Avaliação da eficiência da peroxidação como método
alternativo a clarificação do açúcar por cinética química
J. L. Mandro1, J. A. S. Sartori1, N. T. C. Magri1, G. R. Manarim¹ C. L. Aguiar1.
1 Laboratório Hugot de Tecnologia em Sucroderivados - ESALQ / USP
E-mail para contato: julianalorenz.m@usp.br
RESUMO – A cana-de-açúcar é um cultura de grande apelo economico e cultural responsável pela produção do açúcar, o qual representa a segunda maior commodity do país. Entretanto, o setor sucroalcooleiro brasileiro atual, enfrenta barreiras quanto a aceitação do mercado externo ao açúcar branco, uma vez que o método de clarificação adotado, a sulfitação, vem sendo apontado como produto potêncialmente alergênico. Neste sentido, avaliou-se a eficácia do método alternativo de clarificação, a peroxidação, com o objetivo de testar doses distintas de peróxido de hidrogênio e acompanhar sua degradação de componentes pigmentosos perante o tempo, para isso foi realizada uma cinética química estabelecida com temperatura de 70 °C, pH 5,0 e doses distintas de 202,4 e 500 ppm de Peróxido de Hidrogênio (H2O2), aplicadas a uma
calda de açúcar VHP a 66 ° BRIX durante 90 min com retiradas nos tempos 0, 5, 30, 60, 90 min. Ambos os tratamentos apresentaram redução de cor ICUMSA, em todos os tempos estudados quando relacionados ao controle, sendo que a maior dosagem de H2O2 mostrou-se mais
significativa na redução de cor, comprovando a eficiência do método.
1. INTRODUÇÃO
Atualmente, o setor sucroenergético está se tornando cada vez mais competitivo, o que de fato é incentivado principalmente pela representativa demanda e exigências do mercado externo, especialmente no que diz respeito ao açúcar cristal branco. Ao se analisar a cadeia produtiva do açúcar branco, pode-se encontrar barreiras para a sua ampla aceitação internacional, uma vez que a forma atual de clarificação do açúcar é a sulfitação, processo que consiste, na adição de dióxido de enxofre gasoso (SO2) ao caldo misto, pré-aquecido a temperatura de 60°C, até atingir o valor de pH entre
3,8 e 4,2 (aproximadamente 150 a 300 g de enxofre por tonelada de cana), posterior alcalinização com leite de cal até pH 7,0 - 7,2 (HONIG, 1953). Este processo vem sendo associado a potenciais problemas ambientais e de saúde pública, devido a geração de resíduos tóxicos.
Recentes estudos comprovam que o método de sulfitação envolve graves problemas ambientais com a liberação de resíduos formadores de chuva ácida. Além disso, segundo a Food and Agriculture Organization (FAO) uma em cada 100 pessoas apresentam sensibilidade ao
sulfito e dependendo da severidade, essas podem sofrer graves reações pela sua ingestão, como sensação de desconforto na garganta, congestionamento no peito, tosse, hipotensão e dermatite de contato (PAPAZIAN, 2013). A redução da biodisponibilidade das vitaminas B1 (tiamina), B9 (ácido fólico), nicotinamida e piridoxina também estão presentes em alguns casos. (SCAMPICCHIO et al., 2008; PEREIRA; MOURA; CONSTANT, 2008; VALLY; THOMPSON, 2001).
Diante desta problemática, métodos alternativos de clarificação vem sendo estudados e testados para aumentar a segurança de setor. Os tratamentos que tomam frente neste meio alternativo de clarificação são os POA (processos oxidativos avançados) e dentre eles o Peróxido de Hidrogênio se destaca por ser um dos mais versáteis oxidantes existentes (EPA, 1998). A peroxidação atua nos compostos pigmentosos oxidando-os e consequentemente reduzindo a cor do meio. Neste sentido, este trabalho teve como objetivo avaliar a eficácia da peroxidação na redução de cor ICUMSA do açúcar, avaliando doses distintas de peróxido de hidrogênio perante o tempo em uma cinética química.
2. MATERIAL E METODOS
Para a realização do trabalho, foi adquirido açúcar do tipo VHP (very high polarization) de uma usina da região de Piracicaba - SP, com as características descritas abaixo na Tabela 1, posteriormente o mesmo foi misturado à água destilada até atingir uma concentração de 66 °Brix (teor de sólidos solúveis), visando obter uma calda de açúcar.
Tabela 1 – Características do açúcar VHP
Parâmetros Amostra açúcar
VHP
Polarização (°Z) 97,21
Cinzas (%) 0,07
Proteína (%) 0,45
Cor ICUMSA (IU) 407,65
pH 6,56 Umidade (%) 0,03 Sacarose(mg/ml) 707,00 AR (g/l) 1,4 Granulometria (CV %) 19,09 Turbidez 16,93
Com a calda pronta foi realizado 2 tratamentos com doses distintas de 202,4 e 500 ppm de Peróxido de Hidrogênio (H2O2), onde em cada tratamento adicionou-se 200 mL de calda corrigida
de 70 °C. A reação foi promovida em um shaker (Figura 1) com agitação orbital constante de 100 rpm, a um tempo reacional de uma hora e trinta minutos, sendo ao longo da reação realizada amostragens nos tempos de 0, 5, 30, 60, 90 min. Ao final, foi adicionado catalase proveniente de fígado de boi para promover o termino reação.
Tabela 1 – Modelo da reação de peroxidação realizada no shaker
Para a análise de cor ICUMSA, as amostras foram medidas quanto ao Brix e diluídas à 30° Brix em triplicata. Posteriormente estas foram filtradas com membrana de filtro de nitrato de celulose (diâmetro do poro 0,45µm) e corrigida para pH 7 ± 0,05, sendo em seguida, lidas em espectrofotômetro a uma absorbância de 420 nm com cubeta de quartzo de 1 cm. (ICUMSA METHOD GS1/3-7, 2011).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Se comparados a porcentagem de redução dos tratamentos (Tabela 2) é possível observar que no tratamento com maior concentração de peroxido de hidrogênio, tratamento 2 a redução de cor foi maior bem superior à do tratamento com menor dose principalmente nos pontos 5, 30 e 60 min. É possível observar também que no tratamento 1 a redução de cor seguiu uma proporção maior que no tratamento2, pois no tratamento 2 ocorreu uma alta degradação dos componentes coloridos no primeiro e segundo ponto estudado 5 e 30 min, após isso a redução de cor foi mais sutil, ou seja, em maiores concentrações de peróxido a redução de cor agiu de forma mais brusca nos primeiros 30 min diferentemente do tratamento 1 em que a cor foi sendo progressivamente reduzida. Se comparado ponto a ponto do tratamento 2 observar-se que ocorreu um leve aumento de cor no ponto 90 min em relação ao ponto anterior. Esta ocorrência está relacionada com a consequente formação de fenólicos, flavonóides no meio, por conta da quebra dos já existentes compostos fenólicos e flavonoides a compostos menores e mais disponíveis (LIMA, 2012), isso devido a decrescente ação oxidante do peróxido de hidrogênio perante ao tempo de reação no
tratamento. Para Clarke (1984) compostos fenólicos e flavanóides são os que mais afetam a cor do caldo de cana-de-açúcar, sendo responsáveis por 60 a 75% da cor do açúcar final. Reações de caramelização também podem estar relacionadas ao fato, uma vez que, o aquecimento de carboidratos, em especial de sacarose e de açucares redutores, produz uma série de reações complexas, promotoras de cor, comumente conhecidas como caramelização (FENNEMA, 2000).
Tabela 2 – Características do açúcar VHP
Tempo(min) Redução Trat. 1 (%) Redução Trat. 2 (%) 5 8 27 30 15 42 60 22 48 90 37 47
Já quando comparamos graficamente os dois tratamentos e seus valores de cor ICUMSA podemos constatar que os dois tratamentos apresentaram entre os tempos resultados finais de cor bem próximos, porém o valor inicial (ponto 0) do tratamento 1 era menor do que do tratamento 2 estando estes em 416,26 UI e 500,2 UI respectivamente. Então mesmo o tratamento com maior dose de peroxido de hidrogênio ter obtido porcentagem superiores de redução em relação ao ponto 0 a cor final de cada ponto dos dois tratamento comparadas apresentaram valores sutilmente diferentes para o tratamento com maior dose.
4. CONCLUSÃO
O experimento apresentou resultado satisfatório, pois os dois tratamentos estudados apresentaram redução significativa de cor ICUMSA. Entre as diferentes doses de peróxido de hidrogênio a dose com maior concentração da solução apresentou melhor resultado sendo mais eficiente para a redução de cor. O tempo foi um fator essencial para a degradação dos pigmentos coloridos, onde na maior a dose de peróxido de hidrogênio, menor foi o tempo gasto para a redução de cor.
5. AGRADECIMENTO
Agradeço a FAPESP, CNPQ, ESALQ/USP e o Grupo Hugot Bioenergia pela colaboração na elaboração deste trabalho
6. REFERÊNCIAS
CLARKE, M.A.; BLANCO, R.S.; GODSHALL, M. A. Color tests and onther indicators of raw sugar refining characteriscs. In: Proc. sugar proc reaserch confe. New Orleans, p. 284-302, October 1984.
EPA US. Field applications of in situ remediation technologies: chemical oxidation. Office of Solid Waste and Emergency Response, Tec. Innov. Office, Washington, DC, US, pp. 1–31, 1998.
FENNEMA, O.R. Química de los Alimentos. 2ed. Zaragoza: Acribia S.A, 2000. HONIG, P. Princ sugar tech. New York: Elsevier Publishing Company, v. 1, 1953.
ICUMSA, methods book. GS1/3-7 determination of the solution colour of raw sugar, brown sugar and coloured syrups at pH 7.0- official. ICUMSA meth. book. 2011
LIMA, R. B. Processo de clarificação de caldo de cana-de-açúcar aplicando eletrons acelerados. Dicertação de mestrado. Escola superior de agricultura “Luiz de Queiroz”/ USP. Piracicaba. 2012
PAPAZIAN, R. Sulfites: safe for most, dangerous for some. Disponível em: <www.fda.gov/FDAC/features/0,96_silf.html> Acessado em: 20/07/2015
SCAMPICCHIO, M.; LAWRENCE, N.S.; ARECCHI, A.; MANNINO, S. Determination of Sulfite in Wine by Linear Sweep Voltammetry. Electroanalysis, v. 20, n. 4, p. 444-47, 2008.
