensa troca de mercadoria, fruto da interligação entre os países,
facilitando as relações de trabalho11. A globalização econômica incrementou a
competitividade entre as empresas e entre os países. A competitividade, por
seu turno, precisou reduzir custos, em especial os ligados aos direitos
trabalhistas. Reduzir direitos trabalhistas implicou na reavaliação da rigidez das
normas laborais, apontada como causadora da crise do desemprego. Do
debate da redução de direitos trabalhistas, fazem parte o princípio da proteção
(visa nivelar as desigualdades existentes entre os sujeitos no pacto
empregatício). No plano do neoliberalismo, defende-se a redução do papel do
Estado pela diminuição das normas heterônomas tutelares, passando a ser
regidas por convenções e acordos coletivos.
Arnaldo Süssekind aponta a revolução tecnológica e a implosão do império
soviético como causadores da globalização da economia, e que, em alguns
países desenvolvidos,desencadeou intensa campanha pela liberalização do
comércio mundial. No mesmo passo, Süssekind assinala que a flexibilização
das leis de proteção ao trabalho, ainda que sob tutela sindical, marcou os anos
80 na Europa Ocidental, com significativos reflexos na Constituição pátria de
1988.12
10 SARMENTO, Daniel.
A soberania através da História, in Anuário de Direito e Globalização. Rio de
Janeiro: Renovar, 1999, p. 53.
11 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op cit. p.47. 12 SÜSSEKIND, Arnaldo.
Curso de Direito do Trabalho. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p.
Norberto Bobbio relaciona globalização com deslocamento de populações,
afirmando que ela caminha em todos os países economicamente adiantados,
dos países mais pobres para os mais ricos.13
Daniel Sarmento14 alerta que o processo de globalização acarreta certa
harmonização das práticas culturais, favorecendo a consolidação de uma ética
comum, mas cria, em outra ótica, um ambiente favorável a tutela de direitos
fundamentais no plano supranacional. Prossegue o mencionado autor,
inferindo que a exposição das culturas a costumes exógenos às vezes produz
resultado inverso, desenvolvendo fundamentalismos de diferentes matizes e,
assim, minando a sedimentação de uma pauta axiológica mínima,
indispensável à proteção dos direitos humanos em âmbito global.
O cientista político Samuel P. Huntington, ideólogo do neoconservadorismo
norte-americano, afirmava em 1997 que as fronteiras dos Estados se tornaram
cada vez mais permeáveis. E que a globalização é um processo de expansão
da cultura ocidental e do sistema capitalista sobre os demais modos de vida e
de produção do mundo que conduziria a um choque de civilizações. 15
Na esteira das rápidas transformações, o Direito, não ficou impávido.
Paradigmas criados ao longo dos séculos, que arrimaram o pensamento
jurídico ocidental, foram quebrados, desafiando os juristas a reexaminar
consagrados institutos. Daí o surgimento da flexibilização do conteúdo mínimo
das regras protetivas laboristas, no Brasil e alhures.16
13BOBBIO, Norberto. Direita e Esquerda: razões e significados de uma distinção política.. 2 ed.
Tradução de Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: UNESP, 2001, p. 15.
14 SARMENTO, Daniel.
A soberania através da História, in Anuário de Direito e Globalização. Rio de
Janeiro: Renovar, 1999, p. 65.
15Huntington, 1997, p. 36-7 16 SARMENTO, Daniel.
A revolução industrial, sob o signo do faire, laissez aller,
laissez-passet17, permitiu a instauração de um quadro dramático de miséria humana,
causada pela exploração, sem limites, da mão-de-obra pelo capital. Institutos
como férias, limitação de jornadas, proteção ao trabalho da mulher e do
trabalhador menor, inexistiam.18 Marcada pelo absenteísmo estatal, a
revolução industrial acarretou mudanças no setor produtivo e deu origem à
classe operária, transformando as relações sociais.19
Amauri Mascaro Nascimento20 destaca que a competitividade entre
empresas de diferentes países, resultante da globalização, intensificou-se
graças as facilidades proporcionadas pela velocidade e agilidade das
comunicações e comércio, provocando maior concorrência e, como
conseqüência, acarretando redução de custos da produção, afetando a oferta
de empregos, salários, forma de contratação e jornada de trabalho, refletindo,
assim, no direito do trabalho.
É fato incontroverso que a Carta Política de 1988, a reboque do
neoliberalismo e em oposição ao regime anterior dos governos militares, foi
bastante generosa21 em direitos e garantias, em especial, na órbita do Direito
do Trabalho, dedicando um capítulo a que denominou de direitos sociais. No
texto magno, o constituinte fixou no mesmo patamar o direito do trabalho, a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade,
à infância e a assistência aos desamparados. O presente texto pretende
17 A expressão significa: deixai fazer, deixai ir, deixai passar
.
18 SARMENTO, Daniel.
A soberania através da História, in Anuário de Direito e Globalização. Rio de
Janeiro: Renovar, 1999, p. 56.
19 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 3 ed. São Paulo: LTr, 2007, p.61. 20NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 24 ed. São Paulo, Saraiva,
2009, p 43.
21 ZIMMERMANN, Augusto.
descobrir até que ponto a prodigalidade de direitos trabalhistas insertos na
Constituição Federal de 1988 é fruto da globalização.
O estudo não pode dispensar uma incursão na Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT)22 que está umbilicalmente ligada ao surgimento do Direito do
Trabalho no Brasil e assumiu, para Mauricio Godinho Delgado, a natureza
própria de um código do trabalho23. Foi este diploma que ampliou os direitos
trabalhistas, tais, as férias anuais remuneradas, a jornada semanal, o salário
mínimo, o descanso semanal, a contratação do trabalhador por tempo
indeterminado, como regra, e, entre outros, as normas especiais de tutela do
trabalho. A elaboração da CLT, a despeito da inspiração fascista, demonstra
que a globalização influenciou legislação trabalhista pátria desde o seu
nascedouro.24
O Direito do Trabalho, no Brasil, alerte-se, em que pese sofrer a influência
da globalização desde o seu surgimento, em especial, na era Vargas (esteve a
frente da Revolução de 1930 e da outorga da Constituição de 1937, quando
instituiu o Estado Novo)25, subordina-se a princípios. Estes princípios
constituem o mandamento nuclear de um sistema, pois, são tidos como
superiores as normas positivadas. No caso do direito laboral, avulta de
importância o princípio da proteção ao hipossuficiente, que tem suas origens
extraídas da Segunda Revolução Industrial. Este singular princípio, na
abalizada sabedoria de Maurício Godinho Delgado, estrutura uma teia de
22Criada no Governo de Getúlio Vargas pelo Decreto 5.452/43.
23DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7 ed. São Paulo: LTr, 2008, p.
112.
24 GOMES, Ângela de Castro. Cidadania e direitos do trabalho. Rio de Janeiro: Jorge Zahr, 2002, p. 32. 25FERREIRA, Pinto.
Curso de Direito Constitucional. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 54 a
proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia.26 O que enseja a
conclusão de que a influência da globalização não tem o efeito de um rolo
compressor, mas sofre atenuação da principiologia que informa o direito do
trabalho.
É neste panorama que o estudo será desenvolvido, procurando responder
qual o impacto da globalização na ordem jurídica trabalhista no Brasil após a
Carta Política de 1988. A hipótese levantada é que os fatos sociais no mundo,
os tratados, as convenções e recomendações da OIT, no panorama da
globalização, foram recepcionados pela vigente Lei Suprema, agregando e
ampliando expressivos direitos, alguns já inseridos em Cartas anteriores, ao
patrimônio jurídico dos trabalhadores brasileiros.
CAPÍTULO I
A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL DE 1988
O MOMENTO POLÍTICO
1.1 No Mundo
Em 1988, no ano da promulgação da Carta da República do Brasil, o
mundo vivia momentos de importantes mudanças, no cenário político. As
reformas inauguradas por Mikail Gorbachev, em 1985, denominadas de
Perestroika e Glasnost, na então URSS (União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas) caminhava a passos largos. Gorbachev percebeu que a economia
da União Soviética precisava de reformas, o que seria feito pela Perestroika. A
reforma intitulada de Perestroika consistia em reduzir os gastos com defesa,
significando, desocupar o Afeganistão, negociar com os EUA a redução de
armamento (os acordos de Yalta) e não interferir em outros países comunistas
(A Doutrina Sinatra, significando a política de Gobartchev que permitiu a queda
do Muro de Berlin, emancipação dos países do Leste europeu e a saída das
tropas soviéticas do Afeganistão).27Em 1988, Gorbachev afirmou para Henry
Kissinger: “De qualquer maneira, a União Soviética nunca mais será a
mesma.”28
No ano seguinte, 1989, ocorria a queda do muro de Berlin, acabando
com a separação da Alemanha (Ocidental e Oriental), fato que simbolizou o fim
27
Perestroika: New Thinking for Our Country and the World, Mikhail Gorbatchev, Perennial
Library, Harper & Row, 1988, 297 páginas, ISBN 0-06-091528-5. pt.wikipedia.org/wiki/Perestroika. Acesso em 23.3.11 às 23:10.
28KISSINGER, Henry.
A Diplomacia das Grandes Potências. 3 ed. Tradução de Saul S. Gefter
da Guerra Fria (1945 a 1989). Daí em diante, o bloco soviético desintegrou-se,
tendo a Rússia separado-se das demais Repúblicas.29
No período, a Europa Ocidental prosseguiu a integração do bloco
econômico, configurando a União Européia com nova moeda – o Euro.
Margaret Thatcher, na Grã-Bretanha, e Mitterand, na França, estavam no auge
do poder e trabalhando pela integração política do bloco econômico.30
A China de Deng Xiaoping, implantando o socialismo do livre mercado,
preparava-se para ultrapassar o PIB dos EUA. A história não ajudou, o País de
Mao Tse Tung cresceu, mas não o suficiente para ultrapassar os EUA.
Todavia, ocupa na atualidade a 2ª posição na economia mundial.31
As lutas tribais continuaram na África. Sob o patrocínio de antigos e
novos colonizadores, as lutas destruíram a economia e o meio ambiente, além
de exterminar segmentos da população.
A América Latina vivenciou a guerra pela disputa das Malvinas (ou
Falklands), onde argentinos foram derrotados pelos Ingleses. O fato acarretou,
sob o comando do Presidente portenho Alfonsin, problemas econômicos,
políticos e inúmeros descontentamentos da população por conta do malogro na
guerra pelo arquipélago das ilhas. No Chile, inicia-se um processo de abertura,
onde o principal alvo será o General Pinochet, que acabará, mais tarde, preso
em seu domicílio. A Colômbia continuou enfrentando as FARC, que controla
parte do território, causando constantes inquietações a população e as
autoridades, cometendo atos de terrorismo e seqüestros.
29 O muro de Berlin foi construído em 1961 pela República Democrática da Alemanha,
simbolizava a divisão entre o mundo ocidental (liderado pelos EUA) e o bloco oriental (sob a direção da URSS e as demais Repúblicas socialistas).( educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/muro.htm)
30 A União Européia foi criada em 1992 pelo Tratado de Maastricht. Consiste em um grupode
países europeus que participam de um bloco econômico de integração econômica e política, com um moeda única. (www.notapositiva.com, acesso em 23.3.11, às 23:00)
1.2 No Brasil...19
1.2.1 O Direito Comparado e o Trabalhador
Antes de adentrar no estudo da Carta de 1988, faz-se necessário rever
pequeno histórico da influência do direito comparado no constitucionalismo do
Brasil, desde a Constituição monárquica (1824). A incursão na história do
constitucionalismo pátrio e alienígena mostra que o direito do trabalho sempre
esteve na pauta das constituições.
Várias constituições do velho mundo deram relevo as regras protetivas
do trabalhador no seu direito interno.
A Carta italiana, editada em 1947, no primeiro capítulo, dispõe que a
Itália é uma República Democrática fundada no trabalho (art. 1º). No artigo
quarto, estatui que a República reconhece a todos os cidadãos o direito ao
trabalho e promove as condições para tornar efetivo este direito. A Carta do
país de Mussolini ainda elenca vários dispositivos referentes a proteção do
trabalhador, nos temas: salário para assegurar existência digna do trabalhador
e família; jornada máxima do trabalho fixada em lei; idade mínima para o
trabalho fixada em lei; repouso semanal e férias anuais remuneradas; proteção
especial da mulher e do menor; isonomia de direitos entre homem e mulher;
seguros sociais contra doença, invalidez, velhice, acidente do trabalho e
desemprego involuntário; liberdade sindical; direito de greve. 32
A Lei Fundamental francesa, no preâmbulo da Constituição de 1946, faz
referência ao princípio da igualdade no trabalho, à liberdade sindical, ao direito
de greve e de participação na gestão da empresa. Foi substituída pela de 1958,
32MEIRELES, Edilton.
A Constituição do Trabalho. In Direitos Sociais na Constituição de 1988.
atribui ao Parlamento a competência para aprovar leis sobre o direito do
trabalho, o direito sindical e a seguridade social (art. 34), mas afirma a
superioridade dos tratados sobre as leis (art. 35), o que prestigia as
convenções elaboradas pela OIT (Organização Internacional do Trabalho).33
A Constituição germânica de 1949 assegura o direito dos cidadãos de
formar associações em benefício do aprimoramento das condições de trabalho,
considerando nulos todos os atos que vedem tal direito (art. 9º). Assegura a
competência do Estado para legislar sobre o direito do trabalho, garantindo o
seguro contra o desemprego (art. 14, n. 11).34
A Carta espanhola de 1978 faz referência à liberdade sindical, ao direito
de greve, à contratação coletiva, ao dever e direito ao trabalho, à liberdade de
profissão, à remuneração mínima e a não discriminação.
A Lei Maior lusitana de 1976, alterada pelas leis constitucionais de 1982,
1989 e 1992, é pródiga na concessão de liberdades e garantias dos
trabalhadores. Na segurança do emprego, veda a demissão sem justa causa
ou por motivos políticos ou ideológicos (art. 53). Institui as comissões de
trabalhadores e associações sindicais (art. 54), conferindo-lhes poderes para
agirem na defesa dos seus interesses e na intervenção democrática na vida da
empresa, celebrando acordos e convenções coletivas de trabalho. Disciplina o
salário, observado o princípio da isonomia para o trabalho igual, assim como a
fixação e atualização do salário mínimo (art. 59). Defende que todos têm direito
à seguridade social, reservando ao Estado o papel de organizar um sistema de
seguridade social, unificado e descentralizado (art. 63).35Consolidando as
33SÚSSEKIND, Arnaldo. Direito Constitucional do Trabalho. 4 ed. São Paulo: Renovar, 2010, p.
22.
normas existentes, Portugal lançou, em 2003 (Lei nº 99, de 27 de agosto de
2003) o Código de Trabalho, que inicia o texto prestigiando as normas
coletivas, no teor:36
Artigo 1.º
Fontes específicas
O contrato de trabalho está sujeito, em especial, aos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, assim como aos usos laborais que não contrariem o princípio da boa fé.
O Estatuto Fundamental da China de 1982 determina que o Estado
deverá proteger o trabalhador e criar condições para o emprego,
cumprindo-lhe, ainda, estabelecer a jornada de trabalho, o regime de férias e aprovar as
regras para a aposentadoria (art. 44).37
A Constituição de Cuba, aprovada em 15 de fevereiro de 1976, dispõe
de capítulo dedicado aos direitos sociais, tratando de direitos, deveres e
garantias constitucionais, com normas meramente programáticas. Ressalta que
o trabalho, na sociedade socialista, é um direito, um dever e motivo de honra
para o cidadão. Admite a remuneração do trabalho, observada a qualidade e
quantidade. Proclama que o trabalho voluntário, não remunerado, prestado em
benefício da comunidade, forma a consciência comunista do povo (art. 44),
Assegura a jornada diária de oito horas, o descanso semanal, as férias anuais
remuneradas e a seguridade social (arts. 45 e 46).38
O Estatuto Político da Venezuela foi reformado em 1961 e emendado
em 1973. Estatui que são irrenunciáveis, pelo trabalhador, as disposições que
a lei estabeleça para favorecê-lo ou protegê-lo (art. 85). Fixa diversas regras de
proteção ao trabalhador, desde jornada diária de trabalho de oito horas,
descanso semanal, férias remuneradas (art. 86), estabilidade no emprego e
36http://www.mtss.gov.pt/docs/Cod_Trabalho.pdf, acesso em 3.9.11, às 11:00. 37SÜSSEKIND, Arnaldo. Op. Cit. p.24.
indenização de antiguidade (art. 88), liberdade e autonomia sindical até direito
de greve (dentro das condições limitadas pela lei).39
1.2.2 Constitucionalismo no Brasil
Na linha das Constituições européias, o constitucionalismo pátrio, desde
o seu início, em particular nas Cartas republicanas, assinalou com a disposição
de proteger o trabalhador, inserindo direitos básicos até que na Carta de 1988,
atingiu o maior grau, sendo bastante generosa em dispositivos protecionistas
do trabalhador.
A Constituição monárquica de 1824, decretada dois anos após a
Declararação de Independência, surgiu de um ato de violência política, pela
dissolução, por D. Pedro I, da Assembléia Constituinte. Durou 67 anos, sendo
considerada a Carta mais longa do constitucionalismo brasileiro. Foi
inluenciada pelos postulados da Revolução Francesa, seja assegurando
liberdade para o trabalho (art. 179, nº 24), seja abolindo as corporações de
ofício (art. 179, nº 25), inseridos por inspiração do padre jesuíta Antonio Vieira.
Sob seu ordenamento jurídico, foi proclamada a República e promulgada a Lei
Áurea (13.5.88), a lei de maior alcance social do período monárquico.40
A Carta do Império foi substituída pelo Estatuto de 1891, que contou
com inspiração da Declaração Universal dos Direitos do Homem da Revolução
Francesa (1789) e da Constituição norte-americana (1787), garantindo o livre
exercício de qualquer profissão (art. 72, parágrafo 4º) e o direito de associação
(art. 72, parágrafo 8º). Sob sua ordem jurídica, foram tratados temas como
férias anuais remuneradas, trabalho do menor e sindicalização. Foi reformada
em 1926 e teve o curso interrompido pela Revolução de 1930.
Após uma violenta guerra civil, marcada pela Revolução
Constitucionalista de São Paulo (1932), vem o texto de 1934, que introduz no
constitucionalismo brasileiro a idéia social, já que as duas Constituições
anteriores refletiam uma concepção marcadamente absenteísta de Estado.
Em 1937, após um golpe de Estado capitaneado por Getúlio Vargas41,
foi outorgada a Constituição de 1937, que não chegou a entrar em vigor, tendo
Vargas governado por decretos-leis, sem a autorização dos órgãos legislativos.
Entre os diplomas elaborados por Vargas, na órbita trabalhista, destacam-se os
Decretos que disciplinaram: a justiça do trabalho (nº 1.237/39); a organização
sindical (nº 1.402/39); a primeira tabela de salários mínimos (nº 2.162/40); a
duração do trabalho (nº 2.308/40); o enquadramento sindical (nº 2.381/40); o
trabalho do menor (nº 3.616/41); o imposto sindical (nº 4.289/42); a criação do
SENAI (nº 4.936/42); a Consolidação das Leis do Trabalho (nº 5.452/43).
Com a queda de Vargas, em 29.10.45, foi promulgada a Constituição de
1946, restaurando a normalidade constitucional, que duraria até o movimento
revolucioário de 1964. O Estatuto de 1946 foi elaborada sob a inspiração
democrática oriunda da vitória dos Aliados na 2ª Guerra Mundial. O rol de
direitos sociais foi ampliado, ressaltando a participação do trabalhador nos
lucros da empresa, remuneração dos dias de repouso obrigatório e o direito de
greve. Na mesma linha de inovações, a Justiça do Trabalho passou a pertencer
ao Poder Judiciário, mantendo seu poder normativo nos dissídios coletivos.
São frutos da Carta de 1946, também, as leis sobre o repouso semanal
41 Exerceu a Presidência do Brasil por quatro vezes: 1930 a 1934, governo provisório de 1934
remunerado (Lei nº 605/49), sobre o adicional do trabalho perigoso (Lei nº
2.573/55), sobre a gratificação de Natal – 13º salário (Lei nº 4.090/62), o
salário-família (Lei nº 4.266/63), entre outros diplomas.42
Em 1967, foi votada a Carta de de 1967, que o propósito de continuar o
movimento de 1964, em conformidade com a doutrina de segurança nacional
desenvolvida pela Escola Superior de Guerra. Teve curta duração, sendo
sucedida pela Emenda 1969, que teve o mérito de instituir o direito de gureve,
salvo para os serviços públicos e atividades essenciais definidas em lei (art.
162). Este ordenamento jurídico perduraria até a votação da Constituição de
1988, instituindo um Estado mais Social que Liberal, nas palavras de Paulo
Bonavides.43
1.2.3 A Constituição de 1988
No período que antecedeu a Constituição de 1988, o País vivia clima de
mudanças institucionais, pois, as lembranças dos governos militares ainda
estavam vivas. De 1964 até 1985, período da Guerra Fria, o mundo vivia sob a
bipolaridade – EUA e URSS, enquanto no Brasil, por conta do movimento de
1964, algumas garantias do estado democrático de direito estavam
suspensas.44
[...] No dia 13 de março de 1964, João Goulart realiza um grande comício na Central do Brasil ( Rio de Janeiro ), onde defende as Reformas de Base. Neste plano, Jango prometia mudanças radicais na estrutura agrária, econômica e educacional do país. Seis dias depois, em 19 de março, os conservadores organizam uma manifestação contra as intenções de João Goulart. Foi a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu milhares de pessoas pelas ruas do centro da cidade de São Paulo.
O clima de crise política e as tensões sociais aumentavam a cada dia. No dia 31 de março de 1964, tropas de Minas Gerais e São Paulo saem às ruas. Para evitar uma
42 SÜSSEKIND, Arnaldo. Op. Cit. p. 38 a 49.
43 BONAVIDES, Paulo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 373.
guerra civil, Jango deixa o país refugiando-se no Uruguai. Os militares tomam o poder. Em 9 de abril, é decretado o Ato Institucional Número 1 (AI-1). Este,cassa mandatos políticos de opositores ao regime militar e tira a estabilidade de funcionários públicos. [...]
Em outubro de 1988, foi promulgada a vigente Constituição republicana
no Brasil. Os trabalhos de elaboração da Carta Política começaram em 1º de
fevereiro de 1987, com o concurso de 559 parlamentares.
As discussões consumiram 18 meses para que a Lei Fundamental fosse
promulgada em dia 5 de outubro de 1988, substituindo a elaborada no regime
militar em 1967.
Ao completar 20 anos, o texto magno estava 25% maior do que o
aprovado pela Assembléia Constituinte de 1988 -- quando tinha 245 artigos. Na
atualidade, conta com 250 artigos e 67 Emendas.
Para Celso Bandeira de Mello, o texto aprovado pela constituinte traçava
uma sociedade ideal e possível, mas não atendia à tendência mundial de
abertura dos mercados. Teve de se adaptar, então, para acompanhar o resto
do mundo.45 A Carta, prossegue o consagrado jurista, tem méritos
excepcionais e está à frente do seu tempo. Trouxe conquistas para os direitos
individuais e para os direitos sociais (artigos 5º e 7º). O novel diploma estatui
que a República Federativa do Brasil tem que ser uma sociedade livre, justa e
solidária (artigo 3º). A ordem econômica e social (artigo 170) ganha um
princípio, a função social da propriedade e a expansão das oportunidades de
emprego produtivo. É estabelecida a primazia do trabalho sobre o capital e a
possibilidade de desapropriação de imóvel que não é usado para cumprir sua
45 Revista Consultor Jurídico de 28 de setembro de 2008.
função social. Celso de Mello adverte que a Constituição de 1988 foi, no
entanto, prejudicada com o fim do socialismo e o início da globalização.
O modelo econômico adotado no Brasil, a partir da Constituição de
1988, inicialmente não guardava sintonia com as novas regras da economia
mundial, sendo, portanto, incompatível com os mercados externos. A reforma
do Estado operada por sucessivas Emendas Constitucionais, em especial, as
propostas no governo de Fernando Henrique (1995 a 2003), abriu as portas do
país para investimentos internacionais e para o capital, acarretando uma
constatação da não realização dos direitos sociais prometidos na Carta Federal
e do aumento das desigualdades sociais. Fernando Henrique foi o mandatário
brasileiro que mais incorporou as idéias propostas no denominado Consenso
de Washington, que estabelecia a adoção de políticas fiscais rígidas, a
privatização de funções estatais, a liberalização da economia, além de maior
flexibilização para a contratação de pessoas e serviços sem a intervenção do
Estado.46
A elaboração da Carta de 1988, trouxe a descentralização política, fiscal
e administrativa, além da renovação do federalismo, objetivando a promover a
melhoria dos serviços públicos e da distribuição de renda.
As mudanças empreendidas pelo texto constitucional de 1988 não foram
suficientes para debelar a crise econômica instalada no país, nos vinte anos
anteriores. Assim, era necessário pensar em uma economia globalizada,
promovendo novas alterações no ordenamento jurídico brasileiro buscando, em
uma ótica, permitir o ajuste econômico e, por outra, viabilizar a abertura do
mercado interno para os investimentos internacionais. Foi então que o texto
46COUTINHO, Grijalbo Fernandes.
O Direito do Trabalho Flexibilizado por FHC e Lula. São
magno, por meio de sucessivas EC (Emendas Constitucionais), alterando o
modelo normativo47, passou a sofrer o assédio da globalização, processo
iniciado por Fernando Henrique e continuado por Fernando Collor, até ser
afastado do Poder pelo impeachment.
1.3 Direitos Sociais Incorporados ao texto constitucional
1.3.1 Considerações Iniciais
O constitucionalista Paulo Bonavides assevera que a Carta de 1988 é
basicamente uma Constituição do Estado Social, na medida em que privilegiou
a concretização dos direitos sociais básicos.48
Neste sentido, a Constituição de 1988 não se limitou a consagrar os
direitos individuais, foi além, definindo também os direitos coletivos.49 Neste
sentido, o texto, expressamente, rompeu com a ordem econômica liberal
anterior, segundo a leitura dos artigos 1º e 3º.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania; II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
[...]
A redação do artigo 1º, criando o Estado Democrático de Direito,
arrimado na soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana e nos valores
47 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Constitucional e globalização. Jus
Navigandi, Teresina, ano 9, n. 525, 14 dez. 2004. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/6041>. Acesso em: 29 ago. 2011.
48BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p.
371.
49ZIMMERMANN, Augusto.
Curso de Direito Constitucional. 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris
sociais do trabalho e da livre iniciativa, e no pluralismo político traduzem, com
redundância, a ordem criada sob a nova Lei Fundamental. Anote-se que desde
o primeiro dispositivo, a Constituição homenageia os valores sociais do
trabalho, tema umbilicalmente atado ao Direito do Trabalho.
O constituinte criou um sistema de garantias que valorizaram o trabalho
como instrumento de concretização do Estado Social (valores sociais do
trabalho). Essas garantias foram separadas em vários grupos. 50
A tutela do trabalho foi colocada no primeiro grupo de garantias,
assegurando os direitos trabalhistas fundamentais, individuais e coletivos,
acrescentando os princípios protecionistas, no teor do artigo 7º, CF.
As garantias de proteção social, vistas em um processo de integração
socioeconômica dos trabalhadores, foram colocadas no segundo grupo.
Nessas garantias, inserem-se, além de outras, a formação de uma política
agrícola que assegure habitação para o trabalhador rural (artigo 187, VIII, CF),
ações de proteção à saúde (artigo 200, II, CF), proteção ao meio ambiente do
trabalho (artigo 200, VIII, CF), proteção contra o desemprego involuntário,51
promoção da integração dos necessitados ao mercado de trabalho (artigo 203,
III, CF), política de educação com formação para o trabalho (artigo 214, IV,
CF), proteção do menor trabalhador (artigo 227, I a III, do parágrafo 3º, CF).
Finalmente, no terceiro grupo foram colocadas outras garantias que se
relacionam com o trabalho como instrumento de implantação do Estado Social.
Este grupo apresenta dois subgrupos, um que limita as classes
econômicas, promovendo um equilíbrio entre o capital e o trabalho. Neste
50 BUELGA, Gonzalo Maestro.
La constituciónd del trabajo em El Estado Social, p.50.
51O texto constitucional prevê a estabilidade como regra de proteção para o empregado. Por tal
subgrupo, destacam-se as regras que impõem uma função social à
propriedade, à desapropriação por descumprimento da função social (artigo
186, CF), a que agrega à instituição da livre iniciativa o seu valor social (artigo
1º, IV, CF) e as que limitam a atuação do poder econômico, como, a alçada ao
princípio da busca do pleno emprego (artigo 170, VIII, CF).
No segundo subgrupo, elencam-se o princípio da liberdade sindical,
embora mitigado pela unicidade sindical, e o consagrado direito de greve. Com
tais prerrogativas, o legislador constituinte outorgou aos trabalhadores
instrumentos de real inserção no sistema político e meios eficazes de
interferência no sistema econômico-financeiro, graças a um maior poder de
negociação.52
As regras diretamente relacionadas ao trabalho, classificam-se em:
direitos fundamentais de liberdades públicas; direitos do cidadão; direitos
específicos do trabalhador; direitos de defesa; normas que condicionam a
política socioeconômica; e normas que regulam a organização do Estado.
1.3.2 Direitos relacionados às liberdades coletivas e individuais
Neste tópico, ganham relevo a liberdade sindical (art. 8º, CF), ainda que
relativizada pela unicidade sindical53, o direito de greve (art. 9º, CF)54 e a
liberdade de escolha do trabalho, da profissão ou do ofício (artigo 5º, XIII, CF).
1.3.3 Direitos relacionados diretamente ao trabalho
52 MEIRELES, Edilton. A Constituição do Trabalho. Op. Cit.p.60
53 Princípio da unicidade sindical significa uma organização sindical por base territorial, sendo
esta não inferior a um Município. (art. 8º, II, CF)
54 Regulamentada pela Lei nº 7.783/89. O direito a greve tem fundamento no princípio da
O princípio da igualdade é prestigiado em diversos dispositivos (art. 7º,
XXX, XXXI e XXXII, além de X e XI do art. 37, e art. 173, II, CF). Constata-se
que a igualdade já é destacada no art. 5º, caput, o que bastaria para preservar
o secular princípio, tão decantado por Aristóteles, repetido por Rui Barbosa e
componente da trilogia da Revolução Francesa, juntamente com a liberdade e
a fraternidade.
Quanto ao princípio da igualdade, é oportuno compulsar o alerta de
Paulo Bonavides de que este princípio é o centro medular do Estado social e
de todos os direitos de sua ordem social, compondo a concepção estrutural do
Estado democrático contemporâneo. Para o consagrado constitucionalista, a
igualdade é o direito fundamental guardião do Estado social.55
Na linha da igualdade, o constituinte previu cláusula assegurando a
proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos
(art. 7º, XX, CF), reserva de emprego público às pessoas portadoras de
deficiência (art. 37, VIII, CF) e igualdade de tratamento aos trabalhadores
avulsos, nivelando-os com os trabalhadores com vínculo permanente (art. 7º,
XXXIV, CF).
Com respeito, ainda, aos direitos relacionados ao trabalho, o texto
magno contém proteção contra despedida arbitrária, acesso democrático ao
emprego público (art. 37, I, CF) e cláusula de valorização do trabalho (art. 170
e inciso IV, do art. 1º, CF).
O constituinte, no tópico direito de defesa, elencou uma série de
garantias e instrumentos, conferindo aos trabalhadores meios de proteção dos
seus interesses. Assim, autorizou a representação processual, judicial ou
extrajudicial, por meio das associações sindicais (art. 5º, XXI, CF). Tal
prerrogativa, conferida as associações, advirta-se, permite que os sindicatos
substituam, processualmente, os membros da categoria e não apenas os
filiados (art. 8º, III, CF). Ainda como meio de proteção dos seus interesses, a
Lei Fundamental instituiu o direito de greve (art. 9º, CF).56
A coletivização dos direitos do trabalho, considerado outro meio de
defesa dos interesses dos trabalhadores, teve o propósito de impedir a
supressão ou alteração de algumas garantias constitucionais mediante acordos
individuais. Segue-se daí, o reconhecimento das convenções e acordos
coletivos resultantes das negociações coletivas.
Na mesma linha dos direitos coletivos, o constituinte inseriu o direito de
representação dos trabalhadores nas empresas com mais de 200 empregados
(art. 11). O dispositivo nada mais é do que a reprodução da Convenção nº 135
(de 1971) da OIT, ratificada no Brasil em 1990. A convenção preencheu uma
lacuna no texto constitucional. O artigo 11, CF, assegura a representação dos
trabalhadores em empresas com mais de 200 empregados, mas, é omisso
quanto à estabilidade do representante. Por seu turno, a Convenção 135
assevera que os representantes dos trabalhadores na empresa deverão gozar
de proteção eficaz contra todo o ato que possa prejudicá-los, inclusive a
dispensa por motivo da sua condição de representante dos trabalhadores.
56 Admite a paralisação da atividade laboral, por iniciativa dos trabalhadores, atendidos os
dispositivos legais. Não se confunde com o lock out que significa o fechamento da empresa,
CAPÍTULO II
O IMPACTO DAS NORMAS INTERNACIONAIS
2.1 Organizações Internacionais57
Como resultado da globalização, as organizações de trabalho, no plano
internacional, são organizadas com várias finalidades: organizações gerais ou
regionais, organizações com finalidade normativa ou regulamentar;
organizações regionais; organizações com função arbitral; e as consultivas.
As organizações gerais, classificam-se em especializadas, tal a OIT
(Organização Internacional do Trabalho), e genéricas, como a ONU
(Organização das Nações Unidas), atuam no âmbito de todos os países e
fixam princípios programáticos e regras imperativas.
As organizações regionais atuam em determinados territórios,
normalmente, formando uma Comunidade, uma União ou, simplesmente,
instituindo normas aduaneiras, migratórias ou econômicas, visando agilizar o
processo produtivo e ampliar a circulação de riquezas entre os países
interessados. É o caso da União Européia e do Mercossul.
As organizações sem finalidade normativa, mas que possuem função
arbitral ou jurisdicional, são dotadas do poder de conhecer conflitos envolvendo
pessoas físicas ou jurídicas, vinculadas por relações jurídicas internacionais.
Neste exemplo, aponta-se o Tribunal de Justiça da Comunidade Européia.
Finalmente, há as organizações consultivas que têm o propósito de
dabater as diretrizes maiores do bloco econômico. É o caso do Foro Consultivo
Econômico-Social, previsto nos artigos 28 a 30 do Protocolo de Ouro Preto
para o Mercosul.58
2.2 Diplomas Internacionais
Os diplomas internacionais, elaborados pelas organizações
internacionais, irradiam seus efeitos por meios de atos principiológicos e
normativos que inspiram os fundamentos dos sistemas jurídicos da
comunidade internacional.
São classificados em tratados (bilaterais ou multilaterais, segundo o
números de signatários), em convenções internacionais da OIT que não se
confundem com os tratados59, normas comunitárias e contratos coletivos
internacionais.
Neste cenário, destacam-se a Declaração Universal dos Direitos do
Homem, a Carta Social Européia, a Carta Internacional Americana de
Garantias Sociais, entre outros, como as Convenções e Recomendações da
OIT.
2.2.1 Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948
Para Arnaldo Sussekind, as normas contidas na Declaração revelam os
direitos humanos dos trabalhadores, com staus de direitos supra estatais,
independentemente de suas ratificações pelos Países.60
58 Não tem função executiva, mas consultiva. É organizado de forma paritária, com
representação de trabalhadores e empregadores e podendo fazer recomendações para o Mercosul e os Estados membros. (NASCIMENTO, 2006, p. 95)
59 Diferem dos tratados, porquanto são aprovadas por um plenário internacional, enquanto os
tratados resultam do entendimento direto entre os países interessados.
Foi aprovada na resolução da III Sessão Ordinária da Assembléia Geral
das Nações Unidas, em 1948, proclama direitos trabalhistas que foram
rigorosamente também contemplados na Constituição de 1988, tais os que se
seguem:
- dispositivo da Declaração Universal : todo homem tem direito ao
trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de
trabalho e à proteção contra o desemprego;
- dispositivos da Constituição Federal de 1988: são direitos sociais a
educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a seegurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição (art. 6º); é livre o exercício de
qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais
que a lei estabelecer (art. 5º, XIII);
- dispositivo da Declaração Universal: todo homem, sem qualquer
distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho;
- dispositivos da Constituição Federal de 1988: proibição de
diferenças de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por
motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 5º, XXX); proibição de
qualquer discriminação no tocante a salário e critério de admissão do
trabalhador portador de deficiência (art. 5º, XXXI); proibição de distinção
entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais
respectivos (art. 5º, XXXII);
- dispositivo da Declaração Universal: todo homem que trabalha tem
sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que
acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social;
- dispositivos da Constituição Federal de 1988: salário mínimo,
fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de ...(art. 7º, IV); piso salarial
proporcional à extensão e à complexidade do trabalho (art. 7º, V);
irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção o acordo coletivo
(art. 7º, VI); garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que
percebem remuneração variável (art. 7º, VII); décimo terceiro salário com
base ba remuneraçào integral ou no valor da aposentadoria (art. 7º, VIII);
proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa
(art. 7º, X);
- dispositivo da Declaração Universal: todo homem tem direito a
organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses;
- dispositivos da Constituição Federal de 1988: é livre a associação
profissional ou sindical, observado o seguinte...(art. 8º); ninguém será
obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato (art. 8º, V)
- dispositivo da Declaração Universal: todo homem tem direito ao
repouso e ao lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e as
férias remuneradas periódicas;
- dispositivos da Constituição Federal de 1988: duração do trabalho
normal não superior oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada
a compensação de horários e a redução de jornada, mediante acordo ou
convenção coletiva de trabalho (art. 7º, XIII); repouso semanal remunerado,
- dispositivo da Declaração Universal: a maternidade e a infância têm
direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro
ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social.
- dispositivos da Constituição Federal de 1988: licença à gestante,
sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 120 dias (art. 7º, XVIII);
licença-paternidade, nos termos fixados em lei (art. 7º, XIX); proteção ao
mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos
da lei (art. 7º, XX); assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o
nascimento até 5 (cinco) anos de idade emcreches e pré-escolas.
Anote-se que o texto magno sofreu o efeito da Declaração Universal dos
Direitos Humanos de 1948, mas não se contentou com os direitos por ela
contemplados, foi mais longe, dispondo de mais direitos do que os ofertados
naquele consagrado diploma. Daí que a Carta Magna de 1988 disciplinou os
direitos trabalhistas individuais e coletivos em 42 dispositivos, recebendo com
justiça o título de Constituição Cidadã. A recepção dos dispositivos trabalhistas
contidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma prova robusta
de que o impacto da globalização teve papel relevante na elaboração do
Código Supremo brasileiro.
2.2.2 Carta Social Européia de 1961
A Carta Social Européia, firmada em Turim, em 18 de outubro de 1961,
com vigência em 26 de fevereiro de 1965, foi ratificada por sete países:
Alemanha, Dinamarca, Irlanda, itália, Noruega, Reino Unido e Suécia. Entre os
direitos por ela positivados, destacam-se:61
61Artigo 1.º Direito ao trabalho
- direito ao trabalho: disciplinado no art. 6º, caput, e em vários
dispositivos do art. 7º, todos da CF;
- direito à condições de trabalho justas: recepcionado em vários
dispositivos do art. 7º, CF, quando trata de salário, jornada, liberdade
sindical, vedação à discriminação;
- direito à segurança e à higiene no trabalho: recepcionado na CLT
(Consolidação das Leis do Trabalho) , no capítulo referente a Segurança e
Medicina do Trabalho;
- direito à remuneração justa: recepcionado em vários dispositivos do
art. 7º, CF, quando trata de salário mínimo, 13º salário, piso salarial,
irredutibilidade de salário, salário-família.
Constata-se, por conseguinte, que todos os direitos elencados foram
redundamente contemplados no texto da Constituição Federal de 1988 e
regulamentados na legislação celetista (CLT).
2.3 Organização Internacional do Trabalho (OIT)
2.3.1 Considerações gerais
É pessoa jurídica de direito público internacional, de caráter permanente,
integrando o sistema das Nações Unidas, como uma agência especializada,
reunindo, atualmente, 182 Estados de todas as regiões do globo terrestre.
comprometem-se:
1) A reconhecer como um dos seus principais objectivos e responsabilidades a realização e a manutenção do nível mais elevado e mais estável possível de emprego, com vista à realização do pleno emprego;
2) A proteger de modo eficaz o direito de o trabalhador ganhar a sua vida por meio de um trabalho livremente empreendido;
Tem atividade normativa voltada exclusivamente para a esfera
trabalhista, compreendendo Convenções, Recomendações e Resoluções.
Criada pelo Tratado de Versalhes em 1919, a OIT tem o propósito de
regular o direito do trabalho em todos os Estados-membros, por meio dos seus
atos. Assim, quando um País ratifica uma convenção, atrai o ônus de cumpri-la,
apresentar relatórios regulares sobre as medidas adotadas para a sua
aplicação, assim como assume o encargo de divulgar para as organizações de
empregadores e trabalhadores.
A ratificação das deliberações da OTI depende do ordenamento jurídico
interno de cada país, vez que a Organização não constitui um organismo
supranacional com força imperativa sobre os Estados-membros.
O principal valor defendido pela OIT consiste na liberdade sindical, que
considera essencial para a defesa dos trabalhadores.62Referido princípio foi
afirmado no Tratado de Versalhes, em 1919, como direito de associação, tanto
para assalariados como para empresários.
As convenções da OIT têm exercido influência no direito coletivo e no
individual no ordenamento jurídico pátrio. As convenções são diplomas
destinadas a constituir regras gerais e obrigatórias para os Estados
deliberantes, que as inserem no ordenamento doméstico, observadas as regras
do direito interno. Quando não contam com número suficiente de adesões, as
deliberações são promulgadas como simples Recomendações, valendo como
sujeição para orientar o ordenamento interno no Estado-membro.
2.3.2 Classificação das Convenções por Categorias
62NASCIMENTO, Amauri Mascaro.
Curso de Direito do Trabalho. 24 ed. São Paulo, Saraiva,
As 183 Convenções aprovadas até junho de 2001, são classificadas nas
seguintes categorias:
- direitos humanos básicos;
- emprego;
- políticas sociais;
- administração do trabalho;
- relações industriais;
- condições de trabalho;
- segurança social;
- emprego de mulheres;
- emprego de crianças e jovens;
- trabalhadores migrantes;
- trabalhadores indígenas;
- outras categorias especiais.
2.3.3 Convenções Fundamentais
A OIT designou oito categorias comofundamentais, as quais integram a
Declaração de Princípios Fundamentais e Direitos no Trabalho da OIT
(1998). Estas devem ser ratificadas e aplicadas por todos os membros:
- nº 29 e 105 (1957) ambas ratificadas no Brasil – Trabalho forçado:
dispõe sobre a eliminação do trabalho forçado ou obrigatório em todas as suas
formas. Admitem algumas exceções, tais como o serviço militar, o trabalho
penitenciário adequadamente supervisionado e o trabalho obrigatório em
situações de emergência, como guerras, incêndios e terremotos, etc; proíbe o
uso de toda forma de trabalho forçado ou obrigatório como meio de coerção ou
ideológicas; a mobilização de mão-de-obra; como medida disciplinar no
trabalho, punição por participação em greves, ou como medida de
discriminação;
- nº 87 – não ratificada pelo Brasil. Trata da liberdade sindical e proteção
ao direito de sindicalização (1948): estabelece o direito de todos os
trabalhadores e empregadores de constituir organizações que considerem
convenientes e de a elas se filiarem, sem prévia autorização, e dispõe sobre
uma série de garantias para o livre funcionamento dessas organizações, sem
ingerência das autoridades públicas;
- nº 98 – Direito de sindicalização e de negociação coletiva (1948):
estipula proteção contra todo o ato de discriminação que reduza a liberdade
sindical, proteção das organizações de trabalhadores e de empregadores
contra atos de ingerência de umas nas outras, e medidas de promoção da
negociação coletiva;
- nº 100 (1951) e 111 (1958) – ratificadas pelo Brasil. Tratam de
igualdade de remuneração: preconizam a igualdade de remuneração e de
benefícios entre homens e mulheres de igual valor; e discriminação (emprego e
ocupação): preconizam a formulação de uma política nacional que elimine toda
discriminação em matéria de emprego, formação profissional e condições de
trabalho por motivos de raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência
nacional ou origem social, e promoção da igualdade de oportunidades e
tratamento;
- nº 138 (1973) e 182 (1999) – ratificadas pelo Brasil. A 138 disciplina a
idade mínima (1973): objetiva a abolição do trabalho infantil, ao estipular que a