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A (im) possibilidade de aplicação do princípio da insignificância para o crime de pesca predatória

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GRANDE DO SUL

EDSON LUIS ROCKENBACH

A (IM) POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PARA O CRIME DE PESCA PREDATÓRIA

Santa Rosa (RS) 2016

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EDSON LUIS ROCKENBACH

A (IM) POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PARA O CRIME DE PESCA PREDATÓRIA

Monografia final do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUI, como requisito para a aprovação no componente curricular Metodologia da Pesquisa Jurídica.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: MSc. Lurdes Aparecida Grossmann

Santa Rosa (RS) 2016

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Dedico este trabalho a minha esposa Angela, e minhas filhas Gabriela e Natalia pelo incentivo e apoio durante os muitos anos da minha jornada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A minha esposa e as minhas filhas que sempre acreditaram em mim e me incentivaram a realizar meu sonho de cursar uma universidade.

Aos meus professores, com os quais eu tive o privilégio de conviver e contar com seus ensinamentos e dedicação, me guiando pelos caminhos do conhecimento, em especial ao minha orientadora.

Aos meus colegas de trabalho da Brigada Militar de Santa Rosa, que colaboraram com o meu aprendizado.

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise do Princípio da Insignificância, aplicado no crime de pesca predatória, a fim de demonstrar os contrapontos acerca de sua (in)aplicabilidade. Analisa a história da pesca e seu valor para a humanidade, a história da legislação pesqueira no Brasil, traz um conceito de ato tendente e sua aplicabilidade ao fato típico que é a pesca, dentro da visão constitucional. Estuda alguns princípios relacionados ao tema, em especial, a aplicabilidade do princípio da insignificância ao caso concreto. Expõe posicionamentos de alguns juristas, demonstrando a sua correlação aos atos processuais e confrontando-os com alegações de nulidades, em decorrência da afronta aos ditames constitucionais. Aborda as formas de aplicação das normas contidas na Lei 9.605/98, em seus artigos 34, 35 e 36. Faz uma breve análise das situações fáticas geradas e a falta de consenso de magistrados e tribunais sobre o assunto, discutindo se é aplicável ou não o princípio da insignificância ao crime de pesca predatória. Explana posicionamentos e considerações acerca do tema. Colaciona decisões proferidas pelo Tribunal Rio-grandense, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª região e pelo Superior Tribunal de Justiça. Finaliza concluindo que, haja vista o reconhecimento pelo Superior Tribunal de Justiça e a consolidação da matéria ao longo do tempo, é possível chegar à um consenso, quando revestido de todos os requisitos que o ato exige.

Palavras-Chave: Pesca Predatória. Direito ambiental. Crimes ambientais. Aplicabilidade. Princípio da insignificância.

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ABSTRACT

This final paper analyzes the Insignificancy Principle, applied to the crime of predatory fishing, aiming to demonstrate the counterpoints about its (un)applicability. It analyzes the history of fishing and its value to humankind, the history of the fishing legislation in Brazil, brings up a concept of a tending act and its applicability towards the specific fact, which is fishing, by constitutional eyes. It studies some principles related to the topic, especially the applicability of the insignificancy principle in a concrete case. It exposes some jurists’ positions, demonstrating its correlation to the processual acts and confronting them with nullity claims, due to the affront to the constitutional principles. It approaches the means of application of the norms within the Law number 9.605/98, in its articles 34, 35 and 36. It performs a brief analysis of the phatic situations generated and the lack of common understanding between magistrates and courts of the law about the topic, discussing if it is or if it is not applicable the insignificancy principle to the crime of predatory fishing. It explains the positions and considerations about the matter. It compares decisions uttered by the Rio-Grandense Court, by the Federal Regional Court of the 4th region and by the Superior Court of Justice. It brings to completion that, considering the acceptance by the Superior Court of Justice and the consolidation of the matter through time, it is possible to reach a consent, when coated by all of the requirements the act demands.

Key-Words: Predatory Fishing. Environmental Law. Environmental Crimes. Applicability. Insignificancy Principle.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 HISTÓRIA DA PESCA ... 10

1.1 História da pesca no mundo ... 10

1.2 História da pesca no Brasil ... 12

1.3 A história da legislação pesqueira no Brasil ... 13

1.4 Conceitos doutrinários e legais, categorias e métodos de pesca ... 17

1.5 Considerações acerca da pesca predatória ... 21

2 (IM) POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PARA O CRIME DE PESCA PREDATÓRIA ... 24

2.1 Aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes ambientais ... 24

2.2 Ato “tendente” na ótica da Lei 9.605/98, artigo 36 ... 33

2.3 Aplicabilidade do princípio da insignificância aos casos concretos nos crimes de pesca ... 35

2.4 Críticas à atual legislação e política ambiental ... 41

CONCLUSÃO ... 43

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca da aplicabilidade ou não do princípio da insignificância nos crimes de pesca predatória, em suas diversas modalidades. Traz também um breve relato da importância da pesca para a humanidade no Brasil e no Mundo, ressalta um breve histórico da legislação pesqueira brasileira e a importância dada pelos legisladores em relação a atividade pesqueira. Essa discussão é necessária face às diversas críticas tecidas e a falta de consenso sobre o assunto com alegação de inconformidade aos princípios constitucionais da legalidade e obrigatoriedade.

Para a realização deste trabalho foi utilizado o método bibliográfico, sendo efetuadas pesquisas de doutrinas e pesquisas por meio eletrônico de críticas, analisando também as posições pró e contra, e as decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Justiça Federal da 4ª região e do Superior Tribunal de Justiça, acerca da matéria, a fim de enriquecer a coleta de informações e permitir um aprofundamento no estudo da aplicabilidade do Princípio da Insignificância, revelando a importância do consenso para que haja harmonia nos processos.

Inicialmente, no primeiro capítulo, foi feita uma abordagem da importância da atividade pesqueira para a humanidade, destacando que ela é tão antiga quanto a história do homem. Também foi abordada o histórico da legislação pesqueira no Brasil e sua importância para a proteção ao meio ambiente, verificando que o legislador deu importância ao meio ambiente conforme a pressão da sociedade e de movimentos sociais. Constatado que, na época antiga, a atividade pesqueira era pequena e sua grande maioria servia apenas para subsistência. Como marco histórico, foi editada a Lei 6.938/81, que criou, entre outras concepções, a PNMA (Política Nacional de Meio Ambiente), oferecendo conceitos basilares sobre poluição e poluidor, indicando os princípios de responsabilidade civil objetiva por danos ambientais.

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Princípios estes consolidados pela Constituição de 1988, que recepcionou grande parte da Política Nacional de Meio Ambiente em seus artigos, especialmente no artigo nº 225, caput.

No segundo capítulo é analisada mais profundamente a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância os crimes de pesca predatória, motivo de muitas discussões, demonstrando que não há um consenso sobre o assunto, gerando decisões opostas até num mesmo tribunal. Analisado o significado de ato tendente e a intenção do legislador em abarcar um maior conceito de pesca. Por fim, elencadas situações e julgamentos oriundos da aplicação do princípio da insignificância nos crimes de pesca predatória, com intuito de contrapor posicionamentos e decisões.

A partir desse estudo, se verifica que o princípio da insignificância pode ser aplicado nas diversas esferas penais, inclusive nos crimes de pesca predatória. Porém, por tratar-se de um assunto tão delicado e relevante, que afeta toda a sociedade, deve ser adotado como exceção, com análise minuciosa do dano causado ao bem tutelado pela norma, observando se for pequeno ou ínfimo. Análise esta, de responsabilidade do juiz, que tem a missão de avaliar se o dano ambiental pode ser revertido e se ele tem reflexos no meio em que ocorreu.

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1 HISTÓRIA DA PESCA

A pesca sempre foi ligada à história da humanidade, sendo uma das atividades mais antigas desenvolvidas pelo homem. Grandes povos e nações foram erguidos em beira de rios, lagos e mares. Um dos motivos é por causa da água, que é essencial para a vida humana e outro por causa do alimento, que é fornecido pelas águas. A história nos mostra que os peixes e os crustáceos foram a base alimentar de vários povos, antes mesmo do desenvolvimento da agricultura. Começo este trabalho com um breve relato da história de pesca no mundo.

1.1 História da pesca no mundo

Apesar de o homem usar para se alimentar principalmente os peixes e crustáceos, levou muitos anos ou séculos para ele se aventurar para buscar o pescado em alto mar. A história mostra que guerras foram travadas para expulsar povos ou escravizá-los, para tomar pontos estratégicos de pesca. Também conta que apenas com o aparecimento do cristianismo, no império romano, o homem começou a buscar os peixes em lugares mais distantes, porque até então a pesca se restringia a lagos rios próximos e era realizada normalmente pelos escravos.

O peixe, com o passar do tempo, também aparece como moeda de troca e sua importância aumenta conforme são inventadas novas formas de captura dos peixes e crustáceos. No princípio, a coleta base era de mexilhões e ostras, como diz e vem ilustrado no Guia da Pesca Amadora do Brasil, constante no site do extinto Ministério da Pesca e Aquicultura (2015):

A relação do homem com os peixes, é tão antiga quanto a história. Sem ainda ter desenvolvido as formas tradicionais de cultivo da terra e criação de animais, as sociedades primitivas praticamente dependiam da pesca como fonte de alimentos. Restos de cerâmicas usados no preparo da comida, cascas de ostras e mexilhões encontrados na Escandinávia confirmam que, antes mesmo da captura dos pescados com equipamento apropriado, o homem primitivo era um coletor de moluscos.

Segundo consta neste mesmo texto supra mencionado, somente com o aparecimento do cristianismo, o peixe se tornou um prato nobre e seu consumo passa a ser mais frequente. Os nobres comendo salmão e lagosta e os pobres e escravos se alimentando de arenque, carne de atum e de carne de baleia salgados. Também mudou a forma de conservação do peixe. Se na Grécia antiga e no Egito, era mantido em sal, os romanos aprimoram a técnica e começaram a

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usar azeite para a sua conserva. Com isso, o peixe passa a ter valor comercial, sendo usado como moeda de troca por outras mercadorias e como pagamento entre senhores feudais e camponeses.

Nesta época já estava afirmado o peixe como alimento em todos os povos que dispunham de área de pesca. Outro fato importante foi o de os monges, do final do século quatro, começar a produzir e tecer redes para pesca, próprias pra o pescado em alto mar. Com isto aumentou bastante o volume de pescado, fazendo com que o homem fosse cada vez mais longe nos mares atrás de uma boa pescaria, como vem demonstrado no Guia de Pesca Amadora no Brasil (2015):

Na Idade Média, o peixe se usa como moeda de troca entre os senhores feudais e camponeses, era comum que o pagamento da renda da terra fosse feito em peixe ou óleo de peixe. Outro evento importante se deu no final do século 4, os monges começaram a fabricar redes apropriadas para a pesca marítima. Fosse no Mediterrâneo, no Mar Báltico ou no Mar do Norte; fossem os pescadores escandinavos, ingleses, vikings ou lordes, quanto mais se pescava mais sofisticados se tornavam os equipamentos de pesca. Também o gosto do europeu ia se sofisticando: enquanto as populações rurais consumiam arenque, atum salgado e carne de baleia; a aristocracia se regalava com salmão, lagosta e pescados mais finos.

Com o tempo e as adversidades, foram surgindo novas técnicas e novos equipamentos que ajudaram o homem a aumentar sua quantidade de pesca, tornando-a uma atividade popular e consolidando seu consumo. Assim a atividade pesqueira foi ganhando força, e os navios pesqueiros eram cada vez maiores e mais modernos, ganhando câmaras frigorificas, aparelhos de GPS (sistema de localização por satélite), sonares para localização de cardumes, entre outros equipamentos. Isto tornou a atividade pesqueira um potencial para alguns países, principalmente países asiáticos como Japão, China e Coreia do Sul.

A história nos mostra que o peixe se tornou um alimento fundamental para todos os seres humanos, o que torna sua preservação fundamental para que alguns povos não deixem de existir. Fato comprovado por dados da FAO, sigla de Food and Agriculture Organization; no Brasil representada pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura.

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Tabela 1: Pesca no mundo 2006-2011

Produção (em milhões de toneladas)

Ano 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Pesca extrativa Continente 9,8 10,0 10,2 10,4 11,2 11,5 Mar 80,2 80,4 79,5 79,2 77,4 78,9 Total capturado 90,0 90,3 89,7 89,6 88,6 90,4 Aquicultura Continente 31,3 33,4 36,0 38,1 41,7 44,3 Mar 16,0 16,6 16,9 17,6 18,1 19,3 Total capturado 47,3 49,9 52,9 55,7 59,9 63,6 Total geral 137,3 140,2 142,6 145,3 148,5 154,0

Fonte: The State of World Fisheries and Aquaculture 2012, FAO. Os dados de 2011 são estimativas. Não estão incluídas plantas aquáticas.

Tabela 2: Destino da produção 2006-2011

Utilização (em milhões de toneladas)

Ano 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Consumo humano 114,3 117,3 119,7 123,6 128,3 130,8

Outros usos 23,0 23,0 22,9 21,8 20,2 23,2

População (em bilhões) 6,6 6,7 6,7 6,8 6,9 7,0

Consumo per capita (em kg) 17,4 17,6 17,8 18,1 18,6 18,8

Fonte: The State of World Fisheries and Aquaculture 2012, FAO. Os dados de 2011 são estimativas. Não estão incluídas plantas aquáticas.

1.2 História da pesca no Brasil

No Brasil, quando chegaram os portugueses, trouxeram consigo, as técnicas de pesca na época existentes em outros países, principalmente o anzol de ferro. Este veio a substituir os espinhos tortos usados pelos índios para a captura de peixes. Chegando aqui, encontraram os índios nativos, que, com sua técnica e diversos tipos de embarcação e apetrechos, já pescavam e também já tinham em seu cardápio o peixe, mariscos e ostras. Muitos dos índios foram feitos escravos para continuar pescando para os colonizadores, como está descrito no Guia de Pesca Amadora do Brasil (2015):

No Brasil, a geografia generosa de grandes rios e afluentes sempre favoreceu a atividade, de modo que mesmo antes do descobrimento a pesca já havia se estabelecido entre os indígenas. Quando os portugueses aqui atracaram, encontraram tribos nativas com seus métodos próprios para a construção de canoas e utensílios para a captura de peixes.

Assim, foram evoluindo as técnicas empregadas, num país que tem extensão de um continente e oferta hídrica exuberante em todas as regiões. A pesca teve forte influência na

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economia de algumas cidades litorâneas. Também, na expansão de algumas vilas de pescadores, que viraram cidade por ter sua economia mais importante baseada na pesca.

No norte, as principais cidades foram instaladas na beira de rios, pois não tinham acesso por terra. Mais tarde, com a abolição da escravatura, muitos negros continuaram na atividade pesqueira. Com a vinda dos imigrantes de vários países, com sua cultura, suas técnicas de captura do pescado, seus temperos e modos de preparo, houve um aumento considerável na quantidade de pescado no Brasil. Tal fato vem demonstrado no Guia de Pesca Amadora no Brasil (2015):

Mais tarde, com a colonização, a chegada de diferentes povos no território nacional e a miscigenação, verificou-se um desenvolvimento ainda mais significativo na pesca. Além do sonho de construir um pedaço da Europa no Brasil, essa gente trouxe seu conhecimento, suas receitas e temperos, estimulando a efetiva introdução do peixe na culinária brasileira. Registra-se também a influência da pesca no aspecto socioeconômico do país, visto que várias cidades litorâneas se formaram a partir de núcleo de pescadores, no decorrer dos distintos ciclos de nossa história (plantações de cana-de-açúcar e café, bandeiras de mineração e extrativismo). Tradição esta que persiste até hoje na Amazônia, onde a localização das comunidades não corresponde a rua, ou bairro, mas sim aos afluentes dos rios.

Feitas essas primeiras colocações, esclarece-se que o presente trabalho, tem por objetivo analisar e compreender a importância da atividade pesqueira, conhecendo um pouco da história da pesca no mundo e no Brasil, para posteriormente analisar a legislação pertinente e as sanções aplicáveis ao abuso dos recursos naturais e apetrechos de pesca.

1.3 A história da legislação pesqueira no Brasil

No Brasil, como era uma colônia de Portugal, não se dava muita importância ao meio ambiente, pois mais se valorizava o crescimento econômico do que os recursos naturais. Baseado no extrativismo, na época seus regentes priorizaram a ocupação do Brasil e lutavam para que a terra não fosse invadida, por outros povos, portanto até então a exploração dos recursos ambientais era desregrada, somente surgindo as primeiras anotações de legislação referentes à pesca no Brasil, nos anos de 1845 e 1846, onde o governo imperial, sentindo a necessidade de regular e enquadrar quem trabalhava com pesca ou em barcos pesqueiros, editou decretos Nº 358 e 447 respectivamente, que regulavam a vida dos pescadores, não só dos mares mas também dos rios, como bem ilustra e conta um breve relato da história da legislação pesqueira no Brasil.

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Numa breve retrospectiva histórica da legislação brasileira específica, consta que, em 1845 o Estado Imperial editou o Decreto nº 358, instituindo as Capitanias dos Portos nas províncias marítimas. Em 1846, por meio do decreto nº 447, determinou-se o registro obrigatório, junto àquelas Capitanias, de “todos os indivíduos empregados na vida do mar”, o que incluía os pescadores; não apenas os que atuavam na pesca marítima, mas também em águas continentais, organizados em distritos: “cada distrito será composto dos indivíduos empregados na pesca interior e exterior” (LUIZ GERALDO SILVA, 1988, p. 127).

Ainda sobre a legislação pesqueira e aquicultura no Brasil, menciona o autor:

Em 1932 foi extinto o Serviço da Pesca e Saneamento Básico do Litoral da Diretoria de Portos e Costas do Ministério da Marinha e foi criada, no Ministério da Agricultura, a Divisão de Caça e Pesca, subordinada ao Departamento de Indústria Animal. Em 1934, por meio do Decreto nº 23.672, o chefe do Governo Provisório editou o Código de Caça e Pesca, cuja parte referente à pesca vigorou por quatro anos, tendo sido substituída pelo Código de Pesca aprovado por meio do Decreto-Lei nº 794, de 1938. Este, por sua vez, foi revogado e substituído pelo Decreto-Lei nº 221, de 1967, que dispõe sobre proteção e estímulos à pesca e dá outras providências. Embora esta expressão não apareça na ementa ou no texto desse último diploma legal, este também ficou conhecido como Código de Pesca, por haver substituído o anterior, assim identificado. (SILVA, 1988, p.127)

Foram essas as primeiras legislações brasileiras, que se tem notícia que regulavam, mesmo que, minimamente, a pesca no Brasil, pois até ali o setor ainda era muito desregrado, servia para complementar renda, não tinha um comércio que alavancasse e chamasse atenção do governo. Depois veio a República e novos decretos foram publicados. Verifica-se que até esta época, a atividade pesqueira no Brasil não era muito desenvolvida, com pouca ou quase nenhuma interferência do Estado no método extrativista.

A produção nacional também era baixa, não havia um comércio definido. A mão de obra da pesca passou por uma evolução no Brasil com surgimento de dois grupos distintos: no nordeste os jangadeiros, que viviam em comunidades e viviam da pesca e pescavam com suas jangadas longe da costa, e, no sul os caiçaras, que tinham como atividade principal a agricultura, mas pescavam quando cardumes de tainha ou outros peixes se aproximavam da costa. Os caiçaras são descritos por Luiz Geraldo da Silva:

Nas regiões Sudeste e Sul do Brasil formou-se outro grupo de pescadores de grande importância histórica: os caiçaras. Estes se dedicavam prioritariamente à agricultura e praticavam a pesca em caráter suplementar, em especial quando cardumes de tainha e outras espécies de peixes aproximavam-se da costa. (1993, p.45)

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Verifica-se que nesta época ainda existia um certo grau de equilíbrio nos estoques pesqueiros, não existindo até então a sobrepesca, que segundoDias Neto e Dornelles (1996, s.p.) apud BRUNO.PIANNA (2014, s.p.) é “a retirada acima das quotas estabelecidas pelos órgãos ambientais para garantir a manutenção dos estoques pesqueiros.”

Em 1938, através do Decreto Lei, nº 794/38, foi criada uma legislação com política específica para o setor. A partir da década de 60, começou uma nova fase que foi marcada pela edição de normas com maiores referências em questões ambientais, através do Código de Pesca nº 221/67, que durou 42 anos até a entrada em vigor da atual legislação. O autor Talden Queiroz Farias (2007, s.p.) alerta:

Por conta da ênfase dada ao direito de propriedade não existia efetivamente uma preocupação com o meio ambiente, já que não se considerava as relações de cada dos recursos naturais entre si como se cada recurso ambiental específico não influísse no restante do meio natural e social ao redor de si.

Alinhado a tudo isso, estavam as legislações internacionais, refletindo a falta de conscientização ambiental da época, pois com o fim da segunda guerra mundial, ocorreu o aceleramento desordenado da produção agrícola e principalmente da produção industrial e ao esgotamento dos recursos naturais, ficou evidente e necessária uma mudança de postura.

Tanto que em 1972, a ONU organizou uma conferência para tentar amenizar o problema:

[...] a Organização das Nações Unidas organizou em Estocolmo, na Suécia, a 1ª Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio Ambiente, aprovando ao final a Declaração Universal do Meio Ambiente que declarava que os recursos naturais, como a água, o ar, o solo, a flora e a fauna, devem ser conservados em benefício das gerações futuras, cabendo a cada país regulamentar esse princípio em sua legislação de modo que esses bens sejam devidamente tutelados. Essa declaração abriu caminho para que a legislação brasileira, e as demais legislações ao redor do planeta, perfilassem a doutrina protetiva com a promulgação de normas ambientais mais amplas e efetivas. (FARIAS, 2007, s.p.).

Naquela época, o Brasil sofria com o êxodo rural e o crescimento desenfreado da indústria, que gerava distorções de natureza ambiental, com o aparecimento desordenado de favelas, principalmente nos estados do sul e sudeste. Tanto que a cidade de Cubatão, no estado de São Paulo, era considerada uma das cidades mais poluídas do mundo.

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Na época as reservas pesqueiras no Brasil já sofriam com um grave problema, seus estoques começaram a entrar em colapso, e não foi feito nada para que se revertesse a situação, ocorrendo de forma indiscriminada a sobrepesca, já supra definida.

Como marco histórico da tutela jurídica ao meio ambiente no Brasil, pode-se destacar a Lei 6938/81, que criou, entre outros conceitos, a PNMA (Política Nacional de Meio Ambiente), oferecendo conceitos basilares sobre poluição e poluidor, indicando os princípios de responsabilidade civil objetiva por danos ambientais.

Para atingir os objetivos da PNMA, o artigo 2º, inciso I a X da Lei 6938/81, estabelece princípios que devem reger as políticas de meio ambiente:

Art 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo;

II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar; Ill - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais;

IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas; V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras; VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais;

VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental; VIII - recuperação de áreas degradadas; (Regulamento) IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação;

X - educação ambiental a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente. (BRASIL, 2016).

Princípios estes consolidados no país, através da Constituição Federal de 1988, que recepcionou grande parte da Política Nacional de Meio Ambiente em seus artigos, especialmente no artigo nº 225, caput, que garante, a todos, o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe o dever de preservá-lo para todas as gerações. Diz o artigo:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 2016)

Também, com a Constituição de 1988, chamada de Constituição cidadã, os pescadores artesanais passaram a ter alguns direitos reconhecidos, como o direto à aposentadoria especial

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e o direito ao seguro em época de interdição de pesca por autoridade competente. Ela traz referência às colônias de pescadores e competência concorrente entre a União, Estados, Municípios e Distrito Federal, para legislar sobre o assunto. Trata, ainda, das colônias de pescadores, como entidades de classe de trabalhadores artesanais de natureza própria consoante com a Lei. O consultor legislativo Luciano Gomes de Carvalho Pereira (2015, p.04), com experiência na área de agricultura e política rural, explana sobre o assunto:

A Constituição Cidadã reafirmou o direito do pescador artesanal à previdência social, equiparou-o ao trabalhador rural e, por via de consequência, estendeu-lhe o direito ao seguro-desemprego. Esse direito foi primeiramente regulamentado pela Lei nº 8.287, de 1991, posteriormente revogada e substituída pela Lei nº 10.779, de 2003. O Decreto nº 8.424, de 2015, regulamenta essa lei com as alterações que lhe foram introduzidas por meio da Lei nº 13.134, de 2015, entre as quais se destaca a exigência de exercício da atividade pesqueira de forma exclusiva e ininterrupta.O seguro-desemprego pago ao pescador artesanal durante o período de defeso da pesca agrega direitos do trabalhador e política ambiental. A proibição da captura durante o período de reprodução das espécies visa protegê-las e assegurar a sustentabilidade da atividade pesqueira, determinação disposta na Lei nº 11.959, de 2009.

Neste sentido também se refere a Constituição de 1988, reconhecendo o direito dos trabalhadores do setor artesanal:

A Constituição Federal de 1988 também se refere às colônias de pescadores, reconhecidas como órgãos de classe dos trabalhadores do setor artesanal da pesca com forma e natureza jurídica próprias, consoante a Lei nº 11.699, de 2008; estabelece a competência concorrente da União, dos estados e do Distrito Federal para legislar concorrentemente sobre pesca (entre outros assuntos); e determina a inclusão das atividades pesqueiras (entre outras) no planejamento agrícola, o que fez com que a Lei nº 8.171, de 1991, que dispõe sobre a política agrícola, contivesse vários dispositivos referentes à pesca e à aquicultura. (PEREIRA, 2015)

A promulgação de legislações ambientais mais específicas e severas, está satisfazendo, em parte, as aspirações de ambientalistas e alguns penalistas, sendo que as inovações se expandem às pessoas jurídicas. Também há uma grande evolução quando estes dispositivos se referem a políticas de planejamento ambiental e proteção dos trabalhadores desta área, que além de adquirirem direitos, assumem deveres de preservação do meio que os sustenta.

1.4 Conceitos doutrinários e legais, categorias e métodos de pesca

A temática do meio ambiente e da pesca possui diversos conceitos que precisam ser esclarecidos, diferenciados, para compreender os dispositivos legais nela enquadrados. Abaixo seguem algumas definições encontradas em sites e conceitos segundo entendimento de

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doutrinadores, que precisam necessariamente ser assimilados, para serem posteriormente utilizados na explanação das peculiaridades da pesca predatória.

O conceito de meio ambiente é bem diversificado e amplo, dados os diferentes tipos de meios existentes: natural, cultural, artificial e do trabalho. Para este estudo, interessa o natural que engloba: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna, a flora, o patrimônio genético e a zona costeira, de acordo com o artigo 225 da Constituição Federal, já mencionado. Segundo José Afonso da Silva é: “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e cultuais que propiciam o desenvolvimento da vida de todas as formas” (apud Leandro Amaral ANDRADE, 2004, s.p.).

Também conceitua o meio ambiente o doutrinador Ávila Coimbra (apud PERES, 2009,s.p.):

[...] meio ambiente é o conjunto de elementos abióticos (físicos e químicos) e bióticos (flora e fauna), organizados em diferentes ecossistemas naturais e sociais em que se insere o Homem, individual e socialmente, num processo de interação que atenda ao desenvolvimento das atividades humanas, à preservação dos recursos naturais e das características essenciais do entorno, dentro das leis da natureza e de padrões de qualidade definidos.

Já em relação ao conceito de pesca, atividade extrativa inserida no meio ambiente, há várias definições, segundo Junior Taglialenha (2003, s.p.):

Pesca em seu sentido popular é o ato ou a prática de pescar; é o ato de tirar algo da água. Pescar significa apanhar peixe na água. Porém, para a Lei 9.605/98 pescar não é o simples ato de capturar peixe, mas sim "todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora". Portanto, a Lei 9.605/98 ampliou o conceito tradicional de pesca para em seu conceito albergar também os moluscos, os crustáceos e os vegetais hidróbios.

E se esta pesca for predatória, ela tem consequências desastrosas, podendo limitar a produtividade pesqueira, quer seja do ponto de vista biológico, quer econômico, porque existem várias formas e métodos de pesca, desde o mais simples ao mais aprimorado. E quanto mais aprimorado, mais risco ao meio ambiente.

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Segundo o Ministério da Pesca, há várias categorias de pesca, sendo que cada uma é conceituada de acordo com os métodos utilizados pelos pescadores. Abaixo seguem algumas explicações/definições encontradas no site do extinto Ministério da Pesca e Aquicultura (2014). A primeira definição se refere ao método tradicionais:

Pesca Artesanal - O pescador(a) artesanal é o profissional que, devidamente licenciado pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, exerce a pesca com fins comerciais, de forma autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parcerias, desembarcada ou com embarcações de pequeno porte. Para a maior parte deles o conhecimento é passado de pai para filho ou pelas pessoas mais velhas e experientes de suas comunidades. Os pescadores conhecem bem o ambiente onde trabalham como o mar, as marés, os manguezais, os rios, lagoas e os peixes.

A pesca que utiliza equipamentos e embarcações mais sofisticadas é definida como industrial:

A pesca industrial caracteriza-se em função do tipo de embarcação empregada (médio e grande porte) e da relação de trabalho dos pescadores, que diferentemente do segmento artesanal, possuem vínculo empregatício com o armador de pesca (responsável pela embarcação), seja pessoa física ou jurídica. (MINISTÉRIO DA PESCA E AQUICULTURA, 2014, s.p.)

Há ainda, a categoria que pratica a pesca como diversão, sem utilizar grandes incrementos na captura, definida como pesca amadora:

O principal atrativo da pesca amadora é sem dúvida o peixe. São diversas as características que podem definir um peixe como esportivo. Eles podem habitar as águas doces e águas salgadas. Podem passar a vida toda vagando pelos mares ou podem nascer e morrer em uma mesma lagoa. Podem ser grandes e pesados, compridos ou curtos. Depois de fisgados podem saltar fora da água, tentar soltar-se do anzol, procurar os troncos submersos na tentativa de proteção; podem atacar as iscas com voracidade e agressividade. Ou seja, para serem considerados esportivos os peixes devem despertar o interesse do pescador ao tentar capturá-los, seja pela força bruta que tenha que empregar, ou mesmo pela astúcia ou técnica exigidos na sua captura. A designação de “peixe esportivo” para uma determinada espécie depende ainda da região ou do País onde se encontra. O mesmo peixe pode ser considerado “esportivo” em alguns países e em outros não apresentar muito interesse aos pescadores. No Brasil temos peixes esportivos da Amazônia, do Pantanal e peixes esportivos marinhos. (MINISTÉRIO DA PESCA E AQUICULTURA, 2014, s.p.)

A pesca quando ocorre de forma predatória também possui um conceito bem unânime e definido entre os autores, que pode ser encontrado em diversas doutrinas e sites com a seguinte descrição: “é aquela que retira do meio ambiente, mais do que ele consegue repor, diminuindo a população de peixes e mesmo de plantas do ecossistema”. (TAGLIALENHA, 2003, s.p.)

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A pesca pode ser praticada através de vários instrumentos. Os principais são anzol, rede de emalhar, sacos, cerco, bomba, armadilhas e gaiolas. O enquadramento em predatória se dará de acordo com a maneira que estes instrumentos forem utilizados e a época e região em que serão praticados. A ilegalidade, normalmente, se dá em razão das quantidades e tamanhos. Como explica Taglialenha (2003, s.p.) sobre as intenções do pescador:

Ocorre que, via de regra, todos que se aventuram na arte de pescar possuem a intenção de pescar o maior peixe possível. Quanto maior for o pescado melhor será para o pescador. Contudo, peixes pequenos poderão morder a isca ou cair na armadilha, sem que seja essa a intenção do pescador. Portanto, enquanto ele não tiver conhecimento de que o espécime capturado seja inferior ao permitido não haverá dolo em sua conduta e sem dolo o fato em questão é atípico, vez que a lei ambiental não previu a forma culposa. Em consequência, enquanto o pescador não puder verificar que o peixe é de tamanho inferior ao permitido não estaremos diante de um fato típico diante da ausência de dolo, pois até aí poderíamos falar, no máximo, em uma conduta culposa. Portanto, nesse caso, somente ocorrerá o crime caso o pescador, após tomar conhecimento de que o peixe capturado seja inferior ao permitido, resolva tomá-lo para si. Caso, após tomar conhecimento de que o peixe possui tamanho inferior ao permitido, o pescador devolver o peixe à água, sequer crime terá cometido, pois, como já mencionado, até o momento em que ele tomou conhecimento dessa circunstância sua conduta foi, na pior das hipóteses, culposa e não dolosa.

Quanto a definições legais, há três artigos da Lei 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, que necessitam ser citados para posterior retomada. O primeiro deles se refere à poluição e destruição de locais aquáticos:

Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais brasileiras:

Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas:

I - quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aquicultura de domínio público;

II - quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão ou autorização da autoridade competente;

III - quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica. (BRASIL, 2016).

O segundo diz respeito ao ato próprio de pescar:

Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:

Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:

I - pesca espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos;

II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;

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III - transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas. (BRASIL, 2016)

E por fim, o artigo que trata da forma mais cruel e danosa de pesca, seja para os seres humanos ou das águas:

Art. 35. Pescar mediante a utilização de:

I - explosivos ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante;

II - substâncias tóxicas, ou outro meio proibido pela autoridade competente: Pena - reclusão de um ano a cinco anos. (BRASIL, 2016).

As ações citadas nos artigos acima, podem ser concluídos ou apenas cogitados. Com a nebulosidade de alguns dispositivos legais, bastaria que um pescador tivesse a pretensão de pescar em certos períodos, locais ou formas, que já estaria incorrendo em crime. As interpretações literais podem causar equívocos, como será demonstrado adiante.

Além destas, existe, ainda, uma infinidade de concepções e preceitos legais acerca da temática ambiental e da pesca, mas para objeto deste estudo, as definições acima trazidas são suficientes para a compreensão dos demais assuntos a serem discutidos.

1.5 Considerações acerca da pesca predatória

A criminalização de condutas ligadas à prática de crimes de pesca envolve grande complexidade. Primeiro, porque o peixe constitui grande fonte de proteína e alimentação para várias populações, isto desde os tempos mais remotos. Segundo, porque milhares de pessoas dependem diretamente de sua prática para obter sua subsistência.

A realidade do Brasil não é diferente da realidade do mundo. Abusou-se demais, e, ao longo do tempo, as políticas públicas usadas não surtiram efeito. Especialistas dizem que a longo prazo e futuro incerto, se não forem adotadas medidas que realmente funcionem onde os cardumes tenham condições de se reproduzir antes de serem capturados, várias espécies serão extintas. Afirmam também, que é preciso uma fiscalização mais efetiva e uma maior penalização para quem descumpre as regras, por parte das autoridades, além de uma maior conscientização por parte dos pescadores. É o que explica Eduardo Arraia (2015, s.p.), remetendo-se a avaliações de Tito Lotufo, professor universitário:

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A situação da sobrepesca no Brasil é semelhante à do resto do mundo [...] um fator complicador é a responsabilidade sobre a regulação da pesca brasileira migrar de ministério para ministério, culminando em 2003 com a criação do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA). “Não é difícil prever que, num futuro governo, tal ministério seja extinto e suas funções, repassadas a outro”, afirma. “Com isso, toda a administração da atividade fica complicada. Estamos há anos sem estatísticas adequadas, pois essa atribuição foi retirada do Ibama, que já estava estruturado para fazer o trabalho, e passada ao MPA.

Segundo Lotufo, falta proteção e fiscalização para enfrentar o problema, e nesse sentido é urgente que hajam políticas públicas, para que no futuro não nos deparemos com tragédias ambientais. Araia (2015, s.p.), ainda se remetendo a Lotufo, destaca:

[...] enfrentamos sérios problemas em termos de populações de peixes. “O governo estima que 80% dos nossos estoques estejam sobre-explorados”, diz, citando como exemplos a lagosta no Nordeste e grandes peixes oceânicos, como tubarões. O Ministério do Meio Ambiente contabiliza 19 espécies de peixes marinhos ameaçadas de extinção e 32 espécies sobre-exploradas ou ameaçadas de sobre-exploração. Reverter esse quadro não é fácil. Há um Código de Conduta para a Pesca Responsável da ONU que não é respeitado [...]. E a crônica falta de fiscalização aflige o Brasil e outros países.

A abundância ou o despovoamento dos cursos de água não estão relacionados diretamente com a pesca, mas com uma série de fatores físicos e químicos que modificam o meio aquático além do primordial, que é e a alimentação. Junior Taglialenha (2000, p. 1), alerta para o problema da sobrepesca:

A sobrepesca ou pesca predatória – a pesca que reduz as populações de peixes além de sua capacidade de reprodução – é um problema global cada vez mais grave. Cerca de 70% das espécies de peixes dos mares estão sendo exploradas de forma insustentável.

Enrijecer a lei não é solução para o problema. As ações necessárias vão além de punições penais. É preciso políticas públicas para educar as pessoas a preservar o meio ambiente de forma geral, o que vai afetar indiretamente as águas. Isto vem ao encontro com o que diz Taglialenha (2000, p. 1):

Atitude eminentemente humana, o desrespeito pela natureza e, em especial, o desrespeito para com os recursos ictios vem assumindo aspecto calamitoso, tendo tornado vários rios brasileiros estéreis, sem vida, simplesmente mortos. O Brasil, país pródigo em recursos naturais, tem se mostrado igualmente pródigo na arte de destruir o meio ambiente, quer seja através de desmatamentos desordenados, poluição dos rios, construções de hidrelétricas sem qualquer preocupação ambiental, desperdícios de recursos hídricos, caça de animais silvestres, inclusive animais em extinção, etc., além da prática predatória da pesca.

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Ele ressalta ainda, que: “o problemas relacionado à pesca e a criminalização de condutas ligadas à sua prática envolve grande complexidade.” (TAGLIALENHA 2000, p.3). Da mesma forma Arraia alerta:

Devolver aos peixes marinhos condições de crescer sustentavelmente é desafio dos governos e do setor pesqueiro. Sem resolvê-lo, seremos cada vez mais reféns da produtividade das fazendas de pescado, a aquicultura, uma prática polêmica pelo impacto ambiental que gera.(2015, s.p.)

O desafio de solução dos problemas ambientais, sobretudo da sobrepesca, cabe aos governos através da elaboração dos dispositivos legais e das políticas preventivas e restaurativas. Mas cada cidadão tem sua parcela de responsabilidade. É o que será tratado mais adiante.

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2 (IM) POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PARA O CRIME DE PESCA PREDATÓRIA

Motivo de muitas discussões no Brasil, a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao crime de pesca predatória, incluído na lei 9.605/98, em seus artigos 34, 35 e 36, tem gerado decisões opostas, não sendo unanimidade, nem havendo um consenso se é cabível ou não. Nos próxima páginas será analisada a (in)viabilidade da aplicação do dispositivo legal às diversas situações fáticas que surgem, inovando as possibilidades de julgamento e discussão.

2.1 Aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes ambientais

Para fins de compreensão de algumas situações práticas, far-se-á a explanação de dispositivos legais pertinentes para posterior abrangência das possibilidades aplicativas aos crimes ambientais e consequentemente aos relacionados à pesca. Mister se faz a exposição dos artigos 34, 35 e 36, da lei 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.

O artigo 34 menciona os períodos, métodos e quantidades em que é proibida a pesca:

Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:

Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:

I - pesca espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos;

II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;

III - transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas. (BRASIL, 2016)

Já o artigo 35, penaliza a utilização de meios cruéis, nocivos e tóxicos:

Art. 35. Pescar mediante a utilização de:

I - explosivos ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante;

II - substâncias tóxicas, ou outro meio proibido pela autoridade competente: Pena - reclusão de um ano a cinco anos (BRASIL, 2016)

Comparando outras formas de extração pesqueira, o artigo 36, assemelha condutas diversas a mesma tipificação criminal:

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Art. 36. Para os efeitos desta Lei, considera-se pesca todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora.

A partir destes artigos será abordado o princípio da insignificância sob a ótica de sua aplicabilidade nas infrações de natureza ambiental, bem como a possibilidade de admissão ou não com suas limitações. Além da conceituação e características do referido princípio, será dado ênfase à importância das questões dos crimes ambientais e como estes estão inseridos no ordenamento jurídico brasileiro, para demonstrar sua relação com o ramo do Direito Penal e sua vinculação com o Direito Constitucional.

Para entender o princípio do insignificância, a história, segundo Kelton Almeida Machado (2008, s. p.), nos remete ao início do século XX, na Europa onde, devido a crises sociais, o povo, após violentas guerras, passou fome. Algumas pessoas começaram a cometer pequenos furtos em decorrência do desemprego e escassez de alimentos, para satisfazer sua fome e de sua família. Os juristas na época chamaram o fenômeno de criminalidade da bagatela, que originou o princípio da insignificância. Não pode ser usado ao bel prazer dos juízes, sendo que deve ser analisada a cada situação, a cada processo, principalmente com relação ao meio ambiente, pois quando tratamos do meio ambiente devemos ter em mente a real definição do que estamos tratando, pois corremos o risco de não mais poder voltar atrás em nossas decisões e os prejuízos podem ser vultuosos, ao contrário da bagatela.

O meio ambiente elevado à categoria de bem jurídico essencial à vida, à saúde, e à felicidade do homem, integra-se, em verdade, de um conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais, de molde a possibilitar a vida. Bem como retrata o Artigo 3° da Lei 6938/81:

Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente;

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

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IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;

V - recursos ambientais, a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo e os elementos da biosfera.

V - recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora. (BRASIL, 2016)

É importante destacar, que a doutrina e a legislação de uma maneira geral, subdivide o conceito de meio ambiente em natural, artificial, cultural e meio ambiente do trabalho. Como já mencionado anteriormente, todos cidadãos, conforme a Constituição Federal, em seu artigo 225, tem direito ao um meio ambiente equilibrado e saudável, sendo englobado todos os ambientes supra citados.

O que chamamos diariamente de ambiente, envolve tudo o que há de vivo ou não vivo sobre a face da Terra, afetando todos os ecossistemas e as vidas que neles sobrevivem, seja na

ordem de infraestrutura física, química ou biológica.

O professor e jurista Édis Milaré (1993, p. 263) traz um conceito de meio ambiente aceito amplamente entre estudiosos e doutrinadores:

O ambiente elevado a categoria de bem jurídico essencial à vida, à saúde, e à felicidade do homem, integra-se, em verdade, de um conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais, de molde a possibilitar o seguinte detalhamento: meio ambiente natural (constituído pelo solo, água, o ar atmosférico, a flora, a fauna, enfim a biosfera), meio ambiente cultural (integrado pelo patrimônio artístico, histórico, turístico, paisagístico, arqueológico, espeleológico) e meio ambiente artificial (formado pelo espaço urbano construído, consubstanciado no conjunto de edificações, e pelos equipamentos públicos: ruas, praças, áreas verdes, enfim, todos os assentamentos de reflexo urbanístico).

Expostos alguns conceitos de meio ambiente e sua importância, voltamos a matéria da admissibilidade ou não, do princípio da insignificância, à prática de pesca predatória. Certo é, que há muitas controvérsias, tanto na doutrina como na jurisprudência. Para a primeira, a aplicabilidade da lei, está argumentada na idéia de que, sendo ínfimas às infrações ambientais, pouco importando a capacidade econômica da vítima ou do agente, o objeto jurídico tutelado pelo ramo do direito penal não fora violado. Para a segunda, o argumento é de que se aplicarmos o princípio da insignificância, sem uma análise técnica, isso seria perigoso para o equilíbrio do meio ambiente, pelo simples fato de considerarmos certas condutas inofensivas, mas que na realidade, numa análise estritamente técnica,

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causam devastadores danos, uma vez que os prejuízos ambientais atingem toda a sociedade, com reflexos em diversos lugares do planeta.

Percebe-se que não há unanimidade nas ações e na aplicação da lei ao caso concreto. Para isso, impõe-se um comparativo do princípio da insignificância do Direito Penal com o princípio da insignificância do Direito Ambiental.

No âmbito do Direito Penal, o princípio da insignificância é aplicado, principalmente, nos crimes contra o patrimônio, quando a lesão ao patrimônio da vítima é insignificante ou muito baixo, sendo então interpretado como uma conduta atípica. Já no âmbito do Direito Penal Ambiental deve-se analisar a conduta à luz de critérios técnico-ambientais e o grau de extinção da espécie.

Para explicitar as limitações deste princípio nos crimes ambientais, deve-se observar que, por menor que seja o dano causado, este não terá repercussão no equilíbrio do meio ambiente. Traz à reflexão a interrogação de que: será que nossas atitudes e nossas ações, por menor que sejam não terão impacto ambiental no futuro?

O delito de bagatela ou insignificância, não se encontra expressamente anotado na legislação brasileira, no entanto, a doutrina e a jurisprudência têm possibilitado a delimitação das condutas que sejam tidas como insignificantes, sob orientação de um direito penal mínimo. O delito, decorrente da existência de um dano mínimo, que não impõe um prejuízo importante a outrem, é classificado como delito de bagatela, e, sendo assim, não exige a intervenção do direito penal.

O autor Kelton Almeida Machado define de forma bem abrangente o princípio da insignificância:

O princípio da insignificância é um instrumento de interpretação restritiva do direito penal, que busca descriminalizar condutas que embora sendo típicas não atingem de maneira relevante os bens jurídicos protegidos pelo direito penal. Portanto, observamos que o cerne de tal postulado jurídico se baseia numa análise subjetiva do ilícito penal praticado, deixando de se aplicar a jurisdicionalidade penal do Estado, utilizando-se dos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, fragmentariedade e subsidiariedade no caso concreto. (2008, s.p.)

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Importante também destacarmos a diferença existente entre infração de menor potencial ofensivo e infração irrelevante, institutos muitas vezes confundidos pela maioria dos operadores do direito. Na infração de menor potencial ofensivo o agente praticou um fato típico, descrito no tipo penal (tipicidade formal), devendo o julgador aplicar a pena dada ao caso concreto, que na maioria das vezes, por se tratar de delito de menor potencial ofensivo, tem sua pena substituída por penas alternativas, excluindo-se, assim, as penas privativas de liberdade (Lei nº 9099/95). Já na infração irrelevante o agente pratica o fato típico, descrito no tipo penal, mas por se tratar de algo irrelevante, ou seja, insignificante, não seria “justo” ou proporcional impôr-lhe a pena descrita no tipo penal. Não havendo proporcionalidade entre a conduta do agente e o resultado (tipicidade material) o fato é atípico, isto é, a conduta não está contida no conceito analítico de crime. (MACHADO, 2008, s.p.)

Essa confusão é nociva à aplicação do direito, pois na infração de menor potencial ofensivo, afasta-se a tipicidade do crime pela ausência de seu elemento material, e na infração irrelevante, busca-se uma alternativa processual mais célere, pela pouca importância do crime.

Vistos os conceitos de meio ambiente e seu valor para a humanidade, frisa-se que não há a pretensão no presente trabalho de mudar o que já está escrito, mas a ressaltar a importância a um meio termo, um consenso sobre quando é possível aplicar ou não a lei 9.099/95 aos crimes da lei 9.065/98. Há casos específicos.

A lei 9.605/98 em seu artigo 27 já permite o uso da lei 9.099/95, desde que haja prévia recomposição do dano, para crimes que não ultrapassem dois anos ou multa:

Art. 27 Nos crimes ambientais de menor potencial ofensivo, a proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direito ou multa, prevista no art. 76 da Lei 9.099 de 26 de setembro de 1995, somente poderá ser formulada desde que tenha havido a prévia composição do dano ambiental, de que trata o art. 74 da mesma Lei, salvo em caso de comprovada impossibilidade. (BRASIL, 2016)

O tipo penal mencionado acima, tem recebido diversas críticas de ambientalistas, cientistas e juristas, pois não houve um estudo prévio realizado antes da elaboração da lei, sobre o impacto no meio ambiente, o que é fácil de entender pois quem estuda e aprofunda o assunto são cientistas ligados à área ambiental.

Como já foi dito anteriormente, a discussão a respeito da aplicabilidade do princípio da insignificância nos crimes ambientais não é pacifica. Tanto na doutrina quanto na jurisprudência ainda não há consenso, se é possível ou não, a possibilidade da aplicação desse princípio, diante de um caso concreto, que caracteriza crime ambiental. Há uma corrente que aceita e outra não.

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O princípio da insignificância não pode fugir de alguns preceitos que tem uma correlação consigo: o da legalidade, intervenção mínima, proporcionalidade, irrelevância do fato penal e o da lesividade. Sendo que o Estado, através do direito penal, deve apenas intervir em bens jurídicos relevantes, devendo ainda o direito penal calcular a gravidade do fato.

O direito penal só deve agir na defesa de bens jurídicos imprescindíveis à coexistência harmônica entre os homens, naqueles que não podem ser realmente protegidos de forma menos gravosa. Desta forma, a lei penal só deve intervir quando for estritamente necessário para a sobrevivência da comunidade. Vários princípios se inserem nesta idéia e foram adotados pelo sistema penal pátrio. Neste sentido Machado (2008, s.p.) explana sobre o princípio da proporcionalidade:

[...]principal fundamento da adoção do princípio da insignificância no direito brasileiro, estabelece que o julgador deva buscar um equilíbrio entre o resultado do crime e a cominação da pena. O princípio da irrelevância do fato penal nos diz que pela irrelevância da conduta, a pena não deve ser aplicada ao caso concreto, o que está intimamente ligado ao conceito do princípio da insignificância. O último princípio, o da lesividade, considera que não haverá crime se não houver lesão, ou seja, para haver lesão será preciso que o agente cause à vitima uma lesão relevante no seu patrimônio jurídico.

Para muitos doutrinadores a aplicação do princípio da insignificância em leis ambientais, gera um clima de impunidade, o que aumenta, drasticamente, os índices de crimes na esfera ambiental, devido à pouca efetividade da lei. Já, para outros, a aplicação do princípio da insignificância nos crimes ambientais gera uma insegurança jurídica, pois alegam que será feito um juízo de valor diante do caso concreto. Vejamos alguns posicionamentos. Nicolao Dino de Castro Costa Neto (apud MACHADO, 2008, s.p.), Procurador da República adverte que:

[...] a formação do juízo de tipicidade não pode prescindir hodiernamente da observância de dois importantes princípios, os quais sejam: o princípio da adequação social e o princípio da insignificância. Pelo primeiro, impondo-se aferir se a conduta tipificada configura ou não um comportamento socialmente permitido, considerando-se como parâmetro os padrões médios de ética e moralidade vigentes na sociedade. Quanto ao segundo, sob a perspectiva de um Direito Penal de intervenção mínima, recomenda-se verificar se o fato penalmente tipificado não constitui uma bagatela, em face da diminuta repercussão da conduta sobre o bem jurídico protegido.

Já outro autor, que em seus comentários defende que não pode aplicar a lei 9.099/95 à lei ambiental é Cândido Alfredo Silva Leal Junior (apud Machado, 2008, s.p.):

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A constatação ao examinar as figuras típicas previstas na Lei 9.605/98 é que existem situações aparentemente insignificantes que estão previstas na lei, ganhando valor e relevância criminal. A forma como são descritas as figuras típicas não deixa dúvida que o legislador não está preocupado apenas com a quantidade de espécimes abatidos ou destruídos, alcançando qualquer conduta que tenha atingido a objetividade jurídica protegida, seja pelo abate de um animal, seja pelo abate de vários animais. O que ocorre é a variação na graduação da pena, conforme a lesão tenha sido pequena (o tipo-base) ou tenha alcançado grande potencial ofensivo (o tipo-agravado).

E conclui seu raciocínio dizendo que:

Portanto, a lei penal ambiental é cuidadosa em prever os tipos-base dos crimes do meio ambiente, prevendo também circunstâncias específicas que, por sua gravidade ou relevância para o meio ambiente acabam aumentando a pen, isto é, tornam o crime mais grave. Justamente por estarem previstas essas circunstâncias que aumentam a pena (e o crime), é que não se pode dizer que o legislador tenha ignorado a insignificância. O tipo-base já incorpora em si o que poderia ser insignificante, porque não se prende apenas a uma avaliação imediata do valor econômico do animal abatido ou da vegetação destruída, mas considera também outros elementos relacionados ao valor intríseco daquele elemento do ecossistema que foi suprimido ou afetado, daí surgindo a relevância da imposição de sanção àquela conduta. (LEAL JUNIOR, apud MACHADO, 2008, s.p.)

Algumas críticas de doutrinadores em relação à possibilidade de aplicação da lei 9.099/95, é de que não há previsão legal. Alegam ainda que existe incompatibilidade com o princípio da legalidade e incompatibilidade com a obrigatoriedade da ação penal além da falta de proteção às lesões de direitos.

É preciso ter em mente que as leis ambientais não tem a faculdade de somente punir os infratores. A maior corrente assim defende, ressaltando que a legislação é preventiva e educadora. Os objetivos de sua criação já são acautelatórios, voltando a atenção para os riscos eminentes antes mesmo de uma consumação de dano. Em sendo a reparação incerta e onerosa, prima-se pela prevenção.

Nesse sentido Paulo Affonso Leme Machado, menciona o princípio da precaução, em sua obra Direito Ambiental Brasileiro:

A precaução age no presente para não se ter que chorar no futuro. A precaução não só deve estar presente para impedir o prejuízo ambiental, mesmo incerto, que possa resultar das ações ou omissões humanas, como deve atuar para a prevenção oportuna desse prejuízo. Evita-se o dano ambiental, através da prevenção no tempo certo. (2000, p. 57)

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Na mesma linha de pensamento, o autor Álvaro Luiz Valery Mirra (2001), em Direito Ambiental, o princípio da precaução e sua aplicação judicial defende:

A partir do momento em que o princípio da precaução é reconhecido como parte integrante do nosso ordenamento jurídico, entre os princípios gerais do direito ambiental, não resta dúvida que ele exerce influência sobre a interpretação e aplicação de todas as normas do sistema jurídico ambiental em vigor, com repercussões diretas, evidentemente, na aplicação judicial do direito ambiental. (2001, p. 98)

E conclui seu raciocínio:

A partir da consagração do princípio da precaução, é bem de ver, não pode mais haver dúvidas de que o direito ambiental no Brasil é o direito da prudência, é o direito da vigilância no que se refere à degradação da qualidade ambiental e não do direito da tolerância com as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Esse enfoque que deve prevalecer em toda atividade de aplicação do direito nessa área, inclusive na esfera judicial. (MIRRA,2001, p. 98)

Importante salientar que a legislação ambiental brasileira aplicada nos casos concretos, deve alcançar seus efeitos, ou seja, coibir sua infração e punir em caráter exemplar os danos ambientais. Assim como é necessário avaliar o quanto a conduta do infrator atingiu o bem tutelado pela norma, pois alguns doutrinadores falam que se não foi lesado o bem protegido, o crime não é típico. Vejamos um caso prático, por exemplo: se dois amigos estão pescando em época proibida, e são flagrados pela polícia ambiental, um está com o anzol na água e já pescou dez peixes, é lógico que lesou o bem protegido. O outro amigo está com o anzol na água e não pescou nenhum peixe, pode-se deduzir que não lesou o bem protegido. Neste caso, a lei e a pena devem ser aplicadas de forma diversa para cada ato lesivo.

Tratando-se especificamente de proteção ambiental, deve ser feita a pergunta: se existe lesão que possa ser considerada insignificante. A resposta deve ser positiva, mas com cautela. Não basta que a pouca valia esteja no juízo subjetivo do juiz. É preciso que fique demonstrada no caso concreto.

Em análise ao bem jurídico (todas espécies de peixes), protegido pelos tipos dos artigos 34, 35 e 36, da Lei 9.605/98, percebe-se que não estamos diante de uma conduta tipificada tão somente para resguardar espécies em extinção, ou o período de desova ou ainda os locais onde

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a pesca seja proibida, mas com o fim de resguardar interesses bem maiores, por se tratar de proteção a toda fauna aquática, cuja importância atinge aspectos tanto ambientais como econômicos.

Marcelo Crepaldi Dias Barreira e Ricardo Pael Ardenghi (2002, s.p.), chamam a atenção para as dúvidas decorrentes da recente lei:

O fato de a Lei 9.605/98 ser um estatuto normativo recente, o que tem feito surgirem algumas dúvidas acerca da aplicação de certos dispositivos, principalmente quando não existe jurisprudência sobre o tema e a doutrina escusa-se em enfrentá-lo com mais vagar. Um exemplo claro disso é o crime de pesca durante período ou em local proibidos, quando da sua prática não resulta a apreensão de qualquer espécime íctia. É o caso de crime de "pesca sem peixe".

Aqueles que defendem que não é possível aplicar o princípio da insignificância aos crimes ambientais, alegam que o bem tutelado pela lei, ou seja o meio ambiente como um todo, é muito importante, e que não se pode avaliar o impacto pelo abate de um animal ou substâncias poluentes jogadas em um riacho, ficando difícil medir suas consequências.

Por outro lado, a existência ou não de lesão efetiva ao meio ambiente não é o ponto determinante na aplicação da sanção penal, pois a conduta típica referida no caput do artigo 34 da Lei 9.605/98, refere-se a crime formal. O citado dispositivo legal descreve o tipo em questão como "Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente". O núcleo do tipo é o verbo "pescar", definido pelo artigo 36 da mesma lei como "todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios...". Ficando evidente que de pegar ou não o peixe tanto faz, o crime é de pesca.

Bem como citam Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas:

De fato, diante da impossibilidade em se medir as consequências de abater um animal ou despejar substâncias poluentes em um riacho para o equilíbrio ecológico da região, é difícil imaginar um delito que tenha característica "insignificante", que não exija do Estado uma rígida repressão, feita através da sanção penal. Atribuir esse adjetivo aos crimes que "lesam pouco a natureza" é considerar insignificante o próprio objeto jurídico da norma em análise, i.e., o próprio meio ambiente. Por fim, vale salientar, novamente, a lição dos irmãos Passos de Freitas, para quem "o reconhecimento do Princípio da Insignificância deverá ser reservado para hipóteses excepcionais, principalmente pelo fato de que as penas previstas na Lei 9.605/98 são leves e admitem transação ou suspensão condicional do processo. (2000, p. 43)

Referências

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