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O bambu: potencialidades técnicas e sociais e a política de incentivo ao manejo sustentado

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Academic year: 2021

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O BAMBU: POTENCIALIDADES TÉCNICAS E SOCIAIS E A POLÍTICA DE INCENTIVO AO MANEJO SUSTENTADO

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO, CIÊNCIAS CONTÁBEIS E TURISMO PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO

Orientador:

Prof. Dr. Claudio Roberto Marques Gurgel

Niterói – RJ 2014

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RICARDO DE SOUZA MARTINS DA COSTA

O BAMBU: POTENCIALIDADES TÉCNICAS E SOCIAIS E A POLÍTICA DE INCENTIVO AO MANEJO SUSTENTADO

Dissertação submetida à banca examinadora, área de concentração Estudos das Organizações no

Brasil e linha de pesquisa Estado, Organizações e Sociedade, com vistas ao cumprimento das

exigências para obtenção do título de Mestre em Administração, em observância ao disposto do Regimento do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal Fluminense.

Elaborado sob a orientação do Prof. Dr. Cláudio Roberto Marques Gurgel

NITERÓI – RJ 2014

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C837 Costa, Ricardo de Souza Martins da

O Bambu: Potencialidades Técnicas e Sociais e a Política de Incentivo ao Manejo Sustentado / Ricardo de Souza Martins da Costa – Niterói: UFF, 2014. 142p.

Dissertação ( Mestrado Acadêmico em Administração )

Orientador: Cláudio Roberto Marques Gurgel , D.Sc.

1. Bambu 2. Política Pública

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RESUMO

O Bambu é um material extremamente versátil, podendo ser utilizado para diversos fins. Procuraremos demonstrar as potencialidades dessa planta como vetor de desenvolvimento social, apontando as possibilidades de sua apropriação pela parcela da população de maior fragilidade econômica e/ou excluída do processo produtivo. O ciclo produtivo do Bambu emprega mão de obra de baixa qualificação e se desdobra em diversas atividades, desde as mais elementares no ambiente rural até trabalhos artesanais e industriais com design sofisticado, capaz de atender clientela exigente do ambiente urbano. A partir desta exposição básica, investigamos a política pública formalizada em Lei e procuramos respostas para a sua não implementação. Para isto, recorremos à pesquisa bibliográfica, documental e de campo. Nossa conclusão é de que aspectos culturais, políticos e econômicos se combinaram para até o momento fazer da política pública do bambu uma proposta que dorme entre papéis.

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ABSTRACT

Bamboo is an extremely versatile material that can be used for various purposes. We will try to demonstrate the potential of this plant as a vector of social development, pointing out the possibilities of its appropriation by the share of the population with the greatest economic and / or deleted fragility of the production process. The production cycle of Bamboo employs labor unskilled and unfolds in various activities. From the most elementary to the rural and artisanal environment as well as industrial jobs with sophisticated design, able to meet demanding clientele of the urban environment. From this basic exposition, we will investigate the policy formalized in law and seek answers for their non-implementation. For this, we turn to literature, documentary and field research. Our conclusion is that cultural, political and economic factors have combined to make the bamboo policy a proposal that sleeps between roles.

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AGRADECIMENTOS

Trilhar o caminho da realização do sonho de participação em Curso de Mestrado é tarefa que aparentemente se realiza sozinho, porém, a mais simples reflexão acerca do trajeto percorrido, quando próximo de sua conclusão, nos apresenta os inumeráveis auxílios que recebemos, alguns deles quase imperceptíveis, mas que, paradoxalmente, podem se revelar dos mais importantes, seja em uma palavra de incentivo em momento de dúvida, um abraço, uma orientação, um “chega prá lá” ou um “deixe de bobagens” bem dados e nas horas adequadas.

Portanto, agradecer a quem?

Ocorre-me agradecer àqueles que, direta ou indiretamente, me auxiliaram nesse trajeto, mas seria pouco.

No âmbito familiar, à minha esposa e filhos que com certeza foram influenciados por momentos em que vivenciei estresses e nervosismos;

Aos colegas de trabalho pelo apoio e compreensão;

Aos estudantes do PPGAd, da minha turma, da anterior à minha e das posteriores com quem tive o prazer de interagir e dialogar;

Aos professores do PPGAd, que me apresentaram ementa enriquecedora que me fez perceber a importância da valorização de nossa cultura, ainda em formação porém repleta de expressões acadêmicas endógenas relevantes, sem desprezo às contribuições de autores clássicos e contemporâneos exógenos;

Aos “amigos” que estudam e/ou trabalham no Universo do Bambu e que se dispuseram a me dedicar suas impressões e experiências que possibilitaram a elaboração do texto;

Deparo-me com dificuldade em escolher as palavras adequadas para agradecer ao prof. Cláudio Roberto Marques Gurgel, que me orientou na realização deste trabalho e que, com sua calma impressionante e com poucas palavras, direcionava-me na linha a seguir quando minha sensação era a de estar completamente “fora do eixo”.

Em especial, agradeço ao Devas do Bambu, que me capturou em minha trajetória de Vida e me induziu ao início dos estudos de suas inumeráveis potencialidades.

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SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ... 9 2. METODOLOGIA... 13 3. REFERENCIAL TEÓRICO ... 13 3.1OBAMBU ... 16 3.2AS POTENCIALIDADES DO BAMBU ... 19

3.3EXPERIÊNCIAS COM O USO DO BAMBU ... 26

3.4ASPECTOS A SEREM OBSERVADOS ... 35

3.5ABAMBUZEIRA CRUZEIRO DO SUL –BAMCRUS: UMA EXPERIÊNCIA ... 36

3.6AS AÇÕES DO GOVERNO BRASILEIRO ... 39

3.6.1 O Memorando de Entendimento Brasil / China ... 39

3.6.2 A Lei 12.484/2011 – A “Lei do Bambu” ... 40

4. ENTREVISTAS ... 43

4.1ENTREVISTA COM LÚCIO VENTANIA ... 45

4.2ENTREVISTA COM O PROF.JOSÉ LUIZ MENDES RIPPER –PUC–RIO,18/02/2014 ... 51

4.3 ENTREVISTA COM JORGE LUÍS GOMES DE PINHO –SEBRAE -TRÊS RIOS -RJ ... 58

4.4ENTREVISTA COM MARCUS DE ARAÚJO SANTA RITA –LUMIAR –NOVA FRIBURGO –RJ ... 66

4.5QUESTIONÁRIOS RESPONDIDOS POR CORRESPONDÊNCIA ELETRÔNICA ... 71

4.5.1 Entrevista de Lucas Alves Ripper ... 71

4.5.2 Entrevista de Paulo Cesar Casate ... 75

4.5.3 Sérgio Alberto de Oliveira Almeida ... 78

4.6CONSIDERAÇÕES SOBRE AS ENTREVISTAS ... 82

5. CONCLUSÃO... 84

6. REFERÊNCIAS ... 89

7. ANEXOS ... 91

7.1MEMORANDO DE ENTENDIMENTO BRASIL –CHINA ... 91

7.2A LEI DO BAMBU ... 95

7.2.1 A Tramitação da Lei na Câmara dos Deputados ... 97

7.2.2 O Recebimento do Projeto de Lei no Senado, com justificativa ... 102

7.2.3 A Tramitação da Lei no Senado ... 107

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LISTA DE FIGURAS

Figuras Páginas

Figura 1 – Distribuição natural do Bambu no mundo 15

Figura 2 – As partes do Bambu 15

Figura 3 – Broto de Bambu na touceira 17

Figura 4 – Controle de erosão – Planta Viva 18

Figura 5 – Galpão para estábulo 18

Figura 6 – Andaime 19

Figura 7 – Casa de Bambu 19

Figura 8 – Cama de Bambu natural 20

Figura 9 – Cama de Bambu laminado colado – BLC 20

Figura 10 – Broto de Bambu sem as brácteas 21

Figura 11 – Processamento dos Brotos de bambu para alimentação 21

Figura 12 – Brotos de Bambu enlatados 22

Figura 13 – Broto de Bambu embalado à vácuo 22

Figura 14 – Abajur de Bambu 23

Figura 15 – Talheres de Bambu 23

Figuras16 e 17 – Porta papel higiênico e Saboneteira 24

Figuras18 a 20 – Painéis de Bambu revestidos de argamassa - processo 29

Figura 21 – Esquema de Conglomerado Industrial 31

Figura 22 – Garrafas “pet” coletadas no lixo 31

Figuras23 e 24 – Revestindo os Bambus com “pet 32

Figuras 25 e 26 – Tanque rede sendo posicionado 33

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ODE AO BAMBU

“Um homem pode acomodar-se em uma casa de bambu sob um teto de bambu, em uma cadeira de bambu a uma mesa de bambu, com um chapéu de bambu em sua cabeça e sandálias de bambu em seus pés. Ele pode, ao mesmo tempo, ter em uma das mãos uma tigela de bambu, na outra mão pauzinhos de bambu, e comer brotos de bambu. Quando ele terminar sua refeição, que foi cozida em fogo de bambu, a mesa pode ser lavada com um tecido de bambu, e ele pode abanar-se a si próprio com um leque de bambu, tirar uma sesta em uma cama de bambu, deitado sobre uma esteira de bambu, com sua cabeça repousando sobre um travesseiro de bambu. Seu filho pode repousar num berço de bambu, brincando com um brinquedo de bambu. Ao levantar-se ele fumaria um cachimbo de bambu, ou transportaria suas coisas numa cesta de bambu suspensa por uma vara de bambu, com um guarda-chuva de bambu sobre sua cabeça. Ele pode então fazer uma caminhada sobre uma ponte suspensa de bambu, beber água de uma concha de bambu, e coçar-se com uma raspadeira de bambu.” (PEREIRA E BERALDO – 2007)

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1. INTRODUÇÃO

A baixa qualificação da mão-de-obra no Brasil é fato confirmado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, que divulgou em 2007 resultado de pesquisa nacional que concluiu, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – Caged, que apenas 18,3% dos desempregados no Brasil têm qualificação profissional, conforme divulgado no jornal Estado de São Paulo em 08/11/2007 – Economia e Negócios.(SOBRAL; GRANER; NAKAGAMA, 2007)

Borgossian (2013) afirma que:

A falta de mão de obra qualificada é o maior empecilho para o aumento da qualidade e da produtividade da construção no país. É o que diz pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com 424 empresas do setor, segundo 74% das consultadas. Essa deficiência de qualificação, de acordo com 94% dos ouvidos, se dá na falta de trabalhadores básicos, como serventes e pedreiros. A falta de qualificação profissional não atinge apenas a construção. A deficiência de trabalhadores de nível básico é sentida em todos os setores. Faxineiras, vendedores de loja, garçons, pedreiros, pintores, jardineiros, mecânicos, lanterneiros, recepcionistas, atendentes, até eletricistas, todos improvisam, aprendendo uns com os outros, sem acesso a uma formação técnica.

O colunista do jornal Estado de São Paulo Jamil Chade divulgou em seu Blog na Internet em 21 de janeiro de 2013, baseado em dados da Organização Internacional do Trabalho acerca do mercado brasileiro (http://blogs.estadao.com.br/jamil-chade/2013/01/21/brasil-tera-aumento-de-500-mil-desempregados-ate-2014/), informações que trazem projeção de aumento no número de desempregados no Brasil até 2014, atingindo 7,08 milhões de desempregados.

ANO NÚMERO ABSOLUTO PERCENTUAL 2012 6.58 milhões de desempregados 6.3%

2013 6,89 milhões de desempregados 6.5% 2014 7,08 milhões de desempregados 6,6%

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Os dados preocupam e demandam ações de Estado que levem em consideração a baixa qualificação da população e que possam envolver esse contingente de pessoas excluídas do mercado de trabalho.

Percebe-se que a situação apresentada perdura durante o tempo decorrido entre a divulgação dos dados de 2007 e os de 2013.

Em 12 de agosto de 2013 a “Agência Estado” publicou em seu site na Internet

(http://economia.estadao.com.br/noticias/economia-geral,maioria-dos-municipios-nao-elaborou-plano-contra-a-pobreza,161699,0.htm), resultado de pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Municípios – CNM em amostra aleatória de 173 municípios brasileiros de todas as regiões e portes populacionais, ao longo dos dois meses anteriores.

Pela análise do teor da matéria percebe-se o distanciamento entre o que diz o Ministério do Desenvolvimento Social e o que avalia a Confederação Nacional de Municípios (CNM). Enquanto o Ministério enaltece a ação do Governo, salientando “que, graças às parcerias com as prefeituras, o Brasil sem Miséria está cumprindo todas as suas metas”, o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski diz que: “Na área social, você não faz nada sem as prefeituras. A União só assume a propaganda, mas não há orientação nem recursos efetivos do governo federal para os planos.”.

O positivo é que ambos reconhecem a importância da atuação dos Municípios no combate à extrema pobreza no Brasil, que vem sendo efetuado por ações do Programa “Brasil sem Miséria”.

O século XXI iniciou com um marco histórico para a humanidade. Pela primeira vez a população urbana, em âmbito mundial, superou a população rural. Segundo o diretor do escritório regional do UN-Habitat para América Latina e Caribe, Jorge Gavidia - 2007:

O mundo já passou nesse momento a marca de 50% de pessoas que moram na cidade. Na América Latina, 75% das pessoas moram em cidades. Os problemas gerados são a falta de planejamento dessas cidades, que se refletem em uma demanda não satisfeita por serviços básicos: água, esgotos e lixo. No caso da América Latina, agora o problema central é a regularização das propriedades e o serviço de estrutura das nossas cidades.

Esse fato apresenta uma questão fundamental: se é no campo que se produzem os alimentos necessários para a manutenção da vida humana, quem os produzirá para atender à

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demanda cada vez maior? Os avanços tecnológicos introduzidos na produção rural suprem a diminuição da utilização da mão de obra humana?

O bambu, por sua versatilidade e facilidade de manuseio e por sua cultura ser intensiva em mão-de-obra de baixa qualificação, vem despertando o interesse de diversos setores produtivos como sendo capaz de ser parte da solução dos problemas apontados, em especial o da ociosidade da população economicamente ativa no Brasil, haja vista que seu ciclo produtivo é capaz de absorver contingente elevado de trabalhadores com baixa qualificação profissional, propiciando a implantação de programas multidisciplinares que tenham por objetivo a geração de trabalho e renda, principalmente em municípios afastados dos grandes centros urbano-industriais.

A conjugação da cultura do bambu a atividades relacionadas à produção de alimentos e técnicas de utilização de materiais alternativos de construção de moradias e fabricação de utensílios pode representar um grande passo no sentido da redução das desigualdades existentes em nossa sociedade, configurando-se como vetor de desenvolvimento social.

O Estado Brasileiro reconheceu a importância do Bambu ao instituir a Política Nacional de Incentivo ao Manejo Sustentado e ao Cultivo do Bambu – PNMCB (Lei 12.484/2011 – ver anexo 7.2), porém sua implementação até o momento se revela ineficaz.

A elaboração dessa lei foi fruto de mobilização de acadêmicos e ambientalistas que ao longo de vários anos realizam estudos acerca do bambu, evidenciando suas potencialidades. Porém, a despeito dos esforços empreendidos, a aplicabilidade das diretrizes e dos instrumentos expressos em seu texto ainda hoje estão aquém das expectativas.

Investigar os motivos que causam esta incongruência é o objetivo a ser identificado: por que razão, após vários anos de pesquisas e aplicações práticas do bambu, evidenciando-se suas potencialidades de utilização em inumeráveis atividades, com diversos trabalhos acadêmicos e práticos realizados em Universidades Públicas (UFAL, UFF, Unicamp) e Privadas (PUC-RJ), como exemplos não exaustivos, apontando sua praticidade e economicidade nos mais variados usos, após ser publicada uma Lei instituindo uma Política com abrangência significativa, prevendo linhas de crédito, assistência técnica do cultivo à comercialização, além de outros incentivos, ainda hoje, cerca de dois anos e meio após ser publicada, mesmo aqueles que já trabalham com o bambu desconhecem a existência dessa Lei ou, os que conhecem, não conseguem usufruir seus benefícios?

Em primeira tentativa de testar se haveria facilidade em conseguir crédito para iniciar algum empreendimento sob a força dessa Lei, foi realizada consulta informal a uma gerente do Banco do Brasil, em Niterói - RJ. A primeira resposta foi a de que desconhecia a lei; após

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receber uma cópia disse que somente poderia conceder crédito para quem fosse proprietário rural; após conhecer os demais instrumentos e verificar que a abrangência é mais extensa, ficou sem saber o que dizer.

O artesão Marcus Santa Rita, idealizador e empreendedor de projeto sócio-ambiental com o uso do bambu, em Lumiar – Nova Friburgo – RJ, que há 12 anos se dedica a essa atividade, declarou que nem nos órgãos oficiais de fomento conseguiu se valer da lei para receber financiamento; o Artesão Bambuzeiro Lúcio Ventania declarou que o advento da Lei em nada alterou as condições de seu trabalho; o Arquiteto Urbanista Edoardo de Aranha disse que o advento da Lei serviu apenas para que houvesse incentivo maior às pesquisas que realiza e que nos aspectos práticos ainda se aguardam ações positivas.

Em suma, muito se lutou para a aprovação da lei, porém, na prática houve frustração generalizada entre os que se dedicam ao uso e à tentativa de popularização da utilização do Bambu no Brasil.

Os motivos vão além do preconceito em relação ao Bambu apontado pelos professores Khosrow Ghavami, da PUC-RJ e Marco Antonio Pimentel de Mello, da UFF.

Edoardo de Aranha, em curso que ministra acerca das aplicabilidades do Bambu, expõe que no passado se pensou em utilizar o bambu no processo de fabricação de celulose, mas houve interesse de industriais Ingleses em vender suas máquinas que produziam celulose usando o eucalipto como matéria prima, preterindo-se assim a proposta inicial.

Supomos que possa haver boicote à popularização do uso do Bambu no Brasil, motivado por interesses de produtores das matérias primas que podem ser substituídas por essa planta, em suas diversas aplicações.

O aspecto a que creditamos maior importância à popularização do uso do Bambu no Brasil está relacionado à capacidade de absorção de mão de obra de baixa qualificação em todo o seu ciclo produtivo, desde a produção de mudas até a fabricação dos inúmeros utensílios possíveis de serem criados. As possibilidades de conjugação com outras atividades produtivas, seja no ambiente rural ou no urbano, potencializa a relevância da busca pela efetivação das potencialidades da utilização do Bambu como vetor de desenvolvimento social. Acreditamos que com a investigação e identificação dos motivos que entravam a aplicabilidade da Política traçada pela Lei 12.484/2011, a chamada “Lei do Bambu”, poderemos traçar adequadamente estratégias que possibilitem a reversão desses entraves.

Em contato preliminar com alguns dos atores que lidam com o Bambu há tempo considerável, já citados, identificamos que existe uma lacuna a ser preenchida que possibilite

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resposta à indagação acerca dos motivos que fazem com que a Lei do Bambu ainda não haja produzido os efeitos idealizados pelos legisladores.

A intenção é a de complementar as informações fornecidas pelos atores já citados, por intermédio de entrevistas planejadas, além de obter informações de outros elementos que trabalham com o Bambu, alguns já identificados e descritos a seguir, que atuam no ambiente acadêmico ou no processo produtivo, com objetivo de conhecer suas percepções acerca do tema sob investigação.

2. METODOLOGIA

Considerando o critério de classificação proposto por Vergara (2013), conjugaremos meios de investigação, procedendo à Pesquisa Bibliográfica e Pesquisa de Campo, para a qual utilizaremos entrevistas realizadas por intermédio de questionário semiestruturado, possibilitando ao entrevistado discorrer livremente acerca de suas percepções acerca do tema.

A realização das entrevistas foi precedida de um teste. Após essa primeira entrevista-teste, constatou-se a necessidade de reestruturação das perguntas, visando à melhor compreensão do fenômeno em investigação.

A pesquisa bibliográfica, realizada em livros, artigos e publicações na Internet, além de trazer visões de personagens diretamente envolvidos com o “mundo do Bambu”, procura interligar aspectos sociais apontados por autores aparentemente sem ligação com esse mundo, mas que sinalizam condutas de emancipação social as quais procuraremos demonstrar sua pertinência em relação ao tema.

Documentos também foram examinados, desde a própria Lei até memorandos diplomáticos e pareceres parlamentares.

3. REFERENCIAL TEÓRICO

A busca de referências teóricas que enriquecessem as argumentações defendidas neste trabalho encontraram citações em autores que, apesar de aparentemente sem interligação, complementam-se para enriquecer a relevância e pertinência do estudo.

Segundo Ignacy Sachs (2008), os países tropicais devem aprender a lidar com sua vantagem comparativa em relação a outros países, considerada a sua posição geográfica, valorizando suas condições favoráveis para exploração sustentável de seus recursos naturais e baseando suas atividades no paradigma do “Biocubo”: Biomassa, Biodiversidade e Biotecnologia.

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Para que isso possa ocorrer, ainda segundo Sachs, é necessário capacitar adequadamente pequenos fazendeiros no sentido de criar métodos endógenos de exploração dos recursos à sua disposição, fugindo do estigma apresentado por Sérgio Buarque de Holanda (HOLANDA 1995, p. 31), de que:

A tentativa de implantação da cultura européia em extenso território, dotado de condições naturais, se não adversas, largamente estranhas à sua tradição milenar, é, nas origens da sociedade brasileira, o fato dominante e mais rico em conseqüências.

A necessidade de mudança desse paradigma toma relevância quando se discute as formas de exploração das áreas de florestas da Região Amazônica Brasileira, que até o momento seguem os modelos utilizados na exploração da Mata Atlântica, que se mostraram deletérios, trazendo inúmeros malefícios ao solo e aos rios da região (DEAN, 2010).

A necessidade de capacitação de professores que possam difundir novas formas de ensino, adequadas à realidade sócio-cultural de nossa população e com respeito às diferenças regionais é tema de trabalho recente de um grupo de professores no Estado do Pará (XIMENES-ROCHA; COLLARES, 2912), no qual é reforçada a ideia de que devem ser implementadas formas de atuação diferenciadas para a educação de populações do campo, sem que sejam desprezadas as diretrizes básicas de educação, de âmbito nacional.

É necessário, sobretudo, promover a “Inclusão Social pelo Trabalho Decente”, conforme observa Sachs (SACHS 2004, p. 25/26).

O emprego e o auto-emprego decentes constituem a melhor maneira de atender às necessidades sociais por duas razões:

A inserção no sistema produtivo oferece uma solução definitiva, enquanto as medidas assistenciais requerem financiamento público recorrente;

Em termos psicológicos, o exercício do direito ao trabalho promove a auto-estima, oferece oportunidades para a auto-realização e o avanço na escala social, ao contrário do desânimo e da falta de perspectivas vivenciados por assistidos crônicos.

A busca pelo progresso intelectual do estrato social menos favorecido é defendida por Gramsci (GRAMSCI 1978, p.20)

A posição da filosofia da praxis é antitética a esta posição católica: a filosofia da

práxis não busca manter os “simplórios” na sua filosofia primitiva do senso comum,

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afirma a exigência do contato entre os intelectuais e os simplórios não é para limitar a atividade científica e para manter uma unidade no nível inferior das massas, mas justamente para forjar um bloco intelectual-moral, que torne politicamente possível um progresso intelectual de massa e não apenas de pequenos grupos intelectuais.

Segundo Paulo Freire (FREIRE 1982, p. 87):

Nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão do mundo, ou tentar impô-la a ele, mas dialogar com ele sobre a sua e a nossa. Temos de estar convencidos de que a sua visão do mundo, que se manifesta nas várias formas de sua ação, reflete a sua

situação no mundo, em que se constitui. A ação educativa e política não pode

prescindir do conhecimento crítico dessa situação, sob pena de se fazer “bancária” ou de pregar no deserto.

Essa visão de Paulo Freire foi percebida por Lúcio Ventania em suas experiências na implantação das Bambuzerias, quando verificou que os métodos de produção e organização para o trabalho por vezes contrariavam os costumes e a cultura locais. Levar para regiões do Brasil com traços culturais diferenciados a proposta de implantação de processos de trabalho sem o conhecimento adequado das especificidades regionais se mostrou ineficiente.

A Constituição Brasileira, ao traçar os Princípios Fundamentais da República, traz explícito que a busca do exercício da cidadania e a valorização da dignidade da pessoa humana estão entre seus fundamentos:

TÍTULO I

Dos Princípios Fundamentais

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania; II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

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Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

3.1 O Bambu

Com exceção da Europa, o bambu é nativo de todos os continentes, porém, há informações de que seu cultivo já está sendo introduzido na parte oeste da Europa, como Espanha, Itália e Portugal, através da China e Japão (TEIXEIRA, 2006).

Figura 1 - Distribuição natural do Bambu no mundo (autor desconhecido) Fonte: Bambu de Corpo e Alma (CD)

O bambu pertence à família Graminae e subfamília Bambusoideae e apresenta-se em cerca de 50 gêneros que se subdividem em mais de 1.300 espécies distribuídas predominantemente nas regiões tropicais e subtropicais da Ásia, África e América do Sul. Algumas espécies de bambu chegam a crescer um metro em apenas 24 horas em sua fase inicial, podendo alcançar 30 metros em poucos meses. (Pereira e Beraldo, 2007)

O bambu é uma planta lenhosa, tendo uma parte aérea e outra subterrânea, como as árvores. A parte aérea é denominada “colmo” (popularmente vara ou tronco) e a parte subterrânea é formada por rizomas e raízes. Normalmente os bambus são ocos, mas também existem algumas espécies maciças.

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Figura 2: As partes do bambu

Fonte: Painéis de Bambu para Habitações Populares

O colmo do bambu é, em sua maioria, caracterizado por apresentar uma forma ligeiramente cilíndrica e dispor de uma sequência de entrenós (ou internós) ocos que são separados uns dos outros por diafragmas visíveis externamente e denominados nós. Os diafragmas têm a função de dar estrutura e resistência ao colmo.

Os colmos de bambu variam de acordo com a espécie a qual pertençam, havendo uns que chegam a 30 m de altura e cerca de 30 cm de diâmetro. Uma característica comum a todas as espécies é o fato de os colmos já nascerem com o diâmetro na base que terão na fase adulta. Esse diâmetro vai diminuindo de acordo com a altura do bambu, porém, não aumenta com o passar do tempo, conforme ocorre comumente com as árvores.

Outra característica comum é que os colmos geralmente atingem sua altura máxima em poucos meses após a brotação, variando de cerca de 30 dias nas espécies de pequeno porte e até 180 dias nas espécies gigantes. A média de crescimento diário fica entre 20 cm e 1 m, sendo que as maiores taxas ocorrem em períodos chuvosos. Os colmos das espécies alastrantes crescem mais rapidamente durante o dia, enquanto que as entouceirantes durante a noite.

Na fase de broto os colmos são protegidos por uma bainha (brácteas), que vão caindo uma a uma no decorrer do crescimento. Tal proteção é eficaz, pois nessa fase o tecido do colmo é delicado sendo, inclusive, a parte que serve à alimentação humana.

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Figura 3 - Broto de bambu na touceira D latiflorus - Unesp (foto M. Pereira).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

O rizoma é parte fundamental no desenvolvimento do bambu, responsável pelo armazenamento de nutrientes para posterior distribuição aos colmos e pela propagação da planta. O nascimento de novos colmos efetua-se assexuadamente por ramificações dos rizomas.

Existem três tipos básicos de rizomas: Grupo leptomorfo, alastrante ou monopodial; Grupo paquimorfo, entouceirante ou simpodial; Grupo semi-entouceirante ou anfipodial.

Os bambus do grupo entouceirante possuem os rizomas curtos, grossos e sólidos, com internós assimétricos e raízes na parte inferior, sendo normalmente mais grossos do que o colmo anterior que o originou. Ano a ano as gemas desse tipo de rizoma se ativam, formando novos colmos ininterruptamente, próximos uns aos outros, formando uma touceira, que pode chegar a ter de 30 a 100 colmos.

Os bambus do tipo alastrante são mais resistentes às baixas temperaturas e por essa razão são mais encontrados em zonas temperadas. Seus rizomas são longos, delgados e de formato cilíndrico. Em cada nó desse tipo de rizoma existe uma gema que pode se ativar, originando um novo rizoma ou um novo colmo. O rizoma pode crescer entre 1 a 6 metros por ano, formando uma teia que pode atingir de 50 a 100 mil metros lineares por hectare. O manejo desse tipo de bambu é facilitado pela distância entre os colmos, que permite que se ande no meio da plantação com facilidade, escolhendo os colmos adequados para a colheita.

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Os bambus do tipo semi-entouceirante apresentam características comuns aos outros dois descritos, sendo encontrados nas zonas mais altas das cordilheiras.

3.2 As potencialidades do bambu

Considerando as características do bambu e à luz dos conceitos de “Uso” (aplicação de um utensílio ou ferramenta com a função para a qual foi idealizado) e “Utilidade” (aplicação de um utensílio ou ferramenta em função diversa para a qual foi idealizado), podemos sem dúvida criar para o Bambu o termo “Usilidade”, haja vista a infinidade de aplicações possíveis sem possibilidade de caracterização da principal.

Das inúmeras características positivas que se podem creditar ao bambu para ser parte da solução de problemas sociais no Brasil, uma em especial merece atenção: o aprendizado acerca do seu manejo acontece no momento em que se inicia o próprio trabalho, seja ele na preparação do solo para cultivo, na propagação das mudas, na colheita, no tratamento contra pragas ou na industrialização, ou seja, em qualquer fase de seu ciclo produtivo.

A lista de utilidades do bambu é praticamente infindável, abrangendo alimentação, medicina, química, farmácia, fabricação de tecidos, construção de moradias, cercas, mobiliário, armamento, instrumentos para caça e para pesca, embarcações, artesanato, canalização de água, indústria do papel, produção de carvão, instrumentos musicais etc.

As utilidades do bambu começam com o aproveitamento da própria planta viva, seja como regenerador do solo, auxiliar no controle da erosão, formação de matas ciliares evitando assoreamento dos rios, barreira contra ventos, paisagismo etc.

Figura 4 - Controle de erosão – Planta viva (foto J Stamm).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

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Na zona rural o bambu pode ser utilizado para construção de cercas, currais, galpões, estábulos, pocilgas, galinheiros, tanques para criação de peixes, paióis, caramanchões, estacas para plantações etc.

Figura 5 - Construção de Galpão para estábulo (Tropical Bamboo)3.jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

Na construção civil o bambu pode ser utilizado praticamente em todas as etapas do processo, seja para construções simples ou sofisticadas, dos alicerces aos telhados, servindo como pisos, paredes, portas, janelas, andaimes, cabos para ferramentas etc.

Figura 6 – Construção de Andaime (autor desconhecido).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

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Figura 7 – Casa construída com bambu (autor desconhecido).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

Na indústria de móveis o bambu pode ser utilizado com vantagens comparativas em relação a muitos outros tipos de madeira, fabricando produtos de qualidade e beleza incomparáveis, como mesas, cadeiras, guarda-roupas etc., em sua conformação original ou após processamento.

Figura 8 - Cama beliche (autor desconhecido).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

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Figura 9 - Cama em Bambu Laminado Colado (autor desconhecido).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

Na indústria alimentícia o bambu substitui o palmito com a vantagem de não matar a planta para que seja efetuada a colheita, além de possuir valor nutritivo elevado e poder ser embalado e conservado com facilidade.

Figura 10 - Broto comestível sem as brácteas (autor desconhecido).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

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Figura 11 - Broto de bambu em processamento – China (foto M Pereira).JPG Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

Figura 12 - Broto de bambu enlatado – China (foto M Pereira) 1.JPG Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

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Figura 13 - Broto de bambu embalado a vácuo – China (foto M Pereira) 1.JPG Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

Na indústria do artesanato o bambu pode ser utilizado para uma infinidade inesgotável (sic) de projetos, a depender unicamente da criatividade de cada profissional, seja ele escultor, pintor, designer etc.

Figura 14 - Abajur (Carl Hashimoto).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

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Figura 15 - Talheres (E Aranha).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma – CD

Figura 16 - Porta papel (P Bustamante).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

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Figura 17 - Saboneteira (P Bustamante).jpg Fonte: Bambu de Corpo e Alma - CD

Nos tempos atuais, uma característica intrínseca à planta começa a receber atenção mais intensa de cientistas, em todo o mundo, preocupados com os efeitos do aquecimento global: o bambu sequestra da atmosfera quantidade maior de carbono, quando comparado a outras espécies vegetais, o que o credencia a se tornar um grande aliado ao combate a esse fenômeno. Além disso, contribui naturalmente para a regeneração de solos degradados.

Consideradas essas características, surpreende o fato de que o bambu apenas recentemente começasse a ser efetivamente encarado no mundo ocidental como alternativa viável para a substituição, em alguns casos com vantagens, aos materiais tradicionalmente utilizados para os fins apontados.

Experiências com o uso do bambu

O bambu é utilizado há milênios no Oriente, para os mais diversos fins, fazendo parte intrínseca da cultura da população, havendo vários mitos que evidenciam a importância deste material na cultura Oriental (Pereira e Beraldo, 2007):

- Na China o bambu é considerado uma família, composta por várias gerações: podendo ser observados numa mesma touceira colmos “bisavós”, já maduros, “avós”, quase alcançando a maturidade, “mães” e “filhas” - novos brotos comestíveis. Os chineses consideram o bambu como símbolo da longevidade.

- Na Índia o bambu é símbolo da amizade, pois se reconhece que serve ao homem desde o berço até o túmulo.

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- No Vietnã o bambu está simbolicamente relacionando à própria existência do país, pois se considera que seu processo de propagação natural é constante, assim como o processo de renovação das gerações.

- No Japão, frequentemente, os santuários são circundados por plantações de bambu, como parte de uma barreira sagrada contra o mal.

- Muitos outros mitos envolvem o bambu, na Ásia. Nas ilhas Andaman acredita-se que a humanidade emergiu de um colmo de bambu; nativos das Filipinas acreditam que o primeiro homem e a primeira mulher nasceram de um colmo de bambu emergido de uma ilha criada após a batalha das forças elementais (Céu e Oceano). Mitos semelhantes existem em outros locais, como Japão, Malásia e Havaí.

Na costa oeste da América do Sul e na América Central o bambu já era utilizado pelos nativos, centenas de anos antes da chegada dos conquistadores espanhóis. Por esse motivo, arquitetos e engenheiros da Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Costa Rica, entre outros, desenvolvem projetos de grande envergadura e com detalhes deslumbrantes.

Apesar de no Brasil existirem vários gêneros e espécies nativas de bambu, em virtude de essas não serem adequadas à construção civil, nossos indígenas, tradicionalmente, utilizavam o bambu para fabricar apetrechos para caça e pesca.

A partir de estudos científicos realizados em Universidades Brasileiras, como a Universidade Federal Fluminense – UFF, Pontifícia Universidade Católica – PUC – RJ, UNICAMP, Universidade de Brasília – UnB entre outras, muitos trabalhos começaram a ser realizados com a utilização do bambu, rompendo com parte do preconceito dispensado a esse material.

Esse preconceito foi abordado pelo Professor Marco Antonio Pimentel de Mello em sua Dissertação de Mestrado “As Potencialidades de Inserção do BAMBU no Sistema Produtivo no Brasil” – 1997, no Curso de Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense – UFF. (MELLO, 1997)

O programa “Cidades e Soluções” (Cidades e Soluções – Rede Globo de Televisão - 2007), da Globo News, apresentou em 29/04/2007 matéria envolvendo o uso do bambu, que começa com a seguinte afirmação:

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“Se o bio-diesel é o combustível que se planta, não seria exagero dizer que o bambu é o aço verde. Das 1200 espécies conhecidas, pelo menos oito, aqui no Brasil, poderiam substituir o aço à altura e com algumas vantagens importantes: o consumo de energia é 50 vezes menor; além de resistente o bambu não polui e ainda absorve carbono da atmosfera enquanto cresce: um bônus importante em tempos de aquecimento global. O uso inteligente e sustentável do bambu, principalmente na construção civil é o assunto do programa de hoje”. (Globo News, 29/04/2007)

Khosrow Ghavami, professor de engenharia civil da PUC – RJ e pesquisador associado da Princeton University, na entrevista concedida ao programa demonstrou, com testes realizados no laboratório de ensaios mecânicos da PUC-RJ, que o bambu pode substituir o aço em algumas estruturas. No curso que ministra, Ghavami instrui pesquisadores de todo o mundo, que o reconhecem como um dos melhores especialistas no assunto. Declarou-se intrigado por haver tanto preconceito quanto ao uso do bambu no Brasil e relatou o fato de o 14 Bis, de Santos Dumont, haver sido fabricado com esse material.

Os arquitetos urbanistas Edoardo de Aranha e Francisco Lima, no mesmo programa, abordam outro dado importante sobre as touceiras de bambu e seu manejo, que é o fato de serem poderosas regeneradoras do solo no qual estão plantadas. A biomassa formada pelas folhas, que caem constantemente, propicia o surgimento de um substrato rico em nutrientes que criam condições de vida para uma infinidade de insetos, gerando uma exuberância de biodiversidade.

Nesse mesmo Programa foi apresentada experiência realizada no Município de Três Rios – RJ, com a construção de casas populares e implantação de oficina de artesanato em parceria do Sebrae com uma organização ambientalista. O resultado foi a criação da “linha de montagem da casa ecológica”.

Num processo simples, o bambu é cortado, impermeabilizado e engradado em fôrmas pré-dimensionadas e, após serem revestidos com uma massa à base de cimento, são postos em secagem e se transformam em painéis padronizados que servem para a construção de casas bem estruturadas.

O simples uso do bambu nessas construções já seria algo a ser comemorado em termos de respeito ao meio ambiente. A grande novidade está na massa utilizada para a produção dos painéis: uma mistura de cimento, cal, palha de bambu e borracha de pneus usados, triturada, substituindo a brita. Essa mistura, além de diminuir o peso específico dos painéis e propiciar isolamento térmico às paredes, contribui para minimizar o problema do descarte das carcaças dos pneus, que tanto preocupa os ambientalistas.

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O zootecnista e construtor Miguel Esteves explica que as casas produzidas com essa técnica apresentam um bom isolamento térmico e acústico e têm custo bem inferior se comparadas às casas construídas com materiais convencionais. O bambu, por ficar completamente coberto com a massa, em um ambiente anaeróbico, mantém-se protegido por cerca de 200 anos.

Perguntado pelo apresentador do programa sobre se haveria problemas na oferta do bambu, Miguel Esteves assegurou que o Estado do Rio de Janeiro é um dos maiores produtores de bambu do Brasil e que, por isso, o processo tem garantido seu fornecimento de matéria prima.

Ao ser efetuada uma comparação entre o custo de produção de uma casa, de mesmas dimensões, construída com materiais convencionais ou de bambu, chegou-se a uma conclusão surpreendente: numa licitação recente para a construção de 100 casas, o custo unitário foi de R$ 13.500,00; uma única casa de bambu, produzida pela “linha de montagem da casa ecológica”, custou R$ 8.500,00. Segundo avaliação do Coordenador do Sebrae em Três Rios, Jorge Pinho, para a construção em escala das casas ecológicas ainda é possível conseguir uma redução de custos em torno de 10%.

O Secretário de Indústria e Comércio de Três Rios, Júlio Cezar Rezende de Freitas, mostrou-se otimista em relação à continuidade do projeto, numa perspectiva de geração de emprego e renda, o que seria um fato benéfico para o Município, já que traz para o mercado de trabalho pessoas que estavam fora, com uma tecnologia nova. Destacou o uso de materiais ecológicos na construção das casas e enfatizou a necessidade de parceria com a iniciativa privada para aumentar o número de construções, implantando inclusive conjuntos habitacionais.

Na comunidade do morro de São Carlos, também em Três Rios, outra experiência envolvendo o bambu apresenta resultados extremamente positivos no sentido de geração de trabalho e renda. Foi construído um galpão, utilizando o processo já descrito, com a única diferença de terem sido utilizados bambus “gigantes” para servirem de colunas, conjugando-os com conjugando-os painéis pré-fabricadconjugando-os. O novo galpão foi construído para abrigar a expansão de uma oficina de artesanato de bambu que funciona há cerca de dois anos e emprega vários cidadãos da comunidade.

Na UnB – DF, em trabalho de dissertação de mestrado em arquitetura e urbanismo, área de tecnologia, intitulado: “PAINÉIS DE BAMBU PARA HABITAÇÕES ECONÔMICAS: Avaliação do Desempenho de Painéis Revestidos com Argamassa”, produzido em março de 2006, a mestranda Anelizabete Alves Teixeira descreve passo a passo

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o processo de produção de painéis pré-fabricados de bambu, demonstrando sua exequibilidade técnica e econômica. Os painéis prontos apresentam ótima estrutura e são adequados para a construção de moradias (TEIXEIRA, 2006)

Figura 18 - Estrutura do corpo-de-prova finalizada. Fonte: Foto Anelizabete Alves Teixeira

Figura 19- Argamassa sendo aplicada nas estruturas de bambu. Fonte: Foto Anelizabete Alves Teixeira

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Figura 20 - Estruturas recobertas pela argamassa de revestimento aplainada com régua de madeira. Fonte: Foto Anelizabete Alves Teixeira

Os painéis prontos apresentam uma ótima estrutura e são adequados para a construção de moradias.

Nas considerações finais de sua Dissertação, Teixeira enfatiza as peculiaridades do bambu como sendo um material de construção de baixo custo e de fácil manejo, renovável e com grande potencial para se tornar parte da solução habitacional no Brasil, a exemplo do que acontece em países como Equador, México, Colômbia e Costa Rica, notadamente em Políticas Públicas de Habitação temporária, como no caso de situações de emergência para alojamentos por ocasião de catástrofes naturais, ou permanente, na construção de conjuntos habitacionais.

Em trabalho publicado em Cadernos Temáticos n° 3 – jan. 2005, (http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/cadernos03_v1.pdf) págs. 45 e 46 os autores CASAGRANDE Jr., Eloy F.; e UMEZAWA, Helena A., apresentam dados de um estudo realizado para o CEFET-PR intitulado: “Arranjo Produtivo Local Sustentável (APLS) em torno do bambu: inclusão social, geração de renda e benefício ambiental”, no qual apresentam dados relativos a aspectos importantes sobre o benefício ambiental proporcionado pela introdução da cultura do bambu, além de dados econômicos relacionados com a indústria de bambu na China e no Brasil.

Após apresentação de uma dissertação de mestrado defendida junto ao Programa de Pós-graduação em Tecnologia – PPGTE do CEFET-PR, foi implantado um projeto que beneficiou cerca de 130 famílias carentes do Município de Fazenda Rio Grande que se envolveram na “cadeia produtiva do bambu”, desenvolvida com o conceito APLS. A cadeia produtiva do bambu gera emprego e renda para a população envolvida, ao mesmo tempo em que contribui para a regeneração do solo e captura de carbono da atmosfera. O projeto conta com a parceria de Prefeitura local e foi financiado pelo IX prêmio UNISOL/Banco Real – Desenvolvimento Sustentável e Geração de Renda.

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Figura 21 - Conglomerado Agroindustrial em torno do bambu na Colônia Parque Verde Fonte: http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/cadernos03_v1.pdf (20/10/07)

O Instituto do Bambu (Inbambu), criado na Universidade Federal de Alagoas – UFAL, tornou-se centro de referência na capacitação e pesquisa sobre o uso do bambu. Um dos objetivos é dar suporte à economia do bambu. Na construção civil a experiência do Inbambu dispensa o uso do aço nas construções, substituindo-o por fibras do bambu. Em 2000, estimou-se que o custo médio de uma casa popular de 38 m2 era de R$ 4.300,00 – 40% inferior a uma casa de alvenaria. (TEIXEIRA, 2006).

Também por intermédio do Inbambu, outro projeto vem despertando a atenção por sua importância na geração de trabalho e renda: a fabricação de tanques-rede para criação de peixes. Os colmos de bambu são revestidos com garrafas “pet” aquecidas, que garantem maior durabilidade ao bambu, haja vista que ficam protegidos do contato direto com a água. Esse processo contribui para minimizar o impacto negativo que o descarte dessas garrafas provoca na natureza.

Figura 22 – Garrafas “pet” coletadas do lixo – Penedo - AL Foto de Rodrigo Primavera

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Figura 23 – Revestindo os bambus com “pet” – aquecidas com maçarico Foto de Rodrigo Primavera

Figura 24 – Hastes revestidas com “pet” Foto de Rodrigo Primavera

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Figura 25 – Tanque-rede concluído Foto de Rodrigo Primavera

Figura 26 – Tanque-rede sendo posicionado para criação de peixes Foto de Rodrigo Primavera

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3.4 Aspectos a serem observados

Decidir cultivar bambu requer planejamento e muita reflexão. Após ser plantado e começar a se desenvolver, qualquer que seja o tipo de rizoma da espécie escolhida, torna-se extremamente difícil erradicar a plantação. Deve-se observar o local do cultivo, pois, em caso de proximidade com lavouras ou divisas de propriedades, o bambu do tipo alastrante, principalmente, pode acarretar problemas, haja vista que sua trama de rizomas estende-se continuamente. Muitas vezes é necessário o uso de máquinas pesadas para retirar totalmente os rizomas do solo.

Ao contrário de sua erradicação, o início de uma plantação de bambu é relativamente fácil. O primeiro aspecto a ser observado é a finalidade que se pretende para o produto, para subsidiar a escolha da espécie a ser cultivada, haja vista a existência de cerca de 50 gêneros e 1200 espécies de bambu. Para isso, também é necessário observar as condições da região, a fim de se verificar se a espécie escolhida é adequada.

Segundo Graça (1988), o bambu pode ser plantado e produz bem na maioria dos solos, mas se adapta melhor aos que apresentam grande profundidade, com boa drenagem e que sejam arenosos e leves. Deve-se evitar o plantio em solos argilosos e sujeitos a alagamentos e os excessivamente ácidos ou alcalinos. Um local que tem se demonstrado adequado a seu plantio são as margens de lagos e de rios e riachos, servindo como mata ciliar, desde que não sejam alagadas. Quando o solo possui um nível médio de fertilidade, não é necessária adubação especial.

Para se conseguir maior vida útil ao bambu, e assegurar a qualidade de seu aproveitamento, alguns cuidados devem ser observados na ocasião da colheita dos colmos, como época do corte e idade do bambu.

Existe um ditado colombiano que diz: “bambu para vender se corta em qualquer época, mas bambu para uso próprio corta-se na lua minguante”. Esse ditado popular encontra consistência no fato de que, segundo alguns pesquisadores, nessa fase da lua o bambu contém menor teor de umidade.

A estação seca é a mais adequada para o corte do bambu, por também existir menor teor de umidade, o que acarreta menor quantidade de seiva circulando entre suas fibras e, consequentemente, menor quantidade de amido, tornando-o menos atrativo ao ataque de fungos e insetos. Porém, nessa estação o bambu seca muito rapidamente, o que pode ocasionar defeitos e rachaduras indesejadas.

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Dependendo do uso a ser dado, existem diferentes idades para a colheita, desde o uso comestível (semanas) até para construções (três ou mais anos). O corte deve ser efetuado exatamente acima do nó mais próximo ao chão, a fim de se evitar acumulação de água e consequente apodrecimento.

Segundo Pereira e Beraldo (PEREIRA E BERALDO 2007, pág. 95), o bambu está sujeito a se deteriorar pela ação de fungos e insetos, podendo apresentar vida útil de apenas um a três anos quando não for tratado, segundo alguns autores. Recebendo tratamento adequado pode durar entre dez e quinze anos ou mais (dependendo do tratamento e do local no qual estará sendo utilizado). A eficácia dos tratamentos começa na escolha do momento adequado para o corte. Os bambus devem estar maduros e serem cortados na fase minguante da lua e na estação seca do ano (meses de maio a agosto), quando seu teor de amido é menor.

Existem vários métodos de tratamento para que o bambu esteja próprio para utilização. Pode-se tratá-lo apenas com água, fogo, caldeiras pressurizadas, fumaça, produtos químicos etc., dependendo do tempo de que se disponha e da utilização desejada. Todos os tratamentos visam à redução do teor de amido, responsável pelo ataque de insetos.

Quando se dispõe de tempo para o tratamento, o ideal é que as varas do bambu, após o corte, fiquem em pé na própria touceira para que haja uma pré-secagem natural e a seiva escorra naturalmente. Segundo Pereira e Beraldo, provavelmente, em virtude de as folhas não poderem realizar a fotossíntese, exista neste período consumo maior do amido localizado nos colmos.

Logo após o corte os colmos dos bambus devem ser submersos em água, que tanto pode ser corrente ou estagnada, durante quatro a sete semanas, visando a reduzir ou eliminar o amido, por meio da fermentação biológica causada pela ausência de ar.

3.5 A Bambuzeira Cruzeiro do Sul – BAMCRUS: uma experiência

A Bambuzeria Cruzeiro do Sul, fundada pelo artesão “Bambuzeiro” Lúcio Ventania, teve sede inicial em Belo Horizonte – MG, à Rua Cesário Alvim, 698 (atualmente está sediada no Distrito de Ravena – Sabará – MG). Lúcio entrou em contato com trabalhos em bambu aos 10 anos, por intermédio de “Mestre Lu”, Cidadão Chinês, vizinho no bairro de Padre Eustáquio – BH, que lhe contava histórias que foram reencontradas nas pesquisas sobre o bambu na literatura do Oriente. Antes de apresentarmos o trabalho desenvolvido por ele, segue um texto que demonstra a filosofia do trabalho:

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“OS BAMBUZAIS QUE PLANTAMOS HOJE (por Lúcio Ventania)

Diante da absurda insistência da humanidade em banalizar a destruição da vida, do sagrado, de escravizar e acorrentar gerações e gerações à roda gigante do consumismo, do individualismo, da desigualdade e da miséria, a história segue apressada, hirta, surda, cega em sua gritante trajetória sem rumo.

De tempos em tempos, surgem santos, sábios, poetas com suas tochas acesas, a garimpar loucos e lúcidos para a difícil tarefa de atirar rochas nas gretas da engrenagem.

Quanto mais? Até que ponto? Até quando nos comportaremos como animais à porta do matadouro? Impassíveis, atormentados, alienados, burros, como se nada mais fosse possível? Entregaremos assim nossas vidas? Nossa liberdade?

E nossa inteligência? Nossa natureza amorosa? Nossa capacidade de sonhar, descobrir, criar, inventar e reagir? O que faremos com nossos instintos e intuições? Que espontaneidade daremos a nossa imaginação? Que expressões terão nossas faces quando nossos filhos e filhas nos indagarem sobre o amanhã?

Que sinais daremos a nossos ancestrais que ardem por aliviar a febre que abutina a flor de nossas almas?

Frágeis, debilitados, mas não vencidos, ainda não. Oxalá a existência ainda ecoe haverá tempo.

Mesmo que tontos hão de vingar os músculos sonhadores, que pulsam, que universalmente pulsam e sabem que seu afã é o pulsar.

Ah, esfera azulada movedora de futuros incessantes, exala sua magia, penetra o âmago dos mortais.

Que corra nas veias humanas o sangue rubro da poesia desatando braços, línguas e olhos, atando abraços, palavras e visões para ignorar as torres da cobiça.

Que os campos de sabedoria rebrotem fazendo das artes, da educação e da coragem o sal da terra, os frutos e os grãos para todos os povos.

Que a ética das águas doces de nossos rios de outrora, inunde nossa moral e sacie nossa imensa sede de justiça, de amor e de lazer.

Que a Bambuzeria Cruzeiro do Sul, como tantas outras iniciativas no mundo, não se furte de fazer valer o brilho da constelação que lhe empresta o nome.

Que não percamos de vista o sentimento de que vale a pena desafiar, desafinar e provocar situações e movimentos, fatos e pessoas.

Nosso compromisso é contribuir para que a paz e o prazer, não sejam apenas palavras corroídas pelas traças no dicionário da história.

Que os bambuzais que plantamos hoje sejam esteio de conforto e amizade para muitas gerações.”

Em 2002 (acesso em 06/08/07) foi publicada uma reportagem intitulada “Bambu transforma vida em sete Estados”, de autoria de Roselena Nicolau, Fabrícia Carneiro, Mário Lima e Márcia Gouthier, (http://www.sebrae.com.br/revistasebrae/05/temadecapa_04.htm), que sintetiza o trabalho social desenvolvido por Ventania em Minas Gerais e “exportado” para outros seis Estados Brasileiros. Várias peças de artesanato produzidas são realmente exportadas para países da Europa.

Um objetivo pretensioso, segundo os autores da reportagem, é o de se criar um novo ciclo econômico no Brasil, baseado no bambu, similar aos que ocorreram no passado com a cana-de-açúcar, o ouro e o café. Até a publicação dessa matéria, em 2002, já haviam sido implantadas 41 oficinas Bambuzerias para produção de objetos de bambu no Brasil, integrantes do Programa de Desenvolvimento do Ciclo do Bambu, inspirado por Ventania em

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1990, que qualificaram cerca de cinco mil pessoas que estavam fora do mercado de trabalho ou não tinham condições de nele ingressarem.

As “Bambuzerias” surgiram isoladas, em parcerias formadas com Prefeituras, ONGs, Sebrae e com a Cooperação Brasil-Alemanha, que investe em programas ambientais de cunho social, entre outras, e estão se expandindo e levando oportunidades de socialização para várias regiões. A pioneira foi a Bambuzeria Cruzeiro do Sul, localizada em Belo Horizonte – MG (www.bamcrus.com.br), que coordena a instalação das demais nos outros Estados brasileiros.

Alguns aspectos são apontados por Ventania como inibidores da expansão em maior escala do projeto. Um está relacionado ao preconceito: enquanto o bambu é considerado planta sagrada na China e em grande parte do Oriente e utilizada em larga escala em países vizinhos do Brasil como Colômbia, Costa Rica e Equador, o bambu foi considerado durante muitos anos como uma praga no Brasil. Apesar de ser 100% aproveitável, ter alta qualidade e grande produtividade e resistência, o interesse da indústria madeireira e de móveis em descaracterizar essas qualidades criou a ideia de que o bambu é material de baixa categoria.

Outro aspecto é a falta de pessoal qualificado para execução dos projetos, pois existe a demanda para os produtos de bambu e possibilidade de formação de mão-de-obra em escala. Segundo ele é necessário fomentar o gosto pelo bambu entre arquitetos, designers, paisagistas e decoradores. Existe também o desafio de se disseminar conhecimento técnico para se lidar com a matéria-prima.

O desafio do Programa da Bamcrus é desencadear um ciclo de prosperidade cultural, econômica e ambiental no País a partir da popularização do uso do bambu, inserindo no mercado de trabalho a parte da população que, por diversos motivos, está excluída do processo produtivo, ocupando o espaço aberto para produtos ecologicamente corretos, com beleza, qualidade e respeito à vida. “Queremos um novo ciclo econômico no país, mas invertendo a pirâmide social”, diz Lúcio Ventania, que apresenta o Programa Social da Bamcrus:

O “Desenvolvimento do Ciclo do Bambu no Brasil” é um programa de geração de trabalho e renda que utiliza o bambu como vetor de desenvolvimento sustentável. Busca promover o bem-estar físico, social, cultural e econômico, propiciando atividades ocupacionais a partir da realização de cursos técnicos, incentivo e suporte para a formação de associações e Cooperativas Sociais de Produção e Comercialização de Ecoprodutos em Bambu (bambuzerias).

O Programa não é visto apenas como uma prática comercial, mas também como de integração social. Conta com a participação de uma equipe multidisciplinar e ministra cursos

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de capacitação em diversas áreas utilizando como estratégia a realização de oficinas pedagógicas.

As oficinas pedagógicas visam à educação integral dos participantes, com conteúdo programático que possibilita ensinar o processo de fabricação dos produtos e conhecimento da filosofia do trabalho, cuidados pessoais com a saúde, comportamento e integração social, conhecimento do mercado, incentivo à leitura, entre outras atividades.

3.6 As ações do governo brasileiro

O governo brasileiro, em duas ações, pareceu reconhecer, pelo menos formalmente, a importância do bambu como vetor de desenvolvimento.

Uma ação foi a assinatura de um Memorando de Entendimento entre os Ministérios da Ciência e Tecnologia do Brasil e da China, versando acerca de Cooperação Bilateral em Ciência e Tecnologia na Área de Desenvolvimento em Bambu, que em sua Seção I – Dos Objetivos, dispõe que “O objetivo deste Memorando de Entendimento é promover, desenvolver e facilitar a cooperação entre participantes do Brasil e da China em áreas de interesse comum em ciência, tecnologia e inovação na área de desenvolvimento em bambu, em especial em pesquisa, desenvolvimento e produção para o desenvolvimento sustentável; (grifei)

A outra foi a sanção da Lei 12.484/2011 que institui a Política Nacional de Incentivo ao manejo Sustentado e ao Cultivo do Bambu, que dispõe em seu art. 2o, parte final: “...bem como à valorização desse ativo ambiental como instrumento de promoção de desenvolvimento socioeconômico regional.” (grifei)

3.6.1 O Memorando de Entendimento Brasil / China

Em clara demonstração de interesse governamental no desenvolvimento da cultura e utilização do Bambu no Brasil, o Memorando de Entendimento foi assinado em abril de 2011 pelo Ministro da Ciência e Tecnologia da República Federativa do Brasil e pelo Ministro da Ciência e Tecnologia da República Popular da China, com o objetivo de “promover, desenvolver e facilitar a cooperação entre participantes do Brasil e da China em áreas de interesse comum em ciência, tecnologia e inovação na área de desenvolvimento em bambu, em especial em pesquisa, desenvolvimento e produção para o desenvolvimento sustentável”.

Entre as considerações que serviram de base para a celebração desse entendimento está o Acordo de Cooperação em Ciência e Tecnologia entre o Brasil e a República Popular

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da China, firmado em abril de 2010, além da existência de ações conjuntas entre os dois países visando ao desenvolvimento econômico e social de ambos.

Conhecidas as culturas dos dois países, em especial a importância milenar que o Bambu tem na China e que apenas recentemente o Brasil tenha despertado para as potencialidades dessa planta, análise superficial poderia sugerir que o interesse era maior para o Brasil.

O Pesquisador da UnB e Coordenador da Rede Brasileira do Bambu – RBB, prof. Jaime Gonçalves de Almeida, do Centro de Pesquisa e Aplicação do Bambu e Fibras Naturais – CPAB/UnB, explica que, enquanto o interesse da China está na expansão das áreas plantadas com Bambu, em virtude de que na Ásia a produção desse material está deixando de atender à demanda industrial, o interesse do Brasil é promover a propagação do Bambu em escala para conseguir o desenvolvimento adequado.

É necessária investigação específica para avaliar os desdobramentos e benefícios mútuos gerados por essa iniciativa.

3.6.2 A Lei 12.484/2011 – A “Lei do Bambu”

A “Lei do Bambu” foi fruto do esforço de alguns dos atores citados neste trabalho e de outros que acreditam nas potencialidades econômicas, sociais e ambientais da utilização dessa planta, que culminou na elaboração e aprovação da Lei nº 12.484, publicada no Diário Oficial da União do dia 09 de setembro de 2011, que instituiu a “Política Nacional de Incentivo ao Manejo Sustentado e à Cultura do Bambu - PNMCB” (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2011).

3.6.2.1Antecedentes à elaboração da lei

Em desacordo com a formatação deste trabalho no capítulo dedicado às entrevistas com personagens envolvidos com o Bambu, foi realizada entrevista pessoal sem programação, no dia 10 de julho de 2014 com o prof. Jaime Gonçalves de Almeida, do Centro de Pesquisa e Aplicação do Bambu e Fibras Naturais – CPAB/UnB e Coordenador da Rede Brasileira do Bambu, que deixou de ser transcrita na íntegra, devido à sua extensão e abrangência que fugiria da intenção deste trabalho.

Explicou o prof. Jaime que no ano de 2005 aconteceu reunião promovida pelo Ministério do Meio Ambiente e realizada por sua Secretaria de Florestas acerca do Inventário

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Florestal Brasileiro, para a qual foram convidadas instituições públicas e privadas, com a participação do Grupo João Santos - Itapagé, da Embrapa do Paraná, de Pesquisadores da PUC do Rio de Janeiro entre outros, na qual foi sugerida a inclusão do Bambu nesse Inventário. Foi discutida a criação de uma Rede, que inicialmente se pensou que seria apenas de troca de informações.

Outro fato, que nos parece mais significativo, foi a estruturação da Rede Brasileira do Bambu – RBB, iniciada no ano de 2006, quando o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação – MCTi destinou recursos que possibilitaram à Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social encomendar à UnB a organização de um Seminário Nacional visando à estruturação de uma Rede de Pesquisa em Bambu, envolvendo lideranças de diversos setores da sociedade que já estudavam e trabalhavam com esse material, como Pesquisadores, Empresários, Instituições etc..

A ideia dessa rede é popularizar o uso do Bambu no Brasil a partir da criação de uma cadeia produtiva de valor social do bambu. O Objetivo de longo alcance (horizonte) da Rede, divulgado nos Anais do I Seminário Nacional realizado nos dias 13, 14 e 15 de setembro de 2006, em Brasília – DF é: “A Rede, uma iniciativa de diferentes setores envolvidos e interessados na cultura e na difusão do bambu no Brasil, tem por objetivo o desenvolvimento do país e, especialmente, a melhoria de vida de sua população”.

Por intermédio do Edital nº 25/2008 - CNPq / MCTI, foi criada a Rede Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento do Bambu, possibilitando a estruturação de grupo de estudos cujo histórico se pode acessar no site http://www.redebrasileiradobambu.com.br/.

No ano de 2010 foi realizado o II Seminário da Rede Brasileira do Bambu, realizado no Estado do Acre, contrariando parecer do CNPQ que sugeria a realização no Centro-Sul, no Estado de São Paulo ou do Rio de Janeiro, com a alegação de que o Acre era muito distante e sem grandes atrativos. Esse II Seminário foi novo sucesso, atraindo pesquisadores de diversas partes do Brasil.

Estes fatos, além do Acordo Brasil-China de 2011 foram, sem dúvida, os criadores de um ambiente favorável a que em setembro de 2011 se publicasse a Lei que deveria ser um instrumento capaz de impulsionar várias ações concretas em favor do uso e desenvolvimento da cultura do bambu no Brasil.

Entretanto, a Lei caiu no vazio e o próprio Edital 25/2008 foi objeto de tensionamento inútil, revelando a superficialidade e desatenção com tudo até então construído.

Ocorreu que em 2013 houve o lançamento do Edital nº 66/2013 - CNPq / MCTI contendo o mesmo escopo do anterior, fato que motivou o coordenador da Rede Brasileira do

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