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Dimensão espacial na análise econômica de pagamento por serviços ambientais : o caminho para a eficácia

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GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS (FACE) DEPARTAMENTO DE ECONOMIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

LUANA MAGALHÃES DUARTE DE ARAÚJO

DIMENSÃO ESPACIAL NA ANÁLISE ECONÔMICA DE ESQUEMAS DE PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS: O CAMINHO PARA A

EFICÁCIA

MESTRADO EM ECONOMIA

GESTÃO ECONÔMICA DO MEIO AMBIENTE

BRASÍLIA-DF 2019

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GESTÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS (FACE) DEPARTAMENTO DE ECONOMIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

LUANA MAGALHÃES DUARTE DE ARAÚJO

DIMENSÃO ESPACIAL NA ANÁLISE ECONÔMICA DE ESQUEMAS DE PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS: O CAMINHO PARA A

EFICÁCIA

Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção de título de Mestre em Economia - Gestão Econômica do Meio Ambiente, do Programa de Pós-Graduação do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.

Orientador: Prof. Dr. Jorge Madeira Nogueira

BRASÍLIA-DF 2019

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DIMENSÃO ESPACIAL NA ANÁLISE ECONÔMICA DE ESQUEMAS DE PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS: O CAMINHO PARA A

EFICÁCIA

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Economia – Gestão Econômica do Meio Ambiente, do Programa de Pós-Graduação em Economia – Departamento de Economia da Universidade de Brasília, por intermédio do Centro de Estudos em Economia, Meio Ambiente e Agricultura (CEEMA)

Brasília, 03 de dezembro de 2019

______________________________________ Prof. Dr. Jorge Madeira Nogueira (Orientador) Departamento de Economia da UnB ______________________________________ Dra. Carolina Tavares da Silva Bernardo Departamento de Economia da UnB ______________________________________ Prof. Dr. Pedro Henrique Zucchi da Conceição Departamento de Economia da UnB ______________________________________ Prof.ª Dra. Mercedes Maria da Cunha Bustamante Departamento de Ecologia da UnB

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Ao meu amor Vitor e à nossa filha Helena, que, ainda em meu ventre, ilumina o caminho adiante e dá vida à minha vida.

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A Deus, minha força e meu canto, fonte do Amor incomparável, de cuidado e de incontáveis graças.

Ao meu marido Vitor, companheiro incansável: meu porto-seguro, força diária, motivação e acolhimento nos momentos mais desafiadores. A ele, que esteve ao meu lado comigo desde o despertar desse sonho em 2012: essa conquista é nossa. Sem você eu jamais chegaria tão longe.

À minha filha Helena, que, ainda sendo gerada dentro de mim, nos ilumina, nos transforma, nos cura e nos dá razões para seguir adiante. Filha: estamos aqui fora te esperando com todo o amor do mundo!

À minha mãe Mirtes, minha grande inspiração, fonte de amor, fé, garra, força e abraço, na mesma proporção. Tudo que é meu tem um pouquinho de você. Aos meus irmãos Lucas e Giovana, amores da vida, que contribuíram tanto para ser quem eu sou. Amo vocês infinitamente!

Ao meu pai, Ronaldo, e aos meus irmãos, Rogério, Isabela e Rodrigo, sinais evidentes do amor de Deus na minha vida.

À família Duarte, em especial à minha madrinha Sônia e à minha prima Amangad, que tanto me cuidaram e me incentivaram a trilhar o caminho do amor e do conhecimento.

À minha segunda família, Ana, Roberto, Gabriela e Juliana, fontes de amor inesgotável, de apoio e cuidado. Sou muito grata por fazer parte da família de vocês.

À minha irmã de alma, Laís, que, me conhecendo mais do que eu mesma, acredita em mim e me inspira no caminho acadêmico, mas principalmente me motiva a ir em direção daquilo que faz meu coração vibrar.

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na teoria econômica e pelas lições e aprendizados dentro e fora da vida acadêmica.

À prof.ª Dra. Rebecca Runting, pelas contribuições essenciais à minha dissertação, por ter me recebido de portas abertas na Universidade de Melbourne e assim me possibilitado viver uma experiência única para a minha formação acadêmica, cheia de aprendizados na ecologia, na economia e na vida. Aos meus colegas de trabalho do MMA, em especial André, Jennifer, Mateus, Mariana, Otávio e Rodrigo, que me apoiaram desde o início nessa jornada e foram tão importantes nos momentos mais difíceis de conciliar a jornada de trabalho intensa com os desafios do mestrado.

Ao Dr. Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza, meu grande incentivador e amigo, que por tantos anos no MMA me ensinou sobre a vida e sobre o mundo das políticas públicas.

À Dra. Ana Paula Prates, líder e amiga, fonte de apoio e aprendizados no MMA, que possibilitou que eu me dedicasse inteiramente para a escrita da dissertação de mestrado. Sempre lembrarei com muito carinho tudo o que você fez por mim. Aos meus amigos tão queridos, sempre presentes, força e amparo em todos os momentos, imprescindíveis no caminho da vida.

Aos colegas do CEEMA/UnB, por todo o apoio, companhia e alegria ao longo desses dois anos. Com vocês tudo ficou mais leve.

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Quando falamos de «meio ambiente», fazemos referência também a uma particular relação: a relação entre a natureza e a sociedade que a habita. Isto impede-nos de considerar a natureza como algo separado de nós ou como uma mera moldura da nossa vida. Estamos incluídos nela, somos parte dela e compenetramo-nos.

Por isso, já não basta dizer que devemos preocupar-nos com as gerações futuras; exige-se ter consciência de que é a nossa própria dignidade que está em jogo. Somos nós os primeiros interessados em deixar um planeta habitável para a humanidade que nos vai suceder. Trata-se de um drama para nós mesmos, porque isto chama em causa o significado da nossa passagem por esta terra.

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O Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) é um instrumento econômico que se apresenta como uma alternativa de política pública para lidar com a crescente degradação dos ecossistemas. Sob essa perspectiva, o PSA busca incentivar todo aquele que, em virtude de suas práticas de conservação, proteção, manejo e recuperação de ecossistemas, mantém ou incrementa o fornecimento de um serviço ecossistêmico. No entanto, apesar de uma aplicação extensiva do instrumento nas últimas décadas, as evidências de sua eficácia na promoção de conservação de ecossistemas ainda permanecem inconclusivas. Isso ocorre devido à ausência de rigorosas avaliações de impacto e ao fato de que, em muitos casos, os pagamentos são realizados para provedores de serviços ambientais que teriam mantido os ecossistemas intactos de qualquer modo, mesmo na ausência de pagamentos, uma vez que as terras apresentam um baixo custo de oportunidade de uso do solo. A literatura recente tem demonstrado que considerar as interações espaciais na paisagem e a heterogeneidade espacial de custos, benefícios e ameaças relacionados ao serviços ecossistêmicos pode ser uma estratégia valiosa para aprimorar o desempenho de programas de PSA ao redor do mundo. Nesse contexto, a presente investigação objetiva compreender como o uso de informações espaciais no desenho e implementação de esquemas de PSA pode contribuir para o aumento da eficácia do instrumento. Para isso, utiliza-se como método de pesquisa uma revisão crítica da literatura específica, com base em artigos publicados em periódicos científicos indexados nas áreas de economia e ecologia relacionados ao tema. Os resultados apontam para uma série de recomendações específicas de desenho e implementação dos programas, visando uma aplicação mais eficaz dos recursos, incluindo: (1) segmentação espacial; (2) diferenciação de pagamento; (3) monitoramento da condicionalidade; e (4) bônus de aglomeração. Embora haja trade-offs entre os custos da informação extra gerada (por exemplo, dados biofísicos, econômicos e sociais) e resultados mais eficazes, a simplificação excessiva do mecanismo de PSA pode resultar em baixo custo-benefício e induzir a erros no processo de tomada de decisão. Ainda, evidências empíricas mostram que os benefícios gerados pelo uso das informações adicionais superam os custos da

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dados, incertezas, percepções de justiça e trade-offs associados à eficácia e equidade. Ainda, considerar o contexto econômico, social e as especificidades ecológicas locais é essencial para escolher o desenho do programa de PSA mais adequado para obter o máximo impacto na conservação. A coleta de dados ecológicos e econômicos de monitoramento dos programas pode favorecer o acompanhamento dos resultados das ações de conservação e permitir ajustes ao longo do tempo que se adequem a cada realidade local. Por fim, deve-se dar ênfase ao processo de desenho de políticas, para entender em que condições o PSA pode contribuir significativamente para a conservação dos ecossistemas, como uma opção dentre um conjunto diverso de soluções específicas para cada contexto.

Palavras-chave: Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), eficácia, adicionalidade, análise espacial, pagamentos diferenciados.

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Payment for Environmental Services (PES) is an economic instrument that consists on a public policy alternative to deal with the increasing degradation of ecosystems. From this perspective, the PSA seeks to encourage anyone who, through its ecosystem conservation, protection, management, and restoration practices, maintains or enhances the provision of an ecosystem service. However, despite widespread application of the instrument in recent decades, evidence of its effectiveness in promoting ecosystem conservation still remains inconclusive. This is due to the lack of rigorous impact assessments and the fact that, in many cases, payments are made to environmental service providers who would have kept ecosystems intact anyway, even in the absence of payments, due to low opportunity costs of land use. Recent literature has shown that considering spatial interactions in the landscape and the spatial heterogeneity of costs, benefits, and threats related to ecosystem services can be a valuable strategy for enhancing the performance of PES programs around the world. In this context, the present investigation aims to understand how the use of spatial information in the design and implementation of PES schemes can contribute to increase the effectiveness of the instrument. A critical review of the specific literature was conducted, based on articles published in indexed scientific journals in the economics and ecology related areas. The main program design and implementation recommendations for more effective application of resources include: (1) spatial targeting; (2) payment differentiation; (3) monitoring conditionality; and (4) agglomeration bonus. While there are trade-offs between the costs of extra information generated (e.g. biophysical, economic and social data) and more effective outcomes, over-simplification of the PES mechanism can be ineffective and lead to errors in the decision making process. Moreover, empirical evidence shows that the benefits generated by using additional information outweigh the costs of implementing these strategies. Key challenges in maximizing the cost-effectiveness of PSA through spatial analysis include lack of data, uncertainties, perceptions of fairness, and trade-offs associated with effectiveness and equity. Also, considering the economic, social context, and local ecological specificities is essential to choosing the most appropriate PES program design for maximum conservation impact. The collection of ecological

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should be placed on the policy design process to understand under what conditions PES can contribute significantly to ecosystem conservation as an option among a diverse set of context-specific solutions.

Key-words: payment for environmental services (PES), effectiveness, additionality, spatial analysis, payment differentiation

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Figura 1. A relação entre estrutura, função e bem-estar humano. ... 21

Figura 2. Classificação de bens e serviços de acordo com os critérios de rivalidade e

excludibilidade. ... 27

Figura 3. Curva de custo de oportunidade e curva de oferta de serviços ambientais em

caso hipotético. ... 43

Figura 4. Possíveis relações espaciais de serviços ecossistêmicos entre área de

provisão (P) e benefício (B). ... 53

Figura 5. Características espaciais da provisão de serviços ambientais que motivam a

incorporação de informações geográficas em sistemas econômicos e ambientais. ... 60

Figura 6. Resumo das recomendações para projetos de PSA, benefícios potenciais e

limitações de acordo com o tipo de informação espacial disponível. ... 69

Quadro 1. Categorias de serviços ecossistêmicos. ... 24

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INTRODUÇÃO ... 15

CAPÍTULO 1 FUNDAMENTOS DA ECOLOGIA E DA ECONOMIA AMBIENTAL ... 18

1.1 ECOSSISTEMA, FUNÇÕES E SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS: DO QUE ESTAMOS FALANDO? ... 18

1.2 SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS E A AGENDA POLÍTICA ... 22

1.3 DIFERENÇAS ENTRE SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS E SERVIÇOS AMBIENTAIS ... 24

1.4 FALHAS DE MERCADO ... 26

1.4.1 Bens públicos puros, bens de clube e bens de propriedade comum ... 27

1.4.2 Externalidades ... 29

1.4.3 Direitos de propriedade incompletos ... 31

1.4.4 Informação assimétrica ... 32

1.5 PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS: DEFINIÇÕES E CONCEITOS ... 33

1.6 COMENTÁRIOS CONCLUSIVOS ... 36

CAPÍTULO 2 AVALIAÇÃO DE EFICÁCIA E ADICIONALIDADE EM PROGRAMAS DE PSA... 38

2.1 AVALIAÇÕES DE EFICÁCIA EM PROGRAMAS DE PSA ... 38

2.2 ADICIONALIDADE, SELEÇÃO ADVERSA E COMPENSAÇÃO EXAGERADA ... 41

2.3 AVALIAÇÕES DE IMPACTO DE PROGRAMAS DE PSA E SEUS RESULTADOS 43 2.4 INCORPORAÇÃO DE INFORMAÇÕES ESPACIAIS E A EFICÁCIA DO PSA ... 46

2.5 COMENTÁRIOS CONCLUSIVOS ... 47

CAPÍTULO 3 DIMENSÃO ESPACIAL DO PSA: UMA ESTRATÉGIA PARA AUMENTO DA EFICIÊNCIA E EFICÁCIA ... 49

3.1 DINÂMICA ESPACIAL DOS SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS ... 50

3.1.1 Oferta de serviços ecossistêmicos ... 50

3.1.2 Demanda por serviços ecossistêmicos ... 52

3.1.3 Fluxo de serviços ecossistêmicos ... 55

3.1.4 Conectividade ... 56

3.1.5 Aglomeração espacial ... 58

3.2 CARACTERÍSTICAS ESPACIAIS DA PROVISÃO DE SERVIÇOS AMBIENTAIS 58 3.2.1 Heterogeneidade espacial de custos, benefícios e ameaça ... 61

3.2.2 Efeitos de transbordamento e vazamento ... 62

3.2.3 Efeito de limiar ... 65

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4.1 PRIORIZAÇÃO ESPACIAL (“SPATIAL TARGETING”) ... 68

4.1.1 Priorização com foco em benefício (benefit-targeting) ... 70

4.1.2 Priorização com foco em custos (cost-targeting) ... 71

4.1.3 Priorização com foco em benefício-custo (benefit-cost targeting) ... 71

4.1.4 Priorização com foco em ameaça (threat targeting) ... 72

4.2 PAGAMENTOS DIFERENCIADOS – ANÁLISE ESPACIAL DE CUSTOS E BENEFÍCIOS ... 74

4.3 MONITORAMENTO E CONDICIONALIDADE E O USO DE INFORMAÇÕES ESPACIAIS ... 75

4.4 BÔNUS DE AGLOMERAÇÃO ... 78

4.6 COMENTÁRIOS CONCLUSIVOS ... 80

CAPÍTULO 5 DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA A INCORPORAÇÃO DE INFORMAÇÕES ESPACIAIS EM ESQUEMAS DE PSA ... 81

5.1 OPORTUNIDADES PARA A INCORPORAÇÃO DE INFORMAÇÕES ESPACIAIS EM ESQUEMAS DE PSA ... 81

5.1.1 Adicionalidade ... 81

5.1.2 Eficiência e eficácia ... 84

5.2 DESAFIOS PARA A INCORPORAÇÃO DE INFORMAÇÕES ESPACIAIS EM ESQUEMAS DE PSA ... 86

5.2.1. Disponibilidade de dados e incerteza ... 86

5.2.2. Contexto político e institucional e trade-off entre múltiplos objetivos ... 88

5.2.3. Aspectos sociais e efeitos adversos ... 90

5.3 INFORMAÇÕES ESPACIAIS APRIMORAM A EFICÁCIA DE ESQUEMAS DE PSA? 93 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 100

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 103

APÊNDICE A – Resultados da análise bibliométrica ... 120

APÊNDICE B – Análise do Projeto de Lei nº 312/2015 à luz dos conceitos abordados ... 126

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INTRODUÇÃO

Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) é um instrumento econômico inovador que tem sido amplamente adotado nas últimas duas décadas como uma das possíveis respostas para lidar com a crescente degradação dos ecossistemas. Sob essa perspectiva, o PSA busca incentivar todo aquele que, em virtude de suas práticas de conservação, proteção, manejo e recuperação de ecossistemas, mantém ou incrementa o fornecimento de um serviço ecossistêmico.

Apesar do rápido crescimento do número de programas de PSA nos último anos, as evidências de sua eficácia como um instrumento de promoção de conservação de ecossistemas ainda permanecem inconclusivas. Isso acontece principalmente pela ausência de rigorosas avaliações de impacto e pelo fato de que, em muitos casos, os pagamentos são realizados para provedores de serviços ambientais que teriam mantido os ecossistemas intactos de qualquer modo, mesmo na ausência de pagamentos, uma vez que as terras apresentam um baixo custo de oportunidade de uso. Nesses casos, o PSA não apresenta nenhum valor adicional em termos de conservação ambiental.

A literatura recente tem demonstrado que o uso de informações espaciais no desenho e implementação de esquemas de PSA pode influenciar positivamente a adicionalidade e melhorar a eficácia ambiental do instrumento, enfatizando a aplicação de dados de oferta e demanda para a provisão de serviços ambientais. Nesse sentido, vários estudos apontam ganhos em eficiência, eficácia e adicionalidade por meio da incorporação de informações de custos, benefícios e ameaça à provisão de servios ambientais.

Sob essa perspectiva, a presente investigação visa compreender como o uso de informações espaciais no desenho e implementação de esquemas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) pode contribuir para o aumento da eficácia do instrumento. As análises e os resultados aqui apresentados geram recomendações para uma melhor aplicação dos recursos destinados aos programas de PSA implementados dentro e fora do Brasil.

Utiliza-se como método de pesquisa uma revisão crítica da literatura específica, com base em artigos publicados em periódicos científicos indexados nas áreas de economia e ecologia relacionados ao tema. Assim, foram utilizadas

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na Plataforma Scopus as seguintes palavras chave - em português e em inglês – para a busca de artigos e documentos recentes: “serviços ecossistêmicos”, “pagamento por serviços ambientais”, “falhas de mercado”, “adicionalidade”, “eficácia”, “eficiência”, “custo-eficácia”, “direcionamento espacial (spatial

targeting)”, “pagamentos diferenciados”, “monitoramento”, “avaliação de

impacto”, entre outras.

O estudo está dividido em cinco capítulos. O primeiro capítulo apresenta os fundamentos da ecologia e da economia ambiental relacionados ao PSA, incluindo a moldura conceitual que define funções e serviços ecossistêmicos e serviços ambientais e uma revisão das principais falhas de mercado associadas a provisão de serviço ambientais.

O segundo capítulo descreve as principais avaliações de impacto do PSA realizadas nos últimos anos, bem como os desafios de sua implementação, relacionados à ausência de métricas e cenários contrafactuais e à falta de adicionalidade e eficácia do instrumento relatada em muitos casos.

O terceiro capítulo apresenta os princípios da dinâmica espacial dos serviços ecossistêmicos, destacando a importância de considerar dados ecológicos e econômicos para melhor compreender a distribuição heterogênea da oferta, demanda e fluxo de serviços ecossistêmicos e as características da provisão de serviço ambientais que justificam o uso de informações espaciais para a gestão ambiental e para o desenho de esquemas de PSA.

O quarto capítulo é composto por uma revisão da literatura do planejamento espacial da conservação e do PSA, com foco nas recomendações e estratégias descritas na literatura com potencial de incrementar a eficácia do PSA por meio da incorporação de informações espaciais, incluindo seu potencial e suas limitações.

O quinto capítulo conclui com uma análise dos principais desafios, oportunidades e recomendações para a incorporação de informações espaciais no desenho e implementação de esquemas de PSA, incluindo questões políticas, técnicas e institucionais na fase do desenho e implementação que podem afetar a eficácia do PSA.

Por fim, o Apêndice A detalha os principais resultados encontrados na análise bibliométrica realizada com o objetivo de compreender a literatura sobre a dimensão espacial do PSA.

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Já o Apêndice B apresenta uma breve análise do teor do Projeto de Lei nº 312/2015 - recentemente aprovado na Câmara dos deputados - à luz da teoria econômica e dos principais conceitos abordados nesta dissertação.

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CAPÍTULO 1 FUNDAMENTOS DA ECOLOGIA E DA ECONOMIA AMBIENTAL

1.1 ECOSSISTEMA, FUNÇÕES E SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS: DO QUE ESTAMOS FALANDO?

“Um ecossistema consiste em todos os organismos – plantas, animais e microorganismos – que vivem em uma área, juntamente com o seu ambiente físico” (EHRLICH; EHRLICH, 1981, p. 78). Em outras palavras, os ecossistemas são definidos como unidades funcionais que incluem todas as interações entre uma comunidade biótica e seu ambiente abiótico, funcionando como um sistema ecológico complexo, que pode incluir milhares de tipos diferentes de organismos que vivem em uma grande variedade de ambientes individuais (ODUM; BARETT, 1972; RICKLEFS, 2008). Por exemplo, pode-se falar de um ecossistema florestal, um ecossistema da pradaria e um ecossistema estuarino como unidades distintas porque relativamente pouca energia e poucas substâncias são trocadas entre essas unidades em comparação com as inúmeras transformações que ocorrem em cada uma delas (RICKLEFS, 2008). O estudo de ecossistemas, por sua vez, lida com movimentos de energia e materiais e como esses movimentos são influenciados pelo clima e outros fatores físicos. A função do ecossistema reflete as atividades dos organismos, bem como as transformações físicas e químicas de energia e materiais no solo, atmosfera e água (RICKLEFS, 2008). Essas funções, que sustentam a vida na Terra, dependem de um equilíbrio muito delicado entre muitos processos ecológicos, incluindo processos de transformação, armazenamento e transferência de energia em cadeias alimentares; ciclos biogeoquímicos (por exemplo, a ciclagem de nitrogênio) e regulação do clima (DE GROOT; WILSON; BOUMANS, 2002). Sob essa perspectiva, cada tipo de organismo tem o seu papel no ecossistema e é - em certo grau – essencial para o contínuo funcionamento saudável do ecossistema (EHRLICH; EHRLICH, 1981).

O funcionamento dos ecossistemas em termos de prestação de serviços à humanidade foi descrita pela primeira vez no relatório Study of Critical Environmental Problems, por meio do termo “serviços ambientais” (environmental services) (BERNARDO, 2017; MOONEY; EHRLICH, 1997;

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STUDY OF CRITICAL ENVIRONMENTAL PROBLEMS, 1970). A partir desse marco, diversos trabalhos enfatizaram as relações de dependência entre as funções ecossistêmicas e o bem-estar humano, a fim de despertar o interesse da sociedade para a importância de conservar a integridade desses ecossistemas e processos naturais (EHRLICH; EHRLICH, 1981; WESTMAN, 1977). Esses trabalhos incluíam termos como “serviços da natureza” e “serviços públicos do ecossistema global”.

Em 1981, surge o termo “serviços ecossistêmicos” (ecosystem services), elaborado por Ehrlich e Ehrlich (1981), ressaltando o valor social de funções da natureza. Esse trabalho teve como propósito discutir como a perda da biodiversidade1 poderia comprometer a provisão desses serviços críticos para a humanidade e se esses seriam substituíveis por soluções tecnológicas (BERNARDO, 2017; EHRLICH; EHRLICH, 1981; GÓMEZ-BAGGETHUN et al., 2010; MOONEY; EHRLICH, 1997).

No entanto, os termos "função do ecossistema” e “serviços ecossistêmicos” têm sido sujeito a várias, e às vezes, contraditórias interpretações (BOYD; BANZHAF, 2007; DAILY, 1997; DE GROOT; WILSON; BOUMANS, 2002; FISHER; TURNER; MORLING, 2009).

Por um lado, a visão biocêntrica, oriunda da ecologia, descreve “função do ecossistema” como funcionamento interno do ecossistema (ex.: manutenção de fluxos de energia e ciclagem de nutrientes), independente se esses processos são diretamente úteis ou não para os seres humanos (BERNARDO, 2017; DAILY, 1997; EHRLICH; EHRLICH, 1981; GÓMEZ-BAGGETHUN et al., 2010; KANDZIORA; BURKHARD; MÜLLER, 2013; WESTMAN, 1977).

Por outro lado, a visão antropocêntrica, oriunda da economia, define “função do ecossistema” como a capacidade dos processos naturais e componentes de fornecer bens e serviços que satisfaçam as necessidades humanas, direta ou indiretamente (ex.: fornecimento de água potável e tratamento de resíduos) (COSTANZA et al., 1998; DE GROOT; WILSON; BOUMANS, 2002; FISHER; TURNER; MORLING, 2009).

1 A biodiversidade é definida como a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2000).

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Da mesma forma, o conceito de “serviços ecossistêmicos” apresenta divergências relevantes. Na visão ecológica, esses serviços são provenientes de conjunto dos processos energéticos e dos fluxos de matéria (KANDZIORA; BURKHARD; MÜLLER, 2013) e são definidos como “as condições e processos por meio dos quais os ecossistemas naturais e as espécies que os compõem, sustentam e preenchem a vida humana” (DAILY, 1997). Já os “bens ecossistêmicos” – definidos como a estrutura ou estoque - são todos os organismos e fatores abióticos que o integram (ex.: produtos florestais e madeireiros (WESTMAN, 1977).

No entanto, o uso do termo serviços ecossistêmicos foi também uma tentativa abrangente de reformular as preocupações ecológicas em termos econômicos para aprimorar a proteção ambiental, com um foco utilitarista e/ou antropocêntrico (ARMSWORTH et al., 2007; PETERSON et al., 2010). Por exemplo, De Groot, Wilson e Boumans (2002) associam serviços ecossistêmicos a funções de valor ao ser humano. Em consonância com essa definição, Fisher, Turner e Morling (2009) definem serviços ecossistêmicos como os aspectos dos ecossistemas utilizados (ativa ou passivamente) para produzir o bem-estar humano.

Ademais, Boyd e Banzhaf (2007) definem serviços ecossistêmicos como “os componentes ecológicos diretamente consumidos ou desfrutados para produzir o bem-estar humano” (incluindo estrutura e funções dos ecossistemas). Esses autores fazem ainda uma distinção entre benefícios e serviços, onde o benefício seria o ponto onde o bem-estar humano é diretamente afetado e o ponto em que outras formas de capital (construídas, humanas e sociais) provavelmente são necessárias para obter o ganho em bem-estar. Por exemplo, a ciclagem de nutrientes, que é um serviço de uso indireto gera o fornecimento de água limpa, que é um serviço de uso direto. Quando consumida para beber, essa água limpa torna-se um benefício, que requer ferramentas e conhecimento de extração (BOYD; BANZHAF, 2007).

De modo geral, uma função ecossistêmica gera um determinado serviço ecossistêmico quando os processos naturais geram benefícios apropriáveis pelo ser humano, incorporando a noção de utilidade aos ecossistemas (DAILY, 1997). Assim, as funções ou processos se tornam serviços se houver seres humanos que se beneficiem deles. Sem beneficiários humanos eles não são serviços

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(FISHER; TURNER; MORLING, 2009). No entanto, discernir as complexas interações entre estrutura, processo e serviço é uma tarefa complicada pelo fato de os ecossistemas não são fenômenos lineares, mas sim “sistemas complexos”(FISHER; TURNER; MORLING, 2009).

Haines-Young e Potschin (2010) propõem uma forma de representar a lógica que baseia o paradigma dos serviços ecossistêmicos (Figura 1). Esse diagrama faz uma distinção entre as estruturas e os processos ecológicos gerados pelos ecossistemas e os benefícios que as pessoas obtêm a partir deles.

Figura 1. A relação entre estrutura, função e bem-estar humano.

Fonte: Adaptado de Haines-Young e Potschin (2010).

A presença de estruturas ecológicas como florestas e pântanos em uma bacia hidrográfica pode ter a capacidade (função) de retardar a passagem das águas superficiais. Esta função pode ter o potencial de modificar a intensidade da inundação. No entanto, se essa função é considerada um serviço ou não, depende se o 'controle de inundação' é considerado um benefício. As pessoas ou a sociedade valorizam essa função de maneira diferente em lugares diferentes e em momentos diferentes. Portanto, ao definir quais são as funções "significativas" de um ecossistema e o que constitui um "serviço ecossistêmico",

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é importante entender o contexto espacial (localização geográfica), as escolhas e os valores sociais (monetários e não monetários), e o conhecimento sobre a estrutura e dinâmica dos próprios sistemas ecológicos (HAINES-YOUNG; POTSCHIN, 2010).

1.2 SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS E A AGENDA POLÍTICA

No início de sua aplicação, a lógica subjacente ao uso do conceito de serviços ecossistêmicos era principalmente pedagógica. Essa lógica visava (e ainda visa) a demonstrar como o desaparecimento da biodiversidade afeta diretamente as funções do ecossistema que sustentam os serviços críticos para o bem-estar humano (GÓMEZ-BAGGETHUN et al., 2010).

No final da década de 90, alguns autores já ressaltavam que a pouca ênfase na proteção dos sistemas naturais ocorria, em grande parte, porque os seres humanos ainda não entendiam nem apreciavam seu valor e que esse desconhecimento acerca dos serviços dos ecossistemas naturais representava o fracasso dos ecologistas em comunicar suas descobertas ao público em geral. Haveria, portanto, uma necessidade vital de traduzir essas informações para o público em geral, bem como para os formuladores de políticas, de maneira a estimular a ação necessária para preservar os recursos naturais do planeta. (DAILY, 1997; MOONEY; EHRLICH, 1997).

No final da década de 90 e início dos anos 2000, o conceito de serviços ecossistêmicos foi gradualmente sendo incorporado na agenda política. A crescente degradação e o uso insustentável de ecossistemas em todo o mundo despertou o interesse de incorporá-los às decisões de conservação e gestão (CHAN et al., 2006; GÓMEZ-BAGGETHUN et al., 2010; MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005). Demonstrar a influência muitas vezes ignorada entre a natureza e os elementos do bem-estar - água potável, alimentos, combustível, controle de enchentes e benefícios estéticos e culturais - seria a chave tornar a conservação relevante e possível (ARMSWORTH et al., 2007).

Sob essa perspectiva, a Avaliação Ecossistêmica do Milênio foi um marco que firmou o conceito de serviços ecossistêmicos na agenda política (MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005). Ela foi a primeira avaliação

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global abrangente das implicações da mudança do ecossistema para as pessoas. Seu objetivo central foi avaliar as consequências da degradação dos ecossistemas para o bem-estar humano e a base científica necessária para melhorar a conservação e o uso sustentável desses ecossistemas. O trabalho envolveu mais de 1.300 especialistas internacionais e resultou em uma série de publicações em 2005 que descreviam as condições e tendências dos principais ecossistemas e serviços do mundo, e as opções disponíveis para restaurar, conservar ou aprimorar seu uso sustentável (MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005).

A principal conclusão do relatório foi que 60% dos serviços ecossistêmicos avaliados estavam sendo degradados ou usados de maneira insustentável, com importantes implicações para o desenvolvimento, o alívio da pobreza e as estratégias necessárias para que as sociedades lidem e se adaptem a mudanças ambientais de longo prazo (HAINES-YOUNG; POTSCHIN, 2010; MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005).

Desde a Avaliação Ecossistêmica do Milênio, várias outras iniciativas internacionais que trabalham com o conceito surgiram, especialmente com foco de demonstrar o impacto econômico da perda de biodiversidade e dos ecossistemas e elaborar análises custo-benefício em escala global. Alguns exemplos relevantes são o Relatório Stern sobre Economia das Mudanças Climáticas e iniciativas relacionadas com a Convenção de Diversidade Biológica das Nações Unidas2, como a iniciativa “A Economia dos Ecossistemas e da

Biodiversidade”3, que visou estimar os custos da perda de serviços

ecossistêmicos provenientes da inação humana para combater a perda global de biodiversidade (GÓMEZ-BAGGETHUN et al., 2010; TEEB, 2008).

Ademais, a Avaliação Ecossistêmica do Milênio também definiu quatro categorias para os serviços ecossistêmicos (MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT, 2005) (Quadro 1).

2 www.cbd.int 3 www.teebweb.org

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Quadro 1. Categorias de serviços ecossistêmicos.

Serviços de provisão Produtos obtidos dos ecossistemas

(ex.: alimentos, água para consumo humano, madeira e recursos genéticos)

Serviços de regulação Benefícios obtidos da regulação de processos

ecossistêmicos (ex.: regulação do clima, purificação da água, polinização).

Serviços culturais Benefícios imateriais obtidos dos ecossistemas

(ex.: benefícios espirituais e religiosos; educacionais e cênicos).

Serviços de suporte Serviços necessários para a produção de todos os

outros serviços ecossistêmicos (ex.: formação de solo, ciclagem de nutrientes).

Fonte: Avaliação Ecossistêmica do Milênio (2005).

Diversas outras categorizações foram propostas ao longo dos últimos anos (COSTANZA, 2008; DE GROOT; WILSON; BOUMANS, 2002; FISHER; TURNER; MORLING, 2009; KANDZIORA; BURKHARD; MÜLLER, 2013). Como não há um único sistema de classificação capaz de atender a todas as demandas, compreender o contexto social e a finalidade da aplicação da classificação (ex.: fins educacionais, uso dos dados para análise custo-benefício; gestão da paisagem ou políticas de equidade) é fundamental para garantir uma aplicação eficiente e evitar dupla contagem (FISHER; TURNER; MORLING, 2009).

1.3 DIFERENÇAS ENTRE SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS E SERVIÇOS AMBIENTAIS

Os termos “serviços ecossistêmicos” e “serviços ambientais” têm sido amplamente utilizados como sinônimos na literatura acadêmica e em programas de gestão ambiental (GUEDES; SEEHUSEN, 2011; PAGIOLA; PLATAIS, 2002; TITO; ORTIZ, 2013; WUNDER, 2005). Todavia, existe a necessidade de diferenciar os dois termos para que possam ser submetidos a análises eficazes e sistemáticas (BERNARDO, 2017).

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O conceito de serviços ecossistêmicos veio da Ecologia, enquanto o conceito de “serviços ambientais”, surgiu a partir de um enfoque interdisciplinar com o objetivo de ressaltar os efeitos que as atividades humanas causaram sobre o meio ambiente (BERNARDO, 2017; EHRLICH; EHRLICH, 1981; STUDY OF CRITICAL ENVIRONMENTAL PROBLEMS, 1970). Ademais, apesar dos serviços ecossistêmicos serem fornecidos diretamente pela natureza, o tipo, a qualidade e a quantidade dos serviços são afetados pelas decisões tomadas pelos usuários de recursos naturais (JACK; KOUSKY; SIMS, 2008). Deste modo, os proprietários rurais são, em última análise, os agentes econômicos que garantem a oferta de serviços ecossistêmicos e suas ações que levam a essa garantia seriam componentes dos serviços ambientais (NOGUEIRA, 2013).

Sob essa perspectiva, segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (2007), “serviços ambientais” são resultado de uma ação humana que gera um impacto positivo sobre o ecossistema, sendo, portanto, uma subcategoria de “serviços ecossistêmicos” (FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS, 2007). Deste modo, se por um lado, o termo “serviços ecossistêmicos” se refere ao produto das funções e processos ecológicos, por outro lado, “serviços ambientais” são os serviços prestados por pessoas para a manutenção ou a melhoria de um dado serviço ecossistêmico (DAILY, 1997; KARSENTY; EZZINE-DE-BLAS, 2016).

Assim, os seres humanos obtêm benefícios diretamente do meio ambiente (serviços ecossistêmicos provenientes de ecossistemas naturais) e quando intervémna paisagem, por meio dos serviços ambientais (BERNARDO, 2017).

A rápida degradação dos ecossistemas pode, em parte, ser explicada pelo fato de que muitos dos serviços ambientais não se refletem em transações de mercado e não são incorporados nos preços das transações entre seus ofertantes e seus demandantes. No jargão econômico, serviços ambientais são afetados pelas chamadas “falhas de mercado”. Deste modo, ineficácias no comunicar das preferências individuais de uma sociedade podem levar a uma provisão sub-ótima desses serviços (LANDELL-MILLS; PORRAS, 2002). Compreender essas características, portanto, é fundamental para avaliar, gerenciar, manter ou restaurar os serviços ecossistêmicos (FISHER; TURNER; MORLING, 2009).

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1.4 FALHAS DE MERCADO

A economia neoclássica demonstra – a partir do primeiro teorema da economia do bem-estar - que, sob certas condições e hipóteses, o funcionamento de mercados livres conduz a alocações eficientes de recursos escassos na economia (PINDYCK; RUBINFELD, 2006) Assim, os agentes econômicos, maximizando utilidades e lucros, tenderão a gerar nos mercados um conjunto de preços de bens e serviços que conduzirá à eficiência na alocação de recursos (MUELLER, 2007). Para que isso ocorra, uma série de condições (ou arranjos institucionais) deve existir.

Esses arranjos institucionais incluem: (i) mercados existentes para todos bens e serviços produzidos; (ii) mercados perfeitamente competitivos; (iii) informação completa; (iv) direitos de propriedade bem definidos; (v) ausência de externalidades; (vi) bens e serviços privados (não há bens públicos); e (vii) funções de produção e de utilidade bem-comportadas (PERMAN et al., 2003). Nesse caso, a eficiência econômica completa é alcançada, já que os recursos são alocados de modo que nenhuma realocação possa melhorar a situação de um indivíduo sem piorar a situação de outro. Em outras palavras, a eficiência econômica completa prevalece quando o ótimo de Pareto é alcançado (TISDELL, 2005).

No entanto, esse situação ideal de uma economia de mercado perfeita é baseada em hipóteses que originam um paradigma interessante mas que está sujeito a falhas de diversos tipos no mundo real (MUELLER, 2007; STERNER; CORIA, 2012). Deste modo, quando os mercados deixam de operar de maneira eficiente, ou seja, quando os preços inexistem ou falham em comunicar as preferências individuais de uma sociedade, temos uma situação chamada de falha de mercado (LANDELL-MILLS; PORRAS, 2002).

Fontes importantes de falha de mercado no uso e na conservação da natureza incluem: (1) a existência de bens públicos; (2) a presença de externalidades; (3) direitos de propriedade mal definidos; (4) a existência de bens de propriedade comum; (5) mercados incompletos; e (6) informações imperfeitas (ou assimétricas) (STERNER; CORIA, 2012; TISDELL, 2005).

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1.4.1 Bens públicos puros, bens de clube e bens de propriedade comum

Bens privados possuem duas propriedades que os tornam apropriados para o mercado: são rivais e excludentes (FISHER; TURNER; MORLING, 2009) Rival significa que se uma pessoa consome determinado bem ou serviço, outra pessoa não pode consumi-lo. Excludente significa que as pessoas podem ser excluídas de seu consumo. Exemplos de bens e serviços proveninentes dos ecossistemas que são considerados privados incluem alimentos, madeira e recursos medicinais, que são negociados em mercados convencionais (HALL; LIEBERMAN, 2002; PINDYCK; RUBINFELD, 2006).

Todavia, nem todos os bens e serviços ecossistêmicos são rivais e excludentes. De fato, existe um espectro de rival para não rival e de excludente para não excludente, conforme demonstrado na Figura 2. Alguns bens que são não rivais em baixos níveis de uso podem se tornar bens rivais em altos níveis de uso.

Figura 2. Classificação de bens e serviços de acordo com os critérios de rivalidade e excludibilidade.

Fonte: Adaptado de Fisher; Turner e Morling, 2009.

Os bens de clube são bens não-rivais mas excludentes. Por exemplo, as informações que obtemos da natureza (por exemplo, biomimética) não são rivais, pois se um indivíduo usa as informações, não haverá menos informações para outros indivíduos. No entanto, é impossível impedir o uso da informação por

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meio de uma patente (FISHER; TURNER; MORLING, 2009). Outro conjunto de bens são bens de propriedade comum, que são rivais, mas não excludentes. Por exemplo, a pesca em alto mar é um exemplo, já que o uso da pesca deixa menos recursos disponíveis para outros indivíduos (rival), mas impedir o acesso em alto mar é impossível ou envolve altos custos (não excludente). Consequentemente, esses recursos tendem a ser utilizados em excesso (PINDYCK; RUBINFELD, 2006).

Finalmente, existem bens públicos puros, que são rivais e não-excludentes. Por exemplo, a capacidade da atmosfera (com suas interações bióticas e abióticas) de proteger as pessoas da radiação UV gera um benefício onde o uso de um indivíduo não impede o uso de outros indivíduos e não há como impedí-los de usá-lo (FISHER; TURNER; MORLING, 2009). Outros exemplos de bens públicos incluem o ar limpo e o valor de existência de uma espécie (STERNER; CORIA, 2012; TISDELL, 2005).

No caso dos bens públicos puros, em muitos casos, quando os direitos de propriedade não estão definidos de forma apropriada, não há possibilidade de excluir a ação de terceiros em determinado território. Assim, é comum haver o comportamento de pessoas que usufrem do bem sem arcar com seus custos (os chamados “free-riders”), o que estimula uma oferta do bem abaixo do ótimo social.

Deste modo, políticas públicas são necessárias para a regulação da oferta de serviços de bens públicos, para garantir que um bem público seja ofertado em uma quantidade na qual iguale o benefício marginal de demandá-lo com o custo marginal de ofertá-lo, seja por meio de financiamento/pagamento desse bem ou de coleta de tributos pelo seu uso (TISDELL, 2005). Assim, a intervenção do governo para conservar os ecossistemas pode ser necessária para aumentar a eficiência econômica4. Além disso, a intervenção estatal também pode ocorrer

4 Embora a intervenção do governo possa levar a uma melhoria social no caso das falhas de mercado, essa intervenção do governo nem sempre é eficaz devido aos custos de transação envolvidos na execução de políticas e ineficiências relacionadas a burocracias com excesso de pessoal, informações imperfeitas e baixos níveis de motivação e orçamento(LANDELL-MILLS; PORRAS, 2002). Assim, a mera existência de uma falha de mercado não garante automaticamente a implementação de uma determinada política, porque os custos de falhas de mercado devem ser ponderados em relação ao potencial de "falhas de política". Essa comparação deve ser realizada dentro do contexto específico da formulação geral de políticas no país e da economia a ser estudada (STERNER; CORIA, 2012).

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para melhorar a distribuição de renda, diminuir riscos e incertezas e garantir a sustentabilidade. No entanto, isso será feito apenas se os custos da intervenção do governo não excederem os benefícios que serão obtidos (TISDELL, 2005).

No caso dos bens de recurso comum, o comportamento de carona também pode levar ao uso excessivo de recursos comuns, a menos que as instituições sejam fortes o suficiente para limitar o acesso dos usuários. (STERNER; CORIA, 2012). De fato, o fator determinante para o tipo de exploração (sustentável ou não) são as instituições sociais e as regras estabelecidas para o uso daqueles recursos (CIRIACY-WANTRUP, 1971).

Nesse contexto, Ostrom (1990) evidencia alguns exemplos ao longo da história onde a propriedade comum possibilitou um uso sustentável do recurso, no caso de adequados arranjos institucionais. A autora apresenta soluções alternativas à visão polarizada entre Estado e mercado, sustentando a hipótese de que a governança da comunidade pode ser um meio eficiente de gerir a utilização de propriedade (OSTROM, 1990; ROSENBERG, 2012). Por outro lado, em muitos casos a governança de recursos compartilhados falha em garantir a sustentabilidade dos recursos renováveis, como, por exemplo, no caso de uma comunidade local que não leva em consideração os impactos do uso dos recursos em outras comunidades (TISDELL, 2005).

1.4.2 Externalidades

Sem o direito de propriedade claramente definido e com alto custo de excluir um agente de exercer suas atividades, é comum que um agente tome decisões sem arcar com todas as consequências de suas ações, o que é definido como uma externalidade (TIETENBERG; LEWIS, 2015). Isso acontece por que existe uma diferença entre benefícios privados e sociais. Ou seja, valiosos serviços - como a regulação do clima e da qualidade da água; manutenção da biodiversidade e benefícios estéticos, recreacionais e culturais - são frequentemente externos aos mercados e, portanto, subestimados por decisões gerenciais que maximizam o lucro (ALSTON; ANDERSSON; SMITH, 2013; EUROPEAN COMISSION, 2008; JACK; KOUSKY; SIMS, 2008).

De fato, a principal característica das externalidades é que há bens com os quais as pessoas se importam e que não são providos de forma eficiente pelo

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mercado (VARIAN, 2006). Assim, as externalidades ocorrem quando custos são impostos a terceiros sem que sejam totalmente compensados ou quando os benefícios são recebidos por indivíduos que não pagam integralmente por eles (TISDELL, 2005). As externalidades podem ser positivas (no caso de ações que promovem aumento do bem-estar social por meio de ações privadas, como por exemplo, conservação de florestas) ou negativas (no caso de efeitos sociais negativos gerados por determinada atividade, como a poluição) (BERNARDO, 2017).

Como as externalidades não se refletem nos preços de mercado, elas podem se tornar uma causa de ineficiência econômica (PINDYCK; RUBINFELD, 2006). Esse é o caso de diversos serviços ecossistêmicos que não são transacionados no mercado e em muitos casos não possuem preço observável (LANDELL-MILLS; PORRAS, 2002; PETERSON et al., 2010). Por exemplo, os agricultores muitas vezes recebem poucos benefícios da proteção da floresta dentro de suas terras, especialmente quando comparados a usos alternativos da terra, como a conversão para terras agrícolas ou pastagens. Por outro lado, suas práticas de conservação geram benefícios sociais externos, como o controle da erosão e o sequestro de carbono (ENGEL; PAGIOLA; WUNDER, 2008).

Uma intervenção governamental pode minimizar o problema das externalidades e aumentar a eficiência na provisão dos bens e serviços ecossistêmicos, na forma de regulamentação, impostos/subsídios, fortalecimento de direitos de propriedade, licenças negociáveis, facilitação de negociação privada, entre outros (TISDELL, 2005). Mueller (2007) divide essas intervenções em duas categorias principais de políticas ambientais: (1) políticas de comando e controle, apoiada em leis, decretos, tratados, etc e (2) políticas de estímulo de mercado, como, por exemplo, o tributo pigouviano e as licenças negociáveis.

Para solucionar o problema das externalidades, pode-se distinguir dois enfoques alternativos: o pigouviano e o coaseano. A proposta de taxação foi apresentada por Arthur Pigou (1932) e dominou o debate econômico sobre como o governo deveria agir para solucionar as falhas de mercado até a década de 1960 (ROSENBERG, 2012). Para esse autor, a melhor soluçao para internalizar externalidades era por meio de uma intervenção do Estado na economia, taxando as atividades que gerassem externalidades negativas (VARIAN, 2006).

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Por outro lado, Coase (1960) criticou o tributo pigouviano, sugerindo que taxar o gerador da externalidade nem sempre é a solução mais eficiente. O teorema de Coase (1960) sugere que os proprietários poderiam alcançar uma solução ótima para o problema, ou seja, aquela que maximiza os ganhos sociais por meio de uma negociação privada (COASE, 1960). Sob essa perspectiva, se o custo de organizar a atividade econômica fosse baixo, os direitos de propriedade bem definidos e os agentes livres para negociar, os agentes só parariam de negociar quando atingissem uma alocação eficiente de recursos.

Por exemplo, se o problema envolve um gado que destrói a plantação do terreno vizinho, a construção de uma cerca na área de pecuária ou o abandono da área de cultivo poderiam ser soluções negociadas entre os proprietários, sem a necessidade de uma intervenção estatal (COASE, 1960). Essa ideia é criticada especialmente por que no caso de mercado amplo com muitos agentes envolvidos, a complexidade e os custos de negociação poderiam ser altos e afetariam o alcance de um resultado eficiente (HANLEY; SHOGREN; WHITE, 2007; PERMAN, 2003).

1.4.3 Direitos de propriedade incompletos

Hanley, Shogren e White (2007) reconhecem os direitos de propriedade bem definidos como condição para a existência de uma alocação eficiente de recursos. Um sistema de direito de propriedade, portanto, representa uma série de direitos (de propriedade privada ou coletiva) que define os privilégios e obrigações do proprietário para o uso do ativo ou recurso (HANLEY; SHOGREN; WHITE, 2007). Para serem caracterizados como “bem-definidos”, esses direitos de propriedade devem: (i) estar totalmente atribuídos aos agentes (privados ou coletivos); (ii) garantir os custos e benefícios do uso dos recursos exclusivamente aos proprietários; (iii) ser transferíveis de um proprietário para o outro de forma voluntária; e (iv) estar seguros contra invasões e confisco (CIRIACY-WANTRUP, 1971; HANLEY; SHOGREN; WHITE, 2007).

Em muitos casos, externalidades podem ser vistas como conseqüências de direitos de propriedade incompletos. Por exemplo, práticas agrícolas inadequadas podem gerar erosão do solo, causando prejuízo à água coletada pelos proprietários vizinhos à justante. Se os proprietários à justante tivessem

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direito à água limpa, esses proprietários poderiam processar aqueles que causaram a erosão do solo e assim internalizar os efeitos (STERNER; CORIA, 2012). De fato, em muitos casos é difícil atribuir direitos de propriedade bem definidos a atributos ambientais como ar limpo. Outra dificuldade está em estabelecer nitidamente os responsáveis e os prejudicados pela poluição (MUELLER, 2007).

1.4.4 Informação assimétrica

Em muitos casos, o comprador e o vendedor possuem informações diferentes sobre uma transação, gerando uma falha de mercado conhecida como “informação assimétrica” (PINDYCK; RUBINFELD, 2006). Nesse caso, um agente econômico possui uma informação de interesse de outro agente, mas não tem incentivos para comunicá-la (VARIAN, 2006), o que pode afetar o nível de demanda e oferta e gerar uma quantidade produzida abaixo do ótimo de mercado.

A assimetria de informações pode causar duas falhas de mercado distintas, conhecidas como seleção adversa e risco moral (FERRARO, 2008) No caso da seleção adversa, a omissão se dá antes da realização da transação, de maneira que a informação negligenciada, embora seja de importância fundamental, não é considerada no fechamento do acordo (ROSENBERG, 2012, p. 30).

Por exemplo, consumidores podem estar poucos dispostos a pagar um preço adicional por um produto orgânico, já que eles não têm certeza se, de fato, trata-se de um produto orgânico. Como resultado, tanto o lucro como a quantidade produzida estariam em nível ineficientemente baixo (TIETENBERG; LEWIS, 2015). Uma solução potencial para esse exemplo de seleção adversa seria dispor de um mecanismo de certificação para que o consumidor tivesse informações mais confiáveis sobre a procedência dos produtos (HANLEY; SHOGREN; WHITE, 2007).

Já o risco moral surge após a realização da transação. Nesse caso, um agente econômico pode se beneficiar da ausência de verificação de conformidade do contrato, e tentar maximizar sua utilidade evitando o cumprimento de suas responsabilidades contratuais (FERRARO, 2008).

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A compreensão das assimetrias de informação não apenas auxilia a projetar instrumentos de política para resolver as dificuldades de monitoramento; também está no cerne do dilema mais essencial: como promover objetivos sociais, como a equidade, sem destruir os incentivos ao trabalho e à eficiência (STERNER; CORIA, 2012) Como os formuladores de políticas não possuem dados confiáveis sobre danos causados pela poluição e custos de redução, por exemplo, eles não podem elaborar políticas que sejam ao mesmo tempo eficientes (no que diz respeito à alocação de recursos) e justas (no compartilhamento dos encargos de todos os custos envolvidos).

Se os gestores políticos precisam da cooperação de indivíduos que têm informações “privilegiadas”, eles devem aceitar que esses indivíduos possam ganhar algo em troca da divulgação de informações (STERNER; CORIA, 2012). As implicações dessa falha para a gestão adequada dos serviços ecossistêmicos e serviços ambientais será discutida com mais detalhes nos Capítulos 2 e 4.

1.5 PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS: DEFINIÇÕES E CONCEITOS

Uma das possibilidades para solucionar a questão das externalidades e dos bens públicos é compensar os proprietários rurais pelos serviços ambientais fornecidos. Sob essa perspectiva, o pagamento por serviços ambientais (PSA) surge como uma das alternativas de políticas públicas possíveis para realinhar os benefícios sociais e privados resultantes de decisões relacionadas ao uso da terra, por meio de um incentivo de mercado para a manutenção privada de recursos naturais (ALSTON; ANDERSSON; SMITH; JACK; KOUSKY; SIMS, 2008).

De fato, muitos países tem desenvolvido programas de PSA em diferentes escalas para atingir uma variedade de serviços ecossistêmicos, incluindo serviços relacionados à água, seqüestro de carbono e biodiversidade (ALIX-GARCIA; SHAPIRO; SIMS, 2012; LIU et al., 2008; PAGIOLA, 2008; SIMS et al., 2014).

A ideia central do PSA é que beneficiários externos façam pagamentos diretos, voluntários, contratuais e condicionais aos proprietários de terras e usuários locais em troca da adoção de práticas que garantam a conservação e

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a restauração do ecossistema (WUNDER, 2005, 2015). Ou seja, que paguem pelos serviços ambientais desses proprietários.

A partir dessa definição, o mecanismo de PSA pode ser classificado como uma aplicação do Teorema de Coase (PATTANAYAK; WUNDER; FERRARO, 2010), segundo o qual transações voluntárias de mercado entre os atores sociais levam a uma alocação ótima de recursos, desde que os custos de transação sejam baixos e os direitos de propriedade estejam claramente definidos. Assim,

o papel do governo se restringiria à alocação inicial de direitos de propriedade e

a garantia de um ambiente legal onde os direitos de propriedade sejam exequíveis (COASE, 1960).

Na prática, no entanto, existem poucos exemplos de PSA em conformidade com o conceito teórico desenvolvido na literatura (LANDELL-MILLS; PORRAS, 2002; SCHOMERS; MATZDORF, 2013). Sob essa perspectiva, diversos autores afirmam a implementação do PSA tem se desviado substancialmente dos princípios baseados no mercado e poucos mecanismos podem ser considerados mercados puros (FLETCHER; BREITLING, 2012; MURADIAN et al., 2013). De fato, em vários casos o PSA se aproxima mais de um subsídio ambiental aos provedores de serviços ambientais, com recursos provenientes de taxas ou tarifas (ENGEL, 2016).

Desta forma, dois tipos básicos de PSA podem ser distinguidos. O primeiro tipo é o PSA coaseano, que resulta de uma negociação direta entre beneficiários e provedores de serviços ambientais. Um exemplo é o da empresa de engarrafamento de água Vittel (“o beneficiário”) que paga aos agricultores próximos (“os fornecedores”) pela adoção de práticas agrícolas que reduzem a poluição por nitratos. As condições para uma negociação coaseana entre os provedores e os beneficiários de serviços ambientais são frequentemente violadas na prática, porque os serviços são frequentemente bens públicos e os custos de transação das negociações podem ser altos (TACCONI, 2012).

Já o segundo tipo é o PSA pigouviano. Esse se assemelha a um subsídio ambiental, onde os pagamentos são feitos por um agência governamental com orçamento público (ENGEL, 2016). Alguns exemplos de PSA que se enquadram

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nessa categoria incluem esquemas nacionais de PSA implementados na Costa Rica, México, Estados Unidos e China5 (SCHOMERS; MATZDORF, 2013).

Muitos esquemas de PSA existentes representam híbridos dos dois tipos. Consequentemente, a maioria dos programas de PSA envolve atores de terceiros (por exemplo, governos, organizações internacionais, ONGs ou desenvolvedores de projetos de carbono) (ENGEL, 2016). O financiamento do setor privado é promissor apenas se houver poucos beneficiários com uma grande proporção de benefícios totais relativamente altos (como no exemplo da empresa Vittel), os beneficiários estiverem bem organizados (por exemplo, associações de usuários de água) ou quando políticas complementares criarem uma demanda por prestação de serviços (por exemplo, por meio de limites para emissões de carbono ou requisitos de compensação da biodiversidade) (ENGEL, 2016).

Desta forma, existe uma clara divisão na literatura científica correlata ao tema, entre autores que defendem uma visão mais estreita do conceito de PSA e uma visão mais ampla, que abarca um maior número de experiências práticas (ROSA DA CONCEIÇÃO; BÖRNER; WUNDER, 2015; SCHOMERS; MATZDORF, 2013).

A primeira ressalta o PSA como um instrumento de mercado voluntário, e busca identificar as condições para que as intervenções sejam eficientes e destacar os princípios para um desenho ótimo. Segundo essa visão, a escolha de uma definição mais estrita procede da tentativa de identificar o instrumento como sendo algo diferente dos instrumentos já existentes até então.

Sob essa perspectiva, defende-se a utilidade de compreender os diferentes graus de conformidade entre a definição teórica e a implementação do instrumento, de forma a indicar até que ponto esses casos realmente representam o princípio de PSA subjacente, além de permitir comparação entre eles (KARSENTY; EZZINE-DE-BLAS, 2016; WUNDER, 2005, 2013).

5 O Brasil ainda não possui uma regulamentação do PSA em nível nacional. No entanto, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou recentemente o Projeto de Lei n° 312/15, do deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), que cria a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA) e institui o Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (CNPSA) e o Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (PFPSA). O Projeto de Lei está atualmente em tramitação no Senado (BRASIL, 2019). Uma breve análise do teor desse Projeto de Lei está disponível no Apêndice B.

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Já a segunda critica a visão de que o PSA seria um instrumento de mercado e propõe definições mais amplas que reforçam as dimensões institucionais e sociais envolvidas na implementação do instrumento (MURADIAN et al., 2010). Segundo essa visão, a maioria dos esquemas de PSA não preenche os critérios rígidos que definem, principalmente devido às complexidades inerentes dos sistemas socioecológicos e a custos de transação significativos.

Ainda, ressaltam os efeitos que os pagamentos podem ter na indução de mudanças comportamentais, podendo, em alguns casos, excluir as motivações intrínsecas, sociais e éticas para realizar uma atividade de conservação dos ecossistemas naturais (CORBERA; BROWN; ADGER, 2007; MURADIAN et al., 2013; PASCUAL et al., 2010).

1.6 COMENTÁRIOS CONCLUSIVOS

Ecossistemas naturais desempenham um papel essencial na regulação e manutenção de processos e funções que sustentam a vida humana, gerando benefícios à sociedade que são chamados “serviços ecossistêmicos” (DAILY, 1997; DE GROOT; WILSON; BOUMANS, 2002). A partir do final da década de 90 e início dos anos 2000, o conceito de serviços ecossistêmicos foi gradualmente sendo incorporado na agenda política e uma série de iniciativas surgiram com o objetivo de avaliar as mudanças nos ecossistemas e incorporá-los em processos de tomada de decisão.

Portanto, o tipo, a qualidade e a quantidade de serviços fornecidos por um ecossistema são afetados pelas decisões dos usuários sobre os recursos naturais. Nesse sentido, serviços ambientais são os serviços prestados por indivíduos para a manutenção ou a melhoria de um dado serviço ecossistêmico (KANDZIORA; BURKHARD; MÜLLER, 2013; KARSENTY; EZZINE-DE-BLAS, 2016)

Assim, a rápida degradação dos ecossistemas pode, em parte, ser explicada pelo fato de que muitos dos serviços ambientais não recebem um valor econômico e estão frequentemente sujeitos às chamadas “falhas de mercado”. Deste modo, compreender as características associadas a esses serviços é fundamental para avaliar, gerenciar, manter ou restaurar os serviços

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ecossistêmicos (FISHER; TURNER; MORLING, 2009). Dentre as principais falhas de mercado que influenciam a provisão ótima de serviços ambientais, estão: bens públicos, externalidades, direitos de propriedade incompletos e informações assimétricas.

Nesse contexto, o pagamento por serviços ambientais surge como uma das soluções possíveis para solucionar as falhas de mercado associadas a provisão desses serviços, por meio de pagamentos diretos, voluntários, contratuais e condicionais de beneficários externos aos proprietários de terras e usuários locais em troca da adoção de práticas que garantam a conservação e a restauração do ecossistema. Esse conceito surgiu como uma aplicação básica do Teorema de Coase

No entanto, na prática, existem poucos exemplos de PSA em conformidade com o conceito “coaseano”, e, em vários casos o PSA se aproxima mais de um subsídio ambiental aos provedores de serviços ambientais, ou um híbrido dos dois tipos. Essas diferenças geraram uma divisão na literatura sobre um tema, onde alguns autores defendem uma visão mais estreita do conceito de PSA, buscando identificar condições para um desenho ótimo. Outros autores defendem uma visão mais ampla, apresentando a crítica de que o PSA não seria um instrumento de mercado e propondo definições que reforçam as dimensões institucionais e sociais envolvidas na implementação do instrumento.

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CAPÍTULO 2 AVALIAÇÃO DE EFICÁCIA E ADICIONALIDADE EM PROGRAMAS DE PSA

2.1 AVALIAÇÕES DE EFICÁCIA EM PROGRAMAS DE PSA

No início de sua implementação, o PSA foi considerado uma inovação importante porque lidava diretamente com a realidade de que a conservação está longe de ser sempre uma situação “ganha-ganha”. De fato, em muitos casos, as atividades desejáveis do ponto de vista da sociedade são pouco atraentes para os agricultores, madeireiros, pescadores e outros atores que gerenciam os ecossistemas diretamente.

Nesse contexto, esse instrumento de mercado pretende abordar interesses conflitantes por meio de compensações, o que pode ser uma maneira mais eficiente6 de alcançar a conservação quando comparadas à alternativas de comando e controle (ENGEL; PAGIOLA; WUNDER, 2008; WUNDER, 2007; WUNDER; ENGEL; PAGIOLA, 2008). No entanto, apesar de ter se tornado globalmente uma estratégia complementar às estratégias de conservação existentes, como áreas protegidas (KARSENTY; EZZINE-DE-BLAS, 2016; SCHOMERS; MATZDORF, 2013), em muitos casos a contribuição efetiva do PSA para a conservação dos ecossistemas é desconhecida (PATTANAYAK; WUNDER; FERRARO, 2010).

De fato, apesar de uma aplicação extensiva do instrumento nas últimas décadas – que representa mais de 550 programas ativos em todo o mundo e estimados US$ 36 a US$ 42 bilhões em transações anuais (SALZMAN et al., 2018) - evidências empíricas sobre a sua eficácia são escassas, devido à

6 Uma alocação eficiente de recursos ocorre quando nenhum indivíduo consegue aumentar seu bem-estar sem que seja reduzido o bem-estar de outro indivíduo (PINDYCK; RUBINFELD, 2006). Uma política, programa ou projeto é ótimo ou eficiente em um sentido econômico, se maximizar os benefícios líquidos para a sociedade. Assim, para ser considerado eficiente em um sentido estrito, um programa de PSA precisaria direcionar seus fundos para que o valor presente líquido das mudanças resultantes em todos os fluxos de serviços ecossistêmicos fosse maximizado para o orçamento dado. Tal maximização exigiria levar em conta as mudanças no bem-estar associadas a todos os serviços ecossistêmicos afetados pelo programa de PSA, não apenas aqueles associados ao (s) serviço (s) alvo (s). Em um sentido menos estrito, a eficiência poderia ser definida em relação a apenas o valor (líquido presente) das mudanças no (s) serviço (s) específico (s) cuja provisão o programa procura promover. Neste caso, no entanto, deve-se ser explícito sobre este foco seletivo, a fim de evitar interpretações enganosas e se referir ao programa como eficiente com relação a esse serviço específico, em vez de simplesmente “eficiente” (KROEGER, 2013).

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ausência de rigorosas avaliações de impacto (ARMSWORTH et al., 2012; BÖRNER et al., 2017; ENGEL, 2016; EZZINE-DE-BLAS et al., 2016; NAEEM et al., 2015).

Um dos desafios das avaliações de eficácia do PSA é diferenciar resultados gerados a partir das ações do programa dos resultados gerados por outros fatores (ex.: legislação ambiental, padrões de crescimento econômico e de uso dos recursos naturais) (LE VELLY; DUTILLY, 2016). Deste modo, para distinguir os resultados causados pelas intervenções do PSA dentre outros fatores, é necessário utilizar uma abordagem contrafactual capaz de inferir causalidade às intervenções (ENGEL; PAGIOLA; WUNDER, 2008; LE VELLY; DUTILLY, 2016; WUNDER, 2015).

Assim, a eficácia ambiental é definida como a mudança na provisão dos serviços induzidos pelo programa, comparado a um evento contrafactual não observado, ou seja, o que aconteceria na ausência da intervenção do PSA (BÖRNER et al., 2017; PATTANAYAK; WUNDER; FERRARO, 2010). Já a medida de custo-eficácia7 leva em conta os custos e impactos de diferentes

alternativas, possibilitando escolher aquelas que fornecem os melhores resultados para determinado orçamento ou que minimiza os custos para determinado objetivo (LEVIN, 1983). Em outras palavras, para ser custo-eficaz, uma política deve alcançar o mesmo nível de benefícios ambientais a um custo menor do que políticas alternativas.

Ferraro e Pattanayak (2006) apontam para o problema básico na avaliação do sucesso de programas que não possuem um contrafactual, comparando um resultado entre as propriedades que participam de um esquema e as que não participam. Como a participação não é aleatoriamente designada entre as propriedades, os fatores que determinam se um proprietário decide participar de um PSA também podem determinar o resultado do interesse. Por exemplo, se uma floresta estiver longe de estradas e em encostas íngremes, é improvável que seja adequada para a conversão na agricultura. Isso pode

7 Isso contrasta com uma solução economicamente eficiente, já que, embora a eficiência maximize o bem-estar social relacionado ao objetivo de conservação, em muitos casos os orçamentos limitados impedem uma política totalmente eficiente (BÖRNER et al., 2017; DUKE; DUNDAS; MESSER, 2013; LEWIS et al., 2011). Ou seja, embora um programa eficiente seja sempre custo-eficaz, um programa custo-eficaz não é necessariamente eficiente (KROEGER, 2013).

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Figura 1. A relação entre estrutura, função e bem-estar humano.
Figura 2. Classificação de bens e serviços de acordo com os critérios de rivalidade e  excludibilidade.
Figura 3. Curva de custo de oportunidade e curva de oferta de serviços ambientais em caso  hipotético
Figura 4. Possíveis relações espaciais de serviços ecossistêmicos entre área de provisão (P) e  benefício (B)
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Referências

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