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Palavras-Chave: Cinco forças Competitivas; Estratégias Genéricas, Tipos Ideais.

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Academic year: 2021

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Área temática:

Estratégia nas Organizações

Título do trabalho:

Compreendendo os modelos estratégicos de Porter como esquemas típicos ideais

AUTORES

FERNANDA MARIA FELÍCIO MACÊDO Universidade Federal de Ouro Preto

profamacedo@yahoo.com.br

DIEGO LUIZ TEIXEIRA BOAVA Universidade Federal de Ouro Preto profboava@yahoo.com.br

Resumo:

A estratégia envolve o planejamento da utilização de recursos disponíveis ou de situações favoráveis, visando atingir os objetivos definidos. Na prática, a ação estratégica pode se configurar de diferentes formas, além de impactar todas as áreas da organização. Nesse contexto, a investigação científica acerca da temática busca produzir conhecimentos estratégicos passíveis de generalização, válidos para diferentes contextos organizacionais. Ou seja, o saber em estratégia é orientado para objetividade. Assim, dentre os principais trabalhos sobre estratégia com essa característica pode-se destacar os modelos de Porter, cinco forças competitivas e estratégias genéricas. Esses modelos prescritivos buscam apresentar um cenário competitivo e oportunidades de escolhas estratégicas que podem ser efetuadas por quaisquer organizações. A partir disso, pretende-se no presente artigo propor uma releitura desses modelos, apresentando-os como esquemas típicos ideais. Para desenvolvimento dessa proposta discute-se os tipos ideias a partir da concepção da fenomenologia social elaborada por Alfred Schütz. A relevância dessa proposta consiste em discutir os modelos como algo além da prescrição, além de pontuar alguns aspectos que respondem as principais críticas efetuadas contra os modelos. No mais, o estudo desses dois trabalhos de Porter como tipos ideais poderá contribuir para o avanço epistemológico da área de estratégia.

Palavras-Chave: Cinco forças Competitivas; Estratégias Genéricas, Tipos Ideais.

Abstract

The strategy involves planning the use of available resources or favorable situations, to achieve the goals set. In practice, the strategic action can be configured in different ways, in addition to impact all areas of the organization. In this context, scientific research on the subject seeks to produce strategic expertise capable of generalization, valid for different organizational contexts. This is, knowledge in strategy is geared towards objectivity. Thus, among the main work on strategy with this feature can highlight the models of Porter's five competitive forces and generic strategies. These prescriptive models seek to provide a competitive landscape and opportunities for strategic choices that can be made by any organizations. From this, it is intended in this article proposes a reinterpretation of these models, presenting them as typical schemes ideals. To develop this proposal discusses the

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types of design ideas from social phenomenology developed by Alfred Schütz.The relevance of this proposal is to discuss the models as something beyond the prescription, and highlight some aspects that answer the main criticisms made against the models. In addition, the study of these two works of Porter as ideal types can contribute to the epistemological advance the field of strategy.

Keywords:Five Competitive forces, General Strategies, Ideal types.

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1 – INTRODUÇÃO

O saber estratégico elaborado até o momento construiu várias ferramentas para auxiliar o gestor no processo de tomada de decisão. Essa interface do estudo científico da estratégia com a prática estratégica se deve a natureza social aplicada da administração, área de conhecimento que abarca a estratégia. Administração é uma ciência social aplicada e, como tal, é a aplicação da pesquisa científica às necessidades organizacionais. Com isso, é pertinente que a ciência além de apresentar um fim em si mesmo, produza investigações com fins de solucionar problemas da realidade prática administrativa. Logo, a administração enquanto ciência apresenta uma relação significativa com a realidade organizacional. Produz teorias, doutrinas e técnicas que podem melhorar o funcionamento da organização. Diversas vezes, o conteúdo acadêmico produzido é prescritivo no sentido de produzir um dever ser na área da administração de organizações.

Na contemporaneidade, diagnosticar os ambientes organizacionais se torna um desafio cada vez maior, pois o cenário competitivo das empresas vem mudando rapidamente. A estrutura dinâmica de mercado versus a tendência a inércia das organizações por serem naturalmente burocráticas faz do estudo das ferramentas de apoio à decisão estratégica algo substancialmente relevante. Outro fator que torna esse estudo pertinente é a compreensão da racionalidade limitada do tomador de decisão. Nesse sentido, o homem nunca é capaz de tomar decisões ótimas, mas satisfatórias já que não tem como processar todas as informações e conhecimentos existentes sobre determinada ação. Dessa forma, como utilizar ferramentas de apoio a decisão considerando a limitação da racionalidade humana? Uma possível resposta não passa pela negação da limitação da racionalidade do homem, mas sim pela afirmação que não é necessário saber cada detalhe acerca de um aspecto, mas sim os detalhes fundamentais acerca do mesmo.

Nesse âmbito, para aperfeiçoar a prática da estratégia, vários teóricos produziram instrumentos prescritivos para auxiliar o homem, gestor estrategista, na execução de sua tarefa. Porter (1986) ao elaborar seus modelos estratégicos, forças competitivas e estratégias genéricas, visa aumentar a probabilidade de o gestor tomar a melhor decisão possível em dado contexto. Em seus dois modelos o autor oferece um caminho para o gestor seguir, uma orientação que lhe auxilia a lidar com o grande número de variáveis que permeia o meio e a ação estratégica. Todavia, será que esses modelos são somente uma prescrição do fazer estratégia?

Diante desse questionamento, o presente trabalho visa propor uma releitura dos modelos de Porter (1986), considerando-os esquemas típicos ideais. Para desenvolvimento dessa proposta discute-se os tipos ideias a partir da concepção da fenomenologia social elaborada por Alfred Schütz (1972).

Porém, faz-se necessário destacar que para Alfred Schütz (1972) só é possível compreender um fenômeno a partir da ação social correspondente ao mesmo, ou seja, a estratégia deve ser investigada segundo a ação estratégica. A ação social é a vivência do fenômeno.

A ação nunca é isolada, desvinculada de outra ação, separada do mundo. Toda ação apresenta horizontes relacionados com a realidade social do executor da mesma. Dessa forma, somente o autor sabe quando começa e termina sua ação, sendo capaz de dizer o porquê de sua existência.

Essa importância conferida pela fenomenologia social à ação se deve a sua origem, uma vez que essa forma de pensamento é resultado da tentativa de Schütz (1972) em utilizar a obra fenomenológica de Edmund Husserl (1990) para aprofundar as bases da sociologia compreensiva de Max Weber (1991).

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Nesse sentido, Schütz (1972) afirma que a ação social de Weber (1991), conduta humana projetada pelo ator de maneira consciente, tendo um significado subjetivo que lhe dá uma direção e um propósito, se torna o meio de se chegar aos traços típicos de um fenômeno social.

Tais traços típicos de um fenômeno social estão relacionados ao conceito de tipo ideal, que Weber (1991) apontou como a única maneira de se abordar objetivamente os objetos de estudo das ciências sociais. O tipo ideal visa tornar o fenômeno inteligível, através de uma sintetização dos traços típicos do mesmo. É um processo que coloca em evidência tudo o que há de original e específico acerca do fenômeno e da pessoa que o executa. Capalbo (1979, p.86) afirma que

...ao elaborar o tipo ideal a partir de princípios vinculados à história, Weber pretende compreender a ação social como a resultante de forças de relações sociais, ação proveniente do comportamento social que tem um significado subjetivo. Desse modo, coloca o homem como centro das atenções já que a compreensão dos significados se dá no sujeito. Considera as ações motivadas por sentimentos afetivos e as tradicionais como menos racionais, sendo as ações que se aproximam do tipo racional como as mais compreensíveis.

Segundo Schütz (1972, p. 214), os tipos ideais são esquemas interpretativos do mundo social em geral, que se voltam para o depósito de conhecimento dos homens acerca desse mesmo mundo.

A relevância desse artigo consiste em discutir os modelos como algo além da prescrição, além de pontuar alguns aspectos que respondem as principais críticas efetuadas contra os modelos. No mais, o estudo desses dois trabalhos de Porter (1986) como tipos ideais poderá contribuir para o avanço epistemológico da área de estratégia, em um esforço de se pesquisar dois conteúdos já vistos exaustivamente na literatura de forma inovadora.

O trabalho será estruturado em três linhas centrais de discussão. Inicialmente, tem-se uma breve apresentação dos modelos de Porter (1986), cinco forças competitivas e estratégias genéricas, na sequencia, trata-se da discussão do tipo ideal na concepção de Schütz. Por fim, será tecida a argumentação que evidencia os modelos como tipos.

Portanto, o objetivo desse trabalho é apresentar um novo olhar sobre os modelos de Porter (1986), estudados até o momento, como conteúdos que prescrevem a ação estratégica.

Esse olhar inovador será capaz de desvelar pontos complexos que permeiam a investigação científica acerca dessa temática, ainda que em perspectiva introdutória.

2 – MODELOS DE PORTER

A essência da formulação da estratégia é lidar com a concorrência. A concorrência em um segmento tem suas raízes em economias implícitas, e existem forças competitivas que vão muito além dos combatentes estabelecidos em determinado seguimento. O poder lucrativo dessas forças determina o potencial de lucro final de um setor. Assim, seja qual for sua força coletiva, a meta dos estrategistas é sempre encontrar uma posição na indústria em que sua empresa possa se defender melhor contra essas forças ou possa influenciá-las ao seu favor.

Diante dessas considerações, tem-se um modelo de forças competitivas formulado por Porter (1986), sendo essas: entrada, ameaça de substituição, poder de negociação dos compradores, poder de negociação dos fornecedores e rivalidade entre os atuais concorrentes.

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Figura 1: As cinco forças competitivas que dirigem a concorrência na Indústria.

Fonte: Porter (1986)

Em uma perspectiva conjunta, as forças competitivas definem a intensidade da concorrência na indústria, bem como a rentabilidade, sendo que a força ou as forças mais acentuadas predominam e tornam-se cruciais do ponto de vista da formulação de estratégias.

A seguir tem-se uma apresentação geral dessas cinco forças:

Ameaça de Entrada

Os novos entrantes em um segmento trazem nova capacidade, o desejo de ganhar participação de mercado e, em geral, recursos substanciais.

Fornecedores poderosos

Fornecedores podem exercer poder de barganha sobre os participantes de uma indústria a elevar preços ou reduzir a qualidade dos produtos e serviços ofertados.

Compradores poderosos

Os compradores podem forçar os preços para baixo, exigir qualidade mais alta ou melhores serviços, além de jogar os concorrentes um contra os outros.

Produtos Substitutos

Estabelecendo um teto para os preços que podem ser cobrados, os produtos substitutos limitam o potencial de um setor.

Rivalidade

A rivalidade está ligada a presença dos seguintes fatores, como competidores numerosos com mesmo tamanho e poder, crescimento do setor é lento, produtos sem diferenciação ou custo de mudança, custos fixos altos ou produto perecível, entre outros fatores.

Dessa forma, a estrutura existente no setor serve de parâmetro para adaptação das forças e fraquezas da empresa a ela, sendo a estratégia vista como construtora de defesas contra as forças competitivas ou usada para encontrar posições em que as forças sejam mais fracas. O conhecimento das aptidões da empresa e das causas das forças competitivas vai destacar as áreas nas quais a empresa deve ter competição adicional e onde evitá-la.

Ao lidar com as forças que conduzem a concorrência no setor, uma empresa pode desenvolver uma estratégia que assuma uma posição ofensiva. Essa postura é designada para fazer mais do que simplesmente lidar com as forças entre si; ela deve alterar suas causas.

Inovações em marketing podem gerar identificação de marca ou diferenciar o produto de

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outra forma. O equilíbrio de forças é parcialmente resultado de fatores externos e está parcialmente sob controle da empresa.

Logo, a evolução do setor é estrategicamente importante, pois traz mudanças nas forças competitivas. As tendências que trazem prioridade mais alta do ponto de vista estratégico são aquelas que afetam as fontes de competição mais importantes no setor e aquelas que levam novas causas para o primeiro plano.

No planejamento em longo prazo, a tarefa é examinar cada força competitiva, prever a magnitude de cada causa implícita e, então, construir um quadro do provável potencial de desenvolvimento do setor.

Portanto, conclui-se que cada setor tem uma estrutura implícita, ou um conjunto de características fundamentais, econômicas e técnicas, que dão origem as forças competitivas. O estrategista deve posicionar sua empresa para lidar melhor com o ambiente de sua indústria ou influenciar o ambiente a favor da empresa, devendo saber o que faz o ambiente se mover, sendo o conhecimento das forças competitivas a chave para a formulação de um programa estratégico eficiente e eficaz. Para Porter (1986) esse programa se baseia na escolha entre três tipos de estratégias genéricas.

O conceito de estratégias genéricas advém do fato de alguns autores acreditam ser possível definir-se uma tipologia de estratégias amplas. Nesse sentido, as empresas que apresentariam melhor desempenho seriam aquelas que conseguissem aplicar uma, e apenas uma, das três estratégias genéricas.

Porter (1986) propôs uma tipologia de estratégias competitivas genéricas na proporção que podem ser empregadas por qualquer tipo de empresa em qualquer tipo de indústria independentemente do estágio de desenvolvimento da mesma. Essa tipologia pode ser representada pela figura abaixo:

Figura 2 – Tipologia de Estratégias Competitivas Genéricas de Porter Fonte: Porter (1986)

A estratégia de liderança em custo implica que o ponto central é a empresa fazer com que seu custo total seja menor do que o de seus concorrentes. O custo baixo funciona como um mecanismo de defesa da empresa contra a rivalidade de seus concorrentes, fornecedores, ameaça de novos entrantes, ameaça de produtos substitutos e poder de negociação dos compradores.

A estratégia de diferenciação pressupõe que a empresa ofereça, no âmbito de toda a indústria, um produto que seja considerado único pelos clientes, ou seja, cujas características o distingam daqueles oferecidos pela concorrência. A lealdade e a diminuição da sensibilidade ao preço isolam a empresa da rivalidade de seus concorrentes.

Nas estratégias de enfoque, a empresa será capaz de atender melhor ao seu alvo estratégico do que aqueles concorrentes que buscam atender a toda à indústria. O enfoque pode ser em custo mais baixo ou de uma posição de diferenciação.

O quadro apresentado a seguir apresenta as principais características que o autor associa a cada tipo genérico de estratégia, assim como, suas principais vantagens e fontes de risco.

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Abordagem Principais Aspectos Vantagens Riscos Liderança no

custo total

Popularizada nos anos 70 com o conceito de curva de experiência;

Busca de liderança no custo total através de políticas funcionais;

Controle dos custos para mantê-los baixos, mantendo qualidade;

Reinvestimento do lucro na modernização da produção;

São vantagens trazidas pelo baixo custo:

Retornos acima da média;

Defesa contra a rivalidade dos concorrentes;

Defesa contra compradores e fornecedores poderosos;

Barreiras de entrada alta;

Levam a uma posição favorável em relação aos substitutos;

Custos altos envolvidos na modernização do processo produtivo;

Incapacidade de ver mudanças necessárias no marketing ou produto devido ao foco no custo;

Mudança tecnológica anula aprendizado anterior;

Risco de ser imitado.

Diferenciação Produto único;

A diferenciação pode se dar por marca, tecnologia, personalização;

Os custos são controlados, a prioridade é o diferencial;

Cria posição defensável com a obtenção da lealdade dos consumidores com relação à marca. Isso fortalece a resistência da empresa frente às cinco forças competitivas;

Compradores podem sacrificar lealdade à marca por baixo custo;

Sofisticação do consumidor;

Risco de ser imitado.

Enfoque Consiste em enfocar um definido grupo comprador;

Tem alvo definido, escopo menor do que abordagens de custo e diferenciação;

Atinge baixo custo e/ou diferenciação no alvo estratégico estabelecido;

Como pode assumir

características de diferenciação e/ou baixo custo, a abordagem de enfoque assume as vantagens inerentes a estas outras abordagens.

Redução das diferenças entre alvo estratégico e o mercado;

Os concorrentes encontram submercados dentro do alvo estratégico.

Quadro 1: Aspectos das estratégias Genéricas Fonte: Porter (1986)

Porter (1986) cunhou ainda o termo stuck-in-the-middle (meio-termo), para classificar aquelas empresas que não tivessem conseguido implementar com sucesso nenhuma das estratégias genéricas, sendo um tipo residual.

Este posicionamento rendeu ao trabalho do estudioso diversas críticas. O próprio Porter (1991) pondera que em poucas situações, que seria viável a perseguição simultânea das estratégias de baixo custo e de diferenciação, em função de uma determinada combinação muito particular de circunstâncias.

As principais críticas empreendidas ao trabalho de Porter se ligam a validade de seu trabalho estar somente direcionada a realidade de grandes corporações, podendo ser pouco empregada em ambientes de micro e pequenas organizações. Além disso, muitos autores afirmam que hoje os mercados são muito dinâmicos e os rivais podem copiar rapidamente qualquer posição de mercado e a vantagem competitiva é, na melhor das hipóteses, temporária.

Contudo, o modo porteriano de concepção de estratégia é o que apresenta maior difusão em termo mundial e se enraíza mais facilmente nas consciências e no ensino, ainda que seja alvo de muitas críticas. Tal difusão tem início em fins de 1970 e começo dos anos 80, na proporção que o pensamento porteriano começou a influenciar os escritos, o ensino, as práticas e as consultorias em administração.

Um prova disso, segundo Aktouf (2002), um dos principais críticos do autor, as ideias de Porter se tornaram, rapidamente, os fundamentos obrigatórios de disciplinas nos cursos de graduação e pós-graduação em Harvard. Ele é autor de 16 livros e de mais de 60 artigos publicados pelas mais prestigiosas revistas acadêmicas. Seu Competitive strategy: techniques for analysing industries and competitors (1980) foi reeditado 53 vezes e traduzido em 17

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línguas; enquanto que Competitive advantage: creating and sustaining superior performance (1985) já foi reeditado 32 vezes.

No tópico seguinte, apresenta-se o conceito de tipo ideal para subsidiar a releitura dos modelos descritos acima.

3 – ESQUEMAS TÍPICOS IDEAIS

A estratégia constitui um objeto de pesquisa das ciências sociais, posto que se desenvolve no cerne da sociedade. O estrategista encontra-se situado no mundo da vida em constante relacionamento com o outro, sendo que suas ações não são fatos isolados, mas fatos inseridos em uma dinâmica de relacionamento e compreensão social.

Segundo Dilthey (1958, p. 191):

...nós fazemos a reconstituição de nossa própria experiência interna na outra pessoa ao interpretá-la. A compreensão é então um redescobrimento do eu no tu. Esta compreensão dos outros é, então, o paradigma, por assim dizer, do conhecimento que caracteriza as ciências sociais.

Nesse sentido, pretende-se discorrer nesse tópico sobre os esquemas interpretativos típicos ideias e sua base fenomenológica social. Evidencia-se os conceitos chave para a formulação de tipos ideias.

Para Schütz (1972), a primeira tarefa da fenomenologia social consiste em descrever os processos de estabelecimento e interpretação de significado tal como os realizam as pessoas que vivem no mundo social, podendo tomar como tema a pessoa ou o tipo. Pode realizar-se em situações concretas da vida cotidiana ou com alto grau de generalidade. Além disso, a fenomenologia social pode enfocar os objetos culturais e tratar de compreender o seu significado, aplicando-lhes os esquemas interpretativos.

Os trabalhos de Alfred Schütz se baseiam no pressuposto inicial que o homem vive no mundo do senso comum ou da vida, relacionando-se com os outros. Vive nesse mundo em uma constante atitude natural, ou seja, sempre adota uma postura mental que as coisas são tidas como pressupostos. Em atitude natural, o homem aceita a existência da sociedade, compreendendo que o mundo não é privado, mas sim comum a todos.

Nesse sentido, o homem vê como pressuposto a existência material de semelhantes, sua vida consciente, a possibilidade de intercomunicação e a qualidade histórica da organização social e da cultura, da mesma forma que vê como pressuposto o mundo da natureza no qual nasceu (SCHÜTZ, 1979).

Assim, o homem visualiza que além do ego que há dentro dele, existe o alter ego, ou seja, toma consciência da existência do outro. Devido a isso, Schütz (1972) afirma que o mundo da vida é essencialmente intersubjetivo. Esse homem interpreta de forma espontânea sua rotina de afazeres diários, legitimando todos os valores intrínsecos à vida social, tais como regras de controle, relações de poder, classes, religião, trabalho e demais tipos de contratos para convivência social. Além disso, o homem possui uma situação biográfica determinada, apresentando uma história resultante da sedimentação de todas as suas experiências (SCHÜTZ, 1972).

Dessa forma, dependendo das motivações, crenças, valores, costumes vivenciados pelo ser, esse apresentará uma percepção distinta e particular do mundo. A situação biográfica é específica de cada sujeito.

Nesse sentido, pode-se dizer que o mundo da vida cotidiana, comum a todos, se torna único e particular quando observado a partir de uma dada situação biográfica. Logo, o mundo, quando filtrado através de “minha” situação biográfica se torna o “meu” mundo (GORMAN, 1979).

Faz-se necessário ressaltar outro aspecto relevante na situação biográfica de vida, que é o conhecimento empregado para se interpretar o mundo. Tal conhecimento constitui um padrão para assimilação e reconhecimento de informações, podendo ser denominado “acervo de conhecimento ao nosso alcance”. Esse acervo de conhecimento são tipificações

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acumuladas desde a infância, que permitem ao homem representar o mundo do senso comum ou da vida. Assim, em qualquer parte do mundo, o homem, ao analisar objetos, animais, plantas e automóveis, saberá reconhecê-los e decodificá-los de imediato, independentemente do estabelecimento de diálogo com outra pessoa.

Nesse processo, algumas características gerais desses elementos são priorizadas, em um primeiro momento, em detrimento de sua individualidade. Ao vislumbrar uma árvore, o homem a reconhece imediatamente, sem considerar o tamanho do seu tronco, tonalidade de suas folhas, ou demais características que a individualizam. Essas serão analisadas posteriormente, nunca excluídas. Logo, as tipificações são esquemas descritivos impessoais de reconhecimento universal do mundo da vida. Esse acervo de conhecimento é dinâmico e particular, se enriquecendo e ampliando no decorrer da existência humana (SCHÜTZ, 1972).

Esse conceito é determinante para a compreensão da proposta desse artigo.

Assim, ainda que a situação biográfica permita a objetivação do mundo da vida, ela é essencialmente subjetiva. O homem define sua espacialidade e temporalidade de acordo com suas próprias posições no espaço e tempo. As expressões em frente, ao lado, próximo, existem em função da localização do homem que as utiliza, como o agora, o mais tarde são empregados em função de aspectos temporais desse mesmo ser (GORMAN, 1979).

Com base nessa questão da temporalidade e espacialidade, Schütz (1972) aponta a existência de quatro tipos de alter ego na sociedade, a saber:

 Predecessores – pessoas que existiram em uma realidade passada. Somente tomamos consciência de sua existência por leituras ou relatos.

 Contemporâneos – pessoas que estão vivas na mesma realidade temporal, ou seja, no presente.

 Consócios – pessoas que convivem diretamente na mesma realidade temporal e espacial.

 Sucessores – pessoas que viverão após a morte dos contemporâneos e permanecerão anônimas para os mesmos para sempre.

Dentre esses tipos de pessoas, destacam-se os contemporâneos e consócios, pois somente esses são capazes de estabelecer um “relacionamento Nós” e vivenciarem uma

“situação face a face”. Esses termos foram cunhados por Schütz (1972) e advêm do fato da consciência do ser desenvolver “orientações para o tu” (alter ego), ou seja, em sua forma pura, as “orientações para o tu” surgem da captação por uma pessoa da existência de outra em interações face a face.

Assim, se a “orientação para o tu” de uma pessoa é correspondida por outra, se ambas intencionalmente se voltam uma para outra, resulta daí um “relacionamento Nós”. O envolvimento “face a face” com os outros é a principal forma de encontros sociais. Tal envolvimento geralmente acontece quando duas pessoas compartilham a mesma comunidade de espaço e tempo, em suma, é a consciência da presença do outro. Devido a isso, ocorre a simultaneidade da vida, na qual um ser pode experienciar o fluxo de pensamento do outro.

Esse conceito de simultaneidade se deve ao fato do homem só poder atribuir significado à sua ação passada ou futura, sendo que no presente cabe a ele observar as vivências dos demais quando ocorrem realmente. Ao homem cabe esperar que suas ações transcorram para poder refletir sobre elas no passado. Para Schütz (1972), ninguém pode se ver em ação, assim como tampouco pode conhecer o estilo de sua própria personalidade.

Dessa forma, somente em um “relacionamento Nós” compreende-se os significados que os outros atribuem aos fatos, visualizando sua singularidade derivada de sua situação biográfica particular. A partir disso, tem-se que o mundo social ou da vida é intersubjetivo, comum a todos os homens. Nesse mundo, o homem se relaciona e confere significado à sua ação. A ação no mundo da vida é delineada como ação social quando o ator a direciona para outras pessoas, as quais ele vislumbra como seres conscientes (SCHÜTZ,1972).

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Schütz (1972), após fundamentar seu trabalho na intersubjetividade do mundo da vida, volta seu interesse para o estudo da ação social racional que se desenvolve no cerne desse ambiente.

Para Banda (2004, p. 22) esse interesse é despertado na medida em que

...os fenômenos sociais que abarcam os atos humanos não podem ser compreendidos sem serem vistos como atividades humanas de criação, ou seja, sem conhecer os propósitos para os quais estão sendo destinados, bem como sem refletir essas atividades aos motivos que as originaram. Pela teoria dos motivos pode-se aprofundar a teoria da ação humana.

Destaca-se que todas as considerações feitas acerca da ação social são condicionadas à racionalidade da mesma, ou seja, Schütz (1972) abordou fundamentalmente, segundo a classificação weberiana, a ação social orientada para objetivos. Isso se justifica por esse tipo de ação ser um resultado mais direto da intencionalidade da consciência, um dos pressupostos básicos da fenomenologia: toda consciência é consciência de algo (HUSSERL, 1990).

Para compreensão dessa ação social é necessário, primeiramente, conhecer o significado da expressão “possibilidades problemáticas”. Esse conceito relaciona-se com o ato da reflexão desenvolvida pelo homem antes de agir. Tal reflexão leva o homem a suspender sua atitude natural de aceitação perante o mundo, ele passa a perceber que é livre para decidir o curso de sua vida. Assim, o indivíduo projeta a sua ação no futuro, qual a melhor maneira de executá-la para alcançar o fim desejado. Nesse ponto, ele confronta-se com a dúvida entre as possibilidades existentes para a concretização de sua ação.

Destaca-se que as possibilidades problemáticas não são apenas possibilidades em aberto. As possibilidades problemáticas pressupõem contestação, ou seja, as opções se contradizem, cada uma delas tem uma solução diferente e oposta para a resolução de uma questão. Assim, cabe ao ator escolher livremente qual das possibilidades serão concretizadas.

A liberdade confere à ação um caráter subjetivo. Aprofundando seus estudos sobre a projeção e liberdade de escolhas intrínsecas à ação social, Schütz (1972) verifica a existência de dois tipos de motivos presentes nessa ação, o “motivo para” e o “motivo porque” de sua execução.

Os “motivos para” geralmente evidenciam a existência de um projeto de vida do sujeito, uma projeção, ou seja, a ação está ligada a um plano de conduta. Esse plano é elaborado com base “no acervo de conhecimento ao nosso alcance”, fundamentado em experiências passadas semelhantes ao projeto atual.

Para Gorman (1979, p. 61):

Todos os motivos individuais “a fim de” são formas fragmentárias dentro de um plano preconcebido para toda vida. Esse projeto de vida nos fornece um critério para determinar subjetivamente a “melhor” escolha em determinadas situações. Em outras palavras, não existem projetos isolados. Todos os motivos “a fim de” e projetos a longo prazo são formados subjetivamente por cada ator livre.

Grande parte dos “motivos para” são projetados através de um processo de idealização particular baseada na ideia de “posso fazer isso novamente”. No mundo da vida utiliza-se do passado para construção de modelos que orientem o alcance dos fins desejados.

Ao se introduzir o passado na busca pelos “motivos para” encontram-se as manifestações dos “motivos porque” da ação social. Esses últimos são acontecimentos já concluídos na vida do ator social. Eles explicam certos aspectos da realização do projeto, portanto, têm uma realidade temporal voltada para o que já ocorreu. Desse modo, os

“motivos porque” constituem uma categoria objetiva acessível ao observador. Tais motivos constituem causas objetivas dos projetos humanos, livres e subjetivamente definidos.

Sob essa perspectiva, considera-se que a ação constitui um projeto, trazendo em si os

“motivos para” do sujeito e quando realizada permite a atitude reflexiva desse mesmo sujeito,

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conduzindo o investigador aos “motivos porque” da ação. Assim, verifica-se que para Schütz (1979), a ação social desenvolvida no mundo da vida envolve motivação, racionalidade, planejamento, projeção, liberdade de escolha, e deliberação.

A partir dessa investigação da ação social, Schütz (1972) teoriza sobre tipos ideais, um enquadramento específico para dar relevo à diversidade dos fenômenos sociais. Esse tipo centra-se no processo da conduta da ação. A compreensão do tipo ideal deduz em uma forma característica do “motivo para” e o “motivo porque” de um ato manifesto através da identificação da meta e da justificativa constantemente objetivada para o ato.

Schütz (1972) constata que quando o ser humano se distancia de um “relacionamento Nós” com outro indivíduo, ocorre uma perda das características específicas desse outro. Nesse caso, o ser passa a construir linhas de ação que prescrevem o comportamento típico esperado, de atores típicos, em situações típicas.

Após essa tipificação, Schütz (1972) propõe ainda a tipificação de uma pessoa ideal para determinada conduta humana, ou seja, o autor acredita que é possível objetivar o processo de execução de uma ação e da pessoa que a realiza. Ambos os tipos são estreitamente ligados. Os tipos ideais de pessoas são anônimos, ou seja, não importa quantas pessoas são categorizadas sob o tipo ideal, ele não corresponde a nenhuma delas em particular. Segundo o autor, foi exatamente isso que levou Weber a chamá-lo de “ideal”

(SCHÜTZ, 1979, p. 221).

O tipo ideal em Schütz (1972) é elaborado a partir da vivência dos sujeitos. Segundo Jesus et al. (1998, p. 32) é o “tipo vivido cujo sentido é obtido num ato vivido. O tipo vivido concreto possibilita a compreensão das formas significativas de vivência e a compreensão significativa de uma subjetividade comum”.

Desse modo, observa-se que o tipo ideal é construído a partir da subjetividade da ação racional visando investigar outras ações em um segundo momento. O tipo ideal fortalecido por sua natureza subjetiva-objetiva poderá ser empregado para pesquisa de ações que se desenvolvem em situações típicas.

Schütz (1974, p. 85) utiliza ainda o termo “títere” para qualificar o tipo ideal de Weber (1991), em função de o pesquisador poder criar, observar e analisar os seres humanos no cenário social que investiga. A análise do mundo social indica a origem da tipificação. Na vida diária, o homem tipifica as atividades humanas como meios adequados para lograr determinados efeitos, não como emanações da personalidade de seus semelhantes. Assim, o tipo ideal na pesquisa social é um quadro de análise utilizado para se esclarecer o problema para o qual foi construído. Nos dizeres de Schütz (1972, p. 69) a relevância da construção de tipos ideais consiste no fato:

...que a conduta dos indivíduos do mundo social real não é previsível, salvo antecipações vazias, a conduta racional de um tipo pessoal construído se supõe previsível por definição, dentro dos limites dos elementos tipificados na construção.

Desse modo, o modelo de ação racional pode ser utilizado como recurso para se estabelecer uma conduta desviada no mundo social real e identificação das causas que levaram ao desvio de comportamento.

Dada à verificação da importância da construção típico-ideal para análise da conduta desviada, tem-se uma explicação de como elaborar um tipo ideal com o rigor necessário ao processo de produção do conhecimento científico.

Logo, o esquema interpretativo típico ideal é um método de análise da realidade e não um dever ser, uma realidade perfeita a ser seguida.

Inicialmente, o esquema interpretativo típico-ideal, conforme definido por Schütz (1972), deve apresentar um tipo ideal de ação e um tipo ideal de pessoa, associados a uma situação típica. Além disso, precisa ser construído a partir dos motivos presentes na ação social, conforme discutido anteriormente. Assim, o pesquisador deve sempre considerar que o

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tipo ideal necessita de uma situação típica, ou seja, um meio social característico, como por exemplo: indústrias, incubadoras de base tecnológica, universidades públicas, hospitais de pronto-atendimento, usinas nucleares, aeroportos, polos produtivos, entre outros.

Após a identificação do meio típico, o pesquisador parte para a análise da ação social, visando constatar quais aspectos a torna típica, quando desempenhada por um sujeito típico.

Essa investigação é pautada na subjetividade do sujeito da ação. Ressalta-se que o tipo ideal é válido somente para o estudo da ação racional orientada para fins específicos, isto é, a ação é direcionada por motivos “para” e “porque”, não sendo motivada apenas por crenças, valores ou emoções. Essa ação é a mais adequada para se enquadrar a estratégia, pois essa sempre resultada de um projeto ou plano. Dessa forma, o tipo ideal é a junção de três aspectos típicos, sendo elaborado a partir da objetivação de dados obtidos em investigações que privilegiam a subjetividade. Vale lembrar que o tipo vivido é anônimo, sendo um quadro de análise para o fenômeno, e não uma descrição exata das vivências.

Considerando esse aspecto anônimo do tipo ideal, o pesquisador passa a investigar a ação racional e o seu significado atribuído por um sujeito. Esse processo de análise de significado e motivos presentes na ação social racional pode ser feito através do método fenomenológico de pesquisa, posto que esse método centra-se no homem, especificamente na análise do significado e relevância da experiência humana. O ponto inicial da investigação fenomenológica é a compreensão do viver.

Uma vez verificado os motivos presentes na ação, ocorre a construção típico-ideal. Tal processo se dá através da cristalização dos motivos recorrentes nos significados atribuídos pelos agentes à sua ação, somados aos motivos que emergiram de forma implícita ao pesquisador, pois a fenomenologia permite a análise do dito pelo não dito. Tal cristalização deve obedecer aos três postulados estipulados por Schütz (1972), descritos a seguir:

1 – Postulado da Coerência Lógica - o sistema de construções ideais elaborado pelos pesquisadores deve ser estabelecido com o mais alto grau de clareza e nitidez, estando totalmente compatível com os princípios da lógica formal. Garante validade ao resultado.

2 – Postulado da Interpretação Subjetiva – a base para a construção de tipos ideais objetivos deve sempre estar na subjetividade do sujeito, pois confere legitimidade ao tipo. O cumprimento desse postulado garante a possibilidade de referir todos os tipos de ação humana ou seu resultado ao sentido subjetivo que tal ação ou resultado de uma ação tem para o ator.

3 – Postulado da Adequação - um modelo científico de ação humana deve ser construído de tal modo que estabeleça vínculo cognitivo com a realidade social. Assim, fica a garantia da compatibilidade entre as construções do pesquisador e as experiências do sentido comum na realidade social.

Assim, o tipo ideal é construído a partir da objetivação de motivos presentes no significado subjetivo que os sujeitos atribuem a sua ação. Portanto, o tipo ideal schutiano é uma proposta metodológica para solucionar a problemática de investigação em ciências sociais, na medida em que tenta conciliar subjetividade e objetividade.

É necessário compreender que o esquema típico ideal nada tem haver com modelo de perfeição a ser seguido. O tipo condensa em uma estrutura tudo o que é específico de um fenômeno para fins de definir um padrão de análise acerca do mesmo, não sendo, portanto, um conjunto de características elencadas. O tipo ideal não é a soma de características principais de um fenômeno, isso é tipologia, mas sim uma estrutura metodológica derivada da apreensão de aspectos que são típicos de uma ação executada por um determinado tipo de

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pessoa, em uma situação definida. O esquema apresentado na sequencia sintetiza a proposta de Schütz (1972) para o trabalho com esquemas típicos ideais.

Figura 3: Base Fenomenológica Social para elaboração de Esquemas Típicos Ideais Fonte: adaptado de Schütz (1972)

Conforme visto na figura acima, o homem no mundo da vida apresenta uma situação biográfica de vida, sendo essa o conjunto de experiências por ele já vivenciadas. Essa situação é marcada pelo acervo de conhecimento ao alcance que permite ao ser reconhecer os objetos no mundo da vida independente de suas características, isto é, o homem sabe que um pássaro é um pássaro não por seu tamanho, sua cor, ou tipo de pena, mas por estruturas de tipificação.

Essas estruturas são usadas por Schütz (1972) como argumentos que permitem a construção e utilização de esquemas típicos ideais para estudar os fenômenos, pois no próprio mundo da vida existem estruturas objetivas de reconhecimentos que estão presentes além das características que singularizam os objetos. Assim, o tipo ideal quer perceber quais os aspectos que são comuns a um fenômeno além de suas características que o tornam particular.

Dando continuidade a explicação da figura, o homem com uma situação biográfica singular se relaciona com outro homem (alter ego), estabelecendo um relacionamento nós, que segundo Schütz (1972) somente pode ser realizado com pessoas consocias ou contemporâneas. Nesse relacionamento, o homem significa sua ação social racional ao orientá-la segundo “motivos porque”, justificativa, e “motivos para”, finalidade. Durante esse processo de significação da ação o homem é livre para escolher dentre as possibilidades que dispõe para realizar seu projeto. Diante da análise dos “motivos porque” e “motivos para”

mais específicos de determinados tipos de homens em dada situação pode-se construir um tipo ideal válido.

A partir desse esquema, tem-se no tópico posterior, a exposição de argumentos que tornam os modelos estratégicos de Porter (1986), Cinco Forças Competitivas e Estratégias

MUNDO DA VIDA

Ego Alter Ego

Situação Biográfica de Vida

Acerco de Conhecimento ao Alcance Tipificações

Relacionamento Nós Encontro Face a face

Consócios

Contemporâneos Intersubjetividade

Ação Social Racional

Possibilidades Problemáticas

“motivo porque” “motivo para”

Esquema Típico Ideal

Ação Pessoa Situação

Objetivação dos motivos recorrentes

+ +

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Genéricas, esquemas típicos ideais. Além disso, aponta-se novas possibilidades de emprego desse conteúdo estratégico relido com tipo.

4 – MODELOS DE ESTRATÉGIA COMO TIPOS IDEAIS

Para se identificar um tipo ideal é preciso, como já visto anteriormente, existir uma estrutura que sintetize os aspectos objetivos (específicos) de um fenômeno, sendo tal estrutura dotada de um tipo definido de ação, pessoa e situação.

Considerando essas premissas, tem-se que o modelo das cinco forças competitivas e estratégias genéricas como já detalhado em outro tópico, apresenta:

Tipo de Ação – Consecução de estratégia de negócios – Estratégias Genéricas Tipo de Pessoa – Estrategista (alta administração de uma empresa).

Situação típica – Indústria de Grande Porte (ambiente de mercado) – Forças Competitivas.

Porter (1986) afirma que a estrutura da indústria é o fator preponderante na escolha da estratégia da empresa. Consequentemente, a estratégia competitiva é vista como a construção de defesas contra o conjunto das forças competitivas, como um modo de influenciar o equilíbrio das forças externas em favor da empresa, ou como uma resposta, antes dos concorrentes, às mudanças nos fatores básicos destas forças.

Logo, pode-se dizer que os modelos de Porter, lidos como tipos ideias, somente são válidos para estudos de um processo de elaboração de estratégia de negócios, por um estrategista pertencente à alta administração de uma corporação de grande porte. Vale lembrar que a assertiva acima justifica o motivo de não se estudar no escopo desse trabalho outros dois trabalhos de Porter (1990, 1993), Cadeia de Valor e Diamante da Competitividade das Nações, uma vez que esses apresentam outra situação típica, respectivamente, ambiente interno de empresas e países, necessitando de investigações posteriores para ver se também podem ser relidos como esquemas interpretativos típicos ideais.

No tipo ideal de ação, as estratégias genéricas representam o constructo teórico derivado dos motivos mais recorrentes e específicos significados pelo estrategista ao elaborar uma estratégia de negócios. A liderança em custo, diferenciação e enfoque, nesse sentido, não são modelos de como se deve executar uma estratégia, mas uma estrutura que retrata o que é objetivo na ação estratégica em uma situação típica de indústria de grande porte. Isso explica porque não se pode encontrar na realidade prática cada uma dessas estratégias perfeitamente aplicadas. Essa impossibilidade de estar puramente desenvolvida na prática corrobora para tese que apresenta as estratégias genéricas como tipos puros, uma vez que esses são anônimos e impossíveis de se encontrar no mundo da vida. Assim, as estratégias genéricas oferecem ao pesquisador a oportunidade de, a partir de suas indicações, comparar condutas desviadas do tipo puro, logo as estratégias de Porter (1986) são parâmetros para se estudar as empresas e, assim, desvelar a vantagem competitiva presente no que é singular a cada organização.

Na situação típica indústria de grande porte, tem-se o modelo das cinco forças competitivas. Esse modelo é um desenho do que é objetivo na realidade empresarial de empresas de grande porte, devido a isso apresenta maior dificuldade ao ser implementado para estudo de cenários de corporações pequeno e médio porte. Essas forças elencadas por Porter (1986) constituem os fatores típicos que permitem a um estudioso comparar diferentes ambientes empresariais. Uma tendência encontrada na literatura é o uso dessa proposta para diagnosticar o ambiente externo da empresa. Isso, contudo, é uma prática parcial, uma vez que o erro consiste em não entender que o ambiente de cada empresa é dinâmico e variado.

Assim, não a como diagnosticar totalmente algo que não é definido único.

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Como tipo ideal, o modelo das cinco forças de Porter (1986) poderá ser utilizado para compreender o que é subjetivo nos ambientes da empresa a partir da utilização das forças como parâmetro de comparação.

O grande legado das cinco forças é fornecer uma base objetiva, presente em qualquer ambiente de indústria, para se compreender o que há de subjetivo, diferencial entre as realidades organizacionais. O modelo não é algo para as empresas se enquadrarem, mas sim instrumentos de pesquisa.

A vantagem competitiva não está em seguir o modelo de Porter (1986), mas na capacidade de compreender o contexto estratégico a partir da objetividade do tipo. Portanto, neste estágio, pode-se tentar responder a pergunta básica que Porter (1986) faz “Por que as indústrias diferem quanto ao seu potencial de lucro?”.

Isso ocorre em virtude das particularidades de cada organização. O tipo ideal fornece um quadro de análise para estudo e identificação dessas particularidades. Em recente seminário Porter (1997) afirmou: "O todo importa mais do que qualquer parte individual”.

(CARNEIRO et.al. 1997, p.24). Nessa perspectiva tem-se que o autor compreende a relevância de esquemas objetivos, que identificam o que é específico nos fenômenos, todavia, a resposta para a competitividade está nas decisões particulares. Do contrário, todas as empresas que adotassem um mesmo conjunto de procedimentos atingiriam certamente igual resultado.

Logo, deve-se importar no estudo da estratégia tanto o todo como as singularidades.

Lembrando que o emprego de tipos ideais é uma proposta metodologia para se conciliar a investigação de aspectos objetivos e subjetivos de um fenômeno, pois os tipos são estruturas anônimas que permitem o estudo de tudo que específico de uma ação, realizada por um determinado tipo de pessoa, em uma situação definida.

Portanto, a proposta da leitura dos modelos estratégicos de Porter (1986) como tipos ideais faz com que esses passem a ser empregados como quadro de análises da situação típica industrial. Como tipo, os modelos passam a ser métodos para se evidenciar a partir de fatores objetivos, aspectos singulares que podem ser decisivos na competitividade, deixando de ser um caminho, uma receita para se alcançar a mesma.

Essa transformação de manual de procedimentos para método de estudo pode ocasionar um grande avanço na dinâmica epistêmica de pesquisa em estratégia. Como objeto de investigação das ciências sociais, o conhecimento acerca da estratégia necessita avançar conjunturamente. Para uma compreensão dessa assertiva, e relevância epistêmica da leitura dos modelos estratégicos de Porter (1986) como tipos ideais, apresenta-se abaixo como ocorre a pesquisa em ciências sociais.

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Figura 4 – Pólos metodológicos em Ciênciais Sociais Fonte: Bruyne, Herman e Schoutheete (1991, p. 36)

Bruyne, Herman e Schoutheete (1991, p. 31-36), investigando a dinâmica da pesquisa nas ciências sociais, observam que esta é complexa, sendo o ambiente societal de importância fundamental nessa discussão, pois desde o início e ao longo de toda sua elaboração a investigação é influenciada por uma série de fatores, chamados de campos, que atuam no seu desenvolvimento.

Campo da demanda social: como membro de uma sociedade específica, o pesquisador tem sua atividade legitimada pelo sistema sócio-cultural desse meio. O conjunto de pesquisadores, as teorias e as experiências, os rituais e as normas, as instituições acadêmicas e científicas exercem controle sobre a pesquisa. Essa sociedade do discurso elabora a ética da pesquisa e a uniformização da linguagem.

Campo axiológico: implica os valores sociais e individuais que condicionam a pesquisa científica. Os valores culturais impõem ao pesquisador a escolha de suas problemáticas, dos temas que investiga.

Campo doxológico: o senso comum, o saber não sistematizado, as evidências da prática cotidiana. A prática científica retira desse campo suas problemáticas específicas, possibilitando o surgimento de conhecimentos mais elaborados.

Campo epistêmico: estado das teorias, da reflexão epistemológica, metodologia e técnicas de investigação. Há aqui o reconhecimento do grau de objetividade do conhecimento científico.

A metodologia é a lógica dos procedimentos científicos em sua gênese e em seu desenvolvimento, devendo ajudar a explicar não somente os resultados das investigações, como ainda o processo de identificação dos mesmos. Nesse sentido, esses campos de influência na pesquisa social, são articulados a partir de quatro pólos metodológicos que determinam à prática científica e concorrem para a cientificidade das práticas de pesquisa.

Para Bruyne, Herman e Schoutheete (1991) os pólos apresentam as seguintes características:

Pólo epistemológico: garantia da objetivação (produção) do objeto científico. Decide as regras de produção e de explicação dos fatos, da compreensão e da validade das teorias. Faz uso de processos discursivos e métodos como a dialética, a fenomenologia, a lógica hipotética-dedutiva e a quantificação. Esses processos não se excluem mutuamente, podendo ser onipresentes, ou não aparecer em certos tipos de pesquisa.

Pólo teórico: embasa a formulação de hipóteses e construção de conceitos. Propõe regras de interpretação dos fatos, de especificação e de definição das soluções dadas às problemáticas.

Utiliza quadros de referência que desempenham papel paradigmático implícito, sendo os principais o positivista, o compreensivo, o funcionalista e o estruturalista.

Pólo morfológico: enuncia as regras de estruturação e de formação do objeto científico, além de ordenar seus elementos constituintes. Os principais quadros de análise são a tipologia, o tipo ideal, o sistema e os modelos estruturais.

Pólo técnico: controla a coleta de dados, sendo os principais modos de investigação o estudo de caso, estudos comparativos, experimentações e simulação. Esses modos de investigação indicam escolhas práticas pelas quais os pesquisadores optam por um tipo particular de encontro com os fatos empíricos.

Diante dessa compreensão de como se processa a pesquisa em ciências sociais, fica evidente que no polo morfológico da investigação em estratégia faz-se necessário o emprego de tipos ideais. Mais uma vez, vale ponderar que esses são diferentes de tipologias, já que essas consistem na construção de estruturas baseadas em características de um fenômeno, podendo ser facilmente identificadas na realidade. As tipologias são como uma fotografia do

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fenômeno, com cores, tamanho, forma, dimensão, expressão e, já os tipos são como a estrutura óssea do mesmo, algo que todos apresentam, mas está além da aparência.

Finalizando, tem-se que o emprego dos modelos estratégicos de Porter como tipos ideias muito têm a contribuir para a epistemologia e morfologia da pesquisa em estratégia.

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta de releitura dos modelos estratégicos de Porter (1986) como esquemas típicos ideias baseados na fenomenologia social se mostra válida e pertinente, na medida em que isso implica em avanço epistêmico e morfológico para a pesquisa em estratégia.

Observa-se que as estratégias genéricas são tipos específicos de ação estratégica, enquanto as cinco forças competitivas representam as especificidades do ambiente industrial de corporações de grande porte. Essa validade do tipo para uma situação típica, responde as críticas que vários pesquisadores fazem aos trabalhos desse autor. No mais, o caráter objetivo e anônimo do tipo, responde o motivo da impossibilidade das estratégias genéricas serem encontradas puramente na prática organizacional.

A compreensão dos modelos como esquemas típicos ideais resulta na transformação desses em métodos de pesquisa, quadro de análise, capazes de fornecer parâmetros objetivos para se investigar as singularidades da organização, fontes reais de competitividade, deixando de ser simples manuais de boas práticas em estratégia.

No mais, reitera-se que a proposta desse artigo não consiste em uma crítica a Porter (1986) ou a seus seguidores que utilizam sua obra como um caminho prescritivo. O objetivo é fornecer um novo acesso ao fenômeno estratégico. Evidencia-se que os modelos de estratégia são mais do que foram criados para ser, podendo ser empregados como importante recurso metodológico, sendo uma via de acesso a fatores objetivos e subjetivos da estratégia empresarial.

6 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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