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TERRITÓRIO E MEIO AMBIENTE *

WERTHER HOLZER"

ABSTRACT

A phenomenological discussion of the concepts of landscape and plece, and of territory and environment

The article discusses landscape and pface as spatial categories, refating them to those of territory and envi- ronment. The theoreticaf basis for

such a discussion is provided by phe- nomenology, a philosophical per- spective which has been high/y vaf- ued by humanistic geography.

o tema proposto neste texto é o da discussão sobre a paisagem e o lugar enquanto categorias espaciais, e de seu relacionamento com território e meio ambiente - ou o ambiente, como prefiro.

O aporte teórico-conceitual que será utilizado como base para essa discussão é o da fenomenologia. Esta proposta filosófica não é muito usual na geografia, e quem mais a tem discutido são os geógrafos humanistas.

Eles procuram uma concepção de mundo que seja diversa da cartesiana e positivista que tem dominado a ciência nos últimos séculos. Sua pretensão é de relacionar de uma maneira holística o homem e seu ambiente ou, mais genericamente o sujeito e o objeto, fazendo uma ciência fenomenológica que extraia das essências a sua matéria prima. É sob esta perspectiva que serão encaminhadas as reflexões contidas neste texto.

Antes de tudo cabe dizer que a fenomenologia e a geografia tem, em planos diferentes, objetivos convergentes: o de estudar a constituição do mundo .

. Outra versão deste texto foi apresentada na mesa redonda "Território e meio ambi- ente", do IV Encontro do Geociências da Universidade Federal Fluminense, em 5/11/

96 .

.. Professor do Departamento de Urbanismo da Universidade Federal Fluminense.

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Como a fenomenologia se propõe a efetuar este estudo? Ela procura levantar as experiências concretas do homem e encontrar nestas experiênci·

as uma orientação que não as limite a uma simples sucessão. Ela não se atém a estudar as experiências do conhecimento, ou da vida. tais como se apresentam na história. Sua tarefa é de: "analisar as vivências intencionais da consciência para perceber como aí se produz o sentido dos fenômenos, o sentido do fenômeno global que se chama mundo" (DARTIGUES. 1973, 30).

Análise que parte do princípio da intencionalidade, incluindo o mundo na consciência, caracterizando uma nova relação entre o sujeito e o objeto definida por sua correlação, que não se configura em um só objeto, mas no mundo inteiro, como ser-envolvido-no-mundo.

A intencional idade torna possível a redução fenomenológica, a "colo- cação entre parênteses" da realidade como é concebida pelo senso comum.

A redução fenomenológica nos remete às experiências e ao mundo originais, sem considerar as teorias que lhe foram acrescentadas pelas ciên- cias. Nos colocando duas questões: o da constituição do mundo, que interes- sa diretamente aos que estudam a geografia; e o da distinção entre ciência fenomenológica e ciência positivista.

A razão cartesiana baseia-se na dúvida metódica e atribui apenas às ciências naturais o que é racional, objetivo e científico. Ela sustenta que só os conceitos de quantidade são objetivos, daí a atribuição do que é racional à matemática e à física. Para a fenomenologia a razão objetiva se refere a existência humana. independentemente de que possa ser expressa em cate- gorias de quantidade.

A filosofia cartesiana, segundo a fenomenologia, provoca a matemati- zação da natureza, iniciada por Galileu, e a ruptura entre o mundo da ciência e o mundo da vida. O projeto da fenomenologia é de reaproximar as ciências de nossas vidas, ações e projetos, a partir das experiências ante-predicativas (anteriores aos conceitos e aos juízos), ou seja, relativas à percepção do mundo e de seus objetos enquanto fundamentos dos conceitos.

Deve-se aqui abrir um breve parêntese e distinguir a experiência do experimentalista (experiência sobre o fenômeno), da experiência do fenomenólogo (experiência do fenômeno). A primeira só tem sentido quando fundamentada na segunda. Assim, a ciência empírica tem como fundamento o que a fenomenologia denomina de ciências essenciais ou eidéticas.

Para chegar às essências a fenomenologia procede a variações imaginá- rias, que consistem em, no pensamento, fazer variar as características de um objeto ou realidade até que se obtenha o que é invariável - a possibilidade de designação deste fenômeno, ou seja, sua própria essência. As variações reais, por sua vez, derivam das experimentações, da pesquisa empírica e dedutiva.

Este processo de variações imaginárias. denominado redução eidética,

permite a distinção entre fatos e essências, onde o fato é colocado "entre

parênteses" deixando que apareça a idéia. o sentido. As essências são tan-

tas quantas forem as significações que possamos produzir. Seus veículos

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são a percepção, o pensamento, a memória e a imaginação, dando a estas significações um caráter universal, intersubjetivo e absoluto.

Este modo de apreensão é o mesmo das ciências cartesianas: elas também iniciam por estabelecer uma rede de essências, de significados pri- mitivos, que são confrontados com as experimentações. Há, pois, um relacio- namento, que não é de simples sucessão, entre o processo eidético e o pro- cesso experimental.

Neste contexto, a tarefa da fenomenologia é de estudar e classificar em "regiões" os diversos tipos de essência, ou seja, de proceder a uma ontologia regional. Ela foi definida por Husserl como:

"... idéia de que há muitas atitudes no sujeito intencional, irredutíveis umas às outras. A intencional idade científica, artísti- ca, política. técnica, ética e religiosa é sempre um 'relaciona- mento' original e irredutível. Isso implica também que o 'mundo' como correlato da intencionalidade não é construído monisticamente .... Os 'mundos' que decorrem de uma atitude científica, artística, política, ética ou religiosa do sujeito intencio- nal são esferas específicas do ser, 'regiões' nas quais os objetos concordam entre si por um específico ser-assim"(LUIJPEN, 1973, 178).

Para Husserl essa meta seria atingida quando a individualidade fosse ultrapassada e se chegasse ao caráter plenamente objetivo deste "mundo", o que é conseguido quando se compreende a sua constituição para uma plura- lidade de sujeitos - sua constituição intersubjetiva. A intersubjetividade acon- tece no momento em que o corpo, como elemento móvel, coloca-se em con- tato com o exterior e localiza o outro, comunicando-se com outros homens e conhecendo outras situações.

Vistas estas definições, fundamentais para a compreensão deste tex- to, vou me deter na geografia enquanto ciência das essências, e em concei- tos que podem constituir a sua região, como os de paisagem e lugar, território e ambiente.

Notem que nos parágrafos acima, sem falar especificamente da geo- grafia, utilizei diversas palavras que tem como essência significados es- paciais ou, como prefiro, geográficos, tais como: mundo. região e situa- ção. Estes termos foram utilizados por filósofos e outros cientistas sociais, e por si mesmos demonstram como a geografia é uma ciência essencial ou eidética.

Um problema que se coloca quando nos direcionamos para a

fenomenologia é que não podemos nos restringir às denominações positivistas

para as diversas ciências. A classificação cartesiana baseia-se em quantida-

des e métodos empíricos de mensuração. A ciência das essências se refere à

existência humana e a nossa experiência do mundo.

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Há, ainda, a divisão entre essências exatas, que se relacionam indire- tamente com a vivência, produzindo construções; e essências morfológicas, que exprimem nossa vivência e têm por base a sua descrição. As primeiras se referem à lógica dedutiva e à lógica das significações (gramatical); as outras se referem ao percebido, ao imaginário, à consciência, à essência dos objetos materiais, culturais, sociais, etc.

Deste modo, no plano das essências exatas, posso concordar com o filósofo quando afirma que "todo objeto natural tem por essência ser espacial, e a geometria é a eidética do espaço" (GILES, 1975, 154). Mas, no plano das essências morfológicas, estudadas pela ontologia regional, a eidética do es- paço é a geografia, e a sua essência pode ser definida pelo que DARDEL (1990) chamou de geographicité (que pode ser traduzido por geograficidade).

A geograficidade não se refere ao espaço como constructo, ela se refe- re ao espaço geográfico que, como observa Dardel, "tem um horizonte, um modelado, cor, densidade .... Ele é sólido, líquido ou aéreo, largo ou estreito:

ele limita e ele resiste" (DARDEL, 1990, 2). A geograficidade, enquanto es- sência, define a relação do ser-no-mundo, e não do ser-no-espaço. Isto é fácil de compreender a partir da consulta a qualquer dicionário, onde o espaço é definido como: "distância entre dois pontos, ou área ou volume entre limites determinados; ou, lugar ... cuja área pode conter alguma coisa; ou, extensão indefinida; ou, o próprio Universo".

A palavra "mundo" é fundamental para que se compreenda a relação entre a ciência geográfica essencial, ou fenomenológica, e a sua essência, que pode ser denominada geograficidade. Vejamos uma das definições para mundo:

"... a percepção é sempre percepção da coisa total, compreendi- da num campo mais amplo, o qual por sua vez, é abrangido em um horizonte de significados mais distantes. O conjunto desse complicado sistema de sempre mutáveis significados 'próximos' e 'longínquos' ligados aos sempre mutáveis momentos de atua- lidade e potencialidade da percepção, eis o que se chama 'mun- do' na fenomenologia." (LUIJPEN, 1973, 106).

A partir desta definição podemos nos deter em um dos conceitos que estão em discussão neste texto: o de meio ambiente ou, como prefiro, de ambiente. O ambiente, como muito bem coloca Rapoport, pode ser definido como "qualquer condição ou influência situada fora do organismo, grupo ou sistema que se estuda" (RAPOPORT, 1978, 25). Tuan o define como: "As condições sob as quais qualquer pessoa ou coisa vive ou se desenvolve; a soma total de influências que modificam ou determinam o desenvolvimento da vida ou do caráter" (TUAN, 1965, 6).

O próprio Tuan, no entanto, nos lembra que a palavra "environment"

origina-se do francês "environnement" , onde tinha o significado do "ato de

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circunscrever" ou "daquilo que nos rodeia" - seria a paisagem? A palavra podia também equivaler a "monde ambiance"

r

como era utilizada por St- Hilaire e pelo" Oictionnaire de I'Académie Française", de 1884.

Podemos ver que o termo "ambiente", em sua origem, tinha um sentido bem mais amplo. Possuía uma relação dialética com a palavra "mundo"

r

assim como com o termo "paisagem". Sua apropriação pelas ciências cartesianas e positivistas lhe impôs uma restrição: impediu-se que ele abar- casse ao mesmo tempo o sujeito e o objeto.

O termo ambiente, para a geografia escrita em português, ficou com o sentido de "suporte físico imediato" ou de "sistema de objetos que percebe- mos de imediato a nossa volta". Os que se utilizam da língua portuguesa parecem ter sido os únicos a se dar conta de quão restrito pode ser o termo

"ambiente". Associaram-no então à palavra "meio" , provavelmente via lín- gua francesa, que há muito utiliza-se do termo "milieux" , ainda que também com a conotação de suporte físico.

Chatelin nos ensina que:

"Meios e paisagens são formados desses objetos que todo mun- do pode ver, que alguns estudam, e que todos utilizam de diver- sas maneiras: as árvores e as terras, as rochas e as colinas ...

Pensar os meios e as paisagens, é empreender a reunificação ou de colocar todas as atitudes que se pode adotar, em face destes objetos. para perceber, compreender. sentir e se expri- mir" (CHATELlN. 1986, 1).

A palavra "meio ambiente" amplia a escala: o "meio" é mais amplo do que o "ambiente". Mas, continua a se considerar apenas o suporte físico e os objetos, ou traços. que o identificam. Ao homem é reservado o papel de mero espectador: o que percebe. compreende. sente.

Esta expressão "meio ambiente", assim como a de meio, a de ambien- te, e as mais "sofisticadamente científicas", como ecossistema e geossistema.

foi tomada de empréstimo pela geografia de outras ciências, notadamente da biologia. que tem o homem como um entre os milhões de seres vivos que são seu objeto de estudo.

A geografia tem um termo que me parece muito mais rico e apropriado para o seu campo de estudo. Esta palavra incorpora ao suporte físico os traços que o trabalho humano. que o homem como agente. e não como mero especta- dor. imprime aos sítios onde vive. Mais do que isso, ela denota o potencial que um determinado suporte físico. a partir de suas características naturais, pode ter para o homem que se propõe a explora-lo com as técnicas de que dispõe. Este é um dos conceitos essenciais da geografia: o conceito de "paisagem".

A paisagem, assim como o lugar e a região, é um desses termos que

permitem à geografia colocar-se como uma das ciências das essências nos

moldes propostos pela fenomenologia. Ela nos remete para o "mundo" que,

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como coloca TUAN (1965), é um campo que se estrutura na relação do eu com o outro, o reino onde ocorre a nossa história, onde encontramos as coi- sas, os outros e a nós mesmos.

Neste campo de relações o corpo representa a transição do "eu" para o mundo, ele está do lado do sujeito e, ao mesmo tempo, envolvido no mundo.

O corpo constitui

O

ponto de vista do ser-no-mundo. Desta relação fundamen- tai, que é com certeza, geográfica, devem brotar os conceitos essenciais a serem utilizados pelos geógrafos. Vejamos como o território pode vir a ser um deles.

O "território" tornou-se um conceito científico a partir da etologia. Um ornitólogo estabeleceu a primeira definição de territorialidade: "a conduta ca- racterística adotada por um organismo para tomar posse de um território e o defender contra os membros da própria espécie" (HOWARD, 1920; citado por BONNEMAISON, 1981,253).

SACK (1983) afirma que a definição mais comum para territorialidade é mesmo a de defesa de uma área. Defender uma área, nos diz ele, apresenta- se como sendo uma meta em si mesma ou um meio para exercer controle específico sobre algum aspecto da ação humana.

O próprio Sack não aceita esta definição, achando-a demasiado simplista. Para ele, a territorialidade baseia-se no princípio da ação pelo contato e todas as relações territoriais devem ser definidas no contexto social de um acesso diferenciado às coisas e às pessoas. A territorialida- de é "a tentativa de um indivíduo ou grupo (x) de influenciar, afetar ou controlar objetos, pessoas e relacionamentos (y) pela delimitação e pela afirmação de seu controle sobre uma área geográfica. Esta área é o terri- tório" (SACK, 1983: 56).

Esta definição nos coloca vários problemas ao ser analisada segundo os parâmetros da fenomenologia. Primeiramente porque, apesar de afastar- se da definição oriunda da etologia (adequada, talvez, aos animais, mas nun- ca aos seres humanos), ela se refere ao que RAPOPORT (1978) denomina de "ambiente percebido", que relaciona-se com as noções de "ambiente do comportamento" (enunciado por Tolman em 1948); "espaço vital" (como foi proposto por Lewin em 1951); ou de "Umwelt" (como sugeria Von Uexküll em 1959). Este "ambiente percebido" , como na definição de Sack, constitui-se a partir do espaço de ação das pessoas, restringindo o território as áreas que são objeto de sua atuação direta.

Outra questão é que, centrando sua definição nas relações de poder e

no acesso diferenciado às coisas e às pessoas, praticamente se exclui a

possibilidade de grupos com organização estruturada em outras bases pos-

suírem uma territorialidade ou um território. O próprio Sack admite que exis-

tem ações não-territoriais que se relacionam dialeticamente com as territoriais,

mas não as define. Coloca-se, então, o problema de se, por exemplo, os

povos tradicionais ou os povos nômades possuem territorialidade ou território

a partir desta definição.

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Temos outro problema: o de que tanto os etólogos quanto Sack defi- nem com facilidade apenas a territorialidade enquanto um processo social, mas a relacionam apenas vagamente com uma "área geográfica", denomina- da "território" , onde este processo se desenrola.

Uma ciência que tem como essência a geograficidade não pode tomar as definições dadas acima para território e para territorialidade como fenomenologi- camente geográficas. Elas podem ser tratadas, no máximo, como uma interface com outras "regiões" afins de um mesmo campo essencial morfológico.

Existem, no entanto, outras possibilidades de definição do território que são essencialmente geográficas. O primeiro passo, nos aponta Bonnemaison, é nos afastarmos da definição que a etologia deu para o território: qual seja, a de associá-lo a uma apropriação biológica de uma área que se torna exclu- siva de determinados membros de uma espécie, a partir da delimitação de uma fronteira. Para ele, "as sociedades humanas têm uma concepção dife- rente do território. Ele não é forçosamente fechado, ele não é sempre um tecido espacial unido, ele não induz somente a um comportamento necessa- riamente estável" (BONNEMAISON, 1981, 253).

O segundo passo, como nos aponta Lacasse (1996), é de relativisarmos as concepções de território, aceitando que elas possam acontecer em grupos sem governo constituído ou que não tenham políticas territoriais definidas.

Lacasse, ao estudar os Innus (esquimós), observou que eles não conhecem a apropriação privada e não possuem em seu vocabulário termos como pro- priedade, posse ou direito de propriedade. Para os Innus, o território é a vida.

Sua noção de território deriva da ordem costumeira, "que faz referência aos laços afetivos que eles mantêm com a terra. E, nesta ordem, a terra é o lugar de sua cultura" (LACASSE, 1996, 189).

O território, para os Innus, é objeto de gestão, do qual eles são os guardiões. Esta concepção de território tem como base o "lugar" , este sim um conceito essencial para a formulação de um "mundo" pessoal ou intersubjetivo, e que portanto interessa aos que se propõem a fazer uma geografia fenomenológica.

Voltemos a Bonnemaison. Ele observa que:

"... um território, antes de ser uma fronteira, é um conjunto de lugares hierárquicos, conectados por uma rede de itinerários ...

No interior deste espaço-território os grupos e as etnias vivem uma certa ligação entre o enraizamento e as viagens .... A terri- torialidade se situa na junção destas duas atitudes: ela engloba ao mesmo tempo o que é fixação e o que é mobilidade ou, falan- do de outra forma, os itinerários e os lugares" (BONNEMAISON, 1981,253-254).

O autor vai mais longe, observando que a territorialidade é melhor com-

preendida através das relações sociais e culturais que o grupo mantém com

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esta trama de lugares e itinerários que constituem o seu território, onde os conceitos de apropriação biológica e o de fronteira têm validade, no mínimo, limitada.

Para muitas culturas o território pode ser visto como um "arquipélago":

"uma coleção de lugares denominados e apropriados geograficamente, dispersos e assentados em espaços de contornos indistintos, que são limita- dos não por linhas, mas por alguns pontos notáveis: rochedos, árvores, des- níveis, etc." (BONNEMAISON, 1981,254).

Outro ponto levantado pelo autor é o da importância em se distinguir as relações culturais das relações sociais. Ele nos diz: "O espaço social é produ- to, o espaço cultural é estímulo. O primeiro é concebido em termos de organi- zação e de produção, o segundo em termos de significação e de relação simbólica. Um emoldura, o outro é o portador do sentido" (BONNEMAISON, 1981,255).

Concordamos com o autor de que a territorialidade não pode ser redu- zida ao estudo do sistema territorial, ela é a expressão dos comportamentos vividos, ou se preferirmos, da constituição dos mundo pessoal e intersubjetivo, englobando a relação do território com o desconhecido - o espaço estrangeiro.

Conclui-se que, tomando-se os lugares como constituintes essenciais do território, e procedendo-se à investigação dos modos intersubjetivos des- sa constituição, estaremos nos proporcionando a tarefa de fazermos uma geografia voltada para a sua essência, a do estudo do espaço geográfico. No caso do território caberia à geografia, juntamente com outras ciências, deline- ar suas diferenças, a diversidade de suas identidades culturais. Se despre- zarmos esta tarefa essencial da geografia, que é de delinear a constituição integral do "mundo", reduziremos nossa disciplina, no caso do estudo territó- rio, a um mero ramo da etologia.

Estaremos então, destinados, enquanto tributários da ciência cartesiana, aos limites que o espaço impõe ao estudo das nações, dos esta- dos, ou da ordenação mundial de fronteiras sejam elas econômicas, tecnológicas ou políticas.

Estaremos conceitualmente desarmados para uma análise das alter- nativas à um planeta uniformizado economicamente e culturalmente, ou seja, onde atitudes de aproximação com o mundo e com os outros são todas pla- nejadas por quem detém a informação e o poder.

Estaremos, enquanto estudiosos da geografia, sem argumentos para

contrapor àqueles que vêem o território como uma correlação entre pode-

res determinada tão somente por algum sistema econômico, e com isso

não saberemos educar os que nos sucederão para que respeitem aqueles

que compreendem que o território deve ser gerido como um todo

intersubjetivo, considerando toda a vida que há na Terra, considerando-a

como um mundo.

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Bibliografia

BONNEMAISON, Joel (1981): "Voyage Autour du Territoire". In: l'Espace géographique, 10 (4): 249-262.

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DARDEL, Eric (1990): I'Homme et la Terre - nature de la réalité géographique. Paris, Ed. CTHS, 199 p. (P ed. Paris, PUF, 1952).

DARTIGUES, André (1973): O que é a Fenomenologia. Rio de Janeiro, Eldorado, 163 p.

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TUAN, Yi-Fu. (1965). "Environment and World". In: ProtessionalGeographer, 17 (5):

6-7.

Referências

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