UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ - UFC CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA - CAEN
MESTRADO PROFISSIONAL EM ECONOMIA - MPE
FRANCISCO ÂNGELO DE ARAÚJO
PROGRAMAS DE RECUPERAÇÃO FISCAL – REFIS UMA ANÁLISE SOB A ÓTICA DA TEORIA DOS JOGOS
FRANCISCO ÂNGELO DE ARAÚJO
PROGRAMAS DE RECUPERAÇÃO FISCAL – REFIS UMA ANÁLISE SOB A ÓTICA DA TEORIA DOS JOGOS
Dissertação submetida à Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Economia – Mestrado Profissional – da Universidade Federal do Ceará - UFC, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Economia.
Orientador: Prof. Dr. Paulo de Melo Jorge Neto
FRANCISCO ÂNGELO DE ARAÚJO
PROGRAMAS DE RECUPERAÇÃO FISCAL – REFIS UMA ANÁLISE SOB A ÓTICA DA TEORIA DOS JOGOS
Dissertação submetida à Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Economia – Mestrado Profissional – da Universidade Federal do Ceará - UFC, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Economia.
Data de Aprovação: 06 de agosto de 2009.
Banca Examinadora
______________________________________ Prof. Dr. Paulo de Melo Jorge Neto
Orientador
______________________________________ Prof. Dr. Maurício Benegas
Membro
______________________________________ Profa. Dra. Eveline Barbosa Silva Carvalho
AGRADECIMENTOS
A Deus, que me concedeu esta e todas as demais oportunidades e me deu
discernimento para seguir o caminho que me conduz, dentro de minhas limitações, a
cometer menos erros.
À minha família: Esposa e filhos que souberam compreender minha ausência
necessária para a concretização do presente trabalho.
Ao professor Paulo Neto, pela sua lúcida visão sobre o tema e sua oportuna e
brilhante atuação como orientador.
Aos componentes da banca, a Professora Eveline Barbosa, e aos Professores
Maurício Benegas e Paulo Neto, por suas pertinentes sugestões.
A Vítor Borges Monteiro, pela decisiva e indispensável colaboração no tópico de
Teoria dos Jogos, sem a qual não teria logrado o presente êxito.
Ao colega de trabalho, de luta e acadêmica Carlos Eduardo dos Santos Marino, por
RESUMO
O presente trabalho foca-se na análise dos programas de recuperação fiscal – REFIS - sob a ótica da Teoria dos Jogos. A teoria das escolhas públicas e a teoria dos jogos formam o núcleo do arcabouço teórico da presente obra. Uma análise da dinâmica das dívidas ativas da União e do Estado do Ceará é empreendida com o objetivo de mostrar que existe um problema o qual requer uma decisão do governo. Busca-se, através do Modelo de Cournot, esclarecer que as firmas ao decidirem recolher ou não o tributo, têm suas quantidades e seus lucros alterados para maior. Por fim, formaliza-se um modelo em que se analisam as decisões do governo – de editar ou não editar o REFIS, bem como as decisões do contribuinte – de recolher ou não recolher o imposto. O resultado do jogo aponta que para o governo, a melhor estratégia é não editar o REFIS. Os resultados evidenciam ainda que para o contribuinte, a melhor estratégia é recolher o tributo no prazo, no caso em que o governo não edita o REFIS, no entanto é mais vantajoso para este recolher com o benefício no caso em que há a edição do programa.
ABSTRACT
The present work focuses on the analysis of fiscal recovery programs - REFIS - beneath the optics of Game Theory. The theory of public choices and the game theory form the core of the theoretical framework of this present work. An analysis of the dynamics of the outstanding active debt of the Union and the State of Ceará is undertaken with the aim of showing that there is a problem which requires a government decision. Is looked for through the Cournot Model, clarify that firms when decide to collect the tribute or not, have their quantities and profits changed for bigger. Finally, is formalized an model in that analyzes the decisions of government - of edit or not edit the REFIS, and the decisions of the taxpayer - of retract or not retract the tax. The outcome of game shows that for the government, the best strategy is to not edit the REFIS. The results show even that for the taxpayer, the best strategy is to retract the tribute on time, in case in the government does not edit the REFIS, however is more advantageous for him retract with the benefit the case where there is the edition of the program.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO... 8
1. REFERENCIAL TEÓRICO………12
1.1 Aspectos Teóricos do Estado……… 12
1.2 Limitações ao Poder de Tributar………15
1.3 Aspectos Teóricos e Conceituais da Tomada de Decisão……… 16
1.4 Teoria das Escolhas Públicas……… 18
2. BREVE HISTÓRICO SOBRE TRIBUTAÇÃO, DÍVIDA ATIVA E REFIS... 23
2.1 O Poder e o Dever de Tributar... 23
2.2 Dívida Ativa... 25
2.3 Programa de Recuperação Fiscal REFIS……… 30
2.4 REFIS nas Unidades Sub-Nacionais……… 34
3. TEORIA DOS JOGOS………...39
3.1 Aspectos Teóricos e Conceituais da Teoria dos Jogos………. 39
3.2 A Escolha do Governo: Editar ou não Editar o REFIS……….. 41
3.3 O REFIS Visto como um Jogo... 43
3.4 Jogo de Pagar ou não Pagar o Imposto... 44
3.5 REFIS Visto como um Jogo pelas Firmas e pelo Governo………...52
4. CONCLUSÕES………...60
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS……… 64
INTRODUÇÃO
Uma das principais obras na área de teoria econômica, “que para muitos,
inaugura a ciência econômica moderna, A Riqueza das Nações de Adam Smith, é
também o livro que inaugura a visão moderna da ação do Estado na economia”,
conforme assinalado por Biderman et al. (2004 – IX).
Outra obra não menos importante, a teoria de Keynes destaca a
importância do papel do governo na economia, que teria a missão de suavizar os
ciclos econômicos, notadamente em períodos recessivos, nos quais, por uma
retração na economia, as firmas não investem, agravando a recessão. Dado que o
mercado não seria capaz de reverter este ciclo, cabe ao governo agir na forma de
investimentos diretos na atividade econômica.
O mundo hoje vive uma economia global, no qual, qualquer
acontecimento relevante no âmbito econômico em qualquer nação tem reflexos
diretos nos demais países. Considerando-se a crise mundial que ora se instalou e
que segundo os analistas mais otimistas deverá prosseguir no mínimo até o final do
ano de 2009, percebe-se o tamanho da importância do governo na economia. Mais
do que em outro tempo nos últimos quarenta anos, se falou tanto na necessidade de
ações governamentais, seja através de pacotes que envolvam quantias
astronômicas, ou em programas de estatização de empresas privadas (ainda que
provisória) como remédio para o que os economistas apontam como a maior crise
desde a segunda guerra mundial.
O fato é que os governos e só eles podem de fato fazer alguma coisa
para reverter a situação. Nesse ponto convergem todas as tendências ideológicas,
desde as mais radicais de esquerda até as mais extremas conservadoras.
Difícil negar a relevância do papel do governo na economia, dado que se
observa uma relação direta entre o nível da carga tributária e o PIB, em que, salvo
Na ausência de um contraponto, que existiu até pouco tempo, de
economias estatais, como a extinta URSS, o que predomina hoje é o estado fiscal,
caracterizado como tendo a tributação sua fonte de receita.
Dado que o poder de tributar delegado ao Estado possui suas limitações,
os burocratas, os agentes arrecadadores, se vêem balizados entre a vontade política
do governante e a legislação vigente. No que diz respeito à legislação, constata-se
não uma relativa rigidez, dado que a instância que a institui está numa esfera
superior àquela de quem a executa, além de que a mesma, numa perspectiva
temporal é mais duradoura do que o mandato do governante: de quatro ou no
máximo oito anos, no caso de uma reeleição. Quanto à vontade política do
governante, esta há de obedecer alguns contornos: a) o seu comprometimento com
o eleitor/contribuinte, que através do voto o levou ao poder; b) os
financiadores/doadores que disponibilizaram recursos para sua campanha, e c)
coerência com a plataforma ideológica do partido ou coalizão que o levou ao poder.
É com observação nessas três vertentes apontadas acima que o governo
define em que nível irá lançar mão do poder de tributar a assim traçar estratégias
que tragam um retorno máximo em termos financeiros, ao mesmo tempo sem
afrontar, ou transgredir o mínimo possível essas delineações.
É esse assim, o arcabouço da racionalidade do governante, para o qual o
que mais importa é o tamanho do seu prestígio, longevidade no cenário político,
maiores chances de se manter e de ascender na hierarquia dos cargos políticos,
bem como ganhos pessoais presentes e futuros. O posicionamento do governo no
jogo estratégico, além dos contornos apontados acima tem também o foco da
maximização do seu bem estar, qual seja a manutenção do poder.
Quanto ao contribuinte do imposto, sua racionalidade está ligada ao
objetivo da empresa que é a maximização da riqueza do proprietário. Tomando
como foco tão somente a tributação, dado que este é o objeto do presente estudo, o
contribuinte toma suas decisões observando alguns contornos jurídicos e éticos, que
recolher o tributo o expõe a sanções previstas na legislação (multas e juros), além
da repercussão negativa perante a opinião pública, nos casos mais gritantes.
Assume-se, assim, que o contribuinte irá tomar suas decisões, balizado nesses
princípios, direcionadas ao maior retorno possível para a maximização de seus
lucros.
Diante disso percebem-se as posições antagônicas entre governo e
contribuinte e que além dos aspectos, das características e das idiossincrasias de
cada um dos agentes, estes irão se posicionar no jogo na perspectiva de qual
decisão irá tomar o opositor.
Como conseqüência, surge uma dívida Ativa que é incômoda para o
governo dado que estes valores deixaram de ser investidos nas políticas públicas. É
incômoda ainda por se revelar em um peso enviesado na economia, em que alguns
contribuintes têm que suportar mais que outros a carga tributária. O processo de
execução fiscal é moroso, em média 12 anos são necessários, desde a instauração
até a sentença final, o que dificulta ou retarda a ação do governo. O problema exige
uma solução do governo, que então busca alternativas dentro do seu “portfólio” de
decisões e então recorre aos programas de recuperação fiscal – REFIS.
A presente obra está estruturada em três capítulos. No capítulo inicial, um
referencial teórico busca a compreensão do Estado como instituição e instrumento
da ação coletiva, com o objetivo de mostrar que o governo tem a tributação como
quase exclusiva fonte de recursos para seu funcionamento, caracterizando-o como
Estado Fiscal. Referido tópico alude ainda sobre os aspectos teóricos da tomada de
decisão e sobre a teoria das escolhas públicas, objetivando evidenciar como os
agentes devem tomar decisões e como realmente tomam decisões. Mostra ainda os
contornos legais e ideológicos percorridos pelos agentes. O Capítulo dois trata da
dívida Ativa e do REFIS, no qual, breve análise dessa Dívida é empreendido, em
que se mostram os valores do seu estoque, valores recuperados e capacidade do
governo em recuperar seus créditos fiscais. Quanto ao REFIS, este é analisado em
seu aspecto estrutural e de seu efeito de perdão parcial de débitos fiscais. O
modelagem, consagrada na teoria dos jogos como o modelo “centopéia”, em que se
evidenciam os resultados dos possíveis decisões dos contribuintes: pagar ou não
pagar o tributo e do governo de editar ou não editar o REFIS.
Uma vez definidas as variáveis, tais como Imposto, Taxa de Juros,
Prejuízo do governo por não receber o tributo, Lucratividade do contribuinte por
aplicar no setor produtivo da empresa, e as penalidades aplicadas pelo governo ao
contribuinte, o jogo se desenvolve com a decisão inicial do contribuinte. Se este
recolhe o tributo o jogo finda, dado que não carece de nenhuma decisão do governo.
Caso contrário, surge uma dívida e então o governo joga: edita ou não o REFIS. A
decisão final, uma vez supondo como esta a fase decisiva do jogo, fica com o
contribuinte, de recolher ou não com o benefício.
Na presente análise pretende-se estabelecer como pano de fundo um
programa de recuperação de créditos fiscais denominado REFIS, que visa converter
em receita para o erário público, créditos fiscais inscritos na Dívida Ativa do Estado,
apontando em que nível de acerto e falhas essa escolha do governo se encontra.
1. REFERENCIAL TEÓRICO
1.1 Aspectos Teóricos do Estado
É lugar-comum a afirmação de que o Estado passa a existir como fruto da
consciência política do povo que busca organizar-se politicamente. Nesse enfoque,
o Estado é um instrumento de organização política que funciona como um sistema
de funções e um conjunto de órgãos, disciplinados e coordenados para atingir
determinados objetivos.
O Estado, sociologicamente, não se deixa definir por seus fins, dado que
praticamente inexiste uma tarefa da qual o Estado não se tenha ocupado, ao mesmo
tempo em que é impossível apontar tarefas das quais o Estado sempre se tenha
ocupado com exclusividade. (WEBER, 2006, p. 60).
De acordo com a visão aristotélica, o Estado tem duas finalidades
básicas: segurança e desenvolvimento. Este, com o objetivo de promover o bem
comum, aquela, com o de manter a ordem política econômica e social.
Contudo, para funcionar, o Estado necessita obter meios para cumprir
suas múltiplas atividades: política, administrativa, econômica e financeira, sendo
esta, a responsável pela obtenção, gerência, e aplicação de recursos necessários
para o funcionamento das instituições. Diante dessa necessidade, é legitimado ao
Estado o poder de tributar: criar, gerenciar, administrar os mais diversos tributos.
De fato, o Estado Moderno, em sua dimensão financeira, divide-se em
três tipos: o Estado Patrimonial, o Estado de Polícia e o Estado Fiscal. É importante
verificar qual o modelo de Estado adotado pela Constituição Federal brasileira de
1988.
Das diversas definições de Estado encontradas na literatura consultada,
importância da ordem pública e de forma implícita o funcionamento das instituições
através da garantia do cumprimento dos contratos:
O Estado é o instrumento de ação coletiva por excelência da sociedade. É a forma através da qual a sociedade busca alcançar seus objetivos políticos fundamentais: a ordem ou estabilidade social, a liberdade, o bem estar e a justiça social. Estes quatro objetivos são cada um deles finais, mas a ordem ou segurança pública é o primeiro e principal deles. Não apenas porque sem ela não é possível alcançar os três outros objetivos, mas também porque está implicada na definição mínima de Estado. Se não houver ordem pública, se a propriedade e os contratos não forem minimamente respeitados, não haverá Estado. (BIDERMAN et al., p. 4).
O processo de formação do Estado pode ser resumido, a três grandes
grupos teóricos: o histórico, o naturalista e o contratualista. No primeiro, o Estado é
visto como um fenômeno histórico decorrente da luta pela apropriação do
excedente. No segundo grupo estão as teorias que afirmam que o Estado se formou
naturalmente e não por um trato puramente volitivo. No terceiro, as teorias que
afirmam a formação contratual do Estado, como produto da vontade de alguns ou de
todos os homens.
O advento do Estado moderno coincide com a administração patrimonial,
com origem na Europa, surgindo em duas vertentes distintas: uma, na Holanda e na
Inglaterra, outra, na França, Alemanha, Áustria, Espanha e Portugal. Tem como
principal característica o patrimonialismo financeiro, mantendo-se fundamentalmente
das rendas patrimoniais ou dominiais do príncipe, apoiando-se apenas
secundariamente na receita proveniente de tributos. No Estado Patrimonial se
confundem o público e o privado, o imperium e o dominium, a fazenda do príncipe e
a fazenda pública, persistindo poderes periféricos de imposição de tributos em mãos
da Igreja e de senhores feudais.
Ao Estado Patrimonial sucede o Estado de Polícia, que floresce
principalmente na Alemanha e na Áustria, de onde migra para a Itália, a Espanha e
Portugal. O Estado de Polícia caracteriza-se como um Estado modernizador,
intervencionista, centralizador e paternalista, com base na atividade de polícia,
visando a garantia da ordem e da segurança e a administração do bem-estar e da
de polícia, o iniciar-se da separação entre o público e o privado, entre as rendas
patrimoniais e o tributo, que, entretanto, ainda é tênue, permanecendo a indistinção
entre política e economia. O tributo deixa de ser esporádico e destinado a atender
necessidades públicas e passa a exibir finalidades extra-fiscais, podendo ser
cobrado, com apoio na Razão de Estado, para o ulterior fomento das atividades
produtivas, das empresas e mediante intervenção direta na economia, por meio de
monopólios e da fabricação de diversos produtos.
No Estado Fiscal, que gradualmente sucede ao Estado de Polícia, com o
advento do liberalismo e do capitalismo, a receita pública assume novo perfil,
passando a fundar-se nos empréstimos e principalmente nos tributos. Dá-se a
separação entre a fazenda pública e a fazenda do príncipe, entre a política e a
economia, minimiza-se a intervenção estatal, o tributo deixa de ser transitório e
vinculado a necessidades conjunturais para ser cobrado permanentemente com
base na riqueza e na capacidade contributiva.
A Constituição Federal de 1988 adotou claramente o modelo de Estado
Fiscal ao erigir a tributação como o principal meio financeiro para a obtenção de
receitas. A Carta confere competência a todos os entes federados para instituir
impostos, taxas e contribuições de melhoria, à União para instituir empréstimos
compulsórios e contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de
interesse das categorias profissionais e econômicas (CF/88, artigo 145, 148 e 149,
caput).
No Brasil, como um Estado Federal ou uma Federação, a competência
tributária é partilhada entre a União os Estados Membros, o Distrito Federal e os
Municípios. Essa distribuição de competência está prevista na Constituição de 1988.
Dentre os impostos de competência dos estados, destaca-se o Imposto Sobre
Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de
Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), previsto
1.2 Limitações ao Poder de Tributar
Dado que o poder de tributar delegado ao Estado possui suas limitações,
os burocratas - os agentes arrecadadores - se vêem balizados entre a vontade
política do governante e a legislação vigente. No que diz respeito à legislação,
constata-se uma relativa rigidez, dado que a instância que a institui está numa
esfera superior àquela de quem a executa, além de que a mesma, numa perspectiva
temporal é mais duradoura do que o mandato do governante: de quatro ou no
máximo oito anos, no caso de uma reeleição. Quanto à vontade política do
governante, esta há de obedecer alguns contornos: a) o seu comprometimento com
o eleitor/contribuinte, que através do voto o levou ao poder; b) os
financiadores/doadores que disponibilizaram recursos para sua campanha, e c)
coerência com a plataforma ideológica do partido ou coalizão que o levou ao poder.
É com observação nessas três vertentes apontadas acima que o governo
define em que nível irá lançar mão do poder de tributar a assim traçar estratégias
que tragam um retorno máximo em termos financeiros, ao mesmo tempo sem
afrontar, ou transgredir o mínimo possível essas delineações.
É esse assim, o arcabouço da racionalidade do governante, para o qual o
que mais importa é o tamanho do seu prestígio, longevidade no cenário político,
maiores chances de se manter e de ascender na hierarquia dos cargos políticos,
bem como ganhos pessoais presentes e futuros. O posicionamento do governo no
jogo estratégico, além dos contornos apontados acima tem também o foco da
maximização do seu bem estar, qual seja, a manutenção do poder.
Quanto ao contribuinte do imposto, sua racionalidade está ligada ao
objetivo da empresa que é a maximização da riqueza do proprietário. Tomando
como foco tão somente a tributação, dado que este é o objeto do presente estudo, o
contribuinte toma suas decisões observando alguns contornos jurídicos e éticos, que
se não observados podem acarretar em perdas maiores. Simplesmente deixar de
recolher o tributo o expõe a sanções previstas na legislação desde a aplicação de
a execução fiscal, além da repercussão negativa perante a opinião pública, nos
casos mais gritantes. Assume-se, assim, que o contribuinte irá tomar suas decisões
balizadas nesses princípios e direcionadas ao maior retorno possível para a
maximização de seus lucros.
Diante disso percebem-se as posições antagônicas entre governo e
contribuinte e que além dos aspectos, das características e das idiossincrasias de
cada um dos agentes, estes irão se posicionar no jogo na perspectiva de qual
decisão irá tomar o opositor.
1.3 Aspectos Teóricos e Conceituais da Tomada de Decisão
O administrador público ou privado toma decisões com base nas
informações disponíveis. A teoria das escolhas aponta duas estratégias, em forma
de perguntas:
9 Como as pessoas devem tomar decisões (enfoque normativo)
9 Como as pessoas realmente tomam decisões (enfoque positivo).
No primeiro, parte-se tipicamente de um modelo econômico e procura-se deduzir que informação é necessária para fazê-lo funcionar. No segundo, estudam-se como os indivíduos utilizam os dados que são fornecidos. É importante estudar o enfoque positivo, pois permite identificar a informação que é mais útil. É igualmente importante estudar o enfoque normativo, pois muitos padrões de contabilidade financeira baseiam-se na lógica dedutiva de modelos normativos de tomada de decisões. (HENDRIKSEN; VAN BREDA, 1999, p. 135).
A teoria das escolhas é composta de três vertentes:
9 Noções das ações disponíveis aos indivíduos;
9 Resultados ou conseqüências de suas ações;
9 Funções de preferências que determinam como escolherão entre as
ações disponíveis.
Em termos estáticos, a hipótese de transitividade talvez seja relativamente trivial, mas, em termos dinâmicos, pressupõe que as preferências dos indivíduos são estáveis, o que é uma hipótese muito forte. (HENDRIKSEN; VAN BREDA, 1999, p. 135).
Com base nessa teoria, supõe-se que os indivíduos tenham a capacidade
de analisar e avaliar todas as alternativas disponíveis e ordená-las em ordem de
preferência, com base no conhecimento das conseqüências de cada uma dessas
ações e que sejam capazes de optarem pela ação que traga as melhores
conseqüências.
Dado um conjunto limitado de alternativas, as hipóteses de preferências completas e transitivas são suficientes para permitir a mensuração numérica das preferências de um indivíduo, ou seja, as conseqüências mais desejáveis podem receber pesos maiores do que as conseqüências menos desejáveis [...] Essas medidas formam a base da teoria da utilidade, na qual se supõe que cada indivíduo se comporta como se tivesse um conjunto interno de pesos, denominado função utilidade, que o orienta para a escolha das conseqüências com maior utilidade. A teoria da escolha se reduz, assim, à maximização da utilidade. (HENDRIKSEN; VAN BREDA, 1999, p. 136).
Tem sido demonstrado que esta metodologia de escolha, ou seja, a
maximização do valor esperado das ações pode ser justificada caso as quatro
condições seguintes sejam satisfeitas:
9 As preferências são completas e transitivas.
9 Dados resultados idênticos, é escolhido aquele que tem maior
probabilidade.
9 Situações complicadas de apostas podem ser decompostas em
situações mais simples.
9 Existe uma aposta segura que seria equivalente para o indivíduo. Essa
é a chamada hipótese do equivalente certo.
Assumindo-se as hipóteses acima, conta-se com um modelo de escolha
que incorpora a incerteza. Agora passa a haver, portanto, a necessidade lógica de
uma teoria da informação que possa explicar como essa incerteza seria tratada. O
trabalho mais antigo na área da informação, concentrou-se em como a informação
dos diversos estados. “Este é o chamado papel pré-decisório da informação, porque
permite determinar o valor da informação antes da tomada de decisões”
(HENDRIKSEN; VAN BREDA, 1999, p. 135).
Para o estudo que ora se desenvolve, além desses aspectos apontados
na teoria da escolha, que leva em conta as informações intrínsecas, ou seja, aquelas
relativas às próprias características da entidade, bem como as extrínsecas, quais
sejam aquelas referentes ao ambiente externo em que a entidade está inserida,
devem-se levar em conta as ações praticadas ou as intenções de praticar essas
ações por parte de outras entidades.
Do mesmo modo, levar em consideração que as decisões tomadas
podem afetar a decisão da outra entidade, que por sua vez podem afetar as
conseqüências dessas ações, em um perceptível círculo repetitivo, que será
discutido mais amiúde no capítulo que trata da teoria dos jogos.
1.4 Teoria das Escolhas Públicas
Para um melhor entendimento do processo de tomada de decisão do
governo, é necessária uma abordagem à teoria das escolhas públicas, que vem
auxiliando economistas na compreensão da intervenção governamental na realidade
socioeconômica. O desenvolvimento de uma teoria desse tipo se justifica pelo fato
de o Estado ser responsável por uma parcela considerável do Produto Interno Bruto
(PIB). No caso brasileiro “em algumas métricas responsáveis por 40% do PIB.”
Referida teoria tem sua origem, entre os séculos XVIII, que apontam o
estadista e matemático francês Marquês de Condorcet e à sua descoberta do
“paradoxo do voto” e o século XIX, ao escritor e professor de matemática inglês
Lewis Caroll. Mais recentemente a crítica aponta obras de economistas e cientistas
políticos, notadamente, nos fins da década de 1950 e meados da década de 1960,
com os trabalhos de Kenneth Arrow, Duncan Black, Anthony Downs, Mancur Olson
e William Riker. Uma influência menos unanimemente reconhecida, mas sem dúvida
equiparou a atividade política ao mercado, em que os políticos representam os
empresários e os votos o dinheiro. O consenso aponta como fundadores da referida
teoria os economistas James Buchanan e Gordon Tullok, através da obra The
Calculus of consent, sendo, James Buchanan laureado com o prêmio Nobel de
Economia em 1986 pela contribuição na área da Escolha Pública.
As formulações do eminente economista derivam de duas grandes
preocupações suas: a primeira refere-se ao excesso de matematização dos
problemas sociais, em que as decisões tomavam um caráter meramente numérico.
Para ele, ao se preocuparem em elaborar modelos de análise com enorme
sofisticação matemática, os economistas estavam se esquecendo daquilo que para
ele deveria se constituir no essencial da análise teórica: compreender as motivações
que explicam as decisões dos agentes econômicos. A segunda preocupação do
pensador se reportava à acentuada politização das decisões econômicas, que era
decorrência direta da enorme influência das políticas econômicas de inspiração
keynesiana. Dessa feita havia a transferência para o âmbito da política o que muitas
vezes fazia com que a racionalidade econômica fosse suplantada pelos interesses
dos políticos envolvidos na tomada de decisões. No entendimento de Buchanan, o
economista e o político trabalham com vetores distintos. Enquanto este tem por
parâmetro fundamental em suas tomadas de decisão a eficiência, procurando
sempre a alocação ótima dos recursos escassos, aquele tem por parâmetro a
conquista e a manutenção do poder, o que só pode ser alcançado, no regime
democrático, através do voto.
Buchanan recomenda o estabelecimento de limites à interferência dos
políticos nas decisões econômicas. Esses limites devem ser votados pelos
representantes democraticamente eleitos e inseridos na constituição do país, razão
pela qual a teoria da escolha pública é também chamada de teoria constitucionalista.
De forma equivocada alguns economistas têm-se sentido atraídos pelo
programa de investigação da teoria da escolha pública, mas ao mesmo tempo se
têm afastados por razões de natureza político-ideológica por associarem esta
identificarem com estas posições. De fato é preciso não confundir a teoria da
escolha pública com o pensamento neoliberal que naturalmente se utilizou dos
argumentos desenvolvidos no âmbito da teoria para reforçar a sua posição
ideológica de apoiar o desenvolvimento dos mercados, com cada vez menos
restrições de qualquer natureza e ao mesmo tempo defender a redução da
intervenção do Estado na economia. Por outro lado também não se confunda
tratar-se de uma defesa velada da desordenada intervenção do estado na economia.
Na verdade o que ocorre é que a teoria das escolhas públicas aborda as
duas vertentes opostas, que embrionaram o centro das discussões entre os
clássicos e os neoliberais: a de “falhas de mercado” e “falhas de governo”. O termo
falha aqui assim traduzido como oposto a ideal. Dessa forma o ideal de mercado
seria para muitos economistas o mercado competitivo, sem custos de transação,
com informação simétrica e completa entre os agentes e onde sempre que para
certo preço, existem agentes dispostos a vender e outros dispostos a comprar, a
transação se efetue. Os mercados reais não apresentam aquelas características
“ideais” daí falar-se em “falha”. Por outro lado a “falha do governo” deriva da
comparação com um ideal de governo e de um ideal democrático com a realidade
das atuações dos governos e dos funcionamentos das democracias. O ideal de
governo, tal como implicitamente assumido pelos economistas da welfare
economics, é o governo como se fosse um ditador benevolente, ou seja, um agente
supostamente capaz de impor as suas políticas “ditador” e capaz de conhecer e
satisfazer as preferências dos cidadãos.
Assim a teoria das escolhas públicas se centra como uma investigação
interdisciplinar entre a teoria econômica e a teoria política. Não trata de uma
ideologia liberal ou neoliberal, como também não aborda qualquer outra ideologia
clássica: não trata, portanto, da menor ou maior intervenção do governo na
economia e sim da melhor intervenção do governo na economia.
Da mesma forma que através do aumento da despesa pública (quer em
bens e serviços públicos, quer em transferências - Bolsa Família, por exemplo) se
uma tendência para que em regimes democráticos se produzam orçamentos do
Estado com deficits e não superavits e para que os governos se envolvam em ciclos
político-econômicos caracterizados pelo aumento da despesa pública em período
pré-eleitoral seguido por tensões inflacionárias e políticas restritivas no período
pós-eleitoral. O que é importante realçar aqui é que a existência de déficits e dos ciclos
político econômicos é resultante do processo democrático em si e não da natureza
particular da política econômica adotada pelo governo ser de inspiração keynesiana.
A perspectiva da teoria da escolha pública é que são as regras de jogo do processo
democrático que em grande parte determinam as políticas e não a especificidade
ideológica do partido do governo.
Conforme se observa na prática, percorre-se um longo processo entre a
decisão original e o resultado ou aplicação das políticas públicas. Entre um e outro
são interpostos processos legislativos e gerenciais inerentes à esfera
governamental, tanto quanto a escolhas de agentes privados aos quais são
delegados poderes, funções e recursos.
No percurso desse processo entre a decisão original e o resultado, os
agentes vão interagindo, e percebe-se que o jogo se desenvolve nesse processo,
conforme acentuado por Monteiro (2008, p. 30):
Dadas as preferências desses participantes da escolhas públicas, os resultados de política serão aqueles decorrentes das regras que predominam no processo político. A ênfase da análise passa, assim, da escolha de resultados para a escolha de regras ou processos. Tais preferências definidas no conjunto dos processos derivam-se dos diferentes resultados que podem ser produzidos sob cada processo. Por implicação, os processos herdam o grau de estabilidade desses resultados finais, como de resto, a escolha de processos para a escolha de processos herdas essa estabilidade, e assim por diante. À Constituição cumpre a finalidade de truncar essa regressão infinita, permitindo estabelecer um lócus de expectativas estáveis.
De forma bastante progressiva, tanto na literatura econômica como em
editoriais da mídia impressa e televisiva, evidencia-se a relevância da qualidade das
instituições políticas na geração e sustentação de bons resultados na economia,
suas decisões de investimentos norteadas pela qualidade do ambiente em que se
definem as estratégias de regulação operadas pelos agentes públicos.
É certo que os agentes tomam suas decisões e fazem suas escolhas em
bases racionais e que usam as informações disponíveis para tomar suas decisões.
No entanto, nem sempre as informações estão disponíveis, o que leva os agentes a
tomar decisões com base em perspectivas de probabilidades. Argüindo mais uma
vez a racionalidade dos agentes, estes irão tomar decisões cujo retorno seja o
melhor possível ou sua probabilidade de acontecer seja a mais alta possível.
Estudos em geral apontam para o fato de que os agentes não tomam decisões
baseados em pura intuição, ao mesmo tempo em que se admite que tomam
decisões sem necessariamente ter acesso a todas as informações.
Para o presente trabalho todas as informações do mercado são de
conhecimento comum, ou seja, todos os agentes conhecem suas recompensas ao
tomarem suas decisões. Para discorrer sobre como os agentes fazem suas
escolhas, utilizaremos as teorias das escolhas acima. No entanto, os agentes tomam
suas decisões em situações de interação estratégica e para entender como esses
agentes tomam essas decisões utilizar-se-á a teoria dos jogos.
2. BREVE HISTÓRICO SOBRE TRIBUTAÇÃO, DÍVIDA ATIVA E REFIS
2.1 O Poder e o Dever de Tributar
Uma vez legitimado ao estado o poder de tributar e somente este poder
exercer tal atividade, essa relação é ao mesmo tempo uma relação de dever, para
fazer valer outros princípios legais, previstos na Constituição, tal como a regra da
liberdade e da livre iniciativa na ordem econômica.
A tributação é, sem sobra de dúvida, o instrumento de que se tem valido a economia capitalista para sobreviver. Sem ela não poderia o estado realizar os seus fins sociais, a não ser que monopolizasse toda a atividade econômica. O tributo é inegavelmente a grande e talvez a única arma contra a estatização da economia. (MACHADO, 1998, p.26).
Além disso, há consenso de que os indivíduos consentem na instituição
do tributo, bem como consentem na elaboração e imposição das demais regras
jurídicas que regem o Estado.
A situação de normalidade com relação à tributação é que esta incide
sobre a produção, alcançando expressiva massa da atividade econômica, sendo
bastante ampla a quantidade de empresas identificadas como contribuintes do
imposto. Referidas empresas ao realizarem operações que se configurem como fato
gerador do imposto, estão obrigadas a, em determinado período a recolher o tributo.
Caso isso não ocorra, o valor a recolher será acrescido de juros, multas e correção
monetária, sendo esta última como óbvia, por se tratar apenas da correção do valor
a arrecadar. Outra penalidade decorrente da inadimplência é a restrição a participar
de parcela do mercado, no caso os órgãos públicos e empresas de economia mista,
dada a imposição legal de certidões negativas para participar de licitações.
Na referida situação de normalidade, os contribuintes não tem nenhuma
motivação para deixar de recolher o tributo, dado que caso não recolham, há a
previsão de uma penalidade. Diante dessa situação, recolher o tributo no prazo se
fato de que não recolher o tributo gera um custo para o contribuinte. Essa hipótese
de comportamento do contribuinte está embasada nas teorias das escolhas e da
tomada de decisão comentadas acima.
O governo, por seu turno, não pode prescindir do usufruto de um valor
presente, dado que o que é mais importante para este é o bem-estar da população
que se realiza através da aplicação das políticas públicas que por sua vez
dependem das finanças.
Admitindo a hipótese de que o governo atua com base no teorema do
orçamento equilibrado, ou seja, o nível de gastos e investimentos está no mesmo
nível do valor da arrecadação e admitindo ainda a hipótese de que o governo opera
com o ponto ótimo de arrecadação, qual seja aquele ponto máximo de tributação
suportável pela massa de contribuintes, este não encontra mais espaço para
aumentar o nível da carga tributária, posto que, por hipótese, se encontra no ponto
máximo de arrecadação, conforme figura abaixo.
Tmax taxa de impostos
Figura 1 – Curva de Lafer
Configurando-se as hipóteses acima, o governo não possui margem para
majorar o tributo, sob o risco de sofrer um efeito reverso, não pode prescindir do
nível que ora se realiza e, além disso, deseja elevar seu nível de arrecadação.
Por outro lado, apesar da questão legal e do senso comum de que todos
devem recolher normalmente os tributos o fato é que alguns contribuintes deixam de
recolher, o que causa um mal estar para o governo, que como responsável pela
promoção da justiça social, arca com o ônus desse desequilíbrio no mercado em
que se vê favorecer aqueles que podem praticar uma concorrência desleal
financiada pela apropriação dos tributos. Diante disso, o governo se vê entre três
desconfortáveis alternativas:
1. Abster-se de promover em parte suas políticas por falta desses
recursos;
2. Endividar-se para compensar esse déficit;
3. Impor uma maior carga àqueles que já recolhem normalmente.
É nessa indesejável situação que o governo contabiliza um “ativo”
denominado Dívida Ativa.
2.2 Dívida Ativa
Nesse cenário em que o governo e contribuinte perseguem sentidos
opostos surge um ativo nas contas do governo, classificado em seu balanço
patrimonial como Dívida Ativa e do lado do contribuinte um passivo em suas contas.
Uma situação nada confortável para ambos os lados: o governo sente na mesma
proporção do tamanho da dívida um rombo em seu orçamento, o que vem frustrar,
nessa mesma proporção, a consecução de suas políticas públicas. Quanto ao
contribuinte, este se vê penalizado, através de restrições a fatias do mercado bem
como a encargos de multas e juros sobre a dívida.
A Dívida Ativa tem sua definição no Código Tributário Nacional:
Constitui Dívida Ativa Tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado para pagamento pela lei ou por decisão final proferida em processo regular (CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL – CTN – Art. 201).
O crédito é levado à inscrição como dívida depois de definitivamente
constituído. A inscrição não é ato de constituição de crédito tributário. Pressupõe,
isto sim, que se encontra regular e definitivamente constituído e, ainda, que se tenha
esgotado o prazo fixado para seu pagamento. (MACHADO, 1998, p. 176 e 177).
Denomina-se execução fiscal a ação de que dispõe a fazenda pública
para a cobrança de seus créditos sejam tributários ou não, desde que inscritos como
Dívida Ativa.
A certidão da inscrição do crédito da Fazenda Pública como dívida ativa é
o título executivo extrajudicial de que necessita a exeqüente para propositura da
execução. Nesta, portanto, a exeqüente não pede ao juiz que decida sobre seu
direito de crédito. Pede simplesmente sejam adotadas providências para tornar
efetivo o seu crédito, isto é, providências para compelir o devedor ao pagamento.
(MACHADO, 1998, p. 354).
Nessa situação, o contribuinte se encontra em ponto crítico uma vez que
de acordo com o CTN, em seu dispositivo sobre a exigência da quitação de tributos,
estabelece como: a) condição para o deferimento de concordata ou para a
declaração de extinção das obrigações do falido; b) como condição da sentença de
julgamento de partilha ou adjudicação e c) como condição para a celebração de
contrato com entidade pública ou participação em licitações.
É patente que há motivação para que cada contribuinte tenha aversão a
se ver inscrito como devedor na dívida ativa.
O burocrata que administra o órgão responsável pela arrecadação tem
reduzir o saldo da dívida ativa. O crescimento da dívida é um indicador da
ineficiência da máquina arrecadadora.
Dados da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) revelam que
o nível da Dívida Ativa da União no final do primeiro semestre de 2009 já supera o
valor da arrecadação anual. De acordo com matéria publicada na página da Agencia
Brasil de Comunicação (http://www.agenciabrasil.gov.br), a Dívida Ativa da União em junho de 2009 Supera a Cifra de R$ 680 bilhões de Reais, comparado a um
valor orçamentário de 622 bilhões de reais, a diferença chega a 58 bilhões de Reais.
Considerando as dívidas ativas dos Estados e Municípios esse valor já supera o
Produto Interno Bruto.
Os quadros abaixo revelam o tamanho e a dinâmica dessa conta,
analisada no período de 2000 a 2008.
Tabela 1 - Dívida Ativa da União - Estoque e Arrecadação
ANO ESTOQUE (1) VAR. % ARRECADAÇÃO VAR. % % ARR/EST
2000* 208.378,01 10.371,64 4,98
2001 232.079,25 11,37 8.144,71 (-)21,47 3,51
2002 239.578,11 3,23 9.377,13 15,13 3,91
2003* 265.932,34 11,00 12.599,44 34,36 4,74
2004 310.368,25 16,70 9.569,42 (-)24,05 3,08
2005 377.102,66 21,50 9.943,47 3,91 2,64
2006* 444.859,11 17,97 10.651,58 7,12 2,39
2007 510.532,67 14,76 13.892,76 30,43 2,72
11/08 552.750,38 11.954,08 2,16
00/07 VAR. TOTAL 145,00 33,95
CRESC. MÉDIO 13,66 4,26
Fonte: Elaboração do Autor a partir dos Dados do Ministério da Fazenda-Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional – PGN – Coordenação Geral da Dívida Ativa da União – CDA.
Nota: *Ano em que o Governo editou REFIS. Valores em Milhões de Reais a preços de 31/12/2008 – IGPM. Os Valores do Ano de 2008 se reportam até 30 de Novembro. O Crescimento Total e Médio se reporta de 2000 a 2007.
Tabela 2 - Dívida Ativa do Estado do Ceará - Estoque e Arrecadação
ANO ESTOQUE (1) VAR. % ARRECADAÇÃO VAR. % % ARR/EST
2000* 1.228,27 17,24 1,40
2001 1.659,62 35,11 12,50 (-)27,49 0,75
2002* 2.291,53 38,07 32,86 162,88 1,43
2003* 2.954,79 28,94 28,60 (-)12,96 0,97
2004* 3.414,11 15,54 36,02 25,94 1,06
ANO ESTOQUE (1) VAR. % ARRECADAÇÃO VAR. % % ARR/EST
2006* 4.324,68 11,26 44,00 65,41 1,02
2007 4.832,59 11,74 24,36 (-)44,66 0,50
2008 5.325,44 10,20 25,06 2,87 0,58
00/08 333,57 45,36
CRESC. MÉDIO 20,12% 4,79
Fonte: Elaboração do Autor a partir dos Dados da Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará.
Nota: Balanço Patrimonial dos anos de 2000 A 2008. (*) Ano em que o Governo editou Refis. Valores em Milhões de Reais a preços de 31/12/2008 – IGPM.
Os números acima revelam que o problema, longe de caminhar para uma
solução, vem se agravando ao longo do período. No caso da União, o estoque, ou
seja, o valor do saldo da dívida evolui a uma taxa média anual da ordem de 14%,
enquanto que os valores recuperados crescem a uma média de cerca de apenas
5%. Preocupante ainda é a capacidade que tem o governo de recuperar esses
créditos: o que já era baixíssimo em 2000, cerca de 5% do valor do saldo era
recuperado, em 2008, esse percentual é de apenas 2%.
No estado do Ceará os dados são ainda piores: o crescimento da dívida é
em média 20% ao ano, os valores recuperados não chegam a 5% e a capacidade de
recuperação dos débitos cai dos ínfimos 1,40% do saldo da dívida para pouco mais
de meio por cento.
Conforme se pode observar, os dados acima se reportam até o final do
ano de 2008. No entanto a situação tem se agravado ainda mais no primeiro
quadrimestre do ano de 2009.
De acordo com dados da Procuradoria Geral da fazenda Nacional
(PGFN), os Programas de Recuperação Fiscal do Governo Federal arrecadaram
valores da ordem de R$ 9.132,81 milhões dos anos de 2000 a 2008. A arrecadação
total relativa à Dívida Ativa da União no mesmo período, incluindo os próprios
valores relativos aos programas de recuperação fiscal foi de R$ 96,5 bilhões. Esses
valores revelam que referidos programas representam tão somente 10,4% da
Os valores acima, quando comparados com a arrecadação global, ou
seja, a soma de todas as receitas da união, tornam-se ainda mais insignificantes.
Em igual período, ou seja, de 2000 a 2008, a união arrecadou R$ 4.926,68 bilhões,
revelando uma participação nessa composição de apenas 0,2% relativo ao REFIS
do período - R$ 9,13 bilhões (Fonte: PGFN - Secretaria da Receita Federal).
A ineficiência do governo em cobrar se deve em parte à morosidade do
judiciário, que abarrotado de processos, não consegue julgar em tempo hábil, o que
vem acumulando sobremaneira esse indicador.
Recente matéria assinada por Kiyoshi Harada, Especialista em Direito
Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP, mostram o tamanho do problema
(Revista Jus Vigilantibus - http://jusvi.com)
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional apresentou um anteprojeto de
lei de execução fiscal administrativa, para tentar evitar o colapso total do Judiciário
no âmbito das execuções fiscais, baseada em dados estatísticos acerca da dívida
ativa da União, dentre os quais destacamos os seguintes:
9 O número de execuções fiscais ajuizadas corresponde a mais de 50%
dos processos judiciais, em geral, em curso no âmbito do Poder
Judiciário, sendo que na Justiça Federal essa proporção é de 38,8%.
9 Os dados de 2005 revelam que a taxa média de encerramento de
controvérsias em relação às novas execuções fiscais ajuizadas é
inferior a 50% e apontam um crescimento de 15% de estoque de
execuções em primeira instância na Justiça Federal, havendo uma
taxa de congestionamento médio de 80% nos julgamentos de primeiro
grau.
9 Existem 2,5 milhões de execuções judiciais no âmbito da Justiça
Federal, com baixíssima taxa de impugnação, seja por meio de
9 No âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, enquanto o
processo administrativo tributário leva em média 4 anos, a execução
judicial leva 12 anos para findar.
9 Menos de 1% do estoque da dívida ativa da União de R$ 400 bilhões
(R$ 600 bilhões se incluída a da Previdência Social) ingressam nos
cofres públicos por via de execução fiscal, bem menos do que o
percentual alcançado por medidas de parcelamento (REFIS, PAES e
PAEX).
2.3 Programas de Recuperação Fiscal - REFIS
Diante desse conflito, o governo lança mão em busca de alternativas que
em um só tempo atendam aos pontos citados acima: i) não majorar, ii) manter ou
elevar o nível de arrecadação. O REFIS surge, assim, como essa alternativa, que se
oferece ao contribuinte como forma genérica de perdão de parte da dívida (juros e
multas) em troca do principal (valor do imposto e correção monetária).
Oportuno afirmar que o REFIS é um programa de recuperação fiscal que
dá a oportunidade a contribuintes que no passado não cumpriram com suas
obrigações, a no presente, consertar essa falta, sem que lhe seja imposta nenhuma
penalidade. Numa palavra, ele se refere ao passado e é bastante claro que é
estanque com relação ao futuro por só se reportar a créditos pretéritos.
Desde o ano de 2000 até o ano de 2009, os contribuintes têm convivido
com programas de refinanciamento de débitos fiscais federais. O programa de
refinanciamento de débitos fiscais inaugural foi o chamado Refis, instituído pela
Medida Provisória n. 1.923, de 6 de outubro de 1999. Assim como os programas que
o sucederam, atingiu quase a totalidade dos contribuintes nacionais e trouxe prazos
mais dilatados para o pagamento dos débitos tributários do que os parcelamentos
Os programas de refinanciamento dos débitos tributários costumam trazer
em seu bojo institutos de suspensão, extinção e exclusão do crédito tributário,
juntamente com regras atípicas, por vezes confusas, bem como transportam
requisitos e condições inerentes a um instituto específico para outra espécie de favor
fiscal.
Da análise de tais programas de refinanciamento infere-se que possuem
características de parcelamento, de moratória, de transação, de anistia ou mesmo
de compensação. Todos estes institutos estão descritos nas hipóteses de
suspensão, extinção ou exclusão do crédito tributário no Código Tributário Nacional
e têm características próprias.
A natureza jurídica dependerá do débito que o contribuinte optou por
consolidar no programa, podendo ser, inclusive, mista. Neste caso, o contribuinte
deve atender aos requisitos e às condições delimitadas no Código Tributário
Nacional para cada espécie de instituto jurídico.
Dos cinco institutos presentes nos programas de refinanciamento, quais
sejam, a moratória, o parcelamento, a compensação, a transação e a anistia,
apenas a compensação não possui condições de ser implementada isoladamente,
pois não há como liquidar todos os débitos via compensação sem que esta
liquidação esteja acompanhada de, pelo menos, um outro instituto - moratória,
parcelamento, transação ou anistia.
Observada a restrição acima, a composição dos institutos é livre. Pode o
contribuinte acordar com a União Federal da maneira que melhor lhe convier, desde
que observadas as condições e os requisitos estipulados para cada um dos
programas de refinanciamento.
O Refis, primeiro programa de refinanciamento de débitos instituído a
partir de 2000, é o mais abrangente e que melhor atendeu aos anseios dos
contribuintes. Isso porque previu hipóteses diversas de compensação e prazo
da parcela estava diretamente vinculado ao faturamento do contribuinte, de modo a
viabilizar o seu pagamento mesmo em época de baixa atividade. Sua complexidade,
casada com o fato de consolidar os créditos da União Federal e os do INSS, acabou
por trazer dificuldades operacionais. Entretanto, estas dificuldades não devem tirar o
mérito do mais corajoso e abrangente programa de refinanciamento de débitos
fiscais já instituído.
Depois de três anos, entrou em vigor o Refis II, instituído pela Lei n°
10.684/03, cujo art. 9° ampliou o marco temporal dos efeitos do pagamento e do
parcelamento dos tributos, podendo também ser efetuados após o recebimento da
denúncia.
Por fim, foi editado o Refis III, pela MP n° 303/06, que não previu qualquer
efeito penal ou processual penal relativo ao pagamento integral ou ao parcelamento
de tributos, ao contrário do que sucedeu nos regimes anteriores.
De acordo com notícia veiculada na Revista Questão de Justiça, nova lei
que reedita o REFIS federal está prestes a entrar em vigor, conforme se transcreve
abaixo:
A Secretaria da Receita Federal do Brasil e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, no âmbito de suas respectivas competências, editarão, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias a contar da data de publicação da Lei n.º 11.941 de 27 de maio de 2009, os atos necessários à execução dos parcelamentos nela previstos, inclusive quanto à forma e ao prazo para confissão dos débitos a serem parcelados. (REVISTA QUESTÃO DE JUSTIÇA - jul/2009).
Porém, segundo o teor da legislação publicada, pode-se inferir que os
débitos vencidos até 30/11/2008, constituídos ou não, inscritos em dívida ativa ou
não, inclusive os que já são objeto de execução fiscal já ajuizada poderão ser
parcelados.
Não será necessária apresentação de garantias ou arrolamento de bens
para aderir ao novo programa, mas se já houver penhora efetivada em execução
Os débitos existentes perante a Receita Federal do Brasil - RFB, a PGFN
e o saldo remanescente do REFIS (Lei n.º 9.964/00), do PAES (Lei n.º 10.684/03),
do PAEX (MP n.º 303/06) e dos parcelamentos de que tratam os artigos 38, da Lei
n.º 8.212/91 e 10, da Lei n.º 10.522/02, mesmo que o interessado tenha sido
excluído do programa, também poderão ser parcelados.
Se o interessado discute judicialmente a sua reinclusão ou solicita
parcelamento mediante processo judicial, deverá requerer a desistência da
respectiva ação até 30 (trinta) dias da confirmação de sua inclusão no novo
programa de parcelamento, sendo, nesse caso, dispensados os honorários
advocatícios da União, mas convertidos em renda eventuais depósitos judiciais
existentes, para fins de abatimento dos débitos com direito as reduções previstas no
novo programa.
Os débitos de aproveitamento indevido de créditos de Imposto sobre
Produtos Industrializados - IPI incidente às matérias prima, embalagens e produtos
intermediários adquiridos em alíquota zero ou não tributados e os débitos da
Contribuição para Finalidades Sociais - COFINS de sociedades civis de prestação
de serviços regulamentados, poderão ser também parcelados.
Os interessados que aderiram ao parcelamento da MP n.º 449/08 também
poderão migrar para este novo programa.
Os débitos que não foram objeto de parcelamentos anteriores, se
parcelados pelo novo programa, a mensalidade não poderá ser inferior a R$50,00
(cinqüenta reais) para pessoa física e de R$100,00 (cem reais) para pessoa jurídica,
o não pagamento de 3 (três) parcelas, consecutivas ou não, acarretará a exclusão
do novo parcelamento, sendo considerada como vencida a parcela que ultrapassar
30 (trinta) dias do seu vencimento e não for paga nesse período.
A pessoa jurídica que aderir ao novo programa, poderá usar 25% (vinte e
cinco por cento) do seu prejuízo fiscal próprio e 9% (nove por cento) da base de
mora ou de ofício, juros e débitos inscritos em Dívida Ativa, o pagamento ou
parcelamento dos débitos fica da seguinte forma:
9 À vista com desconto de: - 100% da multa de mora e de ofício; 40% da
multa isolada; 45% dos juros de mora; 100% do encargo legal;
9 30 (trinta) meses com desconto de: 90% da multa de mora e de
ofício;35% da multa isolada; 40% dos juros de mora; 100% do encargo
legal;
9 60 (sessenta) meses com desconto de: 80% da multa de mora e de
ofício; 30% da multa isolada; 35% dos juros de mora; 100% do
encargo legal;
9 120 (cento e vinte) meses com desconto de:70% da multa de mora e
de ofício; 25% da multa isolada; 30% dos juros de mora; 100% do
encargo legal;
9 180 (cento e oitenta) meses com desconto de: 60% da multa de mora
e de ofício; 20% da multa isolada; 25% dos juros de mora; 100% do
encargo legal.
Atente-se para o fato de que o novo programa prevê a re-inclusão de
débitos remanescentes dos três programas anteriores, em condições ainda
melhores que aqueles.
2.4 REFIS nas Unidades Sub-Nacionais
À semelhança do que já ocorreu no plano federal, com a instituição do
Programa de Recuperação Fiscal, mais conhecido por REFIS, vários Estados da
Federação, com exceção de Alagoas, Amapá, Roraima e Paraná, com a mediação
do CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária), que reúne o Ministro da
2000 em Brasília convênios (Convênio ICMS n° 31, 32, 33), tendo em vista a
instituição de "programas de recuperação", a serem implementados no âmbito
estadual. Observadas as linhas gerais acordadas (a seguir detalhadas), cada Estado
da federação tem autonomia para dar ao seu "programa de recuperação fiscal" os
contornos que melhor se adaptem às suas peculiaridades regionais.
Pelos convênios avençados, os Estados pactuantes ficaram autorizados a
conceder parcelamento de débitos fiscais relacionados com o ICMS (abrangendo
também o antigo ICM), decorrentes de fatos geradores ocorridos até 31 de
dezembro de 1999. Considera-se débito fiscal, para fins de parcelamento, a soma
dos impostos devidos, multas, atualizações monetárias, juros de mora e demais
acréscimos previstos na legislação de cada Estado.
As unidades federadas, a seu critério, puderam conceder parcelamento
de débitos pelo prazo máximo de 120 meses (10 anos). Ao contrário do REFIS
federal, que não previa prazo de parcelamento, os programas estaduais o fizeram.
Puderam, ainda, os Estados, para tal concessão, exigir a consolidação de todos os
débitos fiscais existentes (pertinentes ao ICMS/ICM) na data do pedido, inclusive
aqueles que já eram objeto de parcelamento. Cada Estado decidiu assim a diretriz a
ser seguida.
Também a critério das Secretarias de Fazenda estaduais, os
parcelamentos em curso puderam ter o seu número de parcelas vincendas
ampliadas em até 20% (vinte por cento). Trata-se de medida que podia ser
cumulada, a critério dos Estados, com o parcelamento supra referido.
O débito fiscal do contribuinte optante do programa, devidamente
consolidado, sujeitava-se até a data da formalização do acordo, aos acréscimos
previstos na legislação estadual. Após a formalização do acordo, o débito fiscal
ficava sujeito a juros correspondentes à variação mensal da Taxa de Juros de Longo
Prazo -TJLP, tal como ocorre também no REFIS federal. A taxa de juros (SE-LIC) à
época era, em média, de 1,8% ao mês, contra 0,9% da TJLP. Esta taxa de juros
O débito apurado deveria ser pago em parcelas mensais e sucessivas,
que não podiam ser inferiores a 0,5% (meio por cento) do faturamento médio mensal
do exercício imediatamente anterior, nem a 1/120 (um cento e vinte avos) do valor
do débito.
A opção pelo programa também implica em perdão de juros e multas.
Eventual inadimplência do contribuinte, por três meses consecutivos ou não, no
pagamento integral das parcelas, bem como do imposto devido relativamente a fatos
geradores ocorridos após a data da formalização do acordo, implicava em imediata
revogação do parcelamento.
Para os contribuintes que aderiram ao programa eram feitas algumas
exigências e impostas algumas restrições. As principais eram:
a) confissão irrevogável e irretratável dos débitos fiscais;
b) expressa renúncia a qualquer defesa ou recurso administrativo ou
judicial, bem como desistência dos já interpostos, relativamente aos
débitos incluídos no pedido de adesão do contribuinte.
Essas duas exigências, inicialmente previstas no REFIS federal, têm sido
alvo de grandes controvérsias judiciais por parte das empresas optantes do
programa federal, sob alegação de ofensa ao princípio da inafastabilidade do
controle jurisdicional sempre que ocorrer lesão ou ameaça de lesão a direitos. Por
outro lado, a confissão de dívidas pode implicar no afastamento da incidência de
multas. De fato, conforme jurisprudência já pacificada no STJ, em caso de denúncia
espontânea de dívidas não poderá ocorrer incidência de multas. As mesmas
discussões, mantidas tais exigências, deverão repetir-se nos foros estaduais.
Em todo caso, antes de optar pelo programa, os contribuintes estaduais
tiveram que elaborar um minucioso levantamento de todos os débitos pendentes,
posto que, no momento da consolidação, deveriam confessá-los de forma
Observe-se que, ao contrário do REFIS federal, os Convênios assinados
não albergavam previsão da obrigatoriedade da quebra dos sigilos fiscal e bancário.
Ficou, contudo, facultado os Fiscos estaduais exigir do contribuinte o fornecimento
periódico de informações relativas à sua movimentação financeira durante a vigência
do parcelamento, bem como o oferecimento de garantias.
O programa de recuperação acordado entre os Estados foi, sob alguns
aspectos, menos audacioso que o REFIS federal. Enquanto este toma como
referência de pagamento o faturamento da empresa e tem limite aberto para o
parcelamento, o programa estadual toma como principal referência o limite total do
débito, concedendo prazo limitado para as parcelas.
A edição de um Programa de Recuperação Fiscal – REFIS, só será
justificado em sua essência se contemplar dois aspectos: i) diminuição do saldo total
da dívida ativa; ii) estancamento do valor do estoque da dívida ativa ou pelo menos
a manutenção do nível histórico que vinha se observando ao longo do tempo. Essa é
a lógica e coerência com a própria nomenclatura do programa de recuperação.
Nada pode sustentar a eficácia de um programa caso se observe redução na dívida
num momento, mas esta venha a aumentar logo no período seguinte, ou por outro
se observe um vício em que o contribuinte deliberadamente se deixa inscrever como
devedor para gozar do benefício de recolher sem juros e multas, tendo assim o seu
capital disponível no momento anterior para reinvesti-lo em outra atividade.
Caso se observe a hipótese acima (aumento do valor do estoque no
período após o REFIS) o programa se revela em um equívoco de acordo com a
própria lógica do REFIS: a dívida existe por dois motivos principais: aqueles que
deixaram de arrecadar ou são sonegadores ou são contribuinte que deixaram de
recolher por não suportar a carga tributária. Se são sonegadores, irão estes
recolher, sabendo que sempre vem um benefício em seu socorro? E se não
recolhem por não suportar a carga tributária, irão agora suportar a carga tributária de
dois períodos, ou seja, aquele em que deixaram de recolher e o que deveriam
lógica do jogo de sempre adiar o pagamento para se beneficiar dos programas de
recuperação fiscal do governo.
Uma verdade inconteste é o fato de que sempre que se edita um REFIS
um número expressivo de contribuintes adere ao programa fazendo com que valores
que compõem o saldo da dívida se transformem em receita para o estado. No
entanto, o estado não dispõe de uma gradiente apropriada para precisar o quanto o
programa está sendo eficaz ou se pelo contrário está incorrendo ao vício
mencionado acima.
3. JOGO DA RENEGOCIAÇÃO DO REFIS
O presente capítulo traz uma breve visão dos aspectos teóricos da teoria
dos jogos, bem como trata da escolha do governo no que se refere à sua decisão de
recuperar os débitos da dívida ativa: se através da execução fiscal ou programas de
recuperação fiscal. Mostra-se também o jogo de pagar ou não pagar o imposto pelas
firmas através do modelo de Cournot. Por fim mostra-se o jogo do governo e
contribuinte em que se evidenciam as decisões destes, respectivamente em: {editar;
não editar o REFIS} e {pagar; ou não pagar o imposto}
3.1 Aspectos Teóricos e Conceituais da Teoria dos Jogos
A teoria dos jogos tal como é hoje apresentada tem seu embrião nas
formulações do matemático francês Antoine Augustin Cournot (1801-1877) que
apresentou um modelo de duopólio que ficou conhecido como equilíbrio de Cournot,
o qual consiste na análise das decisões de produção de duas empresas, em que
estas decidem cada uma que quantidades produzir, sabendo que a quantidade
produzida pela outra iria afetar os seus lucros.
Outros precursores são apontados com suas contribuições no
desenvolvimento dessa teoria, tais como Robert J. Leonard, para o qual houve uma
nova interpretação de Cournot a partir do trabalho de John F. Nash, um dos mais
importantes matemáticos de século XX.
O matemático alemão Ernst Friedrich Ferdinando Zarmelo e o matemático
francês Félix Edouard Justin Borel, são igualmente citados como precursores dessa
teoria.
pode ser determinada utilizando-se técnicas matemáticas. (FIANI, 2006, p 35).
A teoria dos jogos continuou ganhando força, e hoje é inumerável a
quantidade de artigos e títulos publicados no exterior sobre o tema. De forma
surpreendente, o tema rendeu o Premio Nobel de Economia em duas ocasiões
diferentes: em 1994 e em 2005.
Referida teoria não se aplica a qualquer situação de interação estratégica,
mas somente àquelas situações em que os agentes buscam agir de forma racional.
O presente trabalho não foge a essa regra. Na verdade busca-se fundamentá-lo
nessa premissa de que os agentes são racionais e tomam suas decisões em bases
racionais, não encontrando espaço a defesa de que estes venham a agir por pura
intuição.
Para o presente trabalho o que caracteriza um jogo são “situações que
envolvam interações entre agentes racionais que se comportam estrategicamente...”
e mais:
• Um jogo é um modelo formal. Isso significa que a teoria dos jogos envolve técnicas de descrição e análise, ou, em outras palavras, que
existem regras preestabelecidas para apresentar e estudar um jogo.
• Interações. Significam que as ações de cada agente, consideradas individualmente, afetam os demais.
• Agentes. Um agente é qualquer indivíduo, ou grupo0 de indivíduos envolvidos no processo de interação estratégica com capacidade de
decisão para afetar os demais. Um agente é um jogador
• Racionalidade. Assumir que os agentes/jogadores são racionais significa supor que os indivíduos empregam os meios mais adequados