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Variações escolares e multiplicidades no pensamento

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Educação

LAISA BLANCY DE OLIVEIRA GUARIENTI

VARIAÇÕES ESCOLARES E MULTIPLICIDADES NO PENSAMENTO

CAMPINAS 2019

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LAISA BLANCY DE OLIVEIRA GUARIENTI

VARIAÇÕES ESCOLARES E MULTIPLICIDADES NO PENSAMENTO

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para a obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração Educação.

Orientador: Prof. Dr. Silvio Donizetti de Oliveira Gallo

O ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFERIDA PELA ALUNA LAISA BLANCY DE OLIVEIRA GUARIENTI E ORIENTADA PELO PROF. DR. SILVIO DONIZETTI DE OLIVEIRA GALLO.

CAMPINAS 2019

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

VARIAÇÕES ESCOLARES E MULTIPLICIDADES NO PENSAMENTO

Autora: Laisa Blancy de Oliveira Guarienti

COMISSÃO JULGADORA: Silvio Donizetti de Oliveira Gallo [orientador] Alexandrina Monteiro Cesar Donizeti Pereira Leite Guilherme Carlos Correa Renata Pereira Lima Aspis Paolo Mottana

A Ata da Defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da Unidade.

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Para minha filha Ayla. Que seja infinitamente múltiplo teu viver.

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AGRADECIMENTOS

À Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo nº 2014/07477-0 e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo financiamento do projeto de pesquisa e que incluiu uma Bolsa Estudos e Pesquisa no Exterior (BEPE), processo nº 2016/03424-4, tornando possível a produção desta tese.

Quero compartilhar essa jornada a cada atravessamento que de algum modo compõe a passagem do processo da criação desta tese que teve seu início em 2014, findando em início de 2019:

Ayla, agora e sempre em primeiro lugar de tudo o que é e será atravessado em meu caminho. Ela chegou um ano antes do doutorado, e desde então está inserindo novas configurações temporais, espaciais, sensoriais, passionais, que ultrapassam qualquer modelo preestabelecido. Ela me ensina a querer viver cada dia com mais amor e intensidade. Ela me multiplica em devires ainda não conhecidos. Ela é meu “arrastão na imanência”.

Eliana Maria e Nilto Ivo, que sem eles nada disso seria possível. Fica meu amor, eterna gratidão e parceria sendo restituída através desta tese. Agrego meus irmãos Marcelo e Diego pelas trocas de saberes em intensidades distintas.

Aos quase dez anos de união com Silvio Gallo, guardo respeito, admiração, carinho, risadas e multiplicação de alianças. Meu intenso obrigado.

Aos membros avaliadores da tese Alexandrina Monteiro, César Donizetti Pereira Leite, Guilherme Carlos Corrêa e Renata Lima Aspis, e aos suplentes, Renata Lanza, Sinome Gallina e Wenceslao Machado, meu nobre agradecimento pela preocupação em acolher meu trabalho e aceitarem o convite a embarcarem nesse percurso sinuoso e atrevido.

Al maestro Paolo Mottana per l'accoglienza, per la novità della conoscenza, per le sue magnifiche lezioni e disseminazione concettuale nei suoi corsi. Grazie mille per aver aperto una porta nel mio castello.

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Migues Juliana Bom-Tempo, Juliana Jonson, Nima Spigolon, Ana Lú Moraes, Vivian Marina, Patrícia Gontan, Lidiane Lobo, Sandro, Lucca, Manuela Esteves, Tania Villarroel, Lúcia Royes, Mary, Cristiane Nunes, Paola Sanfelice, Marcus Novaes, Fernandão, Valéria Aroeira, Gláucia Maria, Alexandre Filord, André Camargo, Cristiano Barbosa, Amaranta Krepschi, Michelle Motta, Aline Bagetti, Ana Godoy, Cristina Stolf, Débora Mazza, Daniel Figa, Vanessa Farenzena, Fernando Stevaux, Francisco Estigarribia, Kamilla Mesquita, Luiz Orlandi, Ivo (guardado no peito e na memória), Mariana Nóbrega, Gustavo Sandoval, todo meu carinho, amizade e múltiplos afetos... De cada um teria a escrita de um rio. De cada um deixaria meu registro de como meu campo de afetação foi tocado por vocês. Das nossas trocas, das nossas conversas, das nossas risadas e dos nossos dias obscuros. Valeu!!!

Agradeço aos participantes do grupo de pesquisa Transversal pela partilha de conhecimentos e risadas. Somos muitos contagiando novas pequenas larvas em múltiplos lugares com os nossos saberes e, por isso mesmo, inomináveis de tantos que somos.

Aos professores e funcionários da Faculdade de Educação meu respeito e admiração por cada conhecimento adquirido nesses quase dez anos de instituição direta e indiretamente vivenciados com muito amor e dedicação.

Um agradecimento mais que especial à escola que acolheu esta pesquisa, composta pela equipe diretiva e pedagógica, funcionários e demais pessoas que se ocupam dela. Ao querido e dedicado professor Jean Zeferino Rodrigues por abrir sua turma e acolher minha pesquisa sem nunca interferir na sua funcionalidade. A todas as crianças que passaram pelas variantes aventuras do projeto, meu eterno agradecimento, pois sem elas nada disso seria possível, sem elas a escola não sobrevive, sem elas a escola fica sem cor, sem amor, sem cheiro... Especialmente ao querido aluno F. pela partilha de emoções, aprenderes e carinho. Obrigada de coração a todos e todas.

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RESUMO

Este trabalho apresenta as variações escolares e as multiplicidades no pensamento durante encontros ocorridos no cerco escolar. São apresentados materiais que não podem ser descritos, mas sim expostos em um nível de sensibilidade para além de qualquer interpretação, julgamento ou categorias de análises que encerram o saber. Aqui se experimentam passagens deste contexto onde se tenta apresentar, num nível plástico, seja pelos meios, pelas rachaduras ou pelos subsolos, pequenas possibilidades de criação de linhas de fuga. Cenas possíveis se apresentam em um contexto escolar esboçando estilos e agenciamentos. É um convite a entrar num campo desconhecido, ou que se forja para trazer à tona ditos, não ditos, falas reais e fictícias abafados por um cotidiano escolar, mas que ainda possível de ser penetrado por outras sensações, outras tonalidades, outras aprendizagens.

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ABSTRACT

This work presents the school variations and the multiplicities in the thought during meetings occurred in the school enclosure. Materials are presented which can not be described but exhibited at a level of sensitivity beyond any interpretation, judgment or categories of analysis that conclude the knowledge. Here, passages of this context are tried where one tries to present, in a plastic level, either by the means, by the cracks or by the subsoils, small possibilities of creation of lines of escape. Possible scenes present themselves in a school context outlining styles and assemblages. It is an invitation to enter into an unknown field, or that is forged to bring to the surface said, not said, real and fictitious speeches muffled by a school routine, but still possible to be penetrated by other sensations, other tonalities, other learning.

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RIASSUNTO

Questo lavoro presenta le variazioni scolastiche e le molteplicità del pensiero durante gli incontri avvenuti nel recinto scolastico. Vengono presentati materiali che non possono essere descritti ma esibiti ad un livello di sensibilità al di là di ogni interpretazione, giudizio o categorie di analisi che concludono la conoscenza. Qui si sperimenta il passaggio di un punto in cui si tenta di presentare, a un livello plastico, sia per mezzo di crepe o sottosuolo, piccole possibilità di creare linee di fuga.

Le scene possibili si presentano in un contesto scolastico che delinea stili e assemblaggi. È un invito a entrare in un campo sconosciuto, o che è forgiato per far apparire detto, non detto, discorsi reali e fittizi attutiti da una routine scolastica, ma ancora possibile essere penetrati da altre sensazioni, altre tonalità, altri apprendimenti.

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SUMÁRIO PROVENIÊNCIAS DA TESE 13 ISPIRAZIONI TESTUALI 22 PRIMEIRA PARTE 26 Convite 27 Aprender 28 Inventar 33 Instaurar 36 Ela 38 Abdicar 42 Cartografar 46 Caderno 47 Almoço 49 Enfrentar 56 Boo 57 Atuar 59 Oficinas 60 Contrato 62 Quinta-feira 64 SEGUNDA PARTE 66 Artimanhar 67 Assumir 74 Acionar 77 Insurgir 81 Restituir 84 Avante 86 Decepção 95 Almoço II 95

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Interferências 97 TERCEIRA PARTE 107

Investigar 108 Desalinhar 111

Sanderson 114 Não tem flagrante 118

Derramar 120 Ultimato 121

Ato 127 MULTIPLICIDADES 133

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PROVENIÊNCIAS DA TESE

Um longo percurso foi traçado para chegar até aqui. Incerto de descrever o início, talvez uma primeira lembrança possa começar ativar outras lembranças de como

cheguei a escrever o que logo se apresentará a vocês.

Talvez alguns traços surgiram quando pensava em como as crianças que são submetidas ao processo de ensino escolar constroem suas ilhas imaginárias, suas linhas

de fugas, ou o que descrevo aqui como variações do pensamento escolar.

O que essas crianças pensam enquanto não prestam atenção na aula do professor (a)? O que se engendra num pensamento quando se escapa aos ditames de ordenações?

Um percurso talvez que foi implantado durante a escrita da dissertação quando descrevia sobre as aprendizagens deambulantes num contexto de saberes menores que eram aprendidos no deambular de uma viagem de carro. Uma dissertação que estudou

um filme de road movie e enxergou no percurso de uma viagem extratos de um aprender que não cabiam no contexto escolar. A sala de aula era a rua, a cidade, e os

saberes se interligavam entre personagens, viagens e conceitos.

E quase na finalização da escrita da dissertação que me inquietei com tal questão: como se procede, ou insurgem esses outros saberes num contexto escolar? Será

que traços de aprenderes outros cabiam no contexto escolar? Como se criam essas viagens em um nível intensivo e, ao mesmo tempo, submetido ao cenário de uma sala

de aula?

Foi então que para a criação do problema de pesquisa desta tese pretendi investigar a seguinte hipótese: Impossível de fazer uma cartografia mental com os alunos da escola, ou, como mapear aquilo que pensam, optei por potencializar uma escrita variante e intensiva sobre a própria tese. Frente a essa afirmação, o problema destaque se emoldura verso a seguinte problemática: o que se pode inventar quando se

coloca o pensamento a variar e ao mesmo tempo submetido ao contexto escolar?

Mas até esse ponto, passei por longos processos de construção, desconstruções e reconstruções...

Ao tentar investigar o primeiro problema da tese (o que se aprende, ou o que se engendra no pensamento, quando não se está prestando atenção na aula de um

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professor) percebi que existia a abertura de um segundo problema, o de como cartografar o pensamento variante de um escolar?

Eram dois problemas extremamente delicados de se lidar, ou talvez, até mesmo, impossíveis de mensurar. Mas no início, isso não me soava com tons ameaçadores. Então logo na metade do primeiro ano de doutorado fui a campo investigar essas tais

variações do pensamento. Acreditando ainda na possibilidade de êxito a partir do primeiro problema.

E foi lá que aos pouco se constituiu essa segunda problemática a ser desenvolvida, o como realizar essa cartografia do pensamento escolar? Aos poucos fui

compondo um campo de ação, onde minimamente conseguia realizar alguns feitos na captura dessa variação mental, e aí foram engendradas inúmeras estratégias de como executar o percurso metodológico da pesquisa sem perder a consistência no problema.

Mas a consistência escorria pelas mãos... O problema se esfacelava por ele mesmo... E o tom ameaçador da tese começou a assoprar na minha espinha.

Apesar de o foco não ter se perdido, me vi envolta em inúmeras ações realizadas, mas que por muitas vezes me soavam sem sentido, ou mesmo, de me perguntar como cheguei até aqui com este tipo de procedimento, ou ainda, para que isso

servirá na análise da pesquisa? Foram dias, semanas, meses de grandes dificuldades e introspecção de como iria agir com tanto material a ser analisado e não ter nenhuma

resposta consistente ao problema da pesquisa.

Mas mesmo assim, realizei a qualificação da tese. Aprovada e apavorada, pois em menos de uma semana seguiria em busca de novos conceitos em terras distantes,

segui adiante, já não podia mais estancar esse processo, era cedo e tarde ao mesmo tempo. Um ar de insegurança e incerteza me assolava com bastante intensidade. Mas foi

nesse um ano de investigação que as ideais sobre a tese foram se assentando e tudo parecia se tornar mais claro. Talvez esse um ano fora e pesquisando conceitos que

dessem um maior acolhimento à tese, me direcionaram a um estado mais potencializador e de vontades de escrever algo que não se quer por à prova de nada, algo que não busca nominações, não quer ser... E busca aberturas de novas conexões possíveis numa escrita despretensiosa, livre, leve e alegre. Pois foi com essa energia que

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Retorno desse fora e me assento no meu dentro. Retorno com um problema a ser reconstituído. E foi desse modo, que ao ser impossível cartografar ou mapear intensivamente o pensamento daqueles que abrem sua atenção para outras vias, e, compondo com todos os quase dois anos de campo na escola, com as inúmeras ações realizadas com os alunos e com a nova bagagem conceitual adquirida lá de fora, é que

optei por uma escrita variante e intensiva. Agora consistente, pois amadurecida e decidida.

Assim, a história do problema de pesquisa mostra que num primeiro momento foi necessário deslocar a problemática para intensificar a noção de variação do pensamento (que é intensiva, subjetiva e louca) e assim, portanto, impossível de ser

cartografada, mas não impossível ser descrita intensivamente.

Quando o problema estava numa fase pastosa, isto é, em linhas de aberturas a serem transmutadas, é que iniciei, mesmo sem saber como, alguns procedimentos metodológicos e práticos com os alunos. Investiguei por quase dois anos um professor de quinto ano e seus quase trinta alunos em sala de aula. Obviamente que esses alunos mudaram na troca do ano letivo, mas aquele que mais me interessava, continuou no quinto ano por esses dois anos. A escola era do município de Campinas/SP e minhas observações e ações aconteciam no turno da manhã. Num primeiro momento, em todas

as manhãs, numa segunda fase duas vezes por semana, e talvez num último momento duas ou uma vez por semana.

A primeira estratégia desenvolvida foi a observação. Observei por quase um mês todo movimento que me parecesse interessante e variante dentro da sala de aula. E foram

nesses mesmos dias que meu problema escorria por água a baixo... Como? Como cartografar aquilo que é intensivo? Anotava com cuidado todos esses movimentos. Mas

minha tese não seria sobre movimento, num nível de visibilidade e sim no nível intensivo, mas como? Como?

Também impossível de cartografar as variações de todos os alunos, optei por aqueles que mais agradavam a história do problema da tese, isto é, quem são esses possíveis alunos variantes? Como selecionar sem julgar, sem cair em diagnósticos, em indicações,

etc. Cruzamento de olhares, sorrisos e gostos. Selecionei aqueles que seriam os meus proliferadores de campos intensivos a partir destes três critérios. Intensidade se produz

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com intensidade. Afetando e sendo afetado. Numa estratégia pensada na lógica da troca, da restituição e da presentificação dos acontecimentos.

Aos poucos fui assentando as ideias de como proceder com as estratégias de ação direcionadas a cada estudante específico. A cada um uma estratégia, uma ação

diferenciadora para intensificar o nível dessas afetações de campos, e assim, minimamente extrair efeitos de variações.

Mas que estratégias? Aí surgiram as oficinas pedagógicas de invenção no pensamento e entrevistas para incitar um movimento de assentamento das variações que pudessem ser cartografáveis. Então com base nas anotações dos cadernos é que fui sistematizando as ações a serem realizadas. Numa linha de composição de campos intensivos, as oficinas

existiam quando brotava um desejo interessante no aluno. Caso esse despertar não acontecesse o mapeamento era executado também como um dado válido a pesquisa.

Havia respeito e escuta do feito e do não realizável.

Como intensificador das cenas pedagógicas, alguns materiais surgiram nas oficinas. Muitas vezes usados apenas como bengalas para dar suporte a alguma vontade incitada,

pois assim o estalo inventivo poderia ser intensificado. Mas tudo muito simples e num nível possível de realização. Folhas, lápis, cartolinas, fotografias, madeiras, bolas, cartas

de uno e etc.

A intenção da oficina não era o seu resultado, mas a extração da variação do pensamento durante a execução da oficina, isto é, na duração da ação é que cartografava

extratos de variação do pensamento. Assim como na aula do professor (que vi ser impossível a realização da cartografia do pensamento) vi nas oficinas uma possibilidade

mais consistente no quesito do mapeamento das variações durante o processo das oficinas.

E com as oficinas, os materiais para a análise se tornaram cada vez mais amplos e diversificados, pois cada aluno, ou cada nova composição de alunos, diferentes materiais eram usados, diferentes procedimentos eram compostos, e desse modo, diferentes modos de cartografar o pensamento se colocavam a minha frente. Aberturas

para os mais infinitos campos de perdição. Chegamos a realizar uma oficina sobre o nada e ver o que ele tinha a nos mostrar.

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O nada abriu o campo para jogarmos futebol e abriu campos para a chegada de outros alunos que passavam por ali perto e abriu para que os professores ficassem preocupados

com os alunos que não regressavam a salas de aula e assim foi se abrindo, se expandindo como era a intensão...

Mas isso tudo aconteceu antes da reformulação do problema, antes do exame de qualificação, antes da viagem para fora, tudo antes. E isso tudo antes, agora, foi dissolvido, num procedimento de pesquisa intuitivo e intensivo. Numa escrita que foi

acolhendo passagens de vivências, acontecimentos inusitados e o alicerce já desenvolvido na antiga tese. A antiga tese, com a parte da análise dos dados, pode ser apreciada ao final do exemplar, e se encontra no bloco das multiplicidades que também

compôs o trabalho final da nova tese.

Explico a seguir quais foram minhas afetações, minhas aberturas para expandir o campo inventivo, intensivo e intuitivo da nova tese. Que forças e paixões me tomaram durante

a escrita.

A tese foi escrita a partir da composição de linhas intensivas afetadoras. Sem um sentido claro, essas linhas atravessaram o campo que é envolto pela tese. Uma tese que acolheu no seu estofo cinco intercessores que pulsam na sua (des)centralidade e que ao

mesmo tempo, estes cinco intensificadores de campo, são fortemente alargados por linhas variantes e criadoras de novas afetações a serem constituídas a partir da leitura

desse outro texto.

Abandonamos a primeira versão, mas não a deixamos para trás, seus efeitos e intensidades seguem juntos nessa nova composição, assim como os outros intercessores

que aos poucos foram se agregando. Coloquei tudo no liquidificador!

Para uma primeira paixão que deixei ser afetada, trago algum efeito de “O castelo” de Franz Kafka. Aquela amalgama sinistra e de difícil acesso, ou de obscuridades e não

entendimentos. Algo que quer ir, que quer entrar, mas não consegue. Não decifra os códigos do lugar que ali está e por vezes, a personagem principal, acaba passando por

ingênuo, por palhaço, por idiota.

Uma segunda inspiração é um pequeno vídeo do youtube, onde Gilles Deleuze anuncia algumas palavras sobre o que é uma aula. Dentre suas palavras, uma frase em especial

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encontramos Deleuze dizendo que nem todos os alunos estão interessados durante uma aula e nem mesmo sobre todo o assunto a ser discorrido, mas que quando um assunto interessa mesmo aquele que está dormindo tem como que, um estalo instintual e acaba

direcionando a atenção ao assunto anunciado no momento de interesse. Algo se passa no pensamento daqueles que distraem a atenção, naqueles que desviam a atenção,

naqueles que variam.

Um terceiro componente, então, passa pela antiga tese. A tese que se apresentava com uma configuração lembrando o campo científico, numa dura análise de dados, comparativos e por vezes julgadora. O leitor curioso com isso poderá acessar esse outro modo de categorias de análise no fim da nova versão. Também um capítulo destinado à introdução dos conceitos foi se ramificando, esparramando e contagiando a nova tese

por outras vias. Vias de acesso antes não encontradas. Parece que “o castelo” tem passagens secretas.

Um curiosíssimo quarto elemento passa por um bloco de afeto que talvez seja o intercessor mais querido e talvez desejado. Não consigo descrever o momento em que

ele se assentou para a criação da composição da nova tese. Realmente não tenho a lembrança, mas provavelmente passe pelo fato de frequentemente assistir filmes dos

mais variados gêneros e estilos. Nesse caso, falo de um filme infantil intitulado “Monstros S/A”. A sinopse do filme gira em torno do roubo de energia das crianças

extraída pelo medo, coerção, susto e imposição, para então, se transformarem em energia elétrica no mundo dos monstros. Lá pelo fim do filme descobre-se então que se pode extrair essa vitalidade infantil, a gerar energia no mundo dos monstros, pelo riso e pela alegria. Porém, ainda assim um roubo, um uso covarde e controlador da infância.

Nossa última paixão é muito simples. A escrita da nova tese é esse quinto elemento. O modo despretensioso de querer elencar teorias, formas, nominações para enfim alocá-la

em algum lugar, ou para dizer: “isso é uma tese que se encontra dentro dos padrões da academia científica global e blá blá blá...”. A tese não quer encontrar algo a dizer que a

planifique em um tom acalentador, em uma cor cinza que só diz respeito a uma única coisa, ou a um único nicho específico de leitores estudados para entender daquele assunto. Aqui, vocês encontrarão zumbidos, uivos, gritos, mas de alegria. Nesse sentido,

deixem o texto simplesmente escorrer, sem controle, sem pressão, sem medo, sem querer quantificar, nem mesmo qualificar.

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A intenção foi tentar trazer uma atmosfera onde estes cinco eixos dessem a consistência necessária à força do problema da pesquisa. Que mesmo deslocado do seu sentido original, foi intensificado para melhor consistir no caos que é a variação do pensamento.

Sobreposições e recomposições para emergir a sensação do que os cinco intercessores juntos querem dizer.

Atravessada por esse conjunto de no mínimo cinco elementos que podem ser concisos, já que os outros perpassam um nível de atravessamento imperceptível até mesmo para aquele que escreveu a tese, todos se encontram num nível de intensidades que vai além

de descrições, apresentações, análises e nominações. Escreve-se para todos, num texto que passa pela sensação do medo e da alegria, do obscuro e da claridade, da ingenuidade e da malandragem, do bonzinho que se dá mal e que encontra novas

estratégias de fuga.

“O tabuleiro onde acontece o jogo está sobre a mesa, a mesa sobre o assoalho, que está sobre os pilares apoiados sobre o chão... o chão é tanto, tanto que nem se sabe. E sobre

ele o céu! Vamos brincar de esconde-esconde.” (Corrêa, 2006, p.187).

Desse modo, para a apreciação do texto preparem-se para encontrar uma história, sem pretensão literária, muito menos acadêmica, nem de outra coisa já pensável. A escrita da

tese surge como o próprio ato de variação do pensamento. O que se pode inventar quando se coloca o pensamento a variar e ao mesmo tempo submetido ao contexto

escolar?

Também submetido aos signos escolares é que a história surge (antiga tese), numa atmosfera envolta de suspense, angustias, delírios e calafrios (Kafka), extraindo a

variação do pensamento escolar quando está viajando em aula (Deleuze), querer cartografar o pensamento como um roubo (Monstros S/A) e intensificar esses elementos

numa composição alegre, inventiva e impulsionadora de novas aberturas para o pensamento (nova tese): eis a variação transformada numa tese a gerar contágios

proliferadores de novos signos.

Encontraremos um texto em que uma personagem conduz a história. E se deixa guiar pelas paixões que vão se cruzando. Outros personagens são apresentados como personagens-conceitos. Então lá no texto vocês vão encontrar Gilles Deleuze, Virgínia

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Kastrup, Paolo Mottana, entre outros. Vão encontrar a empresa escolar fortemente instituída em nome da ordem, do poder e do controle.

Mas também aos poucos essa sensação vai se esvaindo, quando a personagem descobre que pode envolver a escola com métodos alternativos aos já instituídos, e talvez, assim

trazer um pouco mais de alegria, cor e cheiro a esse lugar tão hostil, inóspito e degradado que é uma escola nos moldes tradicionais. Porém envolta numa sensação de perseguição e controle, descobre que a escola, seja ela tradicional ou alternativa, ainda

assim está sobre os pilares de um mesmo fim. Ainda precisamos de um lugar para controlar e melhor direcionar métodos de ensino.

A personagem que guia a história não se sente confortável em quase nenhum momento. Mas mesmo confusa e perturbada decide investir nos seus ideais utópicos e é quando seu destino é lançado a um novo campo. Um novo ar de mistério guiará a história quase

no seu fim.

É uma história simples, contada em três grandes blocos. O primeiro é o bloco da novidade e, por isso mesmo, do medo. A entrada na escola, o encontro com pessoas obscuras e subversivas. A imposição de regras e contratos por parte da administração

desse lugar é apresentada nesse momento. Num segundo bloco temos a abertura, a intimidade com a lida no local em que a personagem trabalha. Uma falsa sensação de

quase bem-estar ronda a atmosfera desse bloco. E para finalizar, no terceiro bloco, encontramos vias de controle mais acirrados, mas que nem assim, impossíveis de

instaurar outras linhas de fuga.

Para a realização da proposta criativa textual da tese foram omitidas as devidas referências bibliográficas de citações teóricas, partes de textos literários e relatos de campo (realizados durante o processo de observação-intervenção da parte prática do doutorado), estes que estão imiscuídos ao longo da narrativa. Todos os trechos que se referem às citações estão escritos em itálico. Optou-se por referenciar todos os trechos

utilizados ao final da tese e aparecem pela ordem de paginação. Tempos verbais, concordâncias pronominais e a inclusão de outros diálogos durante a citação, foram

modificados em função da criação narrativa e devidamente assinalados junto à referência do trecho, ainda que continuem em itálico.

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Eis que de longe, atrás daquela névoa, talvez se enxergue alguma porta para a entrada na história. Não se sabe ao certo como é essa porta. Mas espere! Veja! O sol está

nascendo! Ou seria a imensidão de uma bela noite de lua cheia?

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ISPIRAZIONI TESTUALI

Per creare il problema di ricerca di questa tesi ho intenzione di indagare sulla seguente ipotesi:Impossibile realizzare una cartografia mentale con gli studenti della scuola, o come mappare ciò che pensano, ho scelto di potenziare una scrittura variante e intensiva

sulla tesi stessa. Di fronte a questa affermazione, il problema si distingue versi la seguente problematica: cosa si può inventare quando si pensa che il pensiero sia

variabile e allo stesso tempo soggetto al contesto scolastico?

Spiego di seguito quali sono state le mie affettazioni, le mie aperture per espandere il campo inventivo, intenso e intuitivo della nuova tesi. Quali forze e passioni ho preso

durante la scrittura.

La tesi è stata scritta dalla composizione di linee intensive. Senza un chiaro senso, queste linee hanno attraversato il campo che è racchiuso nella tesi. Una tesi che ha ricevuto nel suo rivestimento cinque intercessori che pulsano nella loro (dis)centralità e

nello stesso tempo, questi cinque intensificatori di campo sono fortemente estesi per linee varianti e creano nuove affettazioni che devono essere costituite dalla lettura di

questo altro testo.

Per una prima passione che mi lascia influenzare, porto qualche effetto di "Il castello" di Franz Kafka. Questo sinistro amalgama di difficile accesso, o oscurità e

incomprensione. Qualcosa che vuole andare, che vuole entrare, ma non può. Non decifra i codici del luogo che c'è e qualche volta, il personaggio principale, finisce

per passare attraverso l'ingenuo, il pagliaccio, l'idiota.

Una seconda ispirazione è un breve video del YouTube, in cui Gilles Deleuze annuncia alcune parole su cosa sia una lezione. Tra le sue parole, una frase particolare toccata e

attaccata per la proliferazione della nuova composizione della scrittura della tesi. Lì troviamo Deleuze che dice che non tutti gli studenti sono interessati durante una lezione

e nemmeno sull'intero argomento in discussione ma che quando una faccenda interessa anche chi sta dormendo è così, uno scatto istintivo e finisce per dirigere l'attenzione

sull'argomento annunciato al momento dell'interesse. Sta accadendo qualcosa nelle menti di coloro che distraggono l'attenzione, in coloro che distolgono l'attenzione, in

coloro che variano.

Un terzo componente, quindi, passa attraverso la vecchia tesi.La tesi è stata presentata con un'ambientazione che ricorda il campo scientifico, in un'analisi di dati rigidi,

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comparativi ea volte giudicativi.Il lettore curioso con questo sarà in grado di accedere a questa altra modalità di categorie di analisi alla fine della nuova versione.

Anche un capitolo destinato all'introduzione dei concetti stava ramificando, diffondendo e infettando la nuova tesi in altri modi.Vie di accesso non trovate prima. Sembra che "il

castello" abbia passaggi segreti.

Un quarto elemento molto curioso passa attraverso un blocco di affetto che può essere l'intercessore più amato e forse desiderato.Non riesco a descrivere il momento in cui si

è seduto per creare la composizione della nuova tesi.Non ho davvero il ricordo, ma probabilmente è dovuto al fatto che guardo spesso film di generi e stili diversi. In questo caso, sto parlando di un film per bambini intitolato "Monsters S / A". La sinossi

del film ruota intorno al furto di energia dei bambini, estratta dalla paura, dalla coercizione, dallo spavento e dall'imposizione, e poi trasformata in energia elettrica nel

mondo dei mostri.Alla fine del film, si scopre che si può estrarre questa vitalità fin dall'infanzia, per generare energia nel mondo dei mostri, attraverso risate e gioia.

Tuttavia era ancora una rapina, un uso codardo e un controllore d'infanzia. La nostra ultima passione è molto semplice. La scrittura della nuova tesi è questo quinto

elemento. Il modo senza pretese di voler essere elencato in teorie, forme, nomine per assegnarlo finalmente da qualche parte, o per dire: "questa è una tesi che soddisfa gli standard dell'accademia scientifica globale e bla bla bla ...". La tesi non vuole trovare qualcosa da dire che la pianifichi in un tono agghiacciante, in un colore grigio che

riguarda solo una singola cosa, o una specifica nicchia di lettori studiati per comprendere quel soggetto.Qui troverai ronzio, ululando, urla, ma gioia. In questo senso, lascia che il testo fluisca semplicemente, senza controllo, senza pressione, senza

paura, senza voler quantificare, nemmeno qualificare.

L'intenzione era di cercare di creare un'atmosfera in cui questi cinque assi davano la necessaria coerenza alla forza del problema di ricerca. Anche il suo senso originario è

stato intensificato per meglio comprendere il caos che è la variazione del pensiero. Sovrapposizioni e ricomposizioni per far emergere la sensazione di ciò che significano i

cinque intercessori.

Attraversato da questo insieme di almeno cinque elementi che possono essere concisi, poiché gli altri attraversano un livello di attraversamento impercettibile anche per chi ha

scritto la tesi, tutti sono ad un livello di intensità che va oltre le descrizioni, le presentazioni, le analisi e le nomine.È scritto per tutti, in un testo che passa attraverso

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la sensazione di paura e gioia, di oscurità e chiarezza, di ingenuità e malandragem, del bravo ragazzo che si dà del male e che trova nuove strategie di fuga.

Quindi, per l'apprezzamento del testo, preparati a trovare una storia, senza pretese letterarie, molto meno accademica, o qualcos'altro già pensabile. La scrittura della tesi nasce come l'atto di variazione del pensiero stesso. Che cosa si può inventare quando si

pone il pensiero al variare e allo stesso tempo essere soggetto al contesto scolastico? Troveremo un testo in cui un personaggio conduce la storia. E lasciati guidare dalle passioni che si incrociano. Altri personaggi sono presentati come concetti-personaggi.

Poi nel testo troverai Gilles Deleuze, Virginia Kastrup, Paolo Mottana, tra gli altri. Troveranno la società scolastica fortemente istituita in nome di ordine, potere e

controllo.

Ma gradualmente questa sensazione svanisce, quando il personaggio scopre che può coinvolgere la scuola con metodi diversi da quelli già istituiti, e forse, quindi, portare un

po 'più di gioia, colore e odore in questo luogo così ostile, inospitale e degradato che è una scuola tradizionale.Ma circondato da un senso di persecuzione e controllo, scopre che la scuola, sia essa tradizionale o alternativa, è ancora sui pilastri della stessa fine.

Abbiamo ancora bisogno di un posto per controllare e meglio indirizzare i metodi di insegnamento.

Il personaggio che guida la storia si sente poco comodo mentre la trama se sucede. Ma anche confusa e turbata decide di investire nei suoi ideali utopici ed è quando il suo destino viene lanciato in un nuovo campo. Una nuova aria di mistero guiderà la storia

quasi alla fine.

È una storia semplice raccontata in tre grandi blocchi. Il primo è il blocco della novità e proprio per questo, della paura. Entrata a scuola, incontro con persone oscure e sovversive.L'imposizione di regole e contratti da parte dell'amministrazione di quel

luogo viene presentata in quel momento. In un secondo blocco abbiamo l'apertura, l'intimità con la gestione nel luogo in cui il personaggio lavora.Un falso senso di quasi

benessere circonda l'atmosfera di questo blocco. E per concludere, nel terzo blocco, troviamo modi di controllo più feroci, ma tuttavia possibili da stabilire altre linee di

fuga.

Per la realizzazione della proposta creativa testuale della tesi, sono stati omessi i dovuti riferimenti bibliografici di citazioni teoriche, parti di testi letterari e rapporti sul campo

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dottorato), che sono imiscuidici in tutto il narrativa. Tutti i passaggi che fanno riferimento alle quotazioni sono scritti in corsivo. Si è deciso di riferire tutti gli estratti

usati alla fine della tesi e compaiono nell'ordine di impaginazione.I tempi verbali, le concordanze pronominali e l'inclusione di altri dialoghi durante la citazione sono stati modificati in base alla creazione narrativa e debitamente indicati insieme al riferimento

del brano, sebbene rimangano in corsivo. ***

Ecco, da lontano, dietro quella foschia, potrebbe esserci qualche porta all'ingresso nella storia. Non si sa esattamente come sia la porta. Ma aspetta! Vedi! Il sole sta sorgendo!

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PRIMEIRA

PARTE

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CONVITE

- “Sei que existe um lugar onde você pode oferecer seu trabalho.”, disse ela num tom imperativo e, com sua voz rouca, continuou, - “eu também trabalho lá e posso lhe apresentar aos superiores responsáveis. Vou lhe fornecer o endereço e telefone deste lugar, mas aguarde uns dias, primeiro eu converso com eles e depois peço para entrarem em contato.”, e desligou.

A entrada do lugar oferece uma única porta azul escura. Ela não é confortável, nem mesmo macia. Ela é de ferro, gelada e dura. De imediato, na segurança do portão, avista-se Sr. Fungus, pessoa gélida, enrugada dos anos de cigarro e de pouco sorriso, porém, perfeito para assumir tal função. Depois de uma breve identificação, Sr. Fungus realiza um telefonema e em poucos minutos libera a entrada do recinto. O portal azul se abre, num ranger das correntes, e com o deslizar do portão, compondo uma mescla de ruídos graves e agudos, se fecha. Era uma visita importante para o qual tinha sido agendada uma entrevista com a autoridade máxima lá existente, a diretora. Do portão, sob guarda do Sr. Fungus, a poucos passos estava a sala da diretora, e ao percorrer este curto trajeto noto crianças de diferentes idades e alguns poucos adultos.

- “Seria um trabalho com crianças? Para onde será que „ela‟ havia me designado prestar serviços?”, pensava enquanto caminhava ao meu destino.

A senhora diretora H. J. P. Waternoose recebeu-me cordialmente, sua sala era decorada em tema de floresta, falseando aquela visão da imagem de fábrica/empresa. Sua poltrona marrom parecia mais um tronco gigante de árvore que ornava perfeitamente ao estilo do recinto e sem deixar de notar no meio da pintura do rio, um umidificador de ar borrifava minuto a minuto um aroma de eucalipto silvestre, o que de fato enfatizava o tema da decoração. Sem que eu precisasse falar demasiadamente, aceitou minha oferta e prontamente fui encaminhada para conhecer meu futuro supervisor de trabalho.

- “Siga-me! Vou lhe apresentar seu destino.”, anunciou Waternoose como uma sentença.

Ainda andamos alguns passos até o encontro, e foi nesse percurso que avistei inúmeras portas, a maioria fechada e algumas semiabertas. Das abertas pude ver que as salas eram habitadas por cerca de umas trinta crianças para apenas um único adulto.

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- “São crianças, não há mais dúvidas. Porque eu fui escutar „ela‟? Agora já é tarde.”, pensei enquanto balançava a cabeça e deixava para trás a imagem do portão azul com o Sr. Fungus.

- “Toc-toc-toc. Com licença Sr. Wazowski, quero lhe apresentar a Srta. Sullivan...”, disse a diretora ao abrir da porta, e explanou a sentença, - “... a partir de agora ela vai trabalhar com o senhor.”.

Sr. Wazowski sorriu e mostrou um semblante como se dissesse, - “enfim um empregado para auxiliar na minha função.”.

Porém não sabia Sr. Wazowski o que lhe aguardava... APRENDER

Em poucos dias de trabalho precisei afinar minha função a função do lugar. Sr. Wazowski não impedia que meu trabalho fosse executado com autonomia, porém muitas vezes precisei auxilia-lo junto à sua função. Foi assim que aprendemos um com o outro a respeitar a individualidade do trabalho de cada um. Sr. Wazowski transmitia seus saberes de modo um tanto quanto original e poderia soar a muitos com um tom de transgressão. Cantar “rock and roll” e trabalhar suas letras na aula de português pareciam ser um meio interessante de ativar a participação de todos, e durante a música tentava incluir coreografias para que enfim os corpos pudessem se exercitar. Aos poucos fui notando do por que de alguns professores fechar as portas das suas salas: ou seria para não serem perturbados, ou para não verem o interessante que fugia da rotina.

A sala era configurada por cerca de trinta crianças para agora dois adultos, no estilo mais clássico da representação de uma sala de aula, cinzenta, amarelada, móveis danificados, quadro negro verde e pó de giz esparramado por todos os quatro cantos. Um relógio no centro superior da lousa exibia sempre a mesma hora, o que transmitia a sensação de um tempo sem fim, as cortinas beges e empoeiradas davam uma sensação de pouco acolhimento e desejo em ali permanecer. Nada atrativo a não ser as mil faces que o Sr. Wazowski assumia para entusiasmar a turma. Além disso, ficava ao seu cargo e função a coordenação, organização, sistematização e definições das categorias de saber para todos, enquanto eu, ao fundo da sala, parecia ser apenas mais uma estudante. Cada dia mais perdida, envolta em inúmeros papéis anotados, rabiscados com observações dispersas e desconexas, continuei ali. Nenhum superior, nem mesmo Sr.

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Wazowski desconfiavam da minha presença, nem mesmo da função que exercia ali dentro, e por incrível que pareça poucas crianças se incomodavam com a minha figura.

Sr. Wazowski, mesmo que ludicamente, ensinava alguma coisa para seus alunos e certamente, muitos deles, aprendiam alguma coisa sobre o tema ensinado. Foram nesses dias observando o conjunto da sala e de toda a sua maquinaria de conteúdos programáticos que comecei a me incomodar muito com o quesito ensinar e aprender. Não percebia uma conexão interessante entre esses dois termos no ato de uma cena pedagógica, pois ao observar as ações dos alunos, via outros interesses pairando no ar enquanto o professor falava.

Certo dia levantei para ir ao banheiro. No caminho avistei uma porta semiaberta e ao entrar, não era o banheiro, era o laboratório de informática. Encontrei um senhor sozinho que parecia consertar algum aparelho. Ao apresentar-se falou que era o técnico responsável pela operação de máquinas emissoras de informação da Escola S/A e que poderia chamá-lo por Boggs.

- “E você quem é? Nunca havia lhe visto antes!”, perguntou tratando-me como se fosse mais um dos seus aparelhos tecnológicos.

Brevemente apresentei-me, dizendo que era minha primeira semana, e então, ele olhou para mim num movimento de raio-x instantâneo e logo curvou a cabeça retornando ao seu serviço.

- “Sabe de uma coisa, sempre quis aprender a arrumar computadores.”, comentei para que pudesse retornar uma conversa, e sem ao menos voltar seu rosto ao meu iniciou uma conversação enquanto arrumava seus equipamentos.

- “Sabe de outra coisa Srta. Sullivan, ou posso chamá-la pelo seu apelido,

Sulley? Um professor não se questiona quando interroga um aluno, assim como não se questiona quando ensina uma regra de gramática ou de cálculo. Ele „ensigna‟, dá ordens, comanda.”, aumentando a voz em cada palavra anunciada e continuou, - “os mandamentos do professor não são exteriores nem se acrescentam ao que ele nos ensina. Não provêm de significações primeiras, não são a consequência de informações: a ordem se apoia sempre, e desde o início, em ordens.”, e gritava nas

palavras imperativas, - “Por isso é redundância. A máquina do ensino obrigatório não

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bases duais da gramática. As palavras não são ferramentas; mas damos às crianças linguagem, canetas e cadernos, assim como me deram essa chave de fenda. Provavelmente um dia você também aprenderá.”.

Ao término de suas palavras Boggs continuou sua função, ignorando completamente qualquer reação minha, e assim, sem pronunciar nenhuma palavra, saí do laboratório de trás para frente observando suas ações enquanto ele, de cabeça baixa, seguia nos seus consertos técnicos. Não me atrevi a incitar nenhum outro assunto, naquele momento, não queria voltar a conversar sobre outro tema enquanto não digerisse tal apontamento, que num primeiro momento só me serviu para duvidar mais ainda daquilo que estava fazendo naquele lugar.

- “Mas o que será que esse senhor Boggs estuda além de informática? Será que ele é despossuído de razão? Ou o contrário? Como saber?”, pensava enquanto retornava meio cabisbaixa para a sala de aula, sem entender muito bem se aquelas palavras possuíam algum sentido lógico. Ao sentar no meu posto lembrei-me que não fui ao banheiro e durante aquela manhã segurei meu xixi até o limite.

Volta e meia o Sr. Wazowski me olhava como se fosse mais uma aluna, quase querendo verificar a minha aprendizagem daquilo que recém havia ensinado. Porém na maioria de seus olhares, e como na verdade ele ainda não sabia quais seriam meus serviços prestados, me olhava com um pouco de medo e receio. Ele que apenas havia obedecido ao comando de sua superior, não sabia de quem se tratava aquela estranha recém-chegada, fazendo com que seus olhares fossem um tanto quanto duvidosos sobre a minha presença no ambiente. Bem na verdade, nem mesmo eu sabia ao certo o que iria fazer diante tal situação, aceitar um convite sem ao menos saber do que se tratava não foi uma das minhas atitudes mais sãs. Não imaginava o que era uma Escola S/A, nunca havia prestado meus serviços a um público desse nível, nem mesmo em uma empresa de ensino de tamanho porte.

Mas foi justo nesses dias e mesmo com uma grande dúvida que me assolava diariamente, percebi a necessidade de exercitar lembranças, num sentido de rememoração, e foi assim, ativando minha intuição é que talvez poderia intervir num processo, e assim comecei a ficar mais tranquila quando direcionei minhas primeiras ações a simplesmente observar um único ponto específico: a passagem de um ensinar para um aprender. Assim, para os primeiros momentos de contato com esse novo

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território, observei transições que se procediam naquela rotina diária dentro de uma sala de aula sob o ponto de vista do ensino-aprendizagem.

Foram nesses dias que um certo refinamento de repertório surgia em relação ao que observar, quando, quem e como. Estratégias começavam a serem criadas para que se pudesse atravessar um fluxo já organizado. Aos poucos fui interagindo com as crianças para tentar entender o que de fato elas aprendiam com letras, formas, fórmulas, etc. que lhes eram ensinados. Pouco a pouco descobri mais do que apenas folhas copiadas de matéria escolar, notei outros escritos, desenhos, folhas em branco, rasgadas, amassadas, recortadas.

Nesse meio tempo percebi em um deles uma certa interferência. Certos traços fizeram com que minha atenção se voltasse quase que por completo a ele. Durante a aula do professor percebi que ele criava certas estratégias para fazer com que não estivesse ali, como se viajasse sem sair do lugar, emitindo risos dispersos, falas desconectadas ao tema da aula, cantos e dancinhas de outra ordem, interferindo na lógica do contexto apresentado. E isso me interessou bastante, esse era o ponto necessário a ser exercido pela minha função no lugar, descobrir com os alunos aquilo que de fato aprendiam enquanto o professor ensinava, isto é, investigar justo essas interferências.

As crianças tinham um repertório entre o que Sr. Wazowski ensinava e o que elas aprendiam, pois muito daquilo que era ensinado não era correspondente ao que deveriam aprender. Nesse entre ensinar e aprender elas criavam inúmeras conexões. O caminho diferenciava para todos, e a multiplicidade de percursos demonstrava a variação de um pensar justo quando submetidos a ensignamentos.

- “Como é interessante essa passagem entre ensinar e aprender. Que grande abismo inventivo pode se criar num breve instante. Quantas outras interferências são ignoradas na sistemática da rotina escolar? Seria através desse rasgo pedagógico que prestaria meus serviços? Apostando na dissonância entre o ensinar e o aprender?”, pensava eu pela última vez antes de me convencer a exercer consistentemente a minha função. Extravasar o que a Escola S/A espera de mim e criar com as crianças espaços possíveis de desprendimento desse método que quer conter um pensamento cooptador da criatividade do estudante durante o percurso escolar.

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- “E o que a Escola S/A quer de mim?”, na conversa com a diretora, ela havia dito que meus serviços prestariam como colaboradora didática pedagógica e de auxilio aos estudantes. No entanto, com uma função extremamente ampla, não sabia ela o que realmente agregaria a tal cargo. Ao apresentar-me para o professor, certamente ela achou que eu acompanharia as crianças como um reforço àquilo que não conseguiam aprender. Em certa medida estava certa, pois foi justamente isso que me apaixonou ao conhecer essa atmosfera de uma sala de aula. Sr. Wazowski também compactuava com o imaginário da diretora, porém em nenhum momento disse algo do gênero, salvo as vezes que precisava se retirar da sala para realizar outras atividades (xerox, buscar televisão, dvd, etc.) e pedia que eu conduzisse a classe. Somente depois de entender minha função, decidi conversar com o Sr. Wazowski anunciando alguns afazeres, digamos que “extras”, para o melhor aprimoramento da minha função. Ele, sem ressalvas, disse para incluir tudo aquilo que cooperasse para o desenvolvimento dos seus alunos sem problema algum.

Desse modo, após um tempo observando essas pequenas cenas pedagógicas que se criavam diante de meus olhos, e que não eram levadas em conta, percebi que poderia acentuar tais inclinações, e assim, em poucos dias captei meu colaborador de trabalho. Diante de tantos ali, escolhi o mais “refinado”, o mais bem indicado para atuar nessa situação e assim tentar entender o que de fato uma criança pode enquanto inventa outros caminhos deambulantes.

Em uma breve conversa, explanando sinteticamente meu pensamento embrião, Sr. Wazowski não impôs nenhum empecilho quanto à execução de minha função. Aos poucos começou a enxergar-me com mais segurança sobre aquilo que eu havia lhe proposto; passou a não olhar-me como se fosse mais uma aluna, e nem mesmo com aquele velho ar de desconfiança ou de quando me ignorava. Meu serviço a ser prestado à Escola S/A estava finalmente traçado. De agora em diante assumia minha função, sem que ele soubesse o que o termo função implicasse para mim, continuei convicta de meus embasamentos.

Minha função naquele lugar alicerçava-se em criar estratégias que afrontassem a estrutura escolar no seu patamar de saberes e poderes hegemônicos, intensificando rompimentos nas suas redes e circuitos. Seria a apropriação das ações que possibilitaria a mim e aos afetados, pequenos espaços de descontinuidade do óbvio, assim como

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potencializar o que de mais rico há em nós, as variações em pensamento. Expandir a noção medíocre de sujeito que nos é fabricada, desnormalizando ações, gestos, práticas que nos aprisionam como sujeito. Enfim encontrar espaços para a transgressão como liberdade de criação.

INVENTAR

Ao dedicar meus serviços naquele lugar, optei por desenvolver minha função com um colaborador que de fato me traria prazer em estar ali, foi quando Boo surge como aquele que me colocaria em constantes desabalos. Minha função seria criar cenas pedagógicas para Boo poder extravasar seus desejos, aprenderes, gostos, habilidades, juventude, corpo. Tanto Boo quanto eu, diariamente nos colocariamos em lugares de invenções. Quem começará a incitar tal proposição?

A proposta das cenas pedagógicas reforça a ideia de improviso e presentificação em acontecimentos emergidos como ocupação do presente. Tomar atenção dos detalhes que querem dizer algo, e predominantemente são desconsiderados, deixando assim que fluxos sensíveis acabem escorrendo pela rigidez escolar. Presenciar o que as cenas pedagógicas trazem através de espaços ao exato momento da ação, fazer isto é presentificar os signos que rondam um encontro, potentes a incitar intensidades e múltiplas descobertas através das afetações que se cruzam.

Com o intuito de expandir meus olhares na Escola S/A, comecei a caminhar pelo seu espaço. Foi então que certo dia entrei para conhecer a biblioteca, explorar os livros e outros tipos de materiais que dispunha, e conheci Roz, funcionária do recinto nas partes da manhã. Roz, com um largo sorriso vermelho que compunha estilosamente com um vestido vermelho floreado de azaleias brancas e com um perfume demasiadamente adocicado, acena com a mão num gesto a saudar minha chegada. Apresentei-me brevemente e pedi licença para manusear alguns livros. Após vasculhar bem as obras e materiais disponíveis, comentei com ela como era incrível a capacidade dos distintos autores em inventar histórias dos mais mirabolantes estilos. Roz com seu largo sorriso vermelho cintilante no rosto respondeu:

- “A invenção é algo incrível mesmo, ela é a abertura para o novo, para o

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numa trama sem igual. Inventar algo é sempre híbrido e imprevisível, pois não sabemos quais componentes serão acionados no momento da criação.”.

- “Nossa Roz, é isso mesmo!”, afirmei toda feliz por finalmente encontrar uma pessoa que conversasse num nível parelho de entendimento e que assim, pudesse conversar para além dos encargos funcionais. - “Posso sentar aqui um pouco?”, arrastei uma cadeira de madeira próxima da sua mesa plena de livros didáticos e aproveitando que não era horário de troca de livros e, que, portanto não havia alunos no recinto, comentei:

- “Sabe que uma vez uma pessoa me disse que a invenção é amorfa, é vapor, é

imperceptível, que existe um tempo para ela acontecer, mas também que ela é deambulante, passageira, fluído que transborda espaços e tem como caráter a predominância da ordem de um Saber. Ela pode ser facilmente capturada, mas é silenciosa, se dá no meio, nos espaços menos previsíveis, num pensamento mais discreto possível.”.

Ainda acrescentei sobre a imagem dos alunos que aparentam estar atentos ao conteúdo da lousa, mas na verdade não estão, pois nesse meio tempo, seus pensamentos fazem festa de cores e cheiros incapturáveis no quesito inventivo, quase como o cheiro que se propagava por quase toda biblioteca de perfume adocicado com mofo.

- “Srta. Sulley você sabe que eu aprecio muito os estudos que estimulam a invenção contínua, e sei bem como é difícil desvincular a invenção de uma reprodução, não podemos reduzi-la a um conjunto de leis invariantes e abrevia-la simplesmente ao já conhecido. Com isso o caráter da imprevisibilidade desaparece, e sem as surpresas potenciais a invenção é destituída de seu principal atributo que é a produção de novidades. Imagina se elas fossem roubadas dos nossos tão queridos escritores?”, disse

Roz com suas sobrancelhas grossas e negras, dançantes e pulsantes, para cima e para baixo.

Arrastando a cadeira e inclinando meu corpo quase num esforço brutal para se aproximar ao dela, sussurrando perguntei, - “Mas Sra. Roz, você acha que a Escola S/A está roubando a capacidade inventiva dos alunos?”.

- “Rá, rá, rá, rá, mas é claro minha cara ingênua. A Escola S/A é uma das primeiras instituições que rouba nossa inventividade, nosso tempo, nossa vida, nossa

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energia, nossos desejos e nossas alegrias”, anunciou numa tonalidade irônica e continuou, - “somos submetidos a um processo cognitivo desde os primórdios, onde a

invenção cede lugar a uma aprendizagem de regras e a construção de esquemas intelectuais. Por melhor que sejam os professores, por melhor que sejam os alunos, por melhor que sejam os métodos, o problema está justo nos signos de ordem emitidos diariamente nesse lugar. É por isso que o ensigno é visto como o grande vilão da Escola S/A.”.

- “Sabe Roz, finalmente encontrei minha função aqui nessa Escola S/A. Aparentemente tudo vai funcionar direcionado a uma lógica em que as infinitas variações do pensamento não serão deixadas de lado, em prol de uma organização modular de pensamento. Percebi, em poucos dias, que há um desperdício de inventividade em prol de uma produção massificadora da cognição. Um sistema que prende o signo na significância de um mesmo sentido, fatalmente destina esses estudantes a não terem opções, a não ser, reproduzir, ou então, em pensamento e escondidos, num movimento de linha de fuga, variar seus pensamentos.”.

Ao finalizar, lembrei-me de Boggs e aquilo que ele havia dito e finalmente encontrei sentido à conversa solta sobre os signos e ensignamentos.

- “Srta. Sullivan vamos finalizar essa conversa que em cinco minutos chegam os alunos, você é bem-vinda quando quiser, eu fico aqui todas as manhãs, dia após dia, sem falhas, sem interrupções e sempre em silêncio. Vá lá e tente fazer alguma coisa para que sua função não seja parecida com a minha, coloque sua função em ação o quanto antes, pois é de supra importância iniciar um movimento de experimentação aos imprevisíveis, só assim as coisas podem mudar, mas antes de mudar elas implicam um tempo... A transformação de uma ideia em um experimento pode implicar uma longa gestação, uma espera... Portanto, comece agora. Tchau.”.

Com um pouco de dor de cabeça, devido a mescla de cheiros, acenei com a mão quase sem poder levantá-la, muito menos dizer algo, e mesmo saindo dali um tanto quanto tonta, gostaria de ter ficado mais e aprendido um pouco mais com Roz. Tempo, espera, experimentação, agora eram tantas palavras interessantes que estavam em minhas mãos para executar alguma proposição com elas.

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Nesses dias que seguiram concentrei minhas energias numa etapa introspectiva das observações. Boo ainda não sabia que já era o escolhido, então foquei meu olhar diretamente a tudo aquilo que ele realizava dentro e fora da sala de aula, anotando tudo em pedaços de papéis encontrados aleatoriamente na minha bolsa. Pensativa sobre a questão da inventividade comecei a pesquisar sobre o assunto e sobre proposições interessantes para começar a execução da minha função. Precisava encontrar algo que tivesse sentido para Boo, algo que o colocasse em choque, em estado de intensa felicidade pelo inédito. Por isso mesmo uma tarefa dificílima de realizar.

- “E se fugisse da Escola S/A?”, pensei alto, - “Não, não seria uma tarefa fácil, o Sr. Fungus é excelente na sua função de guardar pessoas, não seria fácil escapar dele. Não! Desistir agora seria tolice. Posso ser ingênua em certos aspectos, mas tola não. Vou enfrentar o que me aguarda mesmo sem saber o que é.”, pensei uma última vez em desistir, mas percebi que já estava envolvida na trama e agora era tarde demais...

INSTAURAR

Vagante e inquieta, decidi entrar na sala de informática, quem sabe Boggs soltasse mais uma daquelas suas frases, e quem sabe com elas eu pudesse partir para seguir nas minhas proposições junto com Boo.

- “Bom dia Boggs, tudo bem?”, saudava o funcionário com um sorriso tímido e maroto.

- “Bom dia! Mas quem é você? Como sabe meu apelido íntimo? Quem lhe ordenou entrar na minha sala?”, perguntava ele enquanto me enchia de perguntas como se fosse uma completa estranha.

- “Boggs, sou a Srta. Sulley, este é meu apelido íntimo, mas meu nome é Srta. James Sullivan. Eu vim outro dia aqui e conversamos brevemente, hoje vim por que quis, ninguém da Escola S/A me enviou”, respondi um pouco nervosa e quase achando que estava cometendo um grande crime.

- “Hmmm, muito bem, entre e feche a porta, estou instaurando um novo sistema de funcionamento para as máquinas”, disse ele com um semblante mais solto.

- “Só para as máquinas? Que pena”, respondo em um tom de ironia ao tentar quebrar o gelo do início obscuro do nosso diálogo.

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- “Olhe menina, sobre aquele dia, venha ver o incrível nascimento do novo e tente aprender algo com isso.”, sussurrou baixinho como se fosse alguma coisa ilegal. Boggs na verdade se lembrou de mim e inclusive do assunto o qual brevemente havíamos conversamos.

- “Veja bem Sulley, aprender diz respeito essencialmente aos signos. Os signos

são objeto de um aprendizado temporal, não de um saber abstrato. Aprender é, de início, considerar uma matéria, um objeto, um ser, como se emitissem signos a serem decifrados, interpretados. Não existe aprendiz que não seja “egiptólogo” de alguma coisa. Alguém só se torna marceneiro tornando-se sensível aos signos da madeira, e médico tornando-se sensível aos signos da doença. A vocação é sempre uma predestinação com relação aos signos. Tudo que nos ensina alguma coisa emite signos, todo ato de aprender é uma interpretação de signos ou de hieróglifos. Veja minha precisão ao manusear essas máquinas, veja que sou sensível aos signos dos códigos da máquina como os softwares e bytes. E você? Em que pé de sensibilidade se encontra para envolver-se com a sua função?”, sentenciou Boogs simplesmente me deixando

muda por alguns instantes e agindo como se soubesse da minha intenção ao visitar o seu laboratório.

- “Boggs, sabe que você fala sempre muito difícil, e, além disso, consegue me deixar com uma sensação perturbadora dias a fio. Mas eu insisto em querer conhecê-lo melhor, esse foi o motivo de ter voltado, voltei por que algo do que você me disse aquele dia e hoje, são assuntos intrigantes e que talvez possam movimentar ainda mais um grande problema pessoal e profissional.”.

Boggs apenas ergueu as sobrancelhas quase escondidas pelo seu longo cabelo, como se dissesse: - “Vai, continua!”. Expliquei a ele minha angustia sobre a inventividade e elucidei que nesse lugar ela é pouco colocada em ação, também expliquei que minha função na Escola S/A seria acompanhar a inventividade do aluno Boo enquanto submetido aos ensinamentos do cerco escolar.

- “Eureka, aqui estava o problema que impedia a instauração do novo. Jogamos fora, formatamos e voilà! Partimos em busca do tempo perdido com velharias retrógradas que impedem a criação. Com as máquinas, menina, veja só, é mais fácil. Já no seu caso, não sou perito, sou bom naquilo que faço e consigo inventar programas incríveis para compartilhar com as crianças da Escola S/A. É isso que faço, dou asas

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àqueles que ainda caminham. Ensino migalhas frente aquilo que realmente eles poderiam inventar. Juntos, também fazemos funcionar essa grande maquinaria escolar, ao mesmo tempo afetamos e somos afetados. E sobre o seu caso aí Sulley, nunca se

sabe como uma pessoa aprende; mas, de qualquer forma que aprenda, é sempre por intermédio dos signos, perdendo tempo, e não pela assimilação de conteúdos objetivos. O signo implica em si a heterogeneidade como relação. Nunca se aprende fazendo como alguém, mas fazendo com alguém, o que não tem relação de semelhança com o que se aprende. Quem sabe aí você possa instaurar um trabalho COM Boo?!”.

Silenciada por suas palavras, seguiu com seus conselhos:

- “Dizer que pensa não necessariamente significa pensar. O pensamento como uma faculdade natural de todo ser humano pode ser confundido como uma mera recognição do mesmo. O pensamento como cópia daquilo que já existe, encaminha-nos para campos confortáveis e tranquilos no pensamento. Como se o pensamento só pudesse começar, e sempre recomeçar, a pensar ao se libertar da Imagem e dos postulados. O pensamento só recomeça inventar ao se desvincular das tramas da recognição, da representação, dos métodos, das fantasias, estas, apresentadas em blocos pelas maquinarias dos „sistemas disciplinares‟ e de „controle‟. É só a partir de um encontro fortuito que o pensamento é forçado à criação de novos problemas, sem ele, o pensamento recai na mesmice da recognição e nada de novo é apresentado ao pensamento; ele então, só pensa quando coagido e quando forçado. Bem, veja minha cara, nosso ouro está chegando.”.

Com a chegada dos alunos para a aula de Boggs, fui obrigada a enfrentar sozinha todas as novas problemáticas trazidas por ele e que sempre me deixavam ainda mais confusa, mas mesmo assim, estava começando a confiar nas palavras dele e a cada dia, tentando entender mais um pouco o que ele dizia. Lembrei então das duas figuras importantes que estavam se tornando ele e Senhora Roz como disparadores de pistas para potencializar meu problema em relação à execução da minha função.

ELA - “Alô?”. - “Sim!”.

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- “É a Mae falando?”.

- “Sim, é a Mae, quem fala?”. - “Aqui é Sulley!”.

- “Ah, você! Diga o que quer!”.

- “Mae, sabe o serviço que você me ofereceu?”. - “E então? Foi aceita ao cargo?”.

- “É, eles me aceitaram.”.

- “E você tem algo a me relatar?”.

- “Pois então, já está dando problemas. Você pode me ajudar?”. - (silencio!).

- “Alô, Mae? Mae? É a Sulley, acho que a ligação caiu.”. - “Quem está falando?”.

- “Eu, a Srta. Sullivan, ainda está na linha?”.

- “Seja breve que estou com uma grande dor de cabeça.”.

- “Então, queria partilhar com você o que anda sucedendo na Escola S/A. Você falou que trabalha lá, mas eu nunca a vi por lá. Então por isso resolvi ligar e conversar sobre a possibilidade de você tentar colaborar na execução da minha função, tudo bem?”.

- “Que horas são?”.

- “Agora? Agora são 16h41min.”.

- “Diga o que precisa, mas seja breve. Tenho uma importante reunião daqui há dez minutos.”.

- “Ah, obrigada. Eu vou tentar resumir para conseguir falar nesses dez minutos que você tem disponível. Sabe Mae, depois desse tempo na Escola S/A finalmente descobri o que posso fazer com a minha função, sabe, tenho a intensão de cartografar as

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variações do pensamento escolar e tentar extrair minimante sutis sensibilidades que perpassam um pensamento que vaga por entre múltiplos graus de variações, pois como é sabido o pensamento imposto para a organização de dentro de uma sala de aula é o da imagem dogmática do pensamento, a imagem da cópia daquilo que se é ensinado e que muito difere do pensamento da variação, da experimentação, da criação. O pensamento engendrado dentro da sala é o da ordem, do senso comum, do bom senso, da tradição, da representação, do método. É um pensamento vinculado às aparelhagens do Estado que impede um pensar em variar sem margens. Um pensamento na lógica do aparelho de Estado prima a organização quando um pensamento variante tem paixão pelo caos. Tantas são as conduções possíveis que um pensamento pode nos levar, que não são possíveis de se cartografar nem o mínimo do que se pensa. Essas variações escorrem por muitos cantos e não sabemos se um pensamento as agrega e nem mesmo para onde vão. Ele pode criar alguma coisa de interessante, porém, em sua maioria, vemos jovens e crianças penderem de certa maneira a variação daquilo que podemos pensar ser uma besteira. Jovens e crianças adoram exercitar em horas a fio, pensamentos inválidos ao contexto de uma lógica gradual de saberes. Mas então, o que eles pensam? Eles pensam em qualquer coisa, bobagens que para o sistema escolar não fazem menor sentido, e o inverso para o campo da invenção, onde as tais besteiras podem compor algo pensante. As besteiras podem gerar quebras em um fluxo homogêneo, padrão rotineiro de uma aula, até surgir então uma ruptura anárquica dos modelos estabelecidos pelas aparelhagens, e a besteira emergir como um corte de fluxo resistente ao que se impõe. A besteira não é bem-vinda ao campo da escolarização, porém acredito que a besteira produzida em sala de aula pode ser uma força necessária para dar conta da produção de novos agenciamentos, produzir novos fluxos à invenção de um pensamento que não pende à cognição, mas que assume um pensamento outro, sem forma e que nunca está pronto. Alô Mae, você continua na linha? Conseguiu captar a sistematização daquilo que pretendo?”.

- “Olha Sulley, as crianças, por exemplo, e apesar daquilo que se costuma dizer,

resistem sem se opor. Elas sabem muito bem que não possuem os recursos para se opor, que sua condição é a de uma dependência infinita, tão infinita que só podem pensar a partir dessa dependência, e não sem ela ou contra ela. Contudo, as crianças admitem a instrução, não podem agir de outra maneira, mas desde o início de sua efetuação sabem fazer com que ela divirja, inventando maneiras de não fazer fazendo,

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