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Rev. bras. polít. int. vol.40 número2

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Academic year: 2018

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Resenhas

SARAIVA, José Flávio Sombra (org.). Relações internacionais contemporâneas. Da construção do mundo liberal à globalização (de 1815 a nossos dias).Brasília: Paralelo 15, 1997, 397 p.

Essa coleção de nove ensaios, escritos por quatro especialistas qualificados da Universidade de Brasília, cobre quase dois séculos de história universal, desde o Congresso de Viena até os umbrais do século XXI. Redigidos de forma acessível e coerente – não mostram, como os de tantas obras coletivas, diferenças de qualidade ou de enfoque que alteram a coesão do conjunto –, apresentam um quadro sumamente completo e complexo da história da humanidade nestes 180 anos. Cabe destacar que os autores conseguem escapar de maneira notável ao duplo perigo de uma visão euro ou “ocidentalocêntrica” e de uma postura dogmaticamente “terceiro-mundista”, combinando a universalidade de diversos enfoques originários do mundo industrializado, europeu em particular, com uma reflexão original a partir de um posto de observação no Brasil. Cada época é analisada com ênfase lógica, e obviamente decrescente, na história européia, mas trata também, de maneira bastante equilibrada e competente, dos países e regiões periféricas, não apenas das potências ascendentes (Estados Unidos, União Soviética e Japão), como também das vastas regiões do que se costuma chamar, ou ainda se denomina, Terceiro Mundo em seus três componentes: América Latina, África e Ásia. Reflete, assim, uma visão universalista que nesta forma seria difícil encontrar fora do Brasil. Não apenas por esta razão, mas igualmente pela qualidade da análise, o estilo ao mesmo tempo científico e compreensível, e o acervo impressionante de dados históricos e estruturais que contém, este livro pode servir com grande utilidade a um público amplo interessado no tema, no Brasil e em qualquer outro país, sem cair por isso, salvo excepcionalmente, em simplificações suscetíveis de serem criticadas por leitores atentos mais especializados.

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época da independência, passando pelo tratado anglo-otomano de 1838, até a abertura da China nos anos 1840 e do Japão nos anos 1850. Em uma segunda fase, os países industrializados, à exceção dos Estados Unidos, introduziram o livre comércio para dentro, desde a abolição das tarifas protecionistas inglesas a partir de 1842, passando pelo tratado anglo-francês de 1860, para estender-se aos outros países centrais. Por volta de 1860, a construção do mundo liberal estava concluída e encerrava-se a fase mercantilista primitiva da economia capitalista.” (p. 87).

O capítulo 3, de Wolfgang Döpcke, estuda com competência e juízo equilibrado o “apogeu e colapso do sistema internacional europeu” entre 1871 e 1918. Especialista alemão de história africana e igualmente professor da Universidade de Brasília, o autor trata em detalhe da divisão do continente negro durante o último quartel do século XIX, reflete sobre o fenômeno do nacionalismo e o desenvolvimento desigual das grandes potências da época. Termina seu ensaio com uma discusão interessante sobre a controvertida culpabilidade alemã em deslanchar a Primeira Guerra Mundial, concluindo pela responsabilidade particular desse país dentro de uma complexa engrenagem internacional que conduzia quase inevitavelmente ao conflito (pp. 157-60), apesar das relações econômicas cada vez mais estreitas por exemplo entre a Alemanha e a França (p. 118).

O capítulo 4, de A. L. Cervo, analisa a “inestabilidade internacional” de 1919 a 1939. Critica duramente, na linha de Keynes, a miopia do Tratado de Versalhes que, junto com a perda de peso das velhas potências européias e as crises do sistema econômico, originaram o segundo grande conflito. “Apesar de corresponder à primeira tentativa de regulamentação de uma sociedade global”, enfatiza, “a ordem de Versalhes – à diferença do que havia ocorrido quando dos anteriores foros internacionais – era incoerente, defeituosa e pouco realista” (p. 169). Encontramos, nestas 42 páginas, uma análise sumamente lúcida, com dados abundantes, deste período crucial da história européia.

J. F. S. Saraiva segue com igual acerto, no capítulo seguinte, com a descrição da “agonia européia e a gestação de uma nova ordem internacional” no período 1939-47. Ambos ensaios contêm numerosos dados e reflexões pertinentes sobre estas décadas particularmente tensas e dolorosas da história européia e internacional. Também de Saraiva são os capítulos 6 e 7, cujos títulos, como os outros, resumem bem a temática: “Dois gigantes e um condomínio: da guerra fria à coexistência pacífica (1947-1968)” e “Détente,diversidade, intranquilidade e

ilusões igualitaristas (1969-1979)”.

O capítulo 8, o único do universitário e também diplomata Paulo Roberto de Almeida, trata de “Os anos 1980: da Guerra Fria ao fim da bipolaridade”, aqueles dez anos que, como sintetiza parafraseando o título de um livro famoso, “abalaram o mundo” ao acabar com a ordem bipolar do segundo pós-guerra e terminando assim de vez com o socialismo real eo “curto século XX” descrito por Hobsbawm.

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Há também uma menção específica sobre os processos de integração latino-americana no capítulo de Almeida: “Os processos de integração econômica sub-regional em curso – em primeiro lugar o Mercosul – contribuiram em muito para reforçar a estabilidade democrática no continente, para aumentar a interdependência recíproca de suas economias e para realçar a capacidade negociadora da América Latina no cenário mundial.” (p. 348). Ainda que isto pareça aplicar-se mais à década seguinte, os fundamentos estão, efetivamente, nos anos 80. Não se ocultam diplomaticamente, por outro lado, certos males notórios da região como “a alta taxa de desigualdade na distribuição da renda, os baixos níveis de educação formal e a carência generalizada de valores de cidadania.” (p. 347)

O nono e último capítulo, novamente a cargo de A. L. Cervo, dá uma excelente visão panorâmica sobre “o fim do século XX” e “as dificuldades para a construção de uma ordem global”. Insiste por exemplo, com muita razão, em um ponto central: “Elementos ou fatores globalizantes não diminuíram o papel do Estado-nação, como parecia no início dos anos 1990. Suas funções se modificaram, é bem verdade, mas ele permanece como sujeito fundamental do sistema internacional, readquirindo importância redobrada em razão da anarquia que perdura, do neomercantilismo e do neocolbertismo tecnológico, da criação de blocos regionais, em razão também do peso acrescido da cultura e da religião na política internacional em confronto com o peso tradicional da força militar.” (p. 360). No final do capítulo e do livro, afirma-se o seguinte: “Nenhuma unidade existe no Terceiro Mundo nos anos 1990” (p. 371). Talvez esta formulação seja algo excessiva, como nos vêm recordar oportunamente as crises não apenas financeiras da Ásia no final de 1997, poucas semanas depois da publicação do livro. Não é vontade de polêmica insistir nestas pequenas ausências e imprecisões de um trabalho de resto excelente e “utilíssimo”, como destaca justificadamente o embaixador Alberto da Costa e Silva na contracapa.

É difícil mencionar todos os elementos importantes que determinaram a história da humanidade desde 1815 e os autores se mostraram plenamente à altura do desafio. Ficam, inevitavelmente, alguns pontos sujeitos a controvérsia ou deixados de lado nestas quase 400 páginas cheias de informações sérias, dados importantes e reflexões em profundidade. Mas eles não tiram em absoluto seu mérito e deve-se felicitar os autores por deve-seu trabalho e recomendá-lo a um público amplo como também, evidentemente, aos especialistas do tema. É também um texto sumamente estimulante para os colegas argentinos, com vistas a aprofundar, como vêm fazendo há vários anos, a reflexão crítica e fundamentada sobre as raízes históricas e estruturais da ordem mundial emergente, que só pode ser entendida e analisada com base em tais trabalhos sérios e abordados, sem binóculos ideológicos, também a partir do Sul”.

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